Catarina Rochamonte
A necessária reforma tem de começar por cima, cortando os privilégios ali onde eles exorbitam
O principal motivo de clamor público por uma reforma administrativa é o
acúmulo de privilégios. Sendo assim, é inusitado que uma proposta de
reforma comece por avisar que os mais privilegiados — magistrados,
parlamentares, militares e membros do Ministério Público, justamente as
categorias de maior remuneração— não serão atingidos. A reforma proposta pelo governo Bolsonaro retira direitos de muitas
categorias de [futuros] funcionários públicos, ao mesmo tempo em que mantém ou
fortalece privilégios do alto escalão do funcionalismo, aqueles que
estão na ponta da pirâmide dos poderes.
[um comentário esclarecedor:
- magistrados, parlamentares e integrantes do Ministério Público, são MEMBROS dos Poderes Judiciário e Legislativo e do Ministério Público = não são funcionários públicos (em que pese que o patrão é o mesmo = o contribuinte = o cidadão = o povo) são regidos por legislações específicas:
- LOMAN, para MEMBROS do Poder Judiciário;
- Estatuto do Parlamentar, Constituição e legislação subsidiária para os parlamentares;
- os membros do Ministério Público - possuidor de algumas prerrogativas especiais mas não é um dos Poderes da República - são regidos pela Lei Orgânica, Constituição e legislação subsidiária.
A reforma administrativa contempla especificamente os regidos pela Lei nº 8.112/90, que são em grande parte os 'barnabés', os que fizeram concurso público.
Os militares nos termos da Constituição de 88 não são servidores públicos e assim não são alcançados pela reforma administrativa, mas também não possuem os privilégios inerentes aos MEMBROS do Poder Judiciário e Poder Legislativo.]
A justificativa para ter excluído os mais privilegiados é que estes são
membros de poderes, com regras próprias. O Parlamento, porém, tem poder
constitucional para ampliar o texto original enviado pelo Executivo e
efetivar uma reforma verdadeira, equânime, democrática e justa.
Não adianta apoiar a proposta inicial da reforma dizendo que se trata de
um primeiro passo. A aprovação da proposta original, sem emendas, seria
um passo em falso. A necessária reforma tem de começar por cima, cortando os privilégios
ali onde eles exorbitam despudorados, afrontosos, escandalosos. [sendo recorrente pela enésima vez: vale fazer alguma coisa agora, ainda que aplicável somente aos aos que ingressarem no Serviço Público após aprovação, do que esperar pela ocasião conveniente.
Collor tentou uma reforma administrativa e não emplacou - exatamente pela impossibilidade de alcançar os então servidores, valendo apenas para os futuros;
Tivesse sido realizada naquela ocasião, grande parte dos então servidores naquela ocasião estariam aposentados ou em vias de se aposentar = a reforma de Collor estaria completando 30 anos = o que implicaria em que uns 80% a 90% dos atuais servidores estariam sob as novas regras.]
A reforma administrativa é necessária para equilibrar as contas, enxugar
e modernizar a máquina pública, melhorar a qualidade dos serviços
prestados e, com isso, favorecer a população. Ocorre que a reforma ora
apresentada mantém as regalias da elite do estamento burocrático que se
mantém à custa do suor do trabalhador comum.
Paulo Guedes, arquiteto da proposta, não apenas defendeu tais
privilégios como mostrou-se indignado por eles não serem mais amplos:
“Acho um absurdo os salários da alta administração brasileira. São muito
baixos”, afirmou, sem nem corar. Para o ministro, a diferença salarial
entre os de cima e os de baixo não estaria ainda de bom tamanho: “Tem
que haver uma enorme diferença”.
Isso não é liberalismo; está mais para Ancién Régime.
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