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quinta-feira, 9 de novembro de 2023

ENEM, esse Cavalo de Troia, e sua montaria.- Percival Puggina

        Desde que caiu em mãos petistas em 2003, o ENEM virou um Cavalo de Troia do tipo que chega relinchando, fazendo sujeira no calçamento, recheado de invasores, braços para fora, acenando bandeiras vermelhas. 
Foi pensado, originalmente, com o intuito de avaliar a aprendizagem dos alunos de ensino médio, no entanto, uma vez confiado ao PT, virou componente de relevo na máquina totalitária que o partido montou no MEC.

Entende-se. Para Paulo Freire, patrono da educação brasileira, educar é um ato político e as provas do ENEM deste ano mostram como bem sublinhou Alexandre Garcia em recente artigo que professores formados com as bênçãos desse patrono já não conseguem elaborar uma prova em linguagem compreensível. A educação brasileira é uma tragédia que vai vitimando sucessivas gerações.

O ENEM não é apenas uma fonte de colossais trapalhadas, como as que se repetem este ano. 
É parte, também, de um projeto de hegemonia em implantação há várias décadas e que se realiza induzindo currículos, ordenando pautas, impondo o vocabulário do partido e ideologizando exames, provas e concursos públicos. 
As cartilhas, os livros distribuídos às escolas, os muitos programas nacionais voltados ao famigerado "politicamente correto" estão alinhados com a mesma estratégia.
 
Imagine o contexto: de um lado, uma prova que habilita os bem colocados, num sistema de cotas e notas, a ingressar na universidade; de outro, um inteiro temário de questões onde as pautas políticas e o vocabulário do partido aparecem como textos de motivação, objetos de interpretação, ou respostas a serem assinaladas como corretas. 
Não raro são introduzidas questões controversas, mas os alunos já sabem como pensam os professores... Se estudantes cubanos, venezuelanos ou nicaraguenses fossem submetidos a algum certame nacional, ele certamente seria assim.
 
O Cavalo de Troia tem o poder de agir nacionalmente e de influenciar a quase totalidade dos estabelecimentos de ensino médio do país, mobilizando quatro milhões de estudantes por edição. 
O atrativo que oferece e a pressão de demanda que determina, leva as escolas a condicionarem seus conteúdos às pautas do ENEM. 
Desse modo, a burocracia do MEC dá o tom que devem entoar as salas de aula do país.

Depois – imenso paradoxo! – essa militância de esquerda agarrada ao MEC como carrapato ideológico impõe regras a todos agita suas bandeirinhas vermelhas em defesa da liberdade de cátedra e da autonomia do professor... Dá-me forças, Senhor!

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

sábado, 6 de maio de 2023

Cavalo de Troia

Na epiderme, a defesa da liberdade. Um pouco abaixo, a tutela

LIMITES - As redes sociais pressionadas: elas não têm culpa por tudo de ruim

LIMITES - As redes sociais pressionadas: elas não têm culpa por tudo de ruim (Florian Gaertner/Getty Images)
 

 Na incrível fábrica brasileira de explicações simples para problemas complicados, escutamos de tudo. 
Há quem tenha culpado os jogos eletrônicos pela violência nas escolas. De um ministro escutei que a culpa era da “liberação das armas”, diante da monstruosidade feita com uma machadinha, em Blumenau. 
Em um grupo de Whats­App, alguém foi taxativo: “A culpa é do Bolsonaro”. Imagino que em outros o culpado tenha sido o Lula. E de uma outra autoridade li que aquilo teria algo a ver com o “golpismo do 8 de Janeiro”.  
Na cacofonia brasileira, cada um vai espalhando suas impressões. 
A favorita da vez é a de que as redes sociais têm culpa no cartório. Seja pelo 8 de Janeiro, seja pela violência, seja por tudo de ruim que anda por aí. E que, como é próprio da tradição brasileira, precisamos de mais uma lei para “pôr ordem em toda essa bagunça”.
 
É sobre isso o debate em torno da Lei das Fake News. O Estado, como se tornou comum por aqui, resolveu regular a discussão. E o fez à moda brasileira: empresas de comunicação, com óbvios interesses no projeto, podem fazer editoriais e emitir sua opinião favorável ao projeto.  
Empresas com visão contrária, negativo. São intimadas a depor, a retirar sua opinião, e se tornam “suspeitas” de uma penca de crimes. Não deixa de ser didático. Nos ajuda a pensar um pouco sobre o que está em jogo.

Os defensores da lei dizem que é preciso regular. É preciso mudar os termos no Marco Civil da Internet, uma antiga lei da época em que se imaginava a internet como um espaço aberto, e determinar que as plataformas devem “atuar diligentemente” para “prevenir e mitigar” toda a sorte de crimes, inclusive aqueles de natureza política, como os “crimes contra as instituições democráticas”. 

Uma plataforma terá de decidir o que entra ou não na conta de uma “grave ameaça” ao estado democrático de direito. 
E, se não acertar, será responsabilizada. As plataformas igualmente terão de monitorar as redes para identificar se há alguma suspeita de crime atual ou que “possa ocorrer no futuro”. Se não o fizer, e não comunicar às autoridades, também podem ser responsabilizadas. 
Por fim, a lei dá amplos poderes ao Comitê Gestor da Internet para fixar “diretrizes” para os códigos de conduta das redes, e igualmente depois para “validar” a sua redação. 
O Comitê terá poderes para “limitar a distribuição massiva de conteúdos e mídias”, pelas empresas de mensagens, como o Whats­App, e deve fazer uma “conferência anual” para discutir todos esses assuntos. 
Este último item demonstra a displicência com que fazemos leis no Brasil. Alguém poderia se perguntar por que cargas-d’água o contribuinte brasileiro precisa pagar, ano após ano, uma conferência anual para discutir qualquer coisa referente à liberdade e à regulação da internet. 
Não há resposta. Apenas uma lei feita no embalo do ativismo e da fúria reguladora que há alguns anos tomou conta do país.

“Na epiderme, a defesa da liberdade. Um pouco abaixo, a tutela”

O Comitê Gestor existe desde os anos 1990, sempre teve atribuições essencialmente técnicas. Se aprovada a lei, a conversa será outra. Ele passa a propor coisas como “diretrizes estratégicas para a liberdade na internet”.  
Dirá, por exemplo, para quantas pessoas você e eu poderemos mandar uma mensagem, no Whats­App, e dirá o que as plataformas deverão admitir ou banir. 
Não é pouca coisa. Podemos até fazer de conta que vivemos todos em uma grande reunião de escoteiros e que não há problema algum em delegar essas coisas a uma instância de poder qualquer. 
Quando Madison e os fundadores dos Estados Unidos desenharam o Bill of Rights, na Constituição americana, era exatamente para que uma coisa dessas não acontecesse. 
Que o Congresso “não faria leis” restringindo um direito que, na sua visão, pertencia às pessoas, aos cidadãos, e não ao Estado. Isso não quer dizer que eles estavam certos. Eles apenas escolheram um caminho, diferente do qual parecemos adentrar, no Brasil.

As guerras culturais da democracia atual fizeram com que muita gente trocasse a defesa da liberdade de expressão por outros tipos de prioridade. O “combate às fake news” e aos “discursos de ódio” é exemplo óbvio. Nada disso é novo, muito menos a pergunta xarope que vem logo depois: quem teria o poder para definir essas coisas? Quem definirá o que significa um “risco sistêmico ao estado democrático de direito”, conforme se lê, insistentemente, no projeto? 

Alguém poderia dizer que tudo isso é autoevidente. O PCO que o diga. Foi banido por “atacar” o STF, ou coisa do tipo. Daria uma tese de doutorado analisar tudo que foi incluído na conta de “ameaça ao estado de direito” no Brasil dos últimos anos. 
Do famoso tuíte do professor Marcos Cintra “ponderando” sobre as urnas eletrônicas a um dedo médio apontado para o edifício do STF. O atual projeto criminaliza a divulgação de “fato que (alguém) sabe inverídico” sobre o processo eleitoral. Ou um fato “passível de sanção criminal”
É duro ter de perguntar, pela enésima vez, o que é exatamente uma informação “verídica”? 
Dar uma opinião contrária ao sistema eleitoral ainda será permitido? Alguém assumirá a possibilidade de cair na malha do “risco sistêmico” ou da “grave ameaça”? 
As plataformas assumirão o risco? Os cidadãos? 
Ou estamos (quase) todos alegres em viver numa democracia pautada pelo medo? 
Suspeito que sim. E talvez seja exatamente aí que resida o problema.

O que estamos discutindo, na verdade, é uma lei vaga, com uma redação displicente, que aprofunda um pouco mais nossa democracia de tutela. É democracia dos tipos penais abertos, da censura prévia, dos banimentos de jornalistas, das decisões “de ofício”, sem contraditório, sem devido processo legal, essas coisas que sempre nos soam tão bem quando atingem o “lado de lá” do jogo político. De uma legislação técnica e bem-feita, que é o Marco Civil da Internet, arriscamos migrar para uma regulação com forte componente político. No eterno pêndulo liberdade versus segurança, parecemos fazer uma opção. O que esquecemos é que tanto a liberdade como a segurança têm lá seus riscos. A liberdade traz o risco de que inverdades sejam ditas; a segurança, o risco de que apenas certos tipos de inverdade possam ser ditos. E não acho que precisamos ir longe para saber disso, no Brasil atual. 

Alguém me definiu o projeto todo como um cava­lo de Troia. Nos preâmbulos, palavras amenas sobre a “liberdade”. “Garantir a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa, o fomento à diversidade.” Logo adiante, quando a lei passa aos comandos objetivos, a liberdade desaparece. Surgem aí o comitê, os códigos, as remoções e punições. É a lógica de decisões recentes sobre a censura, no Brasil de hoje. Na epiderme, a defesa da liberdade; um pouco abaixo, a tutela. Não é bom caminho. Mas reconheço que ele é perfeitamente adequado à nossa tradição. “Somos latinos, não anglo-saxões”, como me disse uma irritada interlocutora, tempos atrás, em um debate. Na hora, brinquei que não sabia se aquilo era uma crítica ou elogio. Mas no fundo acho que todos sabemos.

Fernando Schüler é cientista político e professor do Insper

Os textos dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião de VEJA

Publicado em VEJA, edição nº 2840, de 10 de maio de 2023


quarta-feira, 19 de agosto de 2020

"Sempre se soube que democracia é a vontade da maioria"

Alexandre Garcia

"Para o ministro Marco Aurélio, partidos de oposição se utilizam do  Supremo para fustigar o governo num ranço contra um serviço de informações e contra um presidente de direita"

O ministro Edson Fachin, também vice-presidente da Justiça Eleitoral, diz que a eleição de 2022 pode ser comprometida pelo despotismo e que nos aproximamos de um abismo. E que a democracia tem um “Cavalo de Troia” de autoritarismo. E que seria bom para a democracia se Lula tivesse podido ser candidato em 2018. Para os jornais, ele se referia a Bolsonaro. Quer dizer, ele vê no presidente da República um déspota. Sempre imaginei que um juiz devesse ser isento. Ele pôde fazer campanha para Dilma enquanto era professor e advogado
Mas agora é juiz. 
Terá isenção, depois dessas revelações, para julgar no Supremo e no TSE ações envolvendo Bolsonaro ou mesmo Lula?

A propósito, o ministro Marco Aurélio está sendo um rebelde. Semana passada, na quarta-feira, ele foi voto único num 9 x 1 para atender a um pedido da Rede e do Partido Socialista Brasileiro, impedindo que a Abin compartilhasse informações de outros órgãos públicos. No seu voto vencido, o ministro afirmou que partidos de oposição se utilizam do Supremo para fustigar o governo num ranço contra um serviço de informações e contra um presidente de direita. “Recuso-me a julgar com base em preconceitos”, concluiu. Dois dias depois, na mesma linha, negou liminar ao PDT, que pedia afastamento do ministro Paulo Guedes.

Desde que Bolsonaro assumiu, são muitas as ações do PSol, da Rede, do PSB. [são partidecos esquecidos, sem votos e que caminham para a extinção.
Precisam de holofotes, precisam aparecer e nada melhor que atacar o presidente da REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, JAIR BOLSONARO.
Conseguem atacando o presidente conseguem ao menos flutuar = apesar de flutuar seja também característica do que não presta, do que se joga fora.
O articulista não citou o PCdoB que agora para se manter a tona ataca Sara Winter.
Salvo engano, tem um outro partido comunista que sumiu ou está camuflado sob outro nome.] O PDT tentou manter a obrigatoriedade da contribuição sindical, depois tentou restringir os poderes das Forças Armadas; suspender a lei que leva água tratada e esgoto aos brasileiros; afastar o ministro general Heleno. E conseguiu impedir nomeação de diretor da Polícia Federal. O PSol já entrou com queixa-crime contra Bolsonaro. A Rede acionou o Supremo contra decreto de autodefesa dos cidadãos. Depois de perder no Congresso, tentam anular a derrota apelando ao STF: o PSB entrou contra a lei de liberdade do mercado, o PSol contra a Reforma da Previdência.

Nisso se encaixa a fala do ministro Alexandre de Moraes sobre tirania da maioria. Segundo seu raciocínio, o Supremo seria o órgão moderador para evitar abuso dos vencedores. Ora, sempre se soube que “democracia é a vontade da maioria”. 
Quando é imposta a vontade da minoria, aí se trata, sim, de uma tirania. Também tirania da maioria é quando a maioria do Legislativo impõe vontade diversa da vontade da maioria dos eleitores. Mas, no caso presente, é o Supremo, como instrumento de partidos minoritários, que imporia vontade diferente da expressa pela maioria das urnas. O ministro Moraes fez um sofisma para justificar a ação do Supremo, atuação que o rebelde Marco Aurélio identifica como preconceituosa. O ministro Fachin parece confirmar a ideia de Marco Aurélio.

[saber mais sobre o tema, incluindo vídeo -  clique aqui.]

Alexandre Garcia, colunista - Coluna no Correio Braziliense


terça-feira, 7 de julho de 2020

O Senado e o Supremo - Editorial 6 junho 2020

O Estado de S. Paulo




Cada uma dessas cortes foi concebida para assegurar um país livre e democrático

Desde o fim da 2.ª Grande Guerra no final da primeira metade do século 20, os países desenvolvidos moldaram suas cortes supremas conforme suas tradições jurídicas. Na França, os presidentes da República, do Senado e da Câmara escolhem um terço dos ministros do Conselho Constitucional cada um. Na Itália, o presidente, o Parlamento e os tribunais superiores indicam um terço da Corte Constitucional cada um. Na Alemanha, o Tribunal Constitucional Federal é dividido em duas turmas integradas por  oito ministros e metade das indicações é feita pela Câmara e metade pelo Senado. Para neutralizar pressões políticas e garantir a neutralidade da corte, ela está instalada em Karlsruhe, a 700 quilômetros da capital, Berlim. Nos Estados Unidos, os ministros são indicados pela Casa Branca e só são nomeados depois de serem rigorosamente sabatinados e aprovados pelo Senado.

Cada uma dessas cortes foi concebida para assegurar um país livre e democrático. Além disso, quase todas são integradas por operadores jurídicos oriundos do Ministério Público, da advocacia e das faculdades de direito, e não só por juízes. Não se ater a requisitos vinculados a uma carreira do próprio Judiciário foi o modo encontrado para assegurar a indicação de profissionais destacados e dotados de reputação ilibada, notável conhecimento jurídico, experiência profissional e credibilidade. E como em toda discussão constitucional sempre há uma convergência entre o direito e a política, esse também foi o modo como esses países procuraram neutralizar as pressões partidárias e dotar a corte suprema de uma visão pluralista, capaz de respeitar as forças sociais majoritárias e as minorias sociais. É por isso que a indicação de um ministro não é um ato de escolha exclusiva de um presidente, mas um processo de construção de consenso.


A história mostra que essa experiência deu certo, pois, independentemente de os ministros escolhidos poderem ser conservadores ou progressistas, eles, sem abrir mão de suas convicções, sempre levam em conta os interesses da sociedade, e não os desejos de quem os indicou. Nas cortes supremas francesa, italiana, alemã ou americana, os ministros sabem que, se por um lado não há formas predeterminadas de interpretar uma norma constitucional, por outro, o que deles se espera é que estabilizem as expectativas normativas da sociedade num horizonte de médio e longo prazos.

Em decorrência da instabilidade institucional do Brasil, pois desde sua ascensão ao poder o presidente Jair Bolsonaro passou a criticar sistematicamente o STF e a afirmar que a vontade do povo está acima das instituições democráticas representativas, o modo de escolha dos ministros da mais alta Corte voltou a ser objeto de acirradas discussões. Entre outros motivos porque, dentro de meses, Bolsonaro indicará o sucessor do ministro Celso de Mello, que se aposentará compulsoriamente. E o maior receio é que, em vez de respeitar os requisitos fixados pela Constituição para a escolha, como reputação ilibada e notável saber jurídico, [o critério de reputação ilibada, por ser extremamente subjetivo, não é fácil de ser criticado;
 quanto ao notável saber jurídico,...] ele indique alguém que jamais se destacou na vida jurídica e que, ao vestir a toga, passe a agir no STF como mero auxiliar para a consecução dos objetivos obscurantistas do chefe do Executivo. Pelos nomes já aventados pelo Planalto, o temor procede, pois nenhum tem notável saber jurídico. Podem até ser ministros de Estado, mas, em matéria de saber jurídico, são o que Ruy Barbosa chamava de “nulidades”.

Por isso, se quiser de fato defender a democracia, o Senado precisa deixar claro desde já como agirá quando Bolsonaro formalizar a indicação do sucessor de Celso de Mello. Deve afirmar que seus membros exercerão a prerrogativa de sabatiná-lo com rigor e que não hesitarão em rejeitá-lo caso não atenda aos requisitos constitucionais. Se assim não procederem, os senadores não poderão reclamar mais à frente, quando ficar claro que o nome indicado por Bolsonaro para o STF passar a agir como uma espécie de cavalo de Troia, valendo-se do cargo para servir ao seu padrinho como auxiliar na destruição do Estado de Direito. 

Editorial - Estadão

terça-feira, 22 de outubro de 2019

Drogas, STF e ativismo judicial - Carlos Alberto Di Franco

Não dá para entender o recorrente empenho pela descriminalização, muito menos dos ministros

Existe uma agenda mundial para a naturalização do consumo de entorpecentes

Um tema para lá de grave consta da pauta do Supremo Tribunal Federal (STF): a descriminalização da maconha. É provável, muito provável mesmo, que o resultado seja oposto à vontade popular – o povo não deseja um Estado leniente com o consumo de entorpecentes. 

Mas o ativismo judicial não está nem aí para o sentimento da sociedade. Creio, amigo leitor, que o motivo real para este julgamento não é a descriminalização do consumo de pequenas quantidades de maconha. Este é apenas o pretexto, o primeiro passo, o Cavalo de Troia de uma engenharia de costumes muito maior: a legalização; e não apenas da maconha, mas de toda a sorte de entorpecentes. Existe uma agenda mundial para a naturalização do consumo de drogas. E o STF, infelizmente, está alinhado com a perversa estratégia global. A glamourização das drogas, no entanto, bate de frente com a realidade concreta.

A pacata capital uruguaia vive dias de tensão depois que o governo anunciou que o número de homicídios no país cresceu 66% na primeira metade de 2018 em relação ao mesmo período do ano anterior. Também subiram os registros de furtos a domicílios e assaltos à mão armada. Segundo as autoridades locais, 40% desses delitos estão relacionados a conflitos entre gangues do crime organizado. Para o ministro do Interior, Eduardo Bonomi, 
“o aumento da violência é resultado do aumento dos enfrentamentos de gangues, muitas ligadas ao tráfico de drogas”.   O Uruguai, que já permitia o consumo da maconha, legalizou a produção e a venda da droga em julho de 2017

Indagado se acredita que a regulação da maconha vá reduzir o narcotráfico e a criminalidade, o presidente Tabaré Vázquez, que ocupa o cargo pela segunda vez, deixou claro que estão caminhando em terreno desconhecido, escorregadio e incerto. “É muito cedo para tirar conclusões desse tipo. Teremos de esperar um tempo maior. Só então veremos o que aconteceu”. É uma aventura. Pode custar muitas vidas. Os resultados estão aí: aumento assustador do número de homicídios.

Na verdade, os defensores da regulação, lá e aqui, armados de uma ingenuidade cortante, acreditam que a descriminalização reduzirá a ação dos traficantes. Mas ocultam uma premissa essencial no terrível silogismo da dependência química: a compulsão. O usuário, por óbvio, não ficará no limite legal, sempre vai querer mais. É assim na vida real. O tráfico, infelizmente, não vai desaparecer. [a única forma que permite eliminar ou, no mínimo, reduzir substancialmente, é o COMBATE EM UMA GUERRA SEM QUARTEL  sem favorecer usuários - eles tem que ser punidos severamente = pena igual ou bem próxima da dos traficantes, já que SEM USUÁRIO, a DEMANDA CAI e SEM DEMANDA os traficantes DESISTEM ou partem para o desespero e se torna mais fácil o abate.


Qualquer combate para ser exitoso tem que combater a produção, o tráfico e o consumo.
PENAS SEVERAS, sem essa de DIREITOS DOS MANOS.]
Caso adotássemos os princípios defendidos pelos lobistas da liberação, o Brasil estaria entrando num atalho perigoso. Não estou falando de teorias, mas da realidade cotidiana e dramática de muitos dependentes. Qualquer mudança no tema das drogas só terá legitimidade no âmbito do Congresso Nacional. 

É lá, e não no Supremo Tribunal Federal, que a sociedade brasileira está representada. [é inaceitável que o Supremo, que já pisoteia a Constituição Federal quando se mete a ser legislador, ouse,  em-evidente desrespeito à sociedade, violentar a Constituição para liberar o consumo de drogas.] 


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Carlos Alberto Di Franco - Jornalista. E-mail: difranco@ise.org.br - MATÉRIA TRANSCRITA de VEJA

sexta-feira, 3 de maio de 2019

Cúmplices de Maduro


Ambição do Brasil é se descolar do fracasso da operação amadora de Guaidó

Além do próprio Juan Guaidó, os grandes derrotados com a operação estabanada da oposição na Venezuela foram os serviços de inteligência dos EUA. Guaidó agiu e o governo Trump avalizou tudo com base na informação errada de que haveria uma deserção em massa da cúpula das Forças Armadas. Como tristemente se viu, não foi o que ocorreu. Pelo contrário.  Guaidó se aquartelou na Base Aérea, o presidente oficial Nicolás Maduro trocou o Palácio de Miraflores pelo Forte Tiuna, sede do Ministério da Defesa. Assim, a guerra virou uma disputa pelos militares. Guaidó perdeu, Maduro ganhou. Pelo menos por ora, porque a situação política, econômica e social é insustentável.

Nenhum dos milhares de generais declarou apoio à oposição, enquanto Maduro exibiu fotos marchando com militares e manifestações de comandantes e das ruas. Manteve apoio militar e mostrou força popular. A Casa Branca está tonta, o Planalto está pessimista e tudo é incerto. O chanceler Ernesto Araújo estava em Washington na véspera do blefe de Guaidó, conversando com o secretário de Estado, Mike Pompeo, e com o conselheiro de Segurança, John Bolton. Vêm a ser, exatamente, os dois representantes do governo dos EUA mais diretamente envolvidos com a Venezuela e a derrubada de Maduro.

Os generais brasileiros, porém, não dependem só de informações da Secretaria de Estado e do Pentágono (que, aliás, não se entendem), pois têm contato direto, apesar de informal, com militares venezuelanos. Na terça-feira, enquanto todos se perguntavam onde Maduro havia se metido, o vice-presidente Hamilton Mourão já sabia que ele estava em Tiuna. O problema, para eles, é que os militares venezuelanos são “cúmplices” e não vão ceder só com promessa de anistia. Sabem que, se Maduro cair, lá se vai a promessa.

O regime Chávez-Maduro segue cegamente Cuba, onde não existem duas palavras: negociação e recuo. Logo, tudo é no “vai ou racha”. E, além de não arredar pé, Maduro usou o blefe da oposição a seu favor: Guaidó sai mais fraco do que entrou; Maduro ganhou sobrevida e tende a aumentar a repressão.  mais preocupante é que Guaidó parece ter perdido gás, fôlego, jogando dúvidas sobre o futuro da oposição venezuelana, que já entrou em campo com Henrique Capriles, depois com Leopoldo López e tenta desesperadamente viabilizar Juan Guaidó, sem sucesso. Um atrás do outro, eles vão perdendo as condições para liderar uma saída para o país, pobre país.

Nos EUA, fala-se que “todas as alternativas estão sobre a mesa” e admite-se uma intervenção militar “como último recurso”. No Brasil, o tom é mais cauteloso, mas uma coisa é certa: os militares agem diplomaticamente e recusam qualquer aventura armada contra Maduro, enquanto o presidente Jair Bolsonaro, seus filhos e os tais olavistas sempre dão um jeito de deixar essa solução no ar. Até mesmo quando Bolsonaro abriu o território nacional para os EUA enviarem ajuda humanitária à Venezuela – o que Maduro chamou de “cavalo de Troia–, os militares já reagiram mal: “Entramos numa fria”, dizia uma alta patente.

Agora, enquanto Bolsonaro nega que Guaidó tenha sido derrotado, um general atrás do outro diz o que todo mundo sabe: a operação desta semana foi um fracasso, Guaidó foi o grande fracassado e o cenário é totalmente incerto. A oposição age no escuro, a inteligência americana falhou, não há informações confiáveis e Maduro vai ficando. A esta altura, o Brasil só tem uma ambição: descolar-se do desastre e do amadorismo da terça-feira.

Medalha
 

[o condecorado tem o condão de apequenar uma medalha e, infelizmente, no Brasil isto é rotina.
Basta dizer que Zé Genoíno, Zé Dirceu e outros bandidos chegaram a ser condecorados com a MEDALHA DO PACIFICADOR - a, na época, a mais alta condecoração conferida no Brasil em tempos de paz.
Destacamos o fator temporal por haver dúvidas se após tais criminosos serem condecorados, não ocorreu um 'apequenamento' da honraria.
O mesmo entendimento vale para medalha conferida ao Olavo.]  
Grau máximo da Ordem do Rio Branco para quem chama o vice de “idiota” e trata os generais aos palavrões?! Eu, hein!


Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo


 

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Autofagia

Filhos, fator de desestabilização do governo Bolsonaro 

Mourão é considerado por um grupo de bolsonaristas como um potencial inimigo, um Cavalo de Tróia

A família Bolsonaro parece gostar de um enfrentamento. Ontem à noite, o presidente avalizou pelo Twitter uma afirmação do filho Carlos, que desmentia o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, que dissera que mantivera contato com Bolsonaro no hospital. Queria desfazer assim os boatos de que estaria desgastado com o presidente devido a denúncias de uso indevido de verba propagandística durante a eleição. Pelo jeito, talvez não seja mais ministro hoje.
O PSL está debaixo de fogo cruzado devido à suspeita de ter desviado dinheiro da campanha eleitoral utilizando-se de candidatas “laranjas”. Gustavo Bebianno, que foi presidente do PSL e teve papel de relevo na campanha, está sendo acusado por um grupo de bolsonaristas, entre eles o próprio Carlos, de ter participado dessa tramoia que está sendo investigada pela Justiça. Já na transição do governo houve uma briga entre os dois. Carlos atribuía a Bebianno o convite a Marcos Carvalho, dono da agência AM4, responsável pela campanha digital do presidente eleito, para participar da equipe.
Carlos considera-se o responsável pela comunicação de Bolsonaro nas mídias sociais, tem até mesmo as senhas do pai, e não admite concorrência. Acusou Marcos Carvalho de querer aparecer como “marqueteiro digital” vencedor, sem ter tido tal importância. Certa vez, o vice-presidente Marco Maciel ouviu de Heitor Ferreira, ex-secretário particular dos presidentes Geisel e Figueiredo, a definição do posto que ocuparia no governo de Fernando Henrique Cardoso: “Vice-presidente é nada à véspera de tudo”.
Maciel soube equilibrar-se nessa linha quase etérea entre o “nada” e o “tudo”, e hoje é exemplo de comportamento para um vice-presidente, discreto e eficiente. Ontem, o vice-presidente Hamilton Mourão recebeu com um sorriso o presidente Bolsonaro, que voltava a Brasília depois de 16 dias internado no Hospital Albert Einstein em São Paulo. Sorriso que desfez qualquer desconforto que poderia ter causado uma ironia do presidente, ao telefone: “Quer me matar?”, perguntou a Mourão, que tratou de revelar a “brincadeira” para retirar dela qualquer conotação outra. Embora estivesse se referindo ao churrasco de confraternização de sua turma, de que Mourão participara enquanto ele estava no hospital, o presidente Bolsonaro refletia um estado de espírito inoculado pelo vereador do Rio Carlos Bolsonaro, o filho 02, que mantém a desconfiança de que existem pessoas interessadas na morte de seu pai. [que existem, existem; e são parte do grupo do 'quanto pior, melhor', o que não inclui o general Mourão.]

Antes da posse, ele usou o Twitter para dizer que a morte de seu pai ajudaria “também aos que estão muito perto” (...) “Principalmente após sua posse”. Na posse, ele fez questão de aboletar-se no Rolls-Royce que conduzia seu pai. O 02 acordara com um mau pressentimento e, armado de uma Glock, pediu para ser o guarda-costas do pai. Mourão é considerado por um grupo de bolsonaristas, que inclui até mesmo o guru Olavo de Carvalho e o estrategista americano Steve Bannon, como um potencial inimigo, um Cavalo de Troia que tenta se diferenciar de Bolsonaro recebendo líderes do MST ou defendendo a memória do ambientalista Chico Mendes. [Mourão é general e vice-presidente, humano, e comete erros - só Deus não erra; 
receber os bandidos do MST foi um deles e defender a memória do Chico Mendes não é crime, apesar da memória defendida não significar grande coisa - o que o dono da memória defendida fez pelo Brasil que mereça destaque? NADA.]

“Filhos, melhor não tê-los”, já advertia ironicamente o poeta Vinicius de Moraes, para completar: “Mas sem tê-los, como sabê-los?” A relação do presidente com seus filhos é um dos fatores desestabilizadores deste governo que mal se iniciou. [Bolsonaro quando assumiu dispensou porta-voz - julgou que eles e os filhos seriam os melhores porta-vozes e deu um desastre = com um pouco de exagero = uma zona;
contratou um e as coisas melhoraram.

Agora filhos, especialmente quando agem como os filhos de Bolsonaro (mais complicam que auxiliam e sempre querem apagar fogo com gasolina) são excelentes para serem curtidos como filhos; auxiliares, só eventualmente e mesmo assim em privado.
Ou Bolsonaro, dispensa a ajuda dos filhos, especialmente do Carlos, ou a credibilidade de seu governo vai para o espaço.
Tem a hora do 'pitbull'  e certamente ainda não chegou.]
As confusões envolvendo os três filhos políticos de Bolsonaro provocam intrigas dentro do próprio grupo de governo, especialmente os militares. O senador Flávio Bolsonaro, o 01, tenta se desvencilhar do caso de seu ex-assessor Fabrício Queiroz, apanhado pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) em uma “movimentação atípica” de R$ 1,2 milhão. [o senador até que não complica tanto, inclusive seu 'envolvimento' nas 'movimentações atípicas' de seu ex-assessor é mais uma tentativa da imprensa anti Bolsonaro - aliás, sobre o assunto, até agora o único crime foi o vazamento das investigações do Coaf, crime que não está sendo investigado.]
O deputado federal reeleito Eduardo Bolsonaro, o 03, flagrado em uma palestra afirmando que para fechar o Supremo Tribunal Federal bastaria chamar “um soldado e um cabo”, considera-se um assessor presidencial especialíssimo, e trabalha para ligar o PSL ao conjunto de partidos de direita pelo mundo, que o estrategista americano Steve Bannon sonha reunir. Já admitiu se candidatar à sucessão do pai caso Bolsonaro acabe mesmo com a reeleição, como prometeu. [o que disse na palestra expressou apenas um entendimento, uma ironia.
Convenhamos que a nossa Suprema Corte, melhor dizendo os ministros do STF, em sua maioria, não se preocupam muito em lembrar que o que fazem reflete na imagem do Supremo que integram.]
O 01 nunca recebeu apoio do 02. O 03 ontem se recusou a falar sobre a crise em que o 02 está metido. [o 02 fala demais, considera que política é sempre o confronto e coloca o pai e auxiliares em situações limite.
Tem que ser estimulado pelo pai a ficar fora do Brasil por uns tempos.
O mais grave em seu comportamento é que quer ser o destaque, 'primus inter pares', e considera o confronto essencial para alcançar a posição que deseja.]
 
Merval Pereira - O Globo