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sábado, 17 de junho de 2023

Acomodação geral - Alon Feuerwerker

Análise Política

O 8 de janeiro foi um solavanco que mascarou temporariamente o impulso dominante do pós-eleição: a tendência a acomodar e compor. Como relatado aqui depois do fechamento das urnas na segunda rodada em outubro, todas as forças políticas relevantes, e mesmo algumas menos expressivas, saíram das urnas com poder significativo, e não interessava a esse consórcio informal desarrumar agora as peças no tabuleiro.

Aí veio o 8 de janeiro, cujos efeitos ainda se fazem sentir, mas com papel cada vez mais acessório no que interessa.
[as centenas de inocentes presos com certeza continuam esperando por Justiça e punição dos verdadeiros culpados = os infiltrados.] Servem para animar e colorir o noticiário e, em certa medida, como demonstração de força estatal da coalizão Planalto-STF para conter a crítica, mas a grande política já ganha velocidade trafegando em trilhos próprios. E aí a correlação de forças da vida real mostra a que veio.

A política brasileira é resiliente. Uns dizem que a eficácia dos nossos freios e contrapesos arrasta os vetores para o centro - e defende assim a estabilidade. Outros notam que esses contrapesos e freios funcionam tão bem, e acabaram tão hipertrofiados, que terminam por travar o mecanismo - e assim impedem qualquer mudança substancial. Cada um que escolha a versão preferida.

A expressão mais visível da tensão entre um Executivo pendente à esquerda e um Congresso de maioria à direita são os arranca-rabos por espaços na Esplanada e verbas orçamentárias, para além da gorda fatia já oferecida compulsoriamente aos parlamentares em decorrência do acordo que pôs fim às emendas de relator.

Mas, enquanto o show prossegue, com as CPIs e as ações policiais no horário nobre, a realidade impõe-se, e as ambições maximalistas de lado a lado são freadas pela ética da responsabilidade, resultando num minimalismo algo consensual.

Maquiagens à parte, as reformas trabalhista e da previdência ficarão onde e como estão, bem como a autonomia do Banco Central, no qual o governo buscará fortalecer suas orientações à medida que vai trocando diretores. E o declínio da inflação, derrubada pela bombada Selic, proporciona ao governo o melhor de dois mundos: pode falar mal do BC enquanto aufere os ganhos políticos da ação do BC sobre os preços.

O falecido teto de gastos foi trazido à vida em nova e sofisticada roupagem, de modo a facilitar a atração dos antes demonizados mercados, E, last but not least, é hora de atenuar os ataques ao agro. Afinal, é dali que tem vindo o combustível do PIB, índice-chave na disputa das narrativas, com sua parceira inseparável, a taxa de emprego/desemprego. Via Caged ou IBGE.

Aí é que está o nó.

O minimalismo programático e a flexibilidade para absorver em espaços de poder os ontem desafetos estabilizam momentaneamente Brasília, mas o desafio é fazer o Brasil arrancar, sem o que qualquer estabilidade do atual arranjo será temporária. O presidente da República parece saber disso, pois, segundo o noticiário, proibiu os ministros de ter novas ideias
.[o fedor das 'produções' ministeriais estava se tornando insuportável.]  Pede ação.

As pesquisas reafirmam a cada rodada: Luiz Inácio Lula da Silva mantém a fatia de mercado eleitoral que o levou à vitória no segundo turno. Mas ainda não consolidou áreas no resto do eleitorado. Para tanto, não haverá outro caminho fora do agarrar a bandeira do desenvolvimento e do emprego/trabalho. Para o PT, o eleitor não petista não precisa passar a gostar do partido, basta que em 2026 não queira arriscar a mudança.

Nesse desafio, o governo enfrenta dois obstáculos, um na esfera subjetiva e outro na objetiva. Na primeira, precisa ver como contornar o antidesenvolvimentismo que tomou conta do pensamento dito de esquerda por aqui, reproduzindo em verde e amarelo um vento planetário. Na segunda, precisa torcer para que o aumento da carga tributária (seu caminho de escolha para “acertar o fiscal”) não freie o investimento privado
.[felizmente a segunda hipótese levará o Desgoverno atual ao colapso, a implosão e permitirá a recuperação do Brasil.]
 
Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Uma CPI fundamental para o país - Editorial - Gazeta do Povo

A iniciativa de deputados indignados com o “apagão” da liberdade de expressão que toma conta do Brasil já há alguns anos pode dar ao país uma oportunidade que tem lhe sido negada tanto pelos protagonistas desse apagão quanto por aqueles que teriam o dever de se colocar como contrapeso a eles. 
O deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) conseguiu as assinaturas necessárias para a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) com o objetivo de investigar abusos cometidos por ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O pedido de abertura foi protocolado na quinta-feira, dia 23, e a jurisprudência do próprio Supremo, reafirmada mais recentemente no caso da CPI da Covid, afirma que, uma vez cumpridos os requisitos constitucionais – número mínimo de assinaturas, prazo certo e fato determinado a ser apurado –, os presidentes da Câmara ou do Senado não podem recusar a instalação.

No requerimento de criação da CPI, o  (Novo-RS) afirma que o Poder Judiciário tem repetidamente extrapolado suas funções com decisões arbitrárias.| Foto: Marian Ramos/ Câmara dos Deputados

Por mais que muitas comissões acabem transformadas em espetáculo, como foi o caso da própria CPI da Covid, uma CPI do Abuso de Autoridade, se bem conduzida, faria um grande favor ao Brasil. Não se trata, como em comissões anteriores, de investigar condutas que seus autores gostariam de manter ocultas. O caso, aqui, envolve atos que tiveram ampla divulgação, tanto por parte dos responsáveis por eles quanto da imprensa – com a exceção daqueles trechos dos inquéritos das fake news, dos “atos antidemocráticos” e das “milícias digitais” que permanecem cobertos por um sigilo pouco ou nada justificável. Mais que uma investigação propriamente dita, seu mérito está na intenção de levar à sociedade brasileira um esclarecimento a respeito daquilo que já se conhece.

    O verdadeiro sentido da liberdade de expressão se perdeu, especialmente entre os que têm a obrigação constitucional de defendê-la, caso do STF, e os que têm a obrigação moral de lutar por ela, como formadores de opinião e entidades da sociedade civil organizada

Afinal, nem os ministros do Supremo ou do TSE, nem os setores da sociedade civil e da opinião pública que aplaudiram os atos recentes das cortes (ou, na “menos pior” das hipóteses, se omitiram diante deles) defendem restrições ou agressões à liberdade de expressão – ao menos assim esperamos. Pelo contrário: protagonistas e espectadores sempre julgaram estar protegendo essa liberdade ou coibindo abusos dessa liberdade. 

O mais perto que se chegou de aceitar que havia algo heterodoxo em curso veio em julgamentos no TSE nos quais se mencionou a existência de um “arco de experimentação regulatória” ou de uma “situação excepcionalíssima” que justificaria certas medidas, mas ainda assim elas foram defendidas como sendo tomadas em nome da proteção da democracia e da liberdade de expressão.

Isso significa que o verdadeiro sentido da liberdade de expressão – e de outras garantias constitucionais violadas ao longo dos três inquéritos e da campanha eleitoralse perdeu, especialmente entre os que têm a obrigação constitucional de defendê-la, no caso dos ministros, e os que têm a obrigação moral de lutar por ela, como formadores de opinião e entidades da sociedade civil organizada. 
Recuperar este verdadeiro sentido até que ele volte a ser um consenso evidente é imprescindível se queremos a pacificação do país. O requerimento de abertura da CPI demonstra essa consciência de que há algo muito errado com a forma como as cortes se dispuseram a fazer essa “defesa” da democracia e das liberdades.


“Nos últimos anos e de forma acentuada nos últimos meses, foram inúmeras as violações de direitos e garantias individuais contra cidadãos brasileiros, políticos e também contra pessoas jurídicas, perpetradas por ministros das cortes superiores; ou seja, perpetradas justamente por aqueles que teriam o dever de garantir o pleno exercício desses direitos e não de violá-los”, escreveu Van Hattem no requerimento de abertura da CPI. Tais violações não datam apenas da recente disputa eleitoral; já vêm ocorrendo desde que o Supremo instaurou o abusivo inquérito das fake news, em que a corte se atribuiu o papel múltiplo de vítima, investigador, acusador e julgador o primeiro caso de censura, aplicado à revista Crusoé, data de 2019.

Entre os fatos listados por Van Hattem estão a perseguição a empresários pelo “crime” de dar opinião em grupos privados de WhatsApp, os bloqueios de contas bancárias de pessoas físicas e jurídicas que estariam supostamente apoiando ou participando de manifestações diante de quartéis, e as decisões que censuraram pessoas e veículos de comunicação, inclusive esta Gazeta do Povo. 

E uma rápida passada de olhos pela Lei de Abuso de Autoridade mostra que algumas das ações ali definidas como crime efetivamente fizeram parte da ofensiva antidemocrática representada pelos inquéritos abusivos das fake news, dos “atos antidemocráticos” e das “milícias digitais”: pensemos, por exemplo, nas condutas descritas nos artigos 27 (“Requisitar instauração ou instaurar procedimento investigatório de infração penal ou administrativa, em desfavor de alguém, à falta de qualquer indício da prática de crime, de ilícito funcional ou de infração administrativa”), 30 (“Dar início ou proceder à persecução penal, civil ou administrativa sem justa causa fundamentada ou contra quem sabe inocente”), 31 (“Estender injustificadamente a investigação, procrastinando-a em prejuízo do investigado ou fiscalizado”), 32 (“Negar ao interessado, seu defensor ou advogado acesso aos autos de investigação preliminar, ao termo circunstanciado, ao inquérito ou a qualquer outro procedimento investigatório de infração penal, civil ou administrativa, assim como impedir a obtenção de cópias, ressalvado o acesso a peças relativas a diligências em curso, ou que indiquem a realização de diligências futuras, cujo sigilo seja imprescindível”) ou 36 (“Decretar, em processo judicial, a indisponibilidade de ativos financeiros em quantia que extrapole exacerbadamente o valor estimado para a satisfação da dívida da parte e, ante a demonstração, pela parte, da excessividade da medida, deixar de corrigi-la”) da referida lei.

O silêncio ou o aplauso de parte da sociedade brasileira ao longo desses inquéritos se explica, em boa parte, pelo fato de as decisões costumarem ter como alvo apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, que tinha (e ainda tem) a antipatia dessa parcela da sociedade. Aproveitando-se do fato de a eleição já ter passado, uma CPI bem conduzida, sem paixões partidárias, pode ser o impulso de que muitos brasileiros precisavam para finalmente aperceberem-se da gravidade de tudo o que foi feito nos últimos anos, com a relativização ou o desprezo puro e simples de garantias constitucionais que incluem não apenas a liberdade de expressão, mas também o devido processo legal e a imunidade parlamentar. Em outras palavras, acordar a sociedade brasileira desse “sono da razão” que ajudou a “produzir monstros”, como na gravura de Goya já citada pela Gazeta neste espaço.

    O Judiciário não tomou a iniciativa de levar adiante a necessária distensão após este processo eleitoral altamente polarizado – pelo contrário, continua interessado no confronto e na intimidação. É necessário que os ministros sejam chamados à razão

E, se essa CPI pode abrir os olhos daqueles que ignoraram as ameaças antidemocráticas em nome do antibolsonarismo, ela também pode reacender a esperança de todos aqueles que, sim, perceberam os abusos em curso, mas julgavam ser impossível frear os impulsos autoritários do STF e do TSE, ou já haviam perdido a fé nos seus representantes eleitos. A mera instalação da CPI já seria um sinal inequívoco de que as vias institucionais continuam abertas, que o sistema de freios e contrapesos segue funcionando, que não é preciso buscar soluções de força. A democracia brasileira sairia indubitavelmente fortalecida de um processo como este.

Infelizmente, o Judiciário não tomou a iniciativa de levar adiante a necessária distensão após este processo eleitoral altamente polarizado – pelo contrário, continua interessado no confronto e na intimidação, como mostra a intempestiva e desproporcional resposta de Alexandre de Moraes a uma ação da coligação de Bolsonaro que pedia a impugnação de mais da metade das urnas eletrônicas usadas no segundo turno. Assim, é necessário que os ministros sejam chamados à razão, e a CPI pode finalmente ser o instrumento que permitirá que isso ocorra – ainda que ela fique para o início da próxima legislatura, já que existe uma controvérsia sobre os prazos e sobre as dificuldades de funcionamento durante o recesso em caso de instalação imediata da comissão. [desde que não caia no esquecimento = desmoralização.] Ela merece a mobilização dos brasileiros; o eleitor precisa demonstrar que apoia os deputados que já assinaram o requerimento de abertura, e pressionar os que ainda não o fizeram, pois certamente haverá muitos interessados em enterrar essa investigação, inclusive dentro da Câmaraum deputado do PSD até já acionou o STF em um “ataque preventivo” contra a CPI que ainda não existe. [temos que lembrar que recentemente foi proibido, censurado,  um documentário da Brasil Paralelo, que ninguém chegou a ver. (Nereu Crispim - PSD/RS é o nome do parlamentar que ingressou no STF contra a CPI. CONFIRAM:deputado entra com ação no STF para impedir CPI que tenta investigar o próprio STF.]

  , Mas o Brasil quer e precisa dela.

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Editorial - Gazeta do Povo

 

terça-feira, 21 de junho de 2022

Ministros do STF atuam para barrar proposta que anula decisões do tribunal - Malu Gaspar

Rafael Moraes Moura - O Globo

Tensão entre os poderes

Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) entraram em campo para barrar o avanço da controversa Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pretende garantir ao Congresso o poder de anular decisões não-unânimes da Corte. [vamos limitar nosso comentário à transcrição do parágrafo único, artigo 1º, da CF, que estabelece: 

"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: 

...

O plenário do STF durante a posse do ministro André Mendonça

A equipe da coluna apurou que pelo menos três ministros do STF - de perfil mais político e com maior interlocução com o Congresso - têm procurando lideranças do Centrão e da oposição, principalmente por telefone.

O espectro de interlocutores inclui o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-A L), o presidente nacional do Republicanos, Marcos Pereira, além do secretário-geral do PT, Paulo Teixeira, que não integra o Centrão.

Nessas conversas, os integrantes do STF repetem o que é consenso na Corte: que a proposta do deputado Domingos Sávio (PL-MG) é "flagrantemente inconstitucional", por violar a separação dos poderes, uma das cláusulas pétreas (dispositivo que não pode ser alterado nem mesmo por PEC) da Constituição de 1988. 

Na manhã desta terça-feira (20), o presidente do STF, Luiz Fux, se reúne com as principais lideranças do Senado. Segundo auxiliares do STF, o ministro deve aproveitar o encontro para ressaltar a importância do diálogo e do fortalecimento das instituições – a expectativa é a de a que a PEC também entre nas discussões.

Integrantes da Corte alertam para outro ponto da proposta: se o Congresso acabar assumindo o poder de derrubar decisões do STF, abrirá  caminho para que, em um segundo momento, as assembleias legislativas estaduais façam o mesmo com decisões dos Tribunais de Justiça.

Ministros ouvidos pela coluna acreditam que a PEC serve, acima de tudo, a fins meramente eleitoreiros, reforçando a narrativa bolsonarista de conflito com o Supremo a menos de quatro meses do próximo pleito. 

Também há quem veja uma nova retaliação à Corte, que já contrariou os interesses do Congresso ao mandar abrir a caixa-preta do bilionário orçamento secreto.

No Congresso, o texto é conhecido como “PEC do Equilíbrio”, mas no STF o nome é outro – “PEC do Desequilíbrio”.

Por ora, a sinalização do presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), foi de que não há chances de a proposta andar no Congresso. O movimento, porém, acionou o sinal de alerta no STF, onde se avalia que a tendência é a PEC ficar em suspenso, como uma ameaça permanente. “Eles precisam alimentar a base eleitoral que vive disso”, alfinetou uma fonte que acompanha de perto as discussões.

Expoentes da bancada ruralista e evangélica, que torcem o nariz para decisões do STF, são os principais defensores da proposta. 

Os ruralistas, por exemplo, querem a aprovação do marco temporal para a demarcação de terras indígenasuma tese na qual indígenas podem reivindicar apenas a demarcação de terras já ocupadas antes da data de promulgação da Constituição de 1988. [atualmente, as terras indígenas - os indígenas que são menos de 0,5% da população brasileira, menos de 1.000.000 - ocupam 14% do território brasileiro. Para que tanta terra? especialmente terras ociosas e ainda querem mais. Conheça a insuspeita opinião do Estadão, clicando aqui.] A discussão sobre essa controvérsia ainda não foi concluída pelo STF.

Evangélicos, por sua vez, ficaram contrariados com decisões recentes da Corte – como a criminalização da homofobia e da transfobia –, consideradas uma ameaça à liberdade religiosa. [criminalização por analogia, o que contraria a textualidade do Direito Penal.]

O texto do deputado prevê que o Congresso, com o apoio de ⅗ de deputados e senadores, tem o poder de derrubar decisões do STF que tenham transitado em julgado (esgotado todos os recursos) “sem aprovação unânime dos seus membros”, “e que extrapole os limites constitucionais”.  A PEC não esclarece o que seria extrapolar esses limites.“O estado democrático de direito se sustenta no princípio da independência e harmonia entre os poderes. Para que este princípio basilar seja assegurado é fundamental que exista respeito equilíbrio entre os poderes, isto se dá pelo sistema de pesos e contrapesos, ou seja, nenhum poder é soberano sobre o outro”, escreveu Domingos Sávio ao justificar a medida.[adequadas e incontestáveis palavras. Na conjuntura atual, ula lei aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo Presidente da República, pode ser suspensa por ato monocrático de um ministro do Supremo.]

Um ministro do STF, que acha “muito difícil” a PEC vingar no Congresso, comentou à coluna:  “Já viu algo assim ser aprovado?”

Malu Gaspar, coluna em O Globo


quarta-feira, 24 de novembro de 2021

A confissão de Toffoli - Editorial

Gazeta do Povo

Quase um ano e meio depois de afirmar que o Supremo Tribunal Federal (STF) atua como “editor de uma nação inteira” no abusivo inquérito das fake news, o ministro Dias Toffoli atribuiu uma nova função à corte e que, assim como a de “editor”, não vem nem das leis, nem da vontade popular. Durante o 9.º Fórum Jurídico de Lisboa, o ex-presidente do Supremo afirmou que hoje o Brasil vive um “semipresidencialismo com um controle de poder moderador que hoje é exercido pelo Supremo Tribunal Federal. Basta verificar todo esse período da pandemia”.

A discussão sobre semipresidencialismo – um sistema em que o presidente da República divide formalmente poderes com o Legislativo, embora não a ponto de se falar na adoção do parlamentarismo – já vem de alguns anos e sempre retorna quando se observam impasses entre poderes, especialmente entre Executivo e Legislativo. Se há a constatação de que o Brasil de hoje já funciona em parte de modo semipresidencialista, é porque a Constituição de 1988, embora afirme que o Brasil é uma república presidencialista escolha ratificada pela população no plebiscito de 1993 –, teve entre seus redatores muitos adeptos do parlamentarismo, e que acabaram deixando sementes espalhadas pelo texto constitucional. Resultado disso é o dito “presidencialismo de coalizão”, em que o governante de turno precisa montar uma maioria parlamentar à base de muitas negociações, nas quais se recorre ao fisiologismo e à corrupção pura e simples. O que mais assusta na frase de Toffoli, no entanto, não é a menção à solução fora de lugar representada pelo semipresidencialismo, mas a um papel que o Supremo concedeu a si mesmo ao arrepio de qualquer previsão legal.

O passado recente bem demonstra a que ponto o Supremo se arrogou o papel de “superpoder”

Não existepoder moderador” de nenhum tipo no Brasil, e quem o afirma é o próprio Supremo. Em 2020, a corte havia sido chamada a esclarecer o papel das Forças Armadas na ordem institucional brasileira, e em liminar o ministro Luiz Fux (hoje presidente da corte) afirmou expressamente queinexiste no sistema constitucional brasileiro a função de garante ou de poder moderador: para a defesa de um poder sobre os demais a Constituição instituiu o pétreo princípio da separação de poderes e seus mecanismos de realização. O conceito de poder moderador, fundado nas teses de Benjamin Constant sobre a quadripartição dos poderes, foi adotado apenas na Constituição Imperial outorgada em 1824. Na conformação imperial, esse quarto Poder encontrava-se em posição privilegiada em relação aos demais, a eles não se submetendo. 
No entanto, nenhuma Constituição republicana, a começar pela de 1891, instituiu o Poder Moderador. 
Seguindo essa mesma linha e inspirada no modelo tripartite, a Constituição de 1988 adotou o princípio da separação de poderes, que impõe a cada um deles comedimento, autolimitação e defesa contra o arbítrio, o que apenas se obtém a partir da interação de um Poder com os demais, por meio dos mecanismos institucionais de checks and balances [freios e contrapesos] expressamente previstos na Constituição”.

Mais adiante, na mesma liminar, Fux afirma que “considerar as Forças Armadas como um ‘poder moderador’ significaria considerar o Poder Executivo um superpoder, acima dos demais”; ora, se é assim, não estaria Toffoli querendo fazer do Supremo esse “superpoder, acima dos demais”? E podemos perguntar mais ainda: não estaria o STF realmente agindo desta forma, acima dos demais poderes e acima das próprias leis, extrapolando completamente o seu papel de guardião e intérprete da Constituição Federal?

 
VEJA TAMBÉM:     Supremo sem freios (editorial de 14 de agosto de 2021)
    O apagão da liberdade de expressão no Brasil (editorial de 30 de agosto de 2021)
    A insegurança jurídica e o descrédito do Supremo (editorial de 11 de março de 2021)
    Vergonha para o STF, luto para o Brasil (editorial de 23 de março de 2021)


O passado recente bem demonstra a que ponto o Supremo se arrogou o papel de “superpoder”. Não bastando as inúmeras e constantes interferências nas funções dos poderes Executivo e Legislativo, a corte vem rasgando a Constituição e as leis ao promover um apagão da liberdade de expressão no Brasil, instaurar inquéritos abusivos nos quais o devido processo legal é ignorado, criar crimes sem previsão legal (como na recente equiparação da homofobia ao racismo), anular processos e decisões judiciais realizadas em completo respeito às leis penais e processuais, e inventar suspeições. Como afirmamos neste espaço em março de 2021, “quando a Constituição, a lei, a jurisprudência, os princípios legais e a coisa julgada são ignorados, entra em ação o voluntarismo. Já não existe uma única Constituição, mas tantas Constituições quanto magistrados.  
Já não existe jurisprudência, mas apenas as convicções e as conveniências de cada julgador. E, no Brasil atual, poucas instituições têm representado esse caos judicial de forma tão intensa quanto aquela que deveria ser a principal guardiã da Carta Magna e da segurança jurídica”.
 
A confissão de Toffoli pode fazer corar Montesquieu, o grande teórico iluminista da tripartição de poderes, mas já fora prevista muitos séculos antes pelo poeta romano Juvenal, que nas suas Sátiras questionava: quis custodiet ipsos custodes?, o que poderia ser traduzido como “quem vigia os vigilantes?”, ou “quem guardará os guardiões?”.  
Sem os limites que o bom uso dos freios e contrapesos traria, a tendência dos ministros do Supremo é realmente se tornarem um superpoder que decide como bem entende, sem ter de prestar contas a ninguém. E então a ressalva de que “presidir o Brasil não é fácil” soa ainda mais sarcástica, já que agir como um superpoder, decidindo como se bem entender, sem precisar negociar nada com ninguém ou sem prestar atenção a lei alguma, é a coisa mais fácil que há.


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Editorial - Gazeta do Povo


sábado, 24 de abril de 2021

QUE PARLAMENTO É ESSE? - Percival Puggina

Vou longe, mas já volto. Não se assuste, leitor. É importante o preâmbulo que farei.

No início do século XIII, a Inglaterra vivia momentos difíceis. A disputa entre os filhos do rei Henrique II, as guerras e as campanhas de Ricardo (o Coração e Leão), que o sucedeu em 1189, arrasaram o orçamento da Coroa. Ricardo, como rei, comandara a 3ª Cruzada. 
Para fazê-la, raspou os cofres e monetizou tudo que podia ter algum valor no reino. 
Dois anos depois, enquanto retornava de Jerusalém sem conquistar a cidade, foi capturado e vendido ao rei da inimiga Áustria. Sua liberdade custou o equivalente ao dobro da renda anual da Coroa. Morreu em 1199 e o trono foi assumido por João (conhecido como Sem Terra), o mais jovem dos irmãos.

As disputas internas entre os filhos de Henrique, as aventuras de Ricardo e duas guerras mal sucedidas do rei João contra a França custavam muito e nada rendiam aos barões que se rebelaram e obrigaram João a firmar a Magna Carta, que limitou significativamente seu poder. Esse documento, que João não levou a sério, é considerado o fundador do constitucionalismo moderno. Os barões, através de quem se alastrava pelo reino a cobrança de impostos, achavam, com razão, que pagavam muito por quase nada. E quiseram dar um basta.

Voltei. O orçamento da União aprovado pelo Congresso Nacional para o corrente ano eleva a R$ 247 bilhões o déficit das contas públicas. Foi o menos ruim que se conseguiu obter. Esse número, tão vermelho, é produto cumulativo de irresponsabilidades fiscais que se transferem de orçamento para orçamento. Para sua composição, ao longo dos anos, convergem interesses corporativos, geração de espaços de poder político mediante criação de empresas estatais muitas das quais deficitárias, aumento permanente dos custos operacionais e funcionais dos poderes de Estado, notadamente daqueles cujos salários sobressaem dentro do mercado, e uso político partidário dos recursos públicos. Note-se que não falei dos inestimáveis custos da corrupção, mais uma vez premiada, nestes dias, com o selo nacional da eterna impunidade.

Compare o que aconteceu na Inglaterra do século XIII com o que está acontecendo no Brasil 800 anos depois, Lá, o “parlamento”, como poderíamos definir por analogia aquele conselho dos 25 barões impostos ao rei João, atuava para diminuir o gasto da Coroa e os tributos. Aqui, historicamente, a maioria dos parlamentares brasileiros pressiona para aumentar a despesa pública! Quer que o governante tome mais dinheiro da sociedade. Ou seja, olha para os lados e não olha para frente.

É claro que isso tem nome. É claro que os critérios do atual governo desagradam o mundo e o submundo. O que torna tudo mais difícil para o exercício da cidadania é que a imprensa brasileira parece não saber os nomes dos maus parlamentares, dos oportunistas, dos que fazem política para o mal do país, para o corporativismo e para o clientelismo. A omissão grita, principalmente porque os nomes do Executivo estão, sempre, sob o crivo negativo, o comentário ácido, e são objeto de adjetivos, interjeições e desconstrução de imagem. 
É um ativismo midiático que não atravessa a rua. E o Brasil perde com isso porque a copa fica franqueada aos abusados enquanto o clássico sistema de “freios e contrapesos” ganhou carga e perdeu os freios, atropelando o Estado de Direito.

Os barões se regalam.

 Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


quinta-feira, 25 de junho de 2020

‘Associação criminosa’ no bolsonarismo - EditoriaI - O Globo


A possibilidade levantada por ministro do STF tem base em quebras de sigilo bancário

Um conjunto de organismos de Estado — o Ministério Público Federal, o MP estadual do Rio, o Judiciário e ainda as Polícias Federal, Civil fluminense e a de Brasília — tem dado exemplos do funcionamento dos pesos e contrapesos existentes numa democracia, para o enquadramento de falanges radicais bolsonaristas. A descoberta de que o desaparecido Fabrício Queiroz, íntimo do clã Bolsonaro, por exemplo, estava sendo mantido fora de circulação em imóvel localizado em Atibaia (SP), de Frederick Wassef, advogado do presidente Bolsonaro, foi uma operação do MP do Rio, com a Polícia Civil fluminense, apoiada por sua congênere paulista.

Já a execução de busca e apreensão em um sítio feita por policiais de Brasília encontrou provas da atuação de agrupamentos bolsonaristas extremistas, entre elas fogos de artifício. Foi com fogos que o “300 do Brasil” fez a simulação de bombardeio do Supremo Tribunal, no fim de semana retrasado. O ataque ao STF levou à prisão de Sara Giromini e de mais cinco militantes do mesmo grupo, pedida pelo MP Federal, e decretada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, que preside o inquérito sobre a organização de manifestações antidemocráticas aberto por iniciativa da Procuradoria-Geral da República. Não há conexão operacional entre a prisão de Queiroz e a operação de policiais brasilienses que os levaram a uma base de apoio de radicais da extrema direita. Isso significa que procuradores, juízes e policiais, em Brasília, Rio e São Paulo, trabalham para executar a lei, independentemente de quem seja o alvo e de onde estejam.

Desde as primeiras manifestações, principalmente em Brasília, o tipo de produção das faixas com ataques ao Congresso, ao Supremo e defesa de um golpe, da volta do AI-5, mantendo-se Bolsonaro no Planalto, indicava a existência de um esquema de financiamento dos atos. As faixas tinham a mesma tipologia e o mesmo acabamento industrial. Isso custa dinheiro. O prosseguimento deste inquérito arrolou empresários bolsonaristas, candidatos mais prováveis a financiadores do movimento — como Luciano Hang, Edgard Corona e Otavio Fakhoury —, mas não apenas eles. Por iniciativa do MP Federal, o ministro Alexandre de Moraes determinou a quebra de sigilo bancário de parlamentares bolsonaristas, de operadores de sites e de canais no YouTube.

Pelo menos quatro deputados federais do PSL — Bia Kicis (DF), Guiga Peixoto (SP), General Girão (RN) e Aline Sleutjes (PR) — teriam sacado dinheiro público de suas verbas para exercer os mandatos e canalizaram os recursos à difusão pelas redes de mensagens de sustentação dos atos antidemocráticos. Propagam-se propostas inconstitucionais com dinheiro do contribuinte. Não pode. Outros sigilos foram quebrados, e a teia que vem emergindo da investigação leva o ministro Moraes a admitir a “real possibilidade da existência de uma associação criminosa” que atua por trás de toda esta mobilização de extrema direita. Mais um problema para o Planalto.

Editorial - O Globo