Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador VERGONHA. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador VERGONHA. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 9 de março de 2022

Você (não) está transando? - Revista Oeste

Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

Uma  dessas pesquisas (coordenada pela Universidade de Chicago) entrevistou mais de 9 mil pessoas nos EUA entre 2000 e 2018. Alguns dos resultados:

  • um terço dos homens entre 18 e 24 anos revelou não ter tido nenhuma atividade sexual no ano anterior;
  • a atividade sexual entre mulheres dos 25 aos 34 anos caiu de 12% para 7% nesse período;
  • a proporção de jovens adolescentes que não praticavam qualquer tipo de sexo subiu de 28,8% para 44,2%.

Outra pesquisa, com 7 mil mulheres australianas entre 18 e 39 anos, concluiu que metade delas experimentou algum tipo de angústia quando teve relações “stress, culpa, vergonha ou infelicidade sobre suas vidas sexuais”. E sexo supostamente existe para dar prazer, e não angústia.

Uma terceira pesquisa, realizada no Reino Unido, ouviu 8.500 pessoas e chegou a conclusões pouco animadoras, reveladas no ano passado. Em 1991, os pesquisados disseram que transavam cinco vezes por mês. Em 2001, essa frequência caiu para quatro vezes e, em 2021, caiu para três. Um estudo alemão localizou essa tendência inclusive em casais que moravam juntos. 

E não são casos isolados. Segundo Soazig Clifton, diretora do serviço de pesquisas Natsal do University College London,se você olhar pelo mundo, outros estudos semelhantes mostram também uma queda. Então, está parecendo uma tendência internacional”. Claro que essas pesquisas geralmente não focam nas camadas mais pobres e culturalmente precárias das populações. Mesmo assim, servem como termômetro de tendência.

O que está acontecendo? Dentro de uma perspectiva histórica, estamos vivendo uma era que deveria configurar o auge da nossa atividade sexual. Temos métodos anticoncepcionais, medicamentos e acessórios para tornar o sexo confortável e até pílulas que garantem a ereção masculina. O que mais é necessário?

O site Pornhub teve 42 bilhões de visitas em 2019. São 115 milhões de visitantes por dia

Existem algumas teorias levantadas para tentar explicar essa queda no interesse por sexo. Nenhuma delas é conclusiva, mas a soma indica algumas pistas.

Estamos mais ocupados
Aplicativos, celulares, sistemas de teleconferência, trabalho sem horário, séries que não acabam, grupos de WhatsApp, a guerra no noticiário. O mundo conectado nos dá cada vez menos tempo para as providências básicas de um momento de sexo: relaxar, criar um clima, nos entregar a preliminares, etc. Nada disso impede uma vida sexual intensa e rica para quem está disposto a isso. Mas dificulta bastante. Quantas dezenas de cenas românticas em filmes a gente já viu sendo interrompidas pelo celular?

Pandemia e paranoia

As medidas muitas vezes exageradas para combater a covid fizeram com que mesmo os casais mais íntimos passassem a se olhar com desconfiança. Se a situação estava tão feia que ficou arriscado até respirar ao lado de alguém, qual o incentivo para que, no mínimo, se beijem? Segundo a psiquiatra Carmita Abdo, especialista em sexualidade da USP, o início do lockdown até ajudou a que pessoas praticassem mais sexo por estar trancadas. Mas, conforme a pandemia foi se prolongando, “a prática sexual passou a ser mais esporádica, e as falhas, como falta de desejo, bastante frequentes.” O que, segundo a doutora Abdo, aumentou os casos de violência doméstica, divórcios e separações.

Efeito Instagram

A busca da intimidade de astros e estrelas já custou o preço de um exemplar da Playboy. Um flash de uma pessoa famosa com pouca roupa era um prêmio a ser conquistado. Hoje, esses astros e estrelas se exibem pelo Instagram em busca de curtidas. Aconteceu uma vulgarização da intimidade, de segredos que só eram permitidos para poucos. Ícones tiram fotos de si mesmos, em ambientes artificiais e cheios de ostentação. A imagem que eles projetam joga a nossa vida na vala comum da frustração e da impotência. Descontentes com a vida que levamos, baixamos nosso nível de libido um pouco mais. 
 
Pornô para todos
Só o site Pornhub teve 42 bilhões de visitas em 2019. São 115 milhões de visitantes por dia. Ou 14 milhões por hora. Ou mais de 240 mil por minuto. Ou 4 mil a cada segundo. Como informa o site da empresa, “este é o equivalente às populações de Canadá, Austrália, Polônia e Holanda”. São 209 gigabytes de pornô por segundo
E ficou longe o tempo de degradação e abuso de mulheres, como Linda Lovelace em seu Garganta Profunda (1972). A maioria das produções hoje envolve casais querendo ganhar um dinheiro extra, às vezes farto, com produções caseiras. Deixou de ser também um produto exclusivamente para homens tarados. Bissexuais, trans, gays, mulheres, homens, lésbicas, idosos, todo tipo de gente (menos menores de idade) está estrelando filmes no Pornhub. 
E o usuário tem milhões de possibilidades para encontrar sua fantasia perfeita. A idade média do visitante é 36 anos. A maior faixa de público (36%) está entre os 25 e os 34 anos. O tempo médio de uso no Pornhub é de dez minutos, muito provavelmente o tempo que leva uma pessoa a procurar a autossatisfação. Conclusão: está cada vez mais fácil fazer sexo a sós. E nos fazer refletir sobre as consequências do sexo “presencial”. E essa tendência parece cada vez mais irreversível.

(...)

Leia também “Museu de ideias mortas”

Dagomir Marquezi, colunista - Revista Oeste  - MATÉRIA COMPLETA


quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

2022: VIVA CUBA LIBRE! - Jorge Hernández Fonseca

Não há outro futuro possível para Cuba do que ser livre novamente. A farsa "revolucionária" terminou em 11 de julho, com os cubanos na ilha clamando pela liberdade, em maiúsculas. O que as "viúvas" de Fidel Castro oferecem como futuro é continuar sua "pequena guerra" particular contra os Estados Unidos da América - a única "conquista" tangível da tardia e pestilenta "revolução cubana" - uma conquista que a nenhum cubano interessa, fora da liderança ditatorial.

Uma "revolução" que ofereceu "mundos e fundos" e que depois de 63 anos de enganos e mentiras, milhares de tiros e centenas de milhares de presos políticos, o que nos apresenta é a fome, a desesperança e o desenraizamento do melhor da juventude cubana: uma vergonha !

O único e grotesco argumento "teórico" da gangue que comanda tal "revolução" para permanecer no poder com sangue e fogo, é "para evitar o retorno do capitalismo explorador" e para isso, eles inventaram uma "sinecura" nacional para pague aos cubanos em pesos e venda o que eles precisam em dólares. Algo que nem mesmo o pior explorador do capitalismo ousou fazer.

Não há motivos políticos, econômicos e muito menos morais para continuar com o desenfreado mecanismo "revolucionário" de sacrificar cubanos dentro de Cuba, apenas para que os filhos de Raúl Castro ocupem as casas dos exilados, para que possam gozar férias no exterior - como filhos de reis - para que possam dirigir Mercedes enquanto os cubanos não têm ônibus. Não há razão e é por isso que eles têm que ir embora!

A sobrevivência do regime ditatorial cubano não depende mais apenas das ideologias comunistas ou capitalistas. Outras forças internacionais aproveitam a opressão que a "revolução" tem contra os cubanos e ameaçam exportar seu sistema para outros países latino-americanos - um negócio lucrativo e em expansão, como evidenciado pelas vitórias da esquerda no Peru, Honduras, Chile e com risco de espalhar-se para a Colômbia e o Brasil - o que significa uma sobrevida à exploração comunista contra os cubanos da ilha.

A disposição demonstrada do povo da ilha para enfrentar as injustiças "revolucionárias", a divisão interna da ditadura e a pressão externa do exílio militante enfraquecerá o absurdo explorador dos comunistas de Castro para, mais cedo ou mais tarde, termos aquela Cuba Libre que todos os cubanos merecem e isso o castrismo agora limita.

 Jorge Hernández Fonseca - Acesse e saiba mais


domingo, 10 de outubro de 2021

Shownalismo - Pobreza menstrual, a era dos factoides e o PT xingando Tabata Amaral - VOZES

Gazeta do Povo - Madeleine Lacsko

É inadmissível uma menina não ter um absorvente em pleno século XXI. Infelizmente, o projeto parcialmente vetado não resolvia isso.

Depois de ver o circo que virou um tema tão delicado e importante como a pobreza menstrual, eu havia decidido não escrever sobre. Já estava tentada a enfrentar a questão depois de ler a excelente entrevista da Maria Clara Vieira com o Peter Boghossian. Daí, uma publicação da Helen Pluckrose que me levou a escrever hoje:
Vejo muitas pessoas se desesperando com nossa situação atual e cometendo o erro de pensar que temos apenas duas opções:
1) Siga as abordagens dos justiceiros sociais para questões de raça, sexualidade, gênero, etc.
2) Oponha-se aos justiceiros sociais maneiras que nos impeçam de abordar essas questões.
Não se desesperem. Há razões para ser otimista.

 

Pobreza menstrual, a era dos factoides e o PT xingando Tabata Amaral -  Foto: Bigstock


Juntei todo meu otimismo e farei uma abordagem de jornalismo opinativo sobre o tema. É a modalidade em que temos direito à nossa própria opinião mas não aos nossos próprios fatos. A modalidade em que os fatos são modificados para coincidir com a opinião chama-se SHOWNALISMO, está em alta no mundo todo e agrada muito o público e os algoritmos de rede social. É assim que temos debatido a pobreza menstrual.

Eu sinceramente não tenho a menor ideia se são ou não verdadeiros os números de mulheres que deixam de trabalhar ou estudar durante o período menstrual porque não têm absorvente. Não imaginava que isso existisse, não fazia parte do meu universo. Fucei aqui e acolá. Acabei descobrindo no meu círculo de relacionamentos uma meia dúzia de casos reais. Jamais reclamaram por vergonha, é muito delicado. Eu fiquei de coração partido.

Um único caso de menina que fique sem ir à escola porque não tem absorvente já é inadmissível.  
Como isso pode acontecer num país presenteado por Deus com abundância? 
Não pode existir isso na nossa sociedade. E hoje podemos falar disso abertamente nos grandes centros. Conheço gente no interior que não fala publicamente de menstruação. Lembro da vergonha que eu tinha décadas atrás, jamais falaria disso na frente de um homem. Superada essa barreira, podemos resolver um problema cruel, que deixa marcas psicológicas horríveis.

A questão é COMO evitar que continuemos a ser uma sociedade que convive com a crueldade da perda de oportunidades educacionais e profissionais por falta de absorvente? É uma situação grotesca, que precisa de solução. O projeto aprovado pelo Congresso e parcialmente vetado pelo Executivo resolveria? Não. Ele não faria o absorvente chegar a todas as meninas que precisam porque gestão de Saúde e Educação é compartilhada entre as 3 esferas de governo. Serve para abrir discussão.

Lembra daquela história do Governo Federal tentando reverter medidas sobre COVID tomadas por prefeitos e governadores que foi parar no STF? Falo dessa decisão específica porque virou uma lenda urbana na máquina de moer fatos das redes sociais. Uma coisa foi fato: Governo Federal não pode tomar medida de Saúde que contrarie decisão de Estados e Municípios porque a gestão é compartilhada. É assim na Educação também. Nem pode mandar distribuir absorvente como previa o projeto via Governo Federal.

Seja no sistema de Saúde ou de Educação, a decisão é nos 3 âmbitos. Governo Federal define para o Federal, governos Estaduais para os Estados e governos municipais para os municípios. [lembrando que pela suprema decisão sobre Covid-19, o Governo Federal não pode tomar decisão que contrarie decisão de Estados e Municípios - como aplicar no Brasil, formado por estados e municípios, uma decisão que contrarie decisão dos prefeitos e governadores? ] Aqui em São Paulo, já há lei municipal regendo distribuição de absorventes por órgãos municipais e programa estadual de distribuição de absorventes por órgãos estaduais. Ah, mas não foi isso que o Bolsonaro alegou para vetar. Também foi, só ler o Diário Oficial.

Vivemos a Economia da Atenção. É interessante no ano pré-eleitoral atacar Bolsonaro por negar até absorvente a adolescente pobre. Também é interessante para o governo alegar que vetou mesmo e foi por responsabilidade fiscal. Mentir está sendo muito frutífero para os dois lados e a imprensa embarcou com vontade. O fato é que nem o projeto foi vetado - o programa foi criado ontem - e nem a derrubada do veto parcial garantirá absorvente para mulher que não tem como comprar. Danem-se os fatos, importa capturar a sua atenção. Vai deixar?

Direito seu deixar que o debate público seja dominado por mentiras que engajam muito, mas vou insistir no otimismo. Além de colocar o link, faço questão de transcrever o projeto e mostrar a você que já é lei e foi criado um "Programa de Promoção e Proteção da Saúde Menstrual":

"LEI Nº 14.214, DE 6 DE OUTUBRO DE 2021

Institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual; e altera a Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006, para determinar que as cestas básicas entregues no âmbito do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan) deverão conter como item essencial o absorvente higiênico feminino.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º  (VETADO).
Art. 2º É instituído o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual, que constitui estratégia para promoção da saúde e atenção à higiene e possui os seguintes objetivos:
I - combater a precariedade menstrual, identificada como a falta de acesso a produtos de higiene e a outros itens necessários ao período da menstruação feminina, ou a falta de recursos que possibilitem a sua aquisição;
II - oferecer garantia de cuidados básicos de saúde e desenvolver meios para a inclusão das mulheres em ações e programas de proteção à saúde menstrual.
Art. 3º (VETADO).
Art. 4º O Programa instituído por esta Lei será implementado de forma integrada entre todos os entes federados, mediante atuação, em especial, das áreas de saúde, de assistência social, de educação e de segurança pública.
§ 1º O Poder Público promoverá campanha informativa sobre a saúde menstrual e as suas consequências para a saúde da mulher.
§ 2º Os gestores da área de educação ficam autorizados a realizar os gastos necessários para o atendimento do disposto nesta Lei.
Art. 5º (VETADO).
Art. 6º(VETADO).
Art. 7º (VETADO).
Art. 8º Esta Lei entra em vigor após decorridos 120 (cento e vinte) dias de sua publicação oficial."

O veto parcial
Você pode ver que há quatro artigos inteiros vetados. Não podia deixar nem uma partezinha? Não. Quando o Executivo analisa projeto aprovado pelo Legislativo, ou sanciona ou veta o artigo ou o inciso completos. Ou entra do jeito que foi escrito pelos parlamentares ou é inteiramente anulado. E há vários artigos com vícios técnicos incontornáveis.
Sei que muita gente vai chiar pelo que eu estou falando porque vale tudo para bater em Bolsonaro. Da mesma forma, muita gente chiava quando eu dizia que o trabalho insuficiente do Ministério Público ia acabar soltando todo mundo na Lava Jato e no Mensalão.  
Se o que é dito em entrevista não estiver no papel, não vale, tem de trabalhar e fazer o documento direito. "Ah, mas se fosse projeto de governista, ele teria aprovado". 
Sem dúvida e político de oposição sabe disso. Excelência técnica é o pedágio cobrado no Brasil para quem não é do governo da vez.

Vamos aos artigos vetados, um por um. Sei que tem gente séria dizendo que a justificativa do governo é balela. Fazem por comparação. É verdade que projetos com muito mais problemas e com custo provavelmente mais alto foram sancionados mesmo sem ter a menor condição técnica. Como exemplo, temos os bônus de hoje e o sarapatel de coruja do orçamento secreto. Só que isso não tira os problemas técnicos do projeto da pobreza menstrual.

Vetado: "Esta Lei institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual para assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos e outros cuidados básicos de saúde menstrual."

Como uma lei assegura algo? Ela não assegura, ela institui e espera que seja suficiente para assegurar ou estabelece penalidade para o descumprimento. De que "outros cuidados básicos" estamos falando? Quanto custa isso? Quem paga o quê e qual a previsão orçamentária? 
E se houver município que não precisa da gratuidade, vai ter de ofertar o gratuito porque a lei assegura?

Vetado: "Art. 3º São beneficiárias do Programa instituído por esta Lei:
I - estudantes de baixa renda matriculadas em escolas da rede pública de ensino;
II - mulheres em situação de rua ou em situação de vulnerabilidade social extrema;
III - mulheres apreendidas e presidiárias, recolhidas em unidades do sistema penal; e
IV - mulheres internadas em unidades para cumprimento de medida socioeducativa.
§ 1º Os critérios de quantidade e a forma da oferta gratuita de absorventes e outros itens necessários à implementação do Programa serão definidos em regulamento."
Este artigo é do tipo que me irrita porque esfrega na cara que ninguém pensou em como implementar o projeto, só em como dar entrevista. Quando você fala da rede pública de ensino ou do SUS, não pode dividir usuários. Ou é universal ou não faz. Só pode dividir por razões científicas e técnicas.

A qualidade da divisão de público quero acreditar que seja apenas pueril ou desleixada, não mal intencionada. Explico com perguntas:

- Se a estudante de baixa renda ganhar uma bolsa de estudos de uma escola particular, ela não pode receber absorvente? 
- A moça de baixa renda que não estuda ou a mãe de baixa renda da tal estudante também não recebem? 
- Ou só recebem se estiverem presas ou forem morar na rua?
- De onde tiraram a definição "vulnerabilidade social extrema"? O que define, segundo esse critério, quem pode ou não receber absorvente? A mulher rica que apanhou do marido e fugiu de casa sem levar nem a bolsa pode receber?
- Se a mulher estiver em prisão domiciliar não recebe? Só se estiver internada ou presa? A mulher no regime aberto recebe? Presa enviada para casa para cuidar de filhos pequenos recebe?
- Se os critérios de quantidade não têm parâmetro e forem decididos depois, um prefeito que der um absorvente para cada mulher nessa situação está dentro da lei.


Vetado: Art3 - § 2º Os recursos financeiros para o atendimento das beneficiárias de que trata o inciso III do caput deste artigo serão disponibilizados pelo Fundo Penitenciário Nacional.

Ah, mas então o projeto disse de onde vem o dinheiro, né? Disse, só que não combinou com os russos. O dinheiro do Funap não pode ser usado para isso. Poderia ser usado? Sim, era só modificar a Lei Complementar 79 antes de fazer a outra. Isso foi feito? Não, ninguém nem tentou. 
Quanto o Funap teria disponível para isso? Ninguém sabe porque o custo não foi estimado. Aliás, não se estimou nem a quantidade necessária para as presidiárias, o que seria muito mais fácil de medir porque os governos têm os dados.

Vetado: Art. 6º As despesas com a execução das ações previstas nesta Lei correrão à conta das dotações orçamentárias disponibilizadas pela União ao Sistema Único de Saúde (SUS) para a atenção primária à saúde, observados os limites de movimentação, de empenho e de pagamento da programação orçamentária e financeira anual.
Esse artigo foi assassinado pelo anterior. Se o atendimento não é universal, não pode pagar pelo SUS. E o próprio projeto estipulou que não é universal. Fora isso, o SUS só pode comprar o que tem lei autorizando, existe uma lista indicando para qual finalidade pode comprar. Fizeram lei para atualizar a lista? Não. Quanto isso custaria e quanto seria o limite de pagamento via Ministério da Saúde? Não pode fazer pelo Ministério da Educação? E pelo da Ação Social? Da Mulher e dos Direitos Humanos também não pode? E se tiver parceria público-privada? Suponha que em uma cidade pequena alguém doe absorventes a todo mundo que precisar. 

Vai ter de comprar pelo SUS mesmo assim?                                          Os governadores e prefeitos perderam a autonomia sobre os orçamentos estaduais e municipais? 
Se eles decidirem pagar com verba que não seja a da atenção primária à saúde porque sempre falta, então estariam fora da lei?

Vetado: "O Poder Público adotará as ações e as medidas necessárias para assegurar a oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos às beneficiárias de que trata o art. 3º desta Lei e, no âmbito do Programa de Proteção e Promoção da Saude Menstrual, os absorventes higiênicos femininos feitos com materiais sustentáveis terão preferência de aquisição, em igualdade de condições, como critério de desempate, pelos órgãos e pelas entidades responsáveis pelo certame licitatório."
A Lei Geral de Licitações foi mudada? Agora pode decidir, via projeto de lei, critérios de desempate para um certame específico, à revelia de Estados e Municípios que têm autonomia na área?
O Estado de São Paulo tem, desde 2020, uma lei específica para licitações sustentáveis e colocar sustentabilidade, sem especificar critérios, como quesito para desempate não foi previsto porque não é sustentável. Não têm mais autonomia a Assembleia Legislativa e o Governo do Estado?
Por que só os "feitos com materiais sustentáveis" se já é pacífico na legislação que a sustentabilidade contempla toda a cadeia e a atuação ambiental, social e de governança de todos os fornecedores? Estamos de volta ao século passado e não avisaram?

Vetado: Art. 7º O art. 4º da Lei nº 11.346, de 15 de setembro de 2006, passa a vigorar acrescido do seguinte parágrafo único:
'Art. 4º ...................................................................................................................
Parágrafo único. As cestas básicas entregues no âmbito do Sisan deverão conter como item essencial o absorvente higiênico feminino, conforme as determinações previstas na lei que institui o Programa de Proteção e Promoção da Saúde Menstrual.'
Você sabe o que é SISAN? Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Absorvente é para comer? Não. Então ou não pode entrar aí ou tem de modificar direito a lei, instituindo mais uma finalidade para o SISAN. Foi feito? Não.

Agora tem uma ampla campanha de derrubada do veto, com muita gente informada embarcando. 
Se cair o veto, vai ter absorvente para as mulheres pobres? Não. É mais um projeto que vai parar no STF e virar frisson na mídia, reunindo gente indignada para alimentar algoritmo de político e influencer. O SUS não tem como pagar da forma estabelecida, o próprio projeto exclui mulheres que estão em situação de pobreza menstrual e a lei não pode determinar como isso seria implementado em Estados e Municípios.

O fator Tábata Amaral x soberba é bicho que come o dono
O Congresso Nacional só tem um parlamentar. Chama-se Tábata Amaral. Claro que a adolescência de meia-idade da esquerda passou o dia bradando nas redes sociais que a deputada tentou apropriar-se de um projeto de Marilia Arraes, do PT. A petista vem a ser prima e arquiinimiga do namorado de Tábata Amaral, filho de Eduardo Campos. Os dois se digladiaram como adversários na eleição para a prefeitura de Recife, que ele levou.

Só citei a quizila familiar porque o Brasil nunca é um país, sempre oscilamos entre novela e meme. Claro que sempre as mesmas famílias estão envolvidas. Marilia Arraes apresentou seu projeto em 2019, uma espécie de piora técnica no projeto do vereador carioca Leonel Brizola, transformado em lei no Rio de Janeiro em 2019. No ano seguinte, Tabata Amaral apresentou um projeto corrigindo os vícios técnicos. Claro que não seria aprovado. Todo mundo que acompanha novela sabe direitinho esses trâmites.

Comecemos por Leonel Brizola. Calma que não é o original, é descendente. Não seria estranho a essa altura do campeonato aparecer um espírito na história, mas devo ser fiel aos fatos. O projeto dele respeita o princípio de universalização do sistema público de saúde e dá margem para que o custeio seja decidido pelo executivo sem criar o custo imediatamente. Propõe regulamentação em 120 dias e a fonte de recursos poderá ser prevista para o próximo orçamento municipal, em qualquer secretaria, projeto ou fundo. Sabe quem sancionou? O Crivella.

LEI Nº 6603, DE 3 DE JUNHO DE 2019.
Dispõe sobre o fornecimento de absorventes higiênicos nas escolas públicas do Município do Rio de Janeiro e dá outras providências.
Art. 1º Fica instituído o Programa de Fornecimento de Absorventes Higiênicos nas escolas públicas do Município do Rio de Janeiro.
Parágrafo único. O programa a que se refere esta Lei consiste no fornecimento de absorventes higiênicos para estudantes do sexo feminino, visando à prevenção e riscos de doenças, bem como a evasão escolar.
Art. 2º O Poder Executivo promoverá o fornecimento e a distribuição dos absorventes higiênicos em quantidade adequada às necessidades das estudantes, por meio de máquinas de reposição, instaladas nos banheiros das escolas da Rede Pública Municipal.
Art. 3º A presente Lei será regulamentada pelo Poder Executivo no prazo de cento e vinte dias, contados da sua publicação.
Art. 4º As despesas decorrentes da execução desta Lei correrão por conta das dotações orçamentárias próprias.
Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Câmara Municipal do Rio de Janeiro, 3 de junho de 2019.


Era só fazer pequenos retoques estendendo para outras mulheres e retirando o Artigo 2o. Mas não, tem que florear. Onde já se viu ir atrás de projeto de vereador. Federal tem de ser mais robusto, certo? Não. Também não é o primeiro projeto sobre distribuição de absorventes a aparecer na Câmara Federal. Já havia mais de uma dezena. Nos Estados e Municípios há centenas de leis semelhantes. Várias soluções são pensadas, como distribuir em postos de saúde, fazer parcerias para doação, distribuir nas empresas com um número determinado de empregados. Talvez cada localidade tenha sua forma de solucionar.

Já há distribuição gratuita de absorventes em muitos pontos do Brasil, algumas por iniciativa do governo, outras de entidades da sociedade civil, ONGs, parcerias público-privadas, doações, descontos em impostos, forma de acerto fiscal. Nos Estados de São Paulo e Minas, por exemplo, foi feito por lei estadual e várias leis municipais. Em Florianópolis, há parcerias com entidades que ensinam confeccionar absorventes sustentáveis e acolhem meninas com dúvidas sobre o período menstrual. Todas são iniciativas mais eficazes que o projeto federal.

Suponhamos que a Câmara tirasse os vícios técnicos do projeto e fizesse um sem os problemas que esse teria, daria certo? Não. Cada Estado e cada Município têm autonomia para operacionalizar diretrizes federais sobre este tema. Um projeto federal garantiria que tivéssemos o tema no radar dos orçamentos estaduais e municipais, mas não seria capaz de assegurar que todas as mulheres em situação de necessidade conseguissem absorventes. A efetivação das políticas depende de leis estaduais e municipais.

Apenso, logo existo
Quem já trabalhou em casas legislativas conhece a máxima. Quando alguém já apresentou um projeto sobre um tema que é bandeira de um parlamentar, ele apresenta outro. Pode ser um complemento ou uma correção. Projetos sobre o mesmo tema são "apensados", ou seja, passam a tramitar em conjunto por decisão da Mesa Diretora. É possível que um seja escolhido, que sejam fundidos ou que um deles torne-se a base de uma emenda substitutiva, um novo projeto agregando ideias.

Por que alguém faz um projeto de tema sobre o qual já existe projeto? Ou para corrigir vícios do anterior ou para fazer marketing. O deputado federal Baleia Rossi apresentou um projeto para que o trabalho em casa conte como tempo de serviço na Previdência, a exemplo da legislação argentina. Deputados do PSOL apresentaram a mesma proposta, que tornou-se apenso, mas propiciou ampla divulgação, likes, engajamento e hashtags em redes sociais. A imprensa tende a divulgar esses movimentos. Apenso, logo existo.

Também há casos nobres e um eu acompanhei de perto. A senadora Leila do Vôlei apresentou um projeto de criminalização do stalking, a exemplo das legislações que países civilizados têm desde a década de 1990. A aplicação das penas, no entanto, tinha falhas técnicas. O deputado Fabio Trad, professor de Direito, apresentou um projeto que foi apenso àquele, submetido antes a associações de juízes, promotores e defensores. A lei do stalking é a da senadora, mas o conteúdo é aquele produzido pelo deputado. Modificou-se o texto final e os louros foram cedidos. Nem todos topam isso.

Voltemos aos absorventes. Ano passado, a deputada Tabata Amaral apresentou um projeto sucinto eliminando todos os vícios técnicos do projeto da deputada Marilia Arraes. Não vou repetir os quesitos todos porque, apesar de saber que sou chata com essas coisas, você não é obrigado. Transcrevo:

PROJETO DE LEI Nº , DE 2020 (Da Sra. TABATA AMARAL)
Dispõe sobre a distribuição de absorventes higiênicos em espaços públicos
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1º. Esta lei dispõe sobre a distribuição de absorventes higiênicos em espaços públicos.
Art. 2º. Será realizada a distribuição de absorventes higiênicos em espaços públicos de acordo com as normas regulamentadoras.
Parágrafo único. Será estimulada a oferta de absorventes sustentáveis.
Art. 3º. Esta lei entra em vigor cento e oitenta dias após sua publicação.

O projeto de Tabata Amaral não tem nenhum dos vícios técnicos que justificaram o veto pelo Governo Federal. Mas também não tinha a menor chance de tornar-se o projeto principal. Se você, como eu, é fã de "A Usurpadora", "Avenida Brasil", "Rainha da Sucata" e "Star Wars" sabe todas as razões. O projeto de Marilia Arraes passou a ser a referência e todos os demais viraram apensos. A deputada colocou uns 30 nomes de colegas como coautores.

O projeto não foi mantido na íntegra, foi modificado por uma "emenda substitutiva". Isso quer dizer que formou-se uma comissão de análise e foi escolhida uma relatora para apresentar a redação final, com base nas observações de todos os envolvidos e de mais de uma dezena de projetos semelhantes. Tem o barato que sai caro e o caro que sai mais caro ainda. É o caso. O novo projeto manteve quase todos os vícios técnicos que ensejariam um veto.

"Tem dinheiro para o Fundão Eleitoral mas não tem para absorvente". "Tem dinheiro para bônus de servidor público mas não tem para absorvente". 
"Tem dinheiro para propaganda do governo mas não tem para absorvente". Tudo isso é verdade sim. Nada disso, no entanto, faz com que o projeto troncho torne-se viável. Ser governista talvez bastasse, estamos no Brasil. Mas todos os envolvidos suponho que já sabiam ser oposição ao governo, o que significa um escrutínio técnico minucioso de todas suas ideias.

Política e Economia da Atenção
Tudo isso que eu pesquisei, analisei e escrevi foi pela inspiração da Helen Pluckrose e por amor à causa. Sei que fatos e ações custam caro e têm pouquíssimo retorno na era da Economia da Atenção. Eu ganharia muito mais se topasse mentir. Sairia bradando que Bolsonaro é tão insensível que nega absorvente para mulheres pobres. Ou sairia bradando que a esquerda tem obsessão por esculhambar a responsabilidade fiscal. Imagino quantos cliques e likes. Mas sou um dos poucos imbecis que lê documento e preocupa-se com fatos. Talvez seja masoquismo.

A imprensa está rendida à dinâmica das redes sociais. Importa o engajamento. Este artigo aqui tem baixíssimo potencial. Peço antecipadamente desculpas e já agradeço o privilégio aos meus editores na Gazeta do Povo. Imaginem quanto custa um Lucio Vaz, fiscal dos políticos. Leia o blog dele. Quanto tempo ele leva em cada apuração de gastos públicos? Isso sem contar o tempo investido em técnica e networking para irritar poderosos todos os dias e continuar fazendo a mesma coisa. Nem sei mais se informação é business ou luxo.

O Lucio Vaz só divulga informação depois de obter fontes oficiais, documentos, fazer contas precisas, checar o orçamento. Demorou décadas para ter a habilidade de olhar tudo isso e traduzir para a gente. É caro demais. Daria muito mais retorno pegar um adolescente de meia idade qualquer para ficar gritando sobre lagosta do STF e pedindo para você demonstrar sua indignação. Era só pegar o levantamento que o Lucio Vaz demorou sabe Deus quanto tempo para fazer e criar um factoide. Teria muito mais retorno na Economia da Atenção.

Diante da inspiração vinda da Helen Pluckrose, sabia ter dois caminhos de sucesso na Economia da Atenção. Poderia fazer um artigo demolindo Bolsonaro pela crueldade de negar absorventes a mulheres pobres e derir a uma das hashtags do #BolsonaroEuPrecisoMenstruar. Também poderia fazer um artigo detonando a esquerda por insistir em demolir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Hashtag #CadaUmaQuePagueSeuAbsorvente. Explosão de cliques. Mas sou masoquista.

Jornalistas e políticos foram adestrados pelas redes sociais. Muitos renderam-se à valorização pessoal por cliques e likes. Isso só é possível oferecendo soluções fáceis e necessariamente erradas para problemas complexos. Não vou fingir que não é tentador, é muito. Sei que a condição humana e a realidade são completamente desinteressantes diante das fantasias que podemos alimentar. Fariam muito mais sucesso.

Não é por julgar-me esperta ou fazer avaliações racionais que decidi esmiuçar este assunto, é por profissão de fé mesmo. Dizem que fé move montanhas e vai que, né? Eu morro por dentro quando imagino a menina que eu fui, envergonhada de falar sobre menstruação, tendo de dizer que precisa de absorvente. Nós, como sociedade, não podemos aceitar algo tão cruel e tão injusto. Quanto nos custa isso? Sabe Deus que chagas emocionais e psicológicas são empilhadas sobre a perda objetiva de oportunidades e dinheiro. Ocorre que essas meninas e mulheres precisam de solução, não de boas intenções.

Madeleine Lacsko, colunista - Gazeta do Povo - VOZES    


quarta-feira, 12 de maio de 2021

O Juramento de Hipócrita - Revista Oeste

Guilherme Fiuza

Viver e não ter vergonha de ser feliz, cantar e ser feliz de não ter vergonha. O herói das câmeras de TV nunca tinha cumprido o juramento com tal abnegação

Edição de arte Oeste
Edição de arte Oeste | Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado

Fim de papo. Todos sabiam que um juramento desses torna qualquer um invencível — o que vem a ser a principal qualidade do herói. E um herói atrai imediatamente as câmeras de TV — principalmente depois de afirmar que vai salvar o seu povo no gogó. Luz, câmera, falação. Lá se foi o Doutor Provetta matraquear pelos cotovelos, ao vivo, quase 24 horas no ar. Um show. Ninguém tirava o olho do herói — qualquer distração poderia ser fatal. Vai que você perde alguma palavra-chave e fica indefeso diante do perigo?

Ele falou de tudo. Disse que a culpa era dos ricos e a favela ia se ferrar. Mas ele, Doutor Provetta, não hesitaria em ter uma conversa civilizada com os assassinos que mandam nos morros — porque traficante também é ser humano e os facínoras haveriam de ter sensibilidade social e sanitária. Foi praticamente uma aula de sociologia, como se diz no botequim. Com todo o respeito ao botequim.

Tudo isso de graça. Só um missionário altruísta, um Robin Hood da ciência, compartilharia tanto saber sem cobrar nada de ninguém. Transbordante de empatia e comiseração, o médico revolucionário disse a todos que se isolassem uns dos outros — nada de aproximações inconsequentes que pusessem vidas em risco. Foi então visto num ambiente fechado e aglomerado, sem máscara, abraçando seus áulicos e cantando sorridente: viver e não ter vergonha de ser feliz ou viver e ser feliz de não ter vergonha (há controvérsias sobre o refrão entoado).

 O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta  sem máscara em bar em SP

O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta foi visto sem máscara em bar - CNN

Só uma meia dúzia de inocentes (sempre os mesmos) quis saber se a muvuca do Provetta não contrariava suas diretrizes de isolamento. É uma gente obtusa e azeda, que não suporta a felicidade alheia. Dessa vez o médico revolucionário nem perdeu seu tempo explicando o óbvio: quem faz o Juramento de Hipócrita tem a obrigação de se aglomerar por trás do distanciamento social. O escândalo seria jurar hipocrisia e não praticá-la.

Esses céticos niilistas jamais compreenderão o poder sagrado do juramento para um homem de fé.

Foi assim que o Doutor Provetta mandou todo mundo ficar em casa em nome da vida e foi jogar sinuca no boteco em nome da ciência. Sem máscara, que ninguém é de ferro — e o povo precisa reconhecer a fisionomia do seu herói para se sentir seguro. Então lá estava ele, de cara limpa, mostrando que o verdadeiro médico confia no seu taco quando vê alguém pela bola sete. Viver e não ter vergonha de ser feliz, cantar e ser feliz de não ter vergonha. O juramento do hipócrita nunca tinha sido cumprido com tal abnegação.

E você, que talvez nem mereça, recebeu mais uma lição de graça: o boteco não é só o lugar da sociologia. É também o lugar da ética.

O que deixou o povo um pouco confuso foi a reaparição do Doutor Carlos Henrique Provetta de máscara. OK, agora ele não estava no botequim, mas estava no circo — e aí já começou uma polêmica sobre as supostas diferenças científicas entre circos e botequins, porque todos sabem que palhaços e bêbados são iguais perante a lei e ninguém toleraria diferenças de protocolo sanitário entre essas duas instituições milenares. Mas logo tudo se esclareceu.

Provetta estava de máscara porque se encontrava diante de Renan Calheiros — e mesmo um herói invencível tem seu momento de autocontenção.  A máscara ali não era um sinal preocupante de que o médico salvador pudesse estar começando a sofrer de vergonha na cara. Era só um sinal de reverência a um ídolo — porque quem fez o Juramento de Hipócrita sabe reconhecer um superior juramentado. Enfim, foi um momento bonito na história da medicina. Solta o som, DJ: viveeeer e não ter vergonha… etc.

Guilherme Fiuza, colunista - Revista Oeste

 

terça-feira, 20 de abril de 2021

DESABAFO = nojo, repugnância, vergonha

Aos nossos dois estimados e honrados leitores: 'nínguém' e 'todo mundo'

Admitimos que foi dificil pensar, começar a considerar a ideia de por fim nossas atividades de uma batalha sem compromisso com a esquerda, com a mentira, com a canalhice. 

Aqui temos que citar o discurso magistral do grande Ruy Barbosa - pronunciamento que divide a liderança com uma outra que se tornou voz corrente.  

Discurso das nulidades:  

Facebook

Rui Barbosa - texto completo de famoso discurso

Este é o texto completo das famosas considerações de Rui Barbosa sobre a crise moral, que, infelizmente, não é apresentado ao público. Pelas palavras de Rui Barbosa, fica bem claro que a ruína moral do Brasil começou com a proclamação da república. É só ler o texto para conferir.

“De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto...”.

Essa foi a obra da República nos últimos anos.

No outro regime (monarquia) o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para todo o sempre - as carreiras políticas lhe estavam fechadas.

Havia uma sentinela vigilante, de cuja severidade todos se temiam a que, acesa no alto, guardava a redondeza, como um farol que não se apaga, em proveito da honra, da justiça e da moralidade gerais.

Na República os tarados são os taludos. 
Na República todos os grupos se alhearam do movimento dos partidos, da ação dos Governos, da prática das instituições. Contentamo-nos, hoje, com as fórmulas e aparência, porque estas mesmo vão se dissipando pouco a pouco, delas quase nada nos restando.

Apenas temos os nomes, apenas temos a reminiscência, apenas temos a fantasmagoria de uma coisa que existiu, de uma coisa que se deseja ver reerguida, mas que, na realidade, se foi inteiramente.

E nessa destruição geral de nossas instituições, a maior de todas as ruínas, Senhores, é a ruína da justiça, colaborada pela ação dos homens públicos, pelo interesse dos nossos partidos, pela influência constante dos nossos Governos. 
E nesse esboroamento da justiça, a mais grave de todas as ruínas é a falta de penalidade aos criminosos confessos, é a falta de punição quando se aponta um crime que envolve um nome poderoso, apontado, indicado, que todos conhecem..."
 
 

Prezados leitores, poderíamos ter expressado nosso protesto, gastando milhões de 'byte', reproduzindo manchetes do tipo:

´'Renan Calheiros, comandará investigações sobre mau uso do dinheiro público durante a  pandemias da covid-19;

- Barroso informa antes de sessão virtual do STF, que consultou seus pares no 'olimpo dos deuses'; 

- Partideco quer que Supremo exija explicações do presidente Bolsonaro por alterações ocorridas no quarto escalão do 'meio ambiente'; 

- Zé Guimarães, aquele petista que  criou o hábito de transportar dólares no entrepernas, cuidará na CPI da covid-19, sobre o transporte de dólares por meios não convencionais. 

Teríamos milhares de manchetes desse tipo a transcrever. Para que? 
nos enojar? nos causar asco?

O discurso do Rui diz tudo com a classe, a fineza, a correção que sempre norteou suas manifestações.

Entristece-nos que por razões outras, o nosso presidente não está conseguindo governar e cumprir a missão por nós conferida.

Fechando: todos, sem exceções, que em algum momento da vida pública confundiram o adjetivo 'imortal' com o substantivo 'imortal', fracassaram.

A primeira condição para pleitear alcançar eventual imortalidade é exatamente a de aceitar que é mortal.

Aos que expressaram seu repúdio ao nosso sumiço,nossa gratidão.

Editores do Blog Prontidão Total


segunda-feira, 29 de março de 2021

Os suspeitos - Guilherme Fiuza

Vozes - Gazeta do Povo 
 
Por que o Gilmar tá chorando?
– Por causa do advogado do Lula.
– O que ele fez? Bateu no Gilmar?
– Não.
– Jogou areia no olho do Gilmar?
– Não.
– Amarrotou a toga do Gilmar?
– Não. Quer dizer, não sei. Mas não é por isso que ele tá chorando.
– Então é por quê? O advogado do Lula disse que o STF é uma vergonha?
– Não, o advogado do Lula não acha que o STF é uma vergonha.
 
 
O plenário do STF em sessão com apoio de videoconferência. Imagem ilustrativa.| Foto: Nelson Jr./SCO/STF

 - Então o que aconteceu? Ele xingou o Gilmar?
– Não. O Gilmar tá chorando de emoção.
– Ah, tá. É, deve ser emocionante mesmo trabalhar na suprema corte.
– Ele não tá chorando por causa do trabalho dele.
– Não?
– Não. Tá chorando por causa do trabalho do advogado do Lula.
– Como assim?
O Gilmar ficou encantado com a atuação do advogado do Lula. Começou a fazer elogios a ele e caiu no choro.
– Caramba. E filmaram isso sem ele ver?
– Não, foi em público mesmo.
– Em público?!
– É.

– Ele tava dando uma palestra?
Não. Ele tava numa sessão do STF.
– O que?! O Gilmar elogiou o advogado do Lula no meio de uma sessão do STF??
– Sim. No meio de uma sessão do STF que deliberava sobre um processo de interesse da defesa do Lula.
– E ele chorou de emoção enaltecendo o advogado do réu?
– Do réu condenado.
Você acha isso normal?
– Acho.
– Por quê?
– Porque realmente o advogado do Lula conseguiu um milagre. E diante de um milagre é difícil segurar a emoção.

– Que milagre?
O cliente dele roubou um país inteiro e está em vias de ser inocentado.
– É. Milagre mesmo. Já sabem qual foi o santo?
– Lula.
– Não, perguntei de quem foi o milagre pra santificar o Lula.
Parece que foi um milagre coletivo.
– Autores desconhecidos?
– Não. Bem conhecidos.
Você pode citar algum?
– Claro. Gilmar.

– Hein? O Gilmar está comovido com o milagre que ele mesmo fez?
– Qual é o problema? Ele fez o milagre, gostou, se emocionou e chorou. É um direito dele. Afinal de contas é um ser humano.

– Verdade. Bem lembrado.
– Inclusive ele já tinha chorado antes com o cara do MST.
– Milagre também?
– Não. Era uma live em defesa da democracia.

– Não deixa de ser um milagre se juntar com um cara violento em nome da democracia e ainda conseguir chorar.
– Chorar não é tão difícil assim.
– Quando fiz teatro amador eu nunca conseguia.
Mas quem tá falando de amador?
– Verdade. Ali só tem profissional.


– Claro. Ninguém ganha uma toga e uma varinha de condão se não souber chorar.
– Sem dúvida. Mas não é um pouco suspeito um juiz chorar elogiando o advogado do ladrão?
Não. Suspeito é o juiz que condenou o ladrão.
 
Guilherme Fiuza, jornalista - Gazeta do Povo - VOZES
 
 

terça-feira, 23 de março de 2021

Loquidau, a hipnose - Revista Oeste

Guilherme Fiuza

Nenhum dos estagiários de Coreia do Norte é tratado como ditador. São todos 'empáticos'

A epidemia de coronavírus enfeitiçou as sociedades. Parte desse feitiço está nas palavras mágicas “pandemia” e “covid” — por isso elas foram deliberadamente evitadas na frase anterior. Não que tenhamos aqui o poder de desfazer esse feitiço. É só uma pequena desobediência aos ditames de um senso comum adoecido. A covid (citando pela última vez, por razões psicossemânticas) é real. E também é hipnótica. Aparentemente, pronunciando essa palavra você adquire poderes extraordinários sobre o seu semelhante.

A hipótese acima ainda não tem confirmação científica. Mas… Dane-se. Quem transformou a ciência em licença poética não fomos nós. Já vimos de tudo, até a Organização Mundial da Saúde empurrando pomposamente a humanidade para um gueto existencial chamado loquidau (se virar ciência a gente ajeita a grafia). Enfim, foram eles que começaram.

O tal feitiço está solidamente fundado num tabu. O fato de que o vírus se espalha rapidamente pelo mundo inteiro e realmente pode ser letal em milhares de casos foi transformado na seguinte armadilha: 
ou você aceita todo o repertório de salvacionismos estúpidos e inócuos que se espalhou igualmente pelo mundo inteiro, ou você é uma criatura horrenda que despreza a vida dos outros. 
Fotografar alguém andando de bicicleta para denunciar descumprimento de loquidau e falta de empatia é o diagnóstico inequívoco dessa outra doença que se espalhou junto com a c…
Essa epidemia de dedos-duros, patrulheiros, x-9 e como mais se queira chamar os empáticos de video game se tornou o combustível perfeito para a ascensão dos tiranetes. 
Se uma grande parte da sociedade está disposta a linchar moralmente um vizinho ou um irmão que não se sujeite a qualquer boçalidade apresentada como segurança sanitária, o caminho está livre para o autoritarismo envergonhado sair do armário. E ele perdeu mesmo a vergonha.
 
Governadores e prefeitos que se apresentam como democratas limpinhos já fizeram as seguintes bondades dizendo que estão “salvando vidas”: 
- toque de recolher ilegal supostamente contra aglomerações noturnas (mantendo aglomerações diurnas nos transportes); 
bloqueio de gôndolas de supermercados fingindo que a restrição ao consumo de parte dos produtos diminuirá o contágio; 
proibição de pessoas nas ruas mesmo durante o dia se o motivo da circulação for protesto contra essas falsas medidas sanitárias; 
fechamento de comércio à força soldando portas de lojas; 
proibição a lojista de expor na vitrine número de telefone para delivery; agressão física por parte de forças de segurança pública contra cidadãos (incluindo mulheres e adolescentes) que estavam circulando sem aglomeração (eventualmente sozinhas) por espaços abertos como orlas e praças;
invasão a residências para contar o número de pessoas presentes em reuniões particulares; 
proibição ao trabalho de vendedores ambulantes ao ar livre sem restrição aos que se espremem no ambiente fechado dos ônibus; rodízios de automóveis que aumentaram aglomeração nos transportes públicos e até rodízio de pessoas por número de CPF.

Mas nenhum desses estagiários de Coreia do Norte é tratado como ditador. São todos “empáticos”.

Decide aí. Se você quer continuar sendo enxotado para dentro de casa que nem rato porque te dizem que assim você é um empático contra a c…, fique à vontade. 
Você preferia não entregar sua liberdade de bandeja a tiranetes brandindo falsa ciência, mas e a c…? 
Você não se importa com a c…?? 
É horrível ficar na berlinda dos negacionistas, fascistas e terraplanistas, né? 
Então chega disso. Veste logo a sua ética de butique e sai rastejando aliviado, que ser rato não é tão ruim assim.

Não se esqueça de calar a boca para sempre sobre os estudos em torno do tratamento precoce — esse que médicos medalhões de São Paulo e Rio prescrevem discretamente aos seus pacientes, com todo o cuidado para não atrapalhar a ação dos senhores da verdade que perseguem, insultam, estigmatizam e banem como charlatões desgraçados os que fazem referência a essa terapêutica. 

O que salva é o loquidau.

Leia também “O novo totalitarismo”

Guilherme Fiuza, colunista - revista Oeste 

 


terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

O príncipe autoritário e a prefeita negra - Augusto Nunes

 Revista Oeste

O palavrório insultuoso de Doria tropeçou na elegante altivez de Suéllen

A jornalista Suéllen Rosim, 32 anos, é prefeita de Bauru por ter convencido grande parte do eleitorado de que estava mais preparada que os adversários para solucionar os principais problemas da cidade. O mais antigo é a escassez de água potável. Esse pode ser resolvido com verbas e métodos modernos. O mais recente é a pandemia de coronavírus. Esse é bastante complicado.

Se ainda não apareceu a estratégia perfeita para o combate à covid-19 em nenhum município, ninguém pode dizer com segurança o que deve ser feito num município cuja economia, afetada pela carência de indústrias, se ampara no vigor do comércio e do setor de serviços. É o caso de Bauru. Ao longo da campanha, Suéllen defendeu sua opção para reduzir perdas e danos: fortalecer a franzina rede hospitalar e, simultaneamente, adotar rígidas normas de distanciamento social que evitassem a paralisia por períodos extensos demais dos alicerces econômicos de Bauru. É o que ela tem tentado fazer desde 1º de janeiro, quando assumiu o cargo.

Passados 35 dias de mandato, milhares de bauruenses constataram que, neste momento, o ranking dos piores problemas enfrentados pela prefeita é liderado pelo governador João Doria e seus generais metidos na guerra em curso na frente paulista. Como sabem os espectadores da Ópera dos Farsantes, ninguém ama com tanta intensidade os brasileiros de São Paulo quanto o sumo sacerdote da seita que detém o monopólio da paixão pela vida. Ninguém enfrenta o vírus chinês com a tenacidade do líder escoltado por devotos que capricham no papel de coadjuvantes há quase 200 entrevistas coletivas. Os integrantes do alto-comando baseado no Palácio dos Bandeirantes conhecem todas as cidades paulistas muito mais que seus prefeitos. Quem ousa contestar uma única vírgula dos decretos baixados pelo chefe supremo é sumariamente remetido às galés em que gemem bolsonaristas, terraplanistas, inimigos da ciência e da vida. É lá que o clube dos adoradores sonha instalar Suéllen Rosim.

Desde o dia da posse, aflita com a expansão do coronavirus na região, Suéllen faz o que pode para conseguir os leitos de UTI que faltam há muitos meses e encontrar secretários estaduais dispostos a ouvi-la sobre as urgências e peculiaridades da cidade que governa. Em São Paulo não encontrou nenhum. Voou para Brasília e descobriu o aliado ideal: Marcos Pontes, ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação e, mais importante ainda, nascido em Bauru. O único astronauta brasileiro abriu-lhe as portas de ministérios relevantes e conseguiu que fosse recebida por Jair Bolsonaro. No mesmo dia, Suéllen divulgou a foto dos dois. Os brasileiros normais viram na imagem o presidente da República e a prefeita de Bauru. O governador enxergou uma dupla de inimigos. E então emergiu a terceira e talvez definitiva versão de João Doria. É bem diferente das anteriores.

O que as feministas não teriam feito se a ofendida fosse alguma militante do PT ou do Psol?

A versão original parecia ter acabado de sair de um manual de boas maneiras. Jornalista bem informado, empresário bem-sucedido, educado, procurava controlar-se mesmo quando lidava com atropeladores de sua mais aguda obsessão: a pontualidade de matar de inveja um lorde britânico. Nem sempre conseguia. Para impedir alterações nos horários das centenas de eventos dos encontros que promovia na ilha de Comandatuba, o presidente do Lide interrompia com um apito o jogo de vôlei a dois pontos do fim, ou negava os 30 segundos a mais solicitados pelo orador do discurso confinado em três minutos. Agora está claro que o respeito à pontualidade camuflava o autoritarismo que ficou mais nítido no Doria prefeito e começa a exibir dimensões preocupantes no modelo governador.

O empresário cavalheiresco, risonho, gentil não se reconheceria no político que produziu em 1º de fevereiro a enxurrada de grosserias que deixaria constrangido até um Nicolás Maduro. “Infelizmente, existem os poucos que, como a prefeita de Bauru que, de forma negacionista, ainda faz vassalagem ao presidente Jair Bolsonaro, visitando-o no Palácio do Planalto, ao invés de proteger a população de Bauru e defender a saúde e a vida de seus habitantes”, desandou o governador que em dezembro, depois de fechar São Paulo de novo, decolou rumo às lojas de uma Miami livre de quarentenas. A prefeita acusada de negacionismo jamais fechou os olhos à pandemia de coronavírus e à necessidade de combatê-la. O que Doria reduziu a um ato de vassalagem foi uma audiência concedida pelo presidente da República à prefeita de uma grande cidade. Ainda durante a campanha eleitoral, Suéllen deixou claro que concordava com várias ideias de Bolsonaro e discordava de outras tantas. “Nunca fui vassala de ninguém”, frisou a mulher que se transformou em alvo do chilique insultuoso por ter incorrido, aos olhos de Doria, no pecado da independência e no crime de altivez.

Na semana anterior, ao receber o decreto que castigou São Paulo com outro lockdown fantasiado de “fase vermelha”, assessores da prefeita haviam editado um decreto municipal que incluiu o comércio e o setor de serviços na relação de atividades consideradas essenciais. Colérico, Doria revidou com um recurso logo acolhido pelo Tribunal de Justiça. Suéllen conformou-se com o golpe sofrido pela economia de Bauru. E reagiu ao besteirol agressivo com uma aula de civilidade, encerrada com o recado pedagógico: o governador deve tratar a prefeita tão respeitosamente quanto a prefeita trata o governador.  A  ira não cessou. No meio da semana, o decreto que abrandou a quarentena na maior parte do Estado manteve Bauru na zona vermelha. “A liberação de 120 leitos de UTI já me deixou feliz”, consolou-se Suéllen.

A elegante firmeza da moça que cuida de Bauru contrasta com o servilismo obsceno de jovens áulicos que aplaudem até escorregões do governador. Um deles é Marco Vinholi, 36 anos, secretário do Desenvolvimento Regional, que se apressou em bajular o chefe com uma nota escrita em português de colegial sem chances no Enem. “Suéllen age não apenas como uma militante bolsonarista, age como fã; e fã faz tudo pelo ídolo, inclusive ser pouco racional”, delirou Vinholi. “Num momento em que Bauru tem recorde de casos de coronavírus e 90% dos seus leitos de UTI, a prefeita passa por cima da Ciência e da Medicina, lançando mão de negacionismo.” Sempre torturando o idioma, Vinholi ameaçou instalar Bauru no fim da fila da vacinação. “Muita gente faz priorização por partido, por política ou por qualquer outro tipo de questão”, avisou em dilmês castiço. “A nossa priorização será para aqueles que respeitam a vida. Todos terão parceria, mas a prioridade serão com os gestores responsáveis.” Vassalagem é isso aí. Vassalagem e ignorância, berra esse “a prioridade serão com”. Nos anos 60, Nelson Rodrigues advertiu que os idiotas haviam perdido a vergonha e estavam por toda parte. O cronista genial talvez soubesse que, 60 anos depois, estariam congestionando os primeiros escalões do poder.

No momento da agressão a Suéllen, mulher e negra, onde estavam os movimentos feministas e antirracistas que localizam misoginia na ausência de mulheres na final da Libertadores, e enxergam um sórdido preconceito no branco das paredes nuas? O que não teriam feito se a ofendida fosse alguma militante do PT ou do Psol? Como a prefeita negra é também evangélica e conservadora, foi abandonada por esses clubes de farsantes. Para eles, gente assim não é gente. É uma não pessoa. E portanto pode ser chicoteada verbalmente por um figurão da elite branca que não consegue disfarçar o ódio a divergências e o desprezo pelo convívio dos contrários, sem o qual não existem genuínas democracias.

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste