Folha de S. Paulo/UOL - O Globo - Elio Gaspari
Graças à Lava Jato e a uma delação, destampou-se um dos panelões do Sistema S no Rio
Os e$quemas do $istema $Assim é o Sistema S.
Faz homenagens e tem uma bela caixa, pela qual ao longo dos tempos já passou muita gente boa
O que houve foi uma clara investigação das atividades criminais de 22 advogados, um auditor e um jornalista (Sérgio Cabral)
Em dezembro de 2018, durante aquele doce período que antecede a posse de um governo, o doutor Paulo Guedes disse que era preciso “meter a faca” no Sistema S. Falava daquele conglomerado de instituições que tiram da veia do sistema produtivo até 2,5% do valor das folhas de pagamento das empresas, um ervanário que vai cerca de R$ 18 bilhões anuais.
Esse era o tempo em que Guedes acreditava ser um superministro. Em
agosto de 2019 o presidente Jair Bolsonaro foi ao Piauí e inaugurou a
Escola Jair Messias Bolsonaro. De quem era a escola? Do Sesc, uma das
joias do Sistema S. Valdeci Cavalcante, presidente do Sesc-PI,
esclareceu: “Não estamos homenageando o Bolsonaro. Ele é que irá nos
homenagear se aceitar colocar seu nome em nossos anais.” Assim é o Sistema S. Faz homenagens e tem uma bela caixa, pela qual ao
longo dos tempos já passou muita gente boa. Em dois anos de ministério,
Paulo Guedes não meteu sequer um canivete por esse lado sombrio do andar
de cima nacional.
Felizmente, graças à Lava-Jato do Rio, e à colaboração do mandarim
Orlando Diniz que começou a mandar na Fecomércio do Rio em 2004,
destampou-se um dos panelões do Sistema S no Rio. Ali fraudavam-se
contratos com escritórios de advocacia para corromper magistrados,
fiscais, e quem estivesse a fim de receber um dinheirinho fácil. Quando a Polícia Federal cumpriu 50 mandados de busca e apreensão em
cinco Estados e em Brasília, numa operação denominada Esquema $, a Ordem
dos Advogados do Brasil viu na diligência uma “clara iniciativa de
criminalização da advocacia”. [os ilustres advogados são acusados da prática de crimes e seu órgão de classe acusa a Polícia Federal de criminalizar a advocacia.] A menos que um "anjo da guarda" do Supremo
Tribunal diga o contrário, houve uma confusão na redação da nota, pois o
que houve foi uma clara investigação das atividades criminais de 22
advogados, um auditor do Tribunal de Contas e um jornalista (Sérgio
Cabral).
A Operação Esquema $ foi socorrida pela colaboração de Orlando Diniz. No
século passado ele começou com um pequeno açougue em Copacabana,
presidiu o Sindicato do Comércio Varejista de Carnes do Rio, foi vizinho
de Sérgio “O Gestor” Cabral e tornou-se um dos mandarins do Sistema S
do Rio, em cujos domínios há até um chateau francês, com direito a chef.
Meteu-se em uma encrenca com os marqueses da Confederação Nacional do
Comércio e, em 2018, passou um tempo na cadeia e deixou o cargo.
Suas malfeitorias, bem como a conexão com Cabral e a advogada Adriana
Ancelmo, são conhecidas desde 2013. Graças às informações que reuniu e
aos atos que ratificou, Diniz deu à Lava-Jato o mapa da mina das
roubalheiras embutidas em falsos contratos de advocacia. A denúncia de 510 páginas do Ministério Público tem de tudo, parentes de
magistrados, advogados de personalidades e até mesmo a cozinheira de
Cabral contratada por um braço do Sistema S. Quem já bebeu águas
barrentas saídas da Lava-Jato deve se acautelar à espera de sentenças
judiciais. Até lá, a Operação Esquema $ poderá ajudar Paulo Guedes a
“meter a faca” nessa forma de oneração da mão de obra nacional.
Todas as fraudes denunciadas, envolvendo pelo menos R$ 151 milhões,
destinavam-se a proteger o Sistema e seu maganos. Em um raciocínio
cínico, admita-se que uma empreiteira distribuiu R$ 10 milhões na obra
de uma ponte. Tudo bem, mas a ponte foi entregue. A Fecomércio do Rio, socorrida por suas irmãs do Sistema, torrou R$ 151
milhões para nada. Se um “mano” fizer isso no Morro do Borel, amanhece
com a boca cheia de formigas. Os marqueses do Sistema S dizem que cuidam
de centros culturais e escolas de aprendizado técnico. Vá lá, mas isso
custa em torno de 20% do que gastam. Os 80% pagam pirâmides como o
prédio da Fiesp y otras cositas más. Uma coisa é certa, se algum dia o doutor Paulo Guedes meter a faca no
Sistema S, o Sesc do Piauí não botará seu nome numa escola.
A terceira vaga
Em novembro o ministro Celso de Mello deixará o Supremo Tribunal Federal
e, em junho do ano que vem, será a vez de Marco Aurélio. Assim, o
calendário dará a Jair Bolsonaro o direito de preencher duas vagas na
Corte. Até agora, a corrida pelos lugares tem ofendido as regras do esporte.
Primeiro porque o presidente criou a qualificação de “terrivelmente
evangélico” para o preenchimento de um cargo laico. Depois, pela
atividades de André Mendonça, atual ministro da Justiça. Em poucos
meses, sua pasta meteu-se em ações tão espetaculares quanto ridículas,
processando chargistas e intimando supermercados para justificar o preço
do arroz.
A escolha dos ministros do Supremo compete ao presidente, e os
candidatos têm o direito de se comportar como bem entendem. Poderiam
acreditar nos próprios currículos, mas tentam lustrá-los. A novidade está no aparecimento da teoria da “terceira vaga”. Pelas
regras do jogo, a próxima vaga no STF só surgirá em maio de 2023, quando
Ricardo Lewandowski completa 75 anos. A “terceira vaga” surgiria
oferecendo-se uma embaixada a algum titular do Tribunal.
Folha de S. Paulo/UOL - O Globo - MATÉRIA COMPLETA - Elio Gaspari, jornalista
Esse era o tempo em que Guedes acreditava ser um superministro. Em
agosto de 2019 o presidente Jair Bolsonaro foi ao Piauí e inaugurou a
Escola Jair Messias Bolsonaro. De quem era a escola? Do Sesc, uma das
joias do Sistema S. Valdeci Cavalcante, presidente do Sesc-PI,
esclareceu: “Não estamos homenageando o Bolsonaro. Ele é que irá nos
homenagear se aceitar colocar seu nome em nossos anais.” Assim é o Sistema S. Faz homenagens e tem uma bela caixa, pela qual ao
longo dos tempos já passou muita gente boa. Em dois anos de ministério,
Paulo Guedes não meteu sequer um canivete por esse lado sombrio do andar
de cima nacional.
Felizmente, graças à Lava-Jato do Rio, e à colaboração do mandarim
Orlando Diniz que começou a mandar na Fecomércio do Rio em 2004,
destampou-se um dos panelões do Sistema S no Rio. Ali fraudavam-se
contratos com escritórios de advocacia para corromper magistrados,
fiscais, e quem estivesse a fim de receber um dinheirinho fácil. Quando a Polícia Federal cumpriu 50 mandados de busca e apreensão em
cinco Estados e em Brasília, numa operação denominada Esquema $, a Ordem
dos Advogados do Brasil viu na diligência uma “clara iniciativa de
criminalização da advocacia”. [os ilustres advogados são acusados da prática de crimes e seu órgão de classe acusa a Polícia Federal de criminalizar a advocacia.] A menos que um "anjo da guarda" do Supremo
Tribunal diga o contrário, houve uma confusão na redação da nota, pois o
que houve foi uma clara investigação das atividades criminais de 22
advogados, um auditor do Tribunal de Contas e um jornalista (Sérgio
Cabral).
A Operação Esquema $ foi socorrida pela colaboração de Orlando Diniz. No
século passado ele começou com um pequeno açougue em Copacabana,
presidiu o Sindicato do Comércio Varejista de Carnes do Rio, foi vizinho
de Sérgio “O Gestor” Cabral e tornou-se um dos mandarins do Sistema S
do Rio, em cujos domínios há até um chateau francês, com direito a chef.
Meteu-se em uma encrenca com os marqueses da Confederação Nacional do
Comércio e, em 2018, passou um tempo na cadeia e deixou o cargo.
Suas malfeitorias, bem como a conexão com Cabral e a advogada Adriana
Ancelmo, são conhecidas desde 2013. Graças às informações que reuniu e
aos atos que ratificou, Diniz deu à Lava-Jato o mapa da mina das
roubalheiras embutidas em falsos contratos de advocacia. A denúncia de 510 páginas do Ministério Público tem de tudo, parentes de
magistrados, advogados de personalidades e até mesmo a cozinheira de
Cabral contratada por um braço do Sistema S. Quem já bebeu águas
barrentas saídas da Lava-Jato deve se acautelar à espera de sentenças
judiciais. Até lá, a Operação Esquema $ poderá ajudar Paulo Guedes a
“meter a faca” nessa forma de oneração da mão de obra nacional.
Todas as fraudes denunciadas, envolvendo pelo menos R$ 151 milhões,
destinavam-se a proteger o Sistema e seu maganos. Em um raciocínio
cínico, admita-se que uma empreiteira distribuiu R$ 10 milhões na obra
de uma ponte. Tudo bem, mas a ponte foi entregue. A Fecomércio do Rio, socorrida por suas irmãs do Sistema, torrou R$ 151
milhões para nada. Se um “mano” fizer isso no Morro do Borel, amanhece
com a boca cheia de formigas. Os marqueses do Sistema S dizem que cuidam
de centros culturais e escolas de aprendizado técnico. Vá lá, mas isso
custa em torno de 20% do que gastam. Os 80% pagam pirâmides como o
prédio da Fiesp y otras cositas más. Uma coisa é certa, se algum dia o doutor Paulo Guedes meter a faca no
Sistema S, o Sesc do Piauí não botará seu nome numa escola.
A terceira vaga
Em novembro o ministro Celso de Mello deixará o Supremo Tribunal Federal
e, em junho do ano que vem, será a vez de Marco Aurélio. Assim, o
calendário dará a Jair Bolsonaro o direito de preencher duas vagas na
Corte. Até agora, a corrida pelos lugares tem ofendido as regras do esporte.
Primeiro porque o presidente criou a qualificação de “terrivelmente
evangélico” para o preenchimento de um cargo laico. Depois, pela
atividades de André Mendonça, atual ministro da Justiça. Em poucos
meses, sua pasta meteu-se em ações tão espetaculares quanto ridículas,
processando chargistas e intimando supermercados para justificar o preço
do arroz.
A escolha dos ministros do Supremo compete ao presidente, e os
candidatos têm o direito de se comportar como bem entendem. Poderiam
acreditar nos próprios currículos, mas tentam lustrá-los. A novidade está no aparecimento da teoria da “terceira vaga”. Pelas
regras do jogo, a próxima vaga no STF só surgirá em maio de 2023, quando
Ricardo Lewandowski completa 75 anos. A “terceira vaga” surgiria
oferecendo-se uma embaixada a algum titular do Tribunal.
Folha de S. Paulo/UOL - O Globo - MATÉRIA COMPLETA - Elio Gaspari, jornalista
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