Pode ter sido uma decisão “de caráter exclusivamente
operacional” a desmobilização da força-tarefa da Polícia Federal,
incorporada pela Superintendência da PF no Paraná, mas não é possível
aceitá-la sem um mínimo de desconfiança.
Em
vez de mudar o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, o novo ministro
precisou apenas convencê-lo de que era preciso uma reorganização
funcional.
Mesmo porque não faz o
menor sentido a informação do Delegado Regional de Combate ao Crime
Organizado do Paraná, delegado Igor Romário de Paula, coordenador da
Operação Lava Jato no estado, de que "a nossa demanda hoje de
procedimentos em andamento é bem menor do que no ano passado".
Como
ressaltaram os Procuradores da Lava Jato em Curitiba, depois das
delações dos executivos da Odebrecht naturalmente aumentaram as
necessidades de investigação. Além disso, “há farto material ainda não
periciado”, resultado de 844 buscas e apreensões em 41 fases. Para se
ter uma idéia do volume, só na primeira fase foram 80 mil documentos.
Embora
já tenham sido recuperados mais de R$ 10 bilhões, diz a nota do
Ministério Público em Curitiba, “há um potencial de muitos outros
bilhões, se os esforços de investigação prosseguirem."
Mesmo que a
visão administrativa restritiva, em razão dos cortes de verba, tenha
que se impor neste momento de dificuldades econômicas do governo, é
sintomático que justamente o setor mais delicado das investigações da
Lava Jato seja afetado.
Um governo que é acusado de ter interesse
em cercear as investigações deveria ter cuidados especiais com as
aparências, uma postura que até agora prevaleceu, mas parece ter sido
abandonada. A nova visão gerencial da Polícia Federal coincide com a
chegada ao Ministério da Justiça de Torquato Jardim, que havia sido
acusado de ter sido nomeado justamente para controlar a Polícia Federal.
Em
vez de mudar o diretor-geral da PF, Leandro Daiello, o novo ministro
precisou apenas convencê-lo de que era preciso uma reorganização
funcional. Essa visão coincide com a da futura Procuradora-Geral da
República, Raquel Dodge, que no início do ano apresentara em uma reunião
do Conselho Superior do Ministério Público proposta para limitar em 10%
a transferência de setor de procuradores no Ministério Público Federal.
Com
essa restrição, pois até aquele momento não havia limitação, a Operação
Lava Jato seria prejudicada na opinião de Rodrigo Janot, que explicitou
publicamente sua divergência, estranhando inclusive não ter sido ouvido
pela subprocuradora na pesquisa que havia alegadamente feito para
definir um modelo de gestão que considerava mais adequado, sem, como
garantia, afetar a efetividade das investigações da Lava Jato.
Com
oito dos dez procuradores do CSMP favoráveis à proposta de Raquel
Dodge, o Procurador-Geral, Rodrigo Janot, pediu vista, e o assunto ficou
adormecido. Ao que tudo indica será retomado a partir de setembro,
quando as flechas e a caneta passarão para as suas mãos.
A
intenção de controlar as investigações da Lava Jato, restringindo seus
efetivos e a verba especialmente alocada para a Operação, coincide com
uma disputa de poder entre a Polícia Federal e o Ministério Público, de
um lado, e entre os componentes das duas instituições internamente.
Como
ponto central das investigações, o Ministério Público de Curitiba
ganhou notoriedade nacional, e isso parece ter provocado ciúmes entre os
Procuradores que não estão envolvidos na investigação. O episódio da
Operação Carne Fraca é um exemplo claro dessa disputa interna nas
instituições, levando a conclusões apressadas para ganhar notoriedade
que equivalesse à dos envolvidos na Operação Lava Jato, que comemorava
naquele dia três anos de atividade.
Tanto que na nota oficial da
Polícia Federal, alega-se que se deve “ressaltar que as investigações
decorrentes da Operação Lava Jato não se concentram somente em Curitiba,
mas compreendem o Distrito Federal e outros dezesseis estados”.
O
governo, com dificuldades de verba e interesse político em neutralizar
as investigações, encontrou nas recentes mudanças anunciadas uma maneira
de usar as disputas internas da Polícia Federal e do Ministério Público
para obter êxito na “contenção da sangria”.
Fonte: Merval Pereira - O Globo
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