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quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Querem tirar dinheiro de quem não o tem porque não querem ir ao bolso de quem o tem - A demofobia da ekipekonômika

Elio Gaspari - Folha de S.Paulo - UOL

Paulo Guedes e os çábios da ekipekonômika insistem em morder o andar de baixo

Bolsonaro recolocou Waldery no seu quadrado 

Em menos de 24 horas Jair Bolsonaro impôs mais um vexame aos çábios de sua ekipekonômika.

Na segunda-feira o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, saiu-se com mais um lance de demofobia. Ele queria congelar por dois anos as aposentadorias e benefícios da Previdência Social e defendia a ideia com um argumento que poderia ter saído de um camelódromo: “A desindexação que apoiamos diretamente é a dos benefícios previdenciários para quem ganha um salário mínimo e acima de um salário mínimo. (…) O benefício hoje sendo de R$ 1.300, no ano que vem, ao invés de ser corrigido pelo INPC, ele seria mantido em R$ 1.300. Não haveria redução, haveria manutenção.”

Na manhã de terça Bolsonaro recolocou-o no seu quadrado: “Eu já disse há poucas semanas que jamais vou tirar dinheiro dos pobres para dar para os paupérrimos. Quem porventura vier propor a mim uma medida como essa, eu só posso dar um cartão vermelho para essa pessoa”. Na essência, Bolsonaro lida com um velho problema da condução da política econômica. Os çábios pensam que mandam e tentam atropelar o Planalto com entrevistas capazes de criar fatos consumados. Foi assim com o vazamento do primeiro plano do Renda Brasil, mandado ao lixo pelo capitão. O doutor Waldery repetiu a receita e deu-se mal.

A ekipekonômica quer tirar dinheiro de quem não o tem porque não quer ir ao bolso de quem o tem. No projeto original de reforma da Previdência tungavam-se os miseráveis que vivem com o Benefício de Prestação Continuada. Depois tentaram taxar quem recebe o seguro-desemprego.  O raciocínio do doutor Waldery era indigente.
É sabido que a inflação bate com mais força no andar de baixo. Num exemplo extremo, se um cidadão comprava cinco quilos de arroz por R$ 15 e hoje paga mais de R$ 30, o valor de seu benefício pode ser mantido, mas sua capacidade de comprar arroz será reduzida. A tunga dos aposentados dependia da aprovação de uma emenda constitucional. 

Suas chances de aprovação eram menores que as da existência de uma Brasília em Vênus. Ela tinha a barbicha, as quatro patas e o mau cheiro dos bodes. A proposta surgiu no mesmo dia em que reapareceu problema da falta de atendimento nas agências do INSS. Num caso havia uma má ideia. No outro, serviço malfeito. A adesão de Bolsonaro à eficiência do programa Bolsa Família expôs o primitivismo das ideias de sua ekipekonômika. Todos, inclusive ele, demonizavam o programa petista, mas, na hora do vamos ver, não tinham coisa melhor para botar no lugar. Com a pandemia, jogaram bilhões para custear o necessário benefício emergencial. Como é coisa de emergência, não exige contrapartida, enquanto o Bolsa Família estimula a busca por educação e saúde.

O doutor Paulo Guedes e seus çábios estão presos numa armadilha. Venderam um programa liberal a um capitão intervencionista e insistem em morder o andar de baixo. Tudo isso para deixar a coisas como estão e, se possível, fazê-las andar para trás. O atraso tem um preço. O economista Thomas Piketty disse tudo quando falou com Luciano Huck. “O Brasil é hoje desigual demais para conseguir se desenvolver.”
Isso começou há muito tempo, no século XIX o Visconde de Sinimbu informava: “A escravidão é conveniente, mesmo em bem ao escravo”.
Deu no que deu.

Folha de S. Paulo - O Globo - Elio Gaspari, jornalista






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