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quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

O mundo irreal de Doria e Guedes - Elio Gaspari


 Doria e Guedes estão em outro mundo ao falar de violência

Ministro teme gente quebrando tudo, mas, até agora, quem apareceu quebrando os outros foram policiais

Exatamente uma semana depois de a PM de Wilson Witzel ter sujado a festa do Flamengo, o governador João Doria disse no domingo que São Paulo tem uma polícia preparada, equipada e bem informada.” Naquela hora, os corpos de nove jovens estavam no necrotério, pisoteados depois de uma entrada truculenta de sua PM num pancadão de Paraisópolis. Nas bancas e na rede, nesse mesmo domingo, estava também a entrevista do ministro Paulo Guedes à repórter Ana Clara Costa, na qual ele explicava o “timing” de suas reformas:
“Você dá pretexto para os outros fazerem bagunça. (...) Chamar pra rua manifestação ordeira e pacífica, como a que fazem quase todo fim de semana, problema nenhum. Agora, chamar para a rua para fazer igual no Chile e quebrar tudo foi uma insanidade, irresponsabilidade.”  [causa estranheza é a pressa com que todos acusam  a Polícia Militar.
Todas as vitimas, fatais e feridas, sofreram ferimentos causados pelo pisoteamento. Depoimentos anônimos, informais, - sem credibilidade e imparcialidade - relatam a ocorrência de tiros - nenhuma vítima, ferida ou morta, foi ferida por arma de fogo.

O grande responsável pelo tumulto - gerado  quando mais policiais tiveram que ingressar no recinto da bagunça (bailes Funk precisam ser proibidos - além de representarem atentado a MORAL, BONS COSTUMES, são realizados em locais SEM A MÍNIMA ESTRUTURA para o caso de incêndios, tumultos) atender ao solicitado por policiais que estavam cercados pela multidão - é o responsável pelo realização do que chamam de 'baile'.

Quem promove qualquer atividade com grande concentração de multidão é o responsável por qualquer tragédia que venha a ocorrer - não vale argumentar que é favela e lá tudo vale, o local tem certamente um proprietário e este tem ser responsabilizado se não existir (o que é improvável) um responsável pelo evento.

O correto é responsabilizar os promotores do evento. Na boate KISS foram responsabilizados os proprietários da boate e autoridades que foram coniventes em liberar o local sem prévio atendimento das condições de segurança.]

Há algumas semanas, o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, acompanhando uma ameaça vinda de um filho do presidente, havia cantado a pedra do perigo chileno como justificativa para um surto ditatorial: “Acho que, se houver uma coisa no padrão do Chile, é lógico que tem de fazer alguma coisa para conter.”  [o comentário do general merece apoio de qualquer pessoa sensata - ou a regra é permitir que o Brasil se transforme em uma Nação com ocorrência de tumultos, manifestações violentas e coisas do gênero?
quanto às críticas à Polícia Militar, pelo uso de bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo, é uma obrigação de tropa responsável pelo controle de tumultos, optar, sempre que possível pela utilização de meios não letais. ]

É irresponsabilidade (ou desejo) trazer o espantalho chileno para a situação brasileira, e a tragédia de Paraisópolis, bem como a pancadaria da festa do Flamengo, mostra que nos dois casos a insanidade saiu da PM. Não é de hoje que isso acontece.
Em outubro do ano passado, durante a gestão do governador Márcio França, a PM entrou num pancadão de Guarulhos, e três pessoas morreram em situação semelhante à de Paraisópolis. Doutor Doria poderia examinar a investigação do episódio de Guarulhos. Com uma polícia “preparada, equipada e bem informada”, deu em nada. 

Um morador de Paraisópolis contou que a PM “chegou jogando bombas de efeito moral”. Pode ser que não tenha sido assim, mas na noite de 13 de junho de 2013, a PM paulista bloqueou uma passeata que protestava contra o reajuste dos ônibus na esquina da Rua da Consolação com a Maria Antônia. Quem estava lá viu que uns 20 policiais vieram do nada, jogando bombas de efeito moral. Aquela passeata era ordeira, convocada pelo Movimento Passe Livre e povoada por gente de tênis baratos e camisetas.

Começavam as jornadas de 2013. Anos depois, as manifestações transmutaram-se, e a presidente Dilma Rousseff foi deposta. (Vale lembrar que o governador tucano Geraldo Alckmin e o prefeito petista Fernando Haddad, do PT, que haviam reajustado as tarifas, estavam num evento em Paris, onde cantaram “Trem das onze” durante um jantar.)
Guedes teme que apareça gente “quebrando tudo”, mas, até agora, quem apareceu quebrando os outros foram policiais, em São Paulo e no Rio. Esse comportamento persiste pela garantia da impunidade. 

Nas divagações chilenas de Guedes e do general Heleno insinuam-se paralelos de incitação política. Já que é assim, pode-se temer também que a incitação política venha de outro lado. Em 1968, ela vinha de um maluco chamado Aladino Félix. Antes que terroristas de esquerda começassem a assaltar bancos e a matar gente (naquele ano), ele roubava dinamite e armas. Assaltou pelo menos um banco, explodiu uma bomba na Bolsa e outra num oleoduto. Como era doido, não se pode acreditar na sua palavra quando dizia que estava ligado a um general da reserva que, por sua vez, teria conexões com o governo. Uma coisa é certa: no seu grupo estavam 14 soldados e sargentos da Força Pública de São Paulo, mais tarde transformada numa Polícia Militar.
Naqueles dias o governador de São Paulo, Abreu Sodré, denunciava uma conspiração nos “subúrbios do poder”.

Folha de S.Paulo e O Globo - Elio Gaspari, colunista

 

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