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sexta-feira, 29 de abril de 2022

A pior sofística tornou Lula reelegível - Sérgio Renato de Mello

Numa extensão temporal antes de Cristo (até 500 anos), Sócrates, Platão e Aristóteles, que dispensam apresentação, disputavam com os sofistas conhecimento, sabedoria, verdade e, por fim, virtude. Não que todos os sofistas buscavam isso. O que eles queriam mesmo era o pagamento pelas aulas que davam. Virtude e felicidade vinham em segundo plano ou disfarçadas pela retórica enganadora deles, como certos advogados e políticos de hoje, que relativizam em nome de um sonho, uma utopia, uma vida melhor. 

Alguns sofistas se destacaram. Eles pensavam alto, sim, como os filósofos. Era o trigo no meio do joio. Foi preciso que mentes mais elevadas surgissem para além do debate botequeiro, fantasioso, fraudulento e interesseiro. Só a reflexão individual desinteressada ou o diálogo humilde e cortês levava à virtude, bem pretendido naquela cultura.

Esta assombrosa realidade veio também para os julgamentos por atos delituosos daquela época. 

Certo da injustiça da acusação de ateísmo e sedução de jovens que pesava contra Sócrates e indignado com seu julgamento, Platão escreveu a seguinte carta:

"Outrora, na minha juventude, experimentei o que muitos jovens experimentam. Planejara, assim que alcançasse minha independência, começar imediatamente a participar dos assuntos públicos. Então aconteceram alguns incidentes com relação a esses assuntos. Como nossa Constituição do Estado estivesse sendo alvo de muitas críticas, ela estava sofrendo reformulações. Essa reformulação era conduzida por cinqüenta e um homens, que atuavam como seus autores […]. Ora, ocorria que alguns desses homens eram meus parentes ou conhecidos, e eles solicitaram que eu tomasse parte imediatamente nos negócios do Estado naquilo que me fosse pertinente. Como isso ocorresse na minha juventude, não causou espanto. Eu acreditava, no entanto, que eles administrariam o Estado de maneira que o conduzisse de uma situação de injustiça a uma forma de vida justa, de modo que aguardava sua deliberação com grande expectativa. Logo percebi, porém, que esses homens em pouco tempo faziam o antigo estado de coisas parecer uma idade de ouro. Entre outras coisas, enviaram Sócrates, um velho e caro amigo, que não hesito em declarar o homem mais justo daqueles que então viviam, acompanhado de outros, a um cidadão, com a intenção de levá-lo à força à execução ele [Sócrates] não lhes deu ouvidos, preferindo expor-se aos piores perigos a tornar-se cúmplice de ações criminosas. Em vista dessas coisas e de outras semelhantes e não menos importantes, indignei-me e afastei-me do mau regime de então.

Não muito tempo depois, porém, o mandato dos Trinta sofreu um duro golpe e, com ele, toda a Constituição do Estado. Senti então novamente, embora menos entusiasmado, o desejo de participar dos assuntos coletivos e políticos. Também aqui, em conseqüência da confusão, aconteceram coisas capazes de despertar a indignação […l. Infelizmente, algumas pessoas poderosas arrastaram diante dos tribunais nosso […] amigo Sócrates, levantando contra ele uma acusação das mais graves e no mínimo imerecida: alguns o acusaram de ateísmo, outros o consideraram culpado e executaram um homem que não quisera participar da detenção criminosa de um de seus amigos, outrora […] banido. A medida que voltava minha atenção para isso e para os homens que conduziam a política, e também para a boa educação e as leis, e quanto mais eu me entregava a essas observações e também avançava em idade, mais me parecia difícil a condução dos negócios do Estado; […] de tal modo que eu, antes cheio de ardor para trabalhar para o bem público, considerando tudo isso e vendo a comunidade sob todos os aspectos em completa desordem, acabei ficando aturdido e, apesar de não desistir de pensar […] num modo de melhorar a administração como um todo, esperando sempre o momento oportuno para agir, finalmente compreendi que todos os Estados atuais são mal governados [ I Fui então irresistivelmente levado a louvar a verdadeira filosofia e a proclamar que somente à sua luz se pode reconhecer a justiça nos assuntos públicos e individuais e que, portanto, as dificuldades do gênero humano não cessarão antes que a cooperação dos puros e autênticos sábios chegue ao poder ou que os chefes por aça divina, ponham-se de fato a filosofar" (disponível na excelente obra História da filosofia, de Christoph Helferick).

Sócrates insistia em perguntas que ele sabia sem respostas por amor a um método próprio dele, contrariando os sofistas, que, enganosamente, tinham respostas para tudo. Sócrates perguntava, fazia pensar, pensar, e depois não respondia. Não respondia não porque era ignorante. Não respondia porque a pergunta não tinha resposta. Conceitos importantes, como “virtude”, até hoje, são impossíveis de responder. Todavia, mesmo acabando em nada seus questionamentos, o Oráculo de Delfos o elegeu o homem mais sábio. Eu o chamo de O rei da aporia.

Por certo que isso irritava os sofistas e demais influentes da época.

Lendo a carta de Platão e analisando o julgamento de Sócrates lembro do julgamento da história do Brasil, envolvendo Lula.

No Brasil, em tempo de eleições presidenciais, a pergunta que desassossega corações e mentes é quem vencerá o certame. Pesquisas para lá de suspeitas apontam Lula na frente.

Se Sócrates usava a maiêutica (uma homenagem à sua mãe parteira) como arte de parir uma verdade, o judiciário brasileiro de mais de dois mil anos depois aborta uma falsidade, uma mentira. O STF tornou possível a elegibilidade de um condenado criminal, sem a etiqueta da culpa nos autos, mas com o certificado de corrupto na testa. Lula não é inocente nem aqui nem na China. Esta é a certeza que emana do coração de uma realidade clara e indiscutível.

No que o Supremo Tribunal Federal acreditou para anular o processo de Lula e trazê-lo ao mundo novamente? Peguei o costume socrático de perguntar sempre. Mas, aqui, acredito que temos a resposta, e ela não é nada convincente.

O STF, o moderador brasileiro por escolha própria, ou seja, sem voto, deve ter ouvido de algum oráculo por aí que os seus ministros são os homens mais sábios que existem e que Luis Inácio Lula da Silva é o melhor e fará realizar o sonho da utopia da felicidade (que, nos dias de hoje, equivale a impedir Bolsonaro de se reeleger). E eles acreditaram. A soltura de Lula é prova disso, pelo que constou do habeas corpus n. 193.726.

A mera anulação e soltura deu a impressão de que Lula não roubou o povo. Pura mentira. O povo tem esta representação do que aconteceu, uma ideia, uma imagem, é tudo, e é suficiente para desmistificar o Luladrão. 

Só restou ao povo brasileiro lamentar os “bons” advogados de Lula e os iluminados ministros do Supremo Tribunal Federal, todos unidos e crentes que Lula é a melhor solução para o Brasil. 
Lula é a medida de todas as coisas! Bradam eles, em imitação bem grosseira a Protágoras, o maior sofista contemporâneo das grandes mentes da antiguidade.

E, ainda, os sofistas podem contar com mais ajudantes nesta busca das “verdades”, a classe jornalista e certos “institutos de pesquisa”.

Se a conclusão das tais pesquisas estiver certa, uma verdade surge, enfim: a humanidade não evoluiu nada e a felicidade está cada vez mais longe de cada um de nós.

 Sérgio Renato de Mello  - O autor é Defensor Público de Santa Catarina


sábado, 16 de abril de 2022

“Morte, onde está teu aguilhão?” - Percival Puggina

A partir do Iluminismo, a humanidade passou a conviver de maneira crescente com a noção idealista de um evolucionismo sempre positivo. Acreditava-se, então, que, assim como a natureza evoluía para formas cada vez mais complexas, o pensamento e a cultura se elevariam de maneira inexorável na direção da verdade e do bem.


Surpresa! A ciência criou a bomba atômica. A organização “perfeita” da sociedade abriu o século XX para os manicômios políticos, o racismo ideológico, a eugenia e as mais terríveis formas de totalitarismo que a humanidade conheceu. 
E os desencontros com a verdade foram tão flagrantes que a sociedade foi invadida por um relativismo que em tudo e por tudo dela se afasta. 
Paul Johnson, em seu admirável “Tempos Modernos”, relata esse fenômeno a partir das reflexões feitas por Einstein, aturdido perante o fato de que sua Teoria da Relatividade fora apropriada para atribuir consistência ao relativismo moral (que ele qualificava como doença), e registra: “Houve vezes, no final de sua vida, em que Einstein afirmou desejar ter sido um simples relojoeiro”.
A Paixão de Cristo e a Páscoa da Ressurreição nos colocam frente ao fato central da História.  
Para os cristãos, a história é História da Salvação. E Cristo é o senhor da História. 
Deus não é alguém que joga dados, como ironizavam alguns cientistas no início do século passado, nem está subjugado a outras leis que não a do Amor, que é a lei da própria natureza de Deus, pois “Deus é amor”. Como sustenta S. Paulo, quando até mesmo a fé e a esperança tiverem passado, permanecerá o amor porque Ele será, então, tudo em todos.
 
No século XIX, foi recitada a crônica da morte de Deus. 
No século XX, tentaram transformá-lO num bem de consumo supérfluo. 
No século XXI, seus inimigos acrescentam, no chulo desrespeito a Ele e à Sua Santíssima Mãe, mais e mais chibatadas à sua dor física. 
Sobre tudo e todos, porém, o Senhor da História venceu a morte (“Morte, onde está teu aguilhão?” I Cor 15, 55) para que tivéssemos vida plena e não quedássemos como personagens de Platão na Alegoria da Caverna, vendo apenas o fim de tudo porque o fim de tudo é tudo que o começo nos mostra.

Feliz Páscoa, portanto!

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


segunda-feira, 29 de novembro de 2021

Ação de Graças - Rodrigo Constantino

Monstagem sobre a gravura <i>Pelgrims Holding Bibles</i> / Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Montagem sobre a gravura Pelgrims Holding Bibles / Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

O que poucos sabem, porém, é que as primeiras colônias fracassaram. E não foi apenas por fatores relacionados à sorte. Uma das primeiras colônias a instalar-se na América do Norte foi a Plymouth Colony, estabelecida onde hoje é o Estado de Massachussets, nos anos de 1620. Numa experiência inédita até então, um contrato coletivo estabelecia um sistema no qual as propriedades seriam todas comuns. Trocando em miúdos, os Estados Unidos começaram como um experimento socialista.

Toda a produção deveria ser entregue para armazenamento comunitário, do qual cada indivíduo receberia uma fração igual, não importando com quanto contribuísse. Esse coletivismo levou rapidamente a economia da colônia ao caos. Em 1623, apenas dois anos após a chegada dos primeiros pilgrims, a fome já era a regra. William Bradford, que viria a ser governador da província algumas vezes, assim descreveu aquele triste momento da história americana em seu famoso diário: “Aquela experiência durou alguns anos… E bem evidencia a vilania deste conceito de Platão e outros patriarcas antigos, aplaudido por muitos ultimamente, segundo o qual se acabarmos com a propriedade, em prol da riqueza comum, isto fará a comunidade feliz e próspera… Para esta nossa comunidade (até onde aquilo poderia ser chamado de comunidade), o experimento causou muita confusão e descontentamento. Os homens… lamentavam ter de gastar seu tempo e esforços trabalhando para as mulheres e as crianças de outros homens, sem que obtivessem qualquer recompensa…

O liberal João Luiz Mauad assim explica a reviravolta que ocorreu: “Encurralada pelas terríveis circunstâncias, a liderança dos colonos resolveu abolir a estrutura socialista, que engessava qualquer possibilidade de progresso, transferindo para cada família uma parcela das terras, e permitindo o usufruto de tudo quanto seu trabalho produzisse. A eliminação da propriedade comunal em favor da propriedade privada logo mudou o panorama. Os colonos rapidamente começaram a produzir muito mais do que eles mesmos poderiam consumir”.

Não tardou para que o comércio também florescesse e os excedentes da produção fossem trocados com os índios, que lhes entregavam carnes de caça e peles, estas últimas exportadas com largas margens de lucro para a nobreza europeia. “Esta decisão foi um grande sucesso, pois tornou todas as mãos diligentes e industriosas”, escreveria Bradford pouco tempo depois. Mauad apresenta a razão para esse sucesso:  “Uma das virtudes da propriedade privada é justamente estabelecer a conexão entre esforços e ganhos, custos e benefícios, criando incentivos para que as pessoas produzam conforme as suas necessidades e ambições. Porém, o direito de propriedade é também, e acima de tudo, a melhor arma contra a barbárie, a garantia de que o pão obtido com o suor do próprio rosto não será tomado de ninguém arbitrariamente.”

“O capitalismo de livre mercado, baseado na propriedade privada e troca pacífica, é a fonte da civilização e do progresso humano”, sintetiza Thomas DiLorenzo, autor de How Capitalism Saved America, livro em que resgata a transição redentora do socialismo ao capitalismo nas primeiras colônias.

Esse modelo cria um claro incentivo ao ato conhecido como “free ride”, ou seja, pegar carona no esforço alheio

Os primeiros colonos chegaram a Jamestown no ano de 1607 e encontraram um solo incrivelmente fértil, além de muitos frutos do mar e frutas. Entretanto, dentro de seis meses, 66 dos 104 colonos que vieram estavam mortos, a maioria por causa da fome. Dois anos depois, a Virgínia Company mandou mais 500 “recrutas” para se estabelecerem em Virgínia, e, dentro de seis meses, 440 tinham morrido de fome ou doenças.

DiLorenzo argumenta que a ausência de direitos de propriedade destruiu completamente a ética de trabalho desses colonos. Afinal, não existiam incentivos para o trabalho, já que a recompensa pela produtividade não era do próprio trabalhador, mas de “todos”. Esse modelo cria um claro incentivo ao ato conhecido como “free ride”, ou seja, pegar carona no esforço alheio.

Em 1611, o governo britânico enviou Sir Thomas Dale para servir como high marshalna colônia de Virgínia. Dale notou que, apesar de a maioria dos colonos ter morrido de fome, os sobreviventes gastavam boa parte do tempo em jogos. Dale logo identificou o problema: o sistema de propriedade comum. A propriedade privada logo foi adotada, e a colônia imediatamente começou a prosperar, inclusive praticando trocas voluntárias com os índios.

Os investidores no Mayflower chegaram em 1620 a Cape Cod, assumindo um grande risco financeiro, já que os investidores em Jamestown tinham perdido quase todo seu investimento. Ainda assim, eles cometeram o mesmo erro de seus antecessores, estabelecendo propriedade coletiva da terra. Cerca de metade dos 101 aventureiros que chegaram a Cape Cod estava morta em poucos meses. O principal investidor do Mayflower, o londrino Thomas Weston, chegou à colônia disfarçado para examinar a ruína do empreendimento. Mas os problemas logo seriam solucionados da mesma forma que ocorrera em Jamestown. A propriedade coletiva foi abandonada e, em 1650, as fazendas privadas já eram predominantes em New England.

Mas esses colonos, agora prósperos, estavam cada vez mais preocupados com outra ameaça: o governo britânico e sua tentativa de impor o mercantilismo nas colônias. A Declaração de Independência Americana condenava a tirania da Coroa Britânica, assim como sua postura econômica em relação às colônias americanas. A Declaração menciona diretamente o fato de o governo britânico cortar o comércio das colônias com as outras partes do mundo, e o rei foi acusado de criar impostos sem consentimento dos colonos. Nesse sentido, a Revolução Americana foi contra o mercantilismo, e a favor do capitalismo.

Uma das primeiras leis mercantilistas impostas aos colonos foi o Molasses Act, de 1733, que criou uma elevada tarifa para a importação de melaço. Uma série de leis conhecidas como Navigation Acts representou mais um grande passo em direção ao mercantilismo imposto na América. Essas leis foram importantes como causa da Revolução, segundo DiLorenzo.  O grau de imposição mercantilista nas colônias aumentou consideravelmente após o término da Guerra dos Sete Anos, em 1763. Apesar da vitória britânica contra a França, a Inglaterra estava com um enorme déficit e um império gigantesco cada vez mais caro de manter. Uma série de novas medidas para aumentar impostos foi adotada para subsidiar o Império. Em 1764, o governo britânico criou o Sugar Act, que aumentou impostos para a importação de açúcar. Em 1765, o Stamp Act criou a obrigação do uso de selos do governo para todas as transações com papel nas colônias. Em 1767, os Townshend Acts impuseram várias tarifas novas de importação de produtos ingleses.

Em 1773, novas tentativas de aumento de impostos ocorreram. Dessa vez, o Tea Act iria impor tarifas maiores para a importação de chá. Os comerciantes americanos, temendo a ruína econômica com esse ato, se uniram e orquestraram a famosa Boston Tea Party, onde colonos vestidos de índios jogaram toneladas de chá no mar. A Revolução Americana pode ser vista, então, como uma luta contra o mercantilismo, em defesa dos principais pilares do capitalismo de livre mercado, que tinham permitido a prosperidade das colônias.

Nesse feriado de Ação de Graças, muitos vão festejar sem a devida compreensão do que ele representa, especialmente numa época em que a esquerda promove enorme desinformação sobre o passado e o legado da nação. O economista Don Boudreaux resume bem: “Seremos como perus se não conseguirmos compreender a verdadeira fonte de nossa prosperidade. Essa fonte não é a terra em si — não é a sorte —, não é Deus, inexplicavelmente, sorrindo para os europeus que ocuparam o norte do continente americano: é a consistente e generalizada confiança dos mercados na propriedade privada”.

Leia também “A cidadania corre perigo”

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste


quarta-feira, 17 de novembro de 2021

A TIRANIA NO ESPELHO - Percival Puggina

Para preservá-lo, não vou declinar o nome inteiro de Alexandre, um conhecido que mora no interiorzão do Brasil, mas a cadeira em que ele senta tem o poder de lhe aquecer o sangue, impulsionando tendências que afetam o exercício de seu poder. Por constatar isso, na expectativa de que as observações a seguir possam ser úteis também a outros, escrevo este artigo propondo a Alexandre que se coloque diante do espelho.

Sei que ele leu Edmund Burke e deve ter aprendido que quanto maior o poder, mais perigoso se torna o abuso. Com efeito, sistemas políticos podem vicejar afrontando limites, mas são finitos como todos os males. Aliás, é assim, também, que se afirmam as facções criminosas, como o PCC. Seus lideres conhecem o poder da intimidação, da imediata ação repressiva, da desproporção entre o revide e a agressão, da punição sem julgamento. Funciona, mas está errado. E passa.

Por exemplo: neste momento em que escrevo, o Partido Comunista de Cuba (casualmente outro PCC) está fazendo uso da polícia, do seu poderoso Minint e de suas fascistas “brigadas de resposta rápida” para sitiar as moradias das lideranças “de las protestas por libertad” convocadas para este 15 de novembro. Juntos, baixam o porrete e prendem cidadãos que, quando se atrevem, não conseguem circular nas ruas bloqueadas.

O que as lideranças dos PCCs da vida não sabem é que, como disse alguém, as tiranias fomentam a estupidez e são transitórias como a glória do mundo. Não sem razão esta transitoriedade, durante séculos, foi lembrada nas coroações papais. A glória passa! E porque passa, todo detentor de poder precisa olhar-se no espelho, ouvir mais do que falar, julgar a si mesmo mais do que aos outros, derrotar seus fantasmas interiores antes de materializá-los nos indivíduos sob sua autoridade.

Sei o quanto Alexandre preza a democracia. A cadeira em que senta e lhe concede autoridade não pode proteger a democracia combatendo a liberdade porque, como nos lembrou James Madison, uma se nutre da outra. O motivo é óbvio: não há democracia na servidão. Não se defende a democracia mediante constrangimentos e restringindo liberdades fundamentais.

Tenho falado com muitas pessoas sobre as quais Alexandre exerce seu poder e sinto que elas o veem como um tirano. Penso que há aí um ponto para reflexão, presente a constatação de Platão há 23 séculos: “Muitos odeiam a tirania, apenas para que possam estabelecer a sua”. Diversos males têm solução diante de um espelho.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


segunda-feira, 23 de agosto de 2021

CONTRA A INJUSTIÇA TOGADA, CORAGEM! - Valterlucio Bessa Campelo

A coragem é a primeira das qualidades humanas porque garante todas as outras. (Aristóteles)

Existem determinadas qualidades humanas que desde a antiguidade temos no ocidente como virtudes. São atributos que movem a sociedade na busca da realização do bem, seja a partir do indivíduo ou de grupos. Para Sócrates, quatro virtudes são fundamentais – sabedoria, ou prudência; fortaleza, ou coragem; temperança e justiça. Embora sejam essencialmente qualidades humanas, ele os expandia à cidade. Seu último ato, antes de ser envenenado foi de coragem.

Resumidamente, pode-se dizer, a partir do próprio Sócrates e de Platão e Aristóteles, que Sabedoria, ou prudência, são para fazer boas escolhas, para decidir corretamente, o que leva à racionalidade, à reflexão. Fortaleza, ou coragem, para levar a efeito a decisão tomada, para seguir com retidão, para não sucumbir às dificuldades enfrentadas. Temperança tem a ver com moderação, com freio aos excessos e às paixões. Justiça é a virtude da medida certa, da equidade, das coisas em seus devidos lugares e funções.

Lembrei dos gregos enquanto refletia sobre a prisão recente de Roberto Jefferson, mas não apenas, posto que antes deles vários outros brasileiros tiveram sua liberdade cassada por “delitos de opinião”, no bojo do infame inquérito das “fakenews”, essa monstruosidade criada para perseguir desafetos e fazer a Justiça pender para um lado, o que propriamente dissolve a si mesma. Justiça que tem lado não é verdadeira justiça.

Não pretendo discutir o mérito de nenhuma prisão em si mesma, não tenho, é certo, condições técnicas para isto. Entretanto, como cidadão, percebo uma espécie de agigantamento desproporcional de um poder que o torna assustador. Toda prisão carrega um conteúdo pedagógico, é um exemplo, uma amostra para a sociedade de que determinado ato é punível pela lei de modo severo – o que seria mais severo do que a restrição da liberdade? – então, quando vejo no patamar superior da Justiça brasileira o vezo em calar vozes e opiniões pela força, sinto que de algum modo a minha própria liberdade de expressão está ameaçada.

Possivelmente os áulicos do esquerdismo e o isentismo de cuecas (ou calcinhas) vermelhas se sentem confortáveis com as prisões facilmente decretadas contra seus adversários políticos. A mim, porém, incomoda muitíssimo, porque a pretexto de punir em um ou outro o que filosoficamente se poderia chamar de vício da falta de temperança, ou de prudência, ou as duas juntas, o STF está deliberadamente inibindo na sociedade a virtude da coragem que, segundo Aristóteles, antecede todas as outras. A coragem para ser livre e livremente se expressar está, por certo, ameaçada, intimidada por tantos ataques a este direito inalienável do SER humano.

Lembremos o que disse um dos pais fundadores dos Estados Unidos da América e seu primeiro presidente entre 1789 e 1797, George Washington. À época, adiantou ele que “Quando a LIBERDADE de expressão nos é tirada, logo poderemos ser levados, como ovelhas, mudos e silenciosos, para o abate.” 
Agredidos, vilipendiados é como se sentem aqueles que amam a liberdade e são proibidos de reagir ao monstro togado. 
Satisfeitos é como se sentem aqueles que por covardia ou ignorância abraçam seus futuros algozes. Estes, deveriam estar aprendendo mandarim.
Como se não bastasse censurar, prender e, literalmente, arrebentar, como fizeram com o jornalista Oswaldo Eustáquio (segundo o próprio) através do famigerado inquérito das fakenews, vem ultimamente a mordaça do TSE determinar que as bigh techs desmonetizem canais nas mídias sociais que sejam críticos ao sistema de voto exclusivamente eletrônico, mesmo sendo ele inseguro, como restou provado. 
Não havendo razão ou condições para prender todos, querem asfixiar financeiramente os canais conservadores. 
Enquanto isso, os canais dedicados à propaganda comunista estão à vontade para toda ação deletéria em relação ao governo e à democracia, inclusive para se associarem a governos estrangeiros. 
Aliás, por que se alegra aquele embaixador?

Impressiona que qualquer brasileiro esteja liberado para estupidamente, sem provas, sem sequer indícios, atribuir crimes e insultar o presidente da república ou qualquer do governo, porém, esteja proibido de sequer duvidar, ou questionar a qualidade das urnas utilizadas nas eleições brasileiras, apesar de o TSE jamais haver provado a sua higidez. Pelo contrário, por lá, digo, dentro do sistema eleitoral, durante 6 meses um hacker estagiou impunemente.

Parece que tomar o poder sem ganhar eleições entrou na moda. De Zé Dirceu ao mais idiota útil perambulante nas redações, sindicatos ou universidades, todos vêem a possibilidade de expulsar  um governante mediante expedientes de força, ilegais e infames, como uma opção razoável. Caem no anti-bolsonarismo histérico sem um tostão de reflexão e, assim, ajudam a colocar o Brasil calmamente na antessala do domínio vermelho, à espera de uma venezuelização. Essa gente não mede ou não faz ideia das consequências de sua vileza.

Por seu turno, a velha imprensa, órfã das verbas milionárias que lhe sustentava a ineficiência, cala-se frente à censura e aos desmandos. Os antigos jornalões e as TV’s agacham-se perante a força togada, chegando ao cúmulo de atribuir culpa ao silenciado. Vejam só! A imprensa é incapaz de defender a liberdade de expressão e sedizentes jornalistas a seguem sem se envergonharem.

Como se pode ver nos últimos tempos, a liberdade de expressão de uma parcela da população, a parte conservadora, se transformou alvo do humor de ministros de qualquer tipo e tribunal. 
Querem impor uma narrativa embusteira, historicamente podre, passando por cima dos mais elementares princípios do direito. Pior. Fazem isso sob a complacência das nossas personalidades ditas democratas.
FHC saiu do buraco onde se esconde para passar pano pró autoritarismo. Sociólogos e os filósofos de auditório se calaram. Cadê os defensores dos direitos humanos? Onde se meteram as feministas de sovaco cabeludo? Os intelectuais, os artistas? Onde? Não precisam responder. 
Estão escondidos, achando que golpeando Bolsonaro, o Brasil dará um giro para trás de 20 anos e recuperarão seus prestígios e suas sinecuras. Como faz pra gargalhar numa hora dessas?

Até a velha Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, no passado sóbria e séria, hoje se transformou num puxadinho da esquerda e é incapaz de emitir sequer uma nota em defesa da liberdade de expressão. Pensam eles, talvez, que será suave se transformar em “Ordem dos Advogados Bolivarianos” para não perder a sigla.

Vivemos um momento gravíssimo da história brasileira. Talvez a cisão política levada a cabo pela esquerda odienta, aquela que não se livra do coletivismo mofado e nos últimos 30 anos vem dividindo o Brasil entre pobres e ricos, homens e mulheres, pretos e brancos, homossexuais e heterossexuais, ateus e religiosos, precipite outra ainda maior. Sinceramente, creio que há tempo ainda para a sabedoria e a temperança, do contrário, em busca da maior das virtudes - a justiça, precisaremos muito da primeira - a coragem.

Valterlucio Bessa Campelo escreve opiniões, contos e poemas eventualmente em seu BLOG. 

 

sexta-feira, 4 de outubro de 2019

A caverna da Lava-Jato - Nas entrelinhas

Ex-supervisor da Receita preso seria o responsável pela investigação ilegal de cerca de 134 autoridades, entre as quais os presidentes do Supremo, do Senado e da Câmara

Às vezes, quem pensa que enxerga tudo descobre que está como os prisioneiros da caverna de Platão, a alegoria famosa sobre os sentidos e a razão. Discípulo de Sócrates, o filósofo grego separava o mundo sensível, onde residia a falsa percepção da realidade, do mundo inteligível, alcançado pela razão. A alegoria serve para aguçar nosso olhar sobre o vale-tudo no qual mergulhou a força-tarefa da Lava-Jato, que, agora, coloca em xeque o seu futuro, pela reação que enfrenta no Congresso, no Supremo Tribunal Federal (STF) e na própria Procuradoria-Geral da República.

Na alegoria de Platão, havia um grupo de pessoas que viviam numa grande caverna, com seus braços, pernas e pescoços presos por correntes, forçando-os a olharem unicamente para a parede do fundo da caverna. Atrás dessas pessoas existia uma fogueira e outros indivíduos, que transportavam ao redor da luz do fogo objetos e seres, cujas sombras eram projetadas na parede. Os prisioneiros viam apenas as sombras das imagens, confundindo-as com a realidade. Entretanto, uma das pessoas conseguiu se libertar das correntes e saiu para o mundo exterior.

A princípio, a luz do sol e as cores cegaram o ex-prisioneiro, que se assustou. Assim, quis voltar para a caverna e compartilhar com os outros prisioneiros todas as informações e as experiências que viveu, mas ninguém acreditava no que relatava, e o taxaram de louco. Para evitar que suas ideias atraíssem outras pessoas para os “perigos da insanidade”, os prisioneiros mataram o fugitivo. A história tem a ver com o destino de Sócrates, que foi morto pelos atenienses porque suas ideias eram consideradas subversivas.

A realidade somente é compreendida a partir do pensamento crítico e racional. Essa é a moral da história. Ontem, o Banco Central informou ao juiz Marcelo Bretas que o auditor-fiscal Daniel Gentil e sua mãe, Sueli Gentil, presos na Operação Armadeira, têm R$ 13,9 milhões depositados em 11 contas bancárias, dos quais R$ 10,9 milhões foram encontrados na conta materna. A família Gentil é apontada pelo Ministério Público Federal como a responsável pelo esquema de lavagem de dinheiro de suspeitos, entre os quais Marco Aurélio Canal, supervisor nacional da Equipe Especial de Programação da Lava-Jato, o grupo responsável por aplicar multas aos acusados da operação por sonegação fiscal. Daniel Gentil era subordinado a esse setor.

Delação
A investigação não só confirma as denúncias de que informações da antiga Comissão de Controle de Operações Financeiras (Coaf), tratada como intocável pela força-tarefa da Lava-Jato, estavam sendo utilizadas em investigações ilegais, como revela que o objetivo dos investigadores não era dar mais eficiência e celeridade ao combate à lavagem de dinheiro, mas achacar os investigados. Em troca, eles anulariam multas por sonegação fiscal decorrentes de fatos descobertos pela operação. Canal é suspeito de ter atuado na cobrança de propina de R$ 4 milhões junto à Fetranspor (federação das empresas de ônibus do Rio de Janeiro) e no recebimento de 50 mil euros de Ricardo Siqueira Rodrigues, acusado na Operação Rizoma, mas esse é apenas um ponto de partida. Com as investigações em curso, será possível saber qual a verdadeira extensão da atuação da quadrilha de auditores-fiscais, inclusive no âmbito da Lava-Jato.

Segundo o Ministério Público Federal, bens usados pela família de Canal estão em nome de empresas ligadas a outros auditores, especialmente Daniel Gentil. É o caso da cobertura em que sua família mora, na avenida Lúcio Costa, orla da Barra da Tijuca, que está em nome da empresa B. Magts, cuja única sócia é Sueli, que nunca teria recebido pagamento de aluguel. Também estão em nome da empresa o Honda Fit e o Mitsubishi Outlander usados pela filha e pela mulher de Canal, respectivamente. O Volkswagen Golf do ex-supervisor da Receita está em nome da empresa de outro amigo. Canal teria lavado dinheiro na construção de um shopping center em Itaguaí, município vizinho à capital fluminense, no qual uma empresa em nome de sua mulher tem participação.

Canal foi personagem central do duro ataque à força-tarefa da Lava-Jato feito pelo ministro Gilmar Mendes, na quarta-feira, em seu voto no julgamento do habeas corpus do ex-gerente da Petrobras Márcio de Almeida, que foi concedido. O ex-supervisor da Receita seria o responsável pela investigação ilegal de cerca de 134 autoridades, entre as quais o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, e os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Sua prisão terá impacto no julgamento, pelo plenário do Supremo, da polêmica liminar concedida pelo presidente da Corte, Dias Toffoli, ao senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), suspendendo todas as investigações com base em dados do Coaf obtidos sem autorização judicial. Por essas voltas que o mundo dá, Canal pode fazer uma “delação premiada”, e contar tudo que sabe.


Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense



sábado, 1 de dezembro de 2018

Polícia, Chicago e caserna

Ou Bolsonaro devolve a política a seu lugar, ou não há como esse arranjo dar certo 

[importante ter presente que os políticos em sua quase totalidade são além de incompetentes na gestão, desonestos.]

Platão expulsou os poetas de sua "República"; Jair Bolsonaro, os políticos. Vai funcionar? O presidente eleito decidiu lotear o Executivo entre três legendas, e essa tripartição o aprisiona e o faz refém de sua própria concepção de mundo.  Dividirão o poder o Partido da Polícia, liderado pelo indemissível Sergio Moro; o Partido de Chicago, comandado pelo não menos indispensável Paulo Guedes, e o Partido da Caserna, composto pelo generalato da reserva. Esses anéis de poder representariam o avesso virtuoso da política. Moro é aquele que mandava os políticos para a cadeia e que, já deixou claro, pretende ser juiz informal de seus colegas de ministério. Guedes é o que tem o dever de arrumar as contas que aqueles teriam destroçado. E os militares entram como a força incorruptível, despida de egoísmo.

Ecoam, na visão bolsonariana, o país edênico da ditadura militar, com serviços públicos eficientes, escolas sem partido, pleno emprego, menino brincando de bola, e menina, de boneca. Cada coisa em seu lugar.  Nada que lembrasse, note-se à margem, a mesa com que Bolsonaro recepcionou John Bolton em sua casa: bolo de fubá, café, marxismo cultural, celular, suco de laranja na caixinha, banana, Cuba, tela de computador, manteiga a céu aberto, Israel, Pabllo Vittar, Danoninho, Venezuela, água de coco, ideologia de gênero, queijo em isopor de padaria, Gramsci... Um caos de ofertas claras. Abarrotada, não havia lugar naquela mesa para uma ideia que fosse. Mas volto ao ponto.

Bolsonaro se dedica a uma arquitetura que sobreviva a si mesmo. E isso, então, escreveria a sua biografia de estadista inaugural. O presidente eleito integra a galeria dos governantes que ambicionam nascer póstumos.  Importa a ele menos a administração cotidiana do país, com sua pauta e rotina de dificuldades, do que a suposta grande obra que, na sua imaginação, os pósteros hão de reconhecer.  Ele ainda nem tomou posse, mas já vê a si e à sua herança pelos olhos das gerações futuras. Não por acaso, resolveu ecoar uma afirmação perigosa de Carlos Bolsonaro, um dos filhos, segundo quem há pessoas próximas interessadas na sua morte. Esses temperamentos têm atração intelectual pelo trágico.

Nas democracias bem-sucedidas, governantes são eleitos para tentar melhorar os marcos institucionais, aumentar a eficiência da máquina, elevar o bem-estar da população, fazer reformas pontuais etc. Essas chatices.  Nada ambicionam de extraordinário. Levam a vida a simular modorra mesmo em tempos de grande agitação. É o caso de Theresa May, a enfrentar a sandice vitoriosa do Brexit. São os tipos que prefiro. Esforçam-se para conferir uma aparência de rotina à gestão, ainda que os problemas sejam invulgares.

E há os líderes à moda Bolsonaro, Lula ou Donald Trump, cada um com suas peculiaridades, determinados a deixar a sua marca. Podem ser tipos perigosos --às vezes, também para si mesmos, como sabe o ex-presidente brasileiro.  O petista exorcizava a dita herança maldita; Trump quer a "América grande outra vez", já que teria sido amesquinhada por Obama, e o capitão anuncia que vai tirar o Brasil do caos, para onde o teriam conduzido a corrupção dos políticos, o marxismo e o globalismo. Se não o matarem, ele alerta.

Acontece que não basta prender mais alguns corruptos ou organizar expedições punitivas nos morros do Rio e periferias das grandes cidades. Igualmente ineficaz será produzir diagnósticos cuja síntese pode ser esta: "O Brasil precisa parar de gastar mais do que arrecada".  Não menos ocioso será tingir de verde-oliva a infraestrutura capenga do país, sob o olhar atento de militares vigilantes e certamente bem-intencionados. Onde está o dinheiro?

Na arquitetura de poder de Bolsonaro, os partidos da Polícia, de Chicago e da Caserna se encarregam de governar, e aos políticos, expulsos de uma República já sem poetas, caberia a missão patriótica de aprovar os tais "remédios amargos", que dariam eficiência aos poderosos de fato. Fiel à sua visão de mundo, o presidente eleito pôs um general para dividir com um civil a tarefa de negociar com o Congresso. Ou Bolsonaro devolve a política a seu lugar, ou não há como esse arranjo dar certo. Nascerá póstumo no pior sentido. Para o mal de todos.

Folha de S. Paulo - Coluna do Reinaldo Azevedo
 

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

O ataque final à Criação: o fim da dualidade homem/mulher

Nota de Heitor De Paola:
Eis o texto do cardeal Carlo Caffarra (foto) ao qual fiz referências no programa O Outro Lado da Notícia do dia 22 de setembro, gentilmente traduzido por Ageu Marinho e publicado originalmente pelo LifeSiteNews

 A “última barreira” para Satã de destruir a humanidade é a dualidade masculino/feminino, afirma cardeal.
Por Claire Chretien


Uma ideologia global alimentada por uma liberdade “insana” e “literalmente louca” agora está tentando destruir a “última barreira” que preserva a humanidade de perder o significado de ser “humano”, a saber, a “natureza sexual da pessoa humana na sua dualidade de homem e mulher”, escreveu o cardeal Carlo Caffarra, um cardeal “dubia” recentemente falecido, em um manuscrito publicado pela primeira vez no LifeSiteNews. [“Dubia cardinals” é como são designados os cardeais signatários das dúvidas levantadas ao Papa Francisco por ocasião da publicação da encíclica Amoris Laetitia].


Caffarra escreveu o manuscrito como um prefácio ao livro da socióloga Gabriele Kuby intitulado A Revolução Sexual Global: A Destruição da Liberdade em nome da Liberdade [no original: The Global Sexual Revolution: Destruction of Freedom in the Name of Freedom]. Porém o livro seguiu para impressão antes que as palavras do cardeal fossem recebidas. O manuscrito foi obtido pelo LifeSiteNews.


* * *


Texto completo do prefácio não publicado do cardeal Carlo Caffarra para o livro de Gabriele Kuby “A Revolução Sexual Global – A Destruição da Liberdade em Nome da Liberdade”.
Traduzido para o inglês por Diane Montagna.


O estudo de Gabriele Kuby sobre o panorama cultural no presente livro é um clamor de trombeta para despertar-nos do torpor da razão que nos está arrastando para a perda de liberdade consequentemente de nós mesmos. E Jesus já nos advertira que isso, a perda de nós mesmos, seria a mais trágica perda de todas, ainda que ganhássemos todo o mundo.


A cada página que lia, ouvia dentro de mim mesmo as palavras do enganador do mundo todo: “Você será como Deus, conhecendo o bem e o mal” (Gn 3:5). A pessoa humana elevou-se a si mesmo a uma posição de autoridade moral soberana na qual “Eu” sozinho determino o que é bom e o que é mal. Essa é uma liberdade que é literalmente louca: é uma liberdade sem logos (isto é, razão ou princípio ordenador).


Mas se esse é o contexto teórico (se posso colocar desta forma) do livro inteiro, a obra examina especificamente a destruição da última realidade que permanece de pé no seu caminho. Como irei explicar, o livro também aponta como a liberdade que enlouquece gradualmente engendra as mais devastadoras tiranias.


David Hume escreveu que fatos são coisas teimosas: eles teimosamente desafiam qualquer ideologia. A autora demonstra, e eu considero que acertadamente, que a última barreira a qual essa liberdade insana deve demolir é a natureza sexual da pessoa humana na sua dualidade de homem e mulher, e na sua instituição racional estabilizada pelo casamento monogâmico e pela família. Atualmente essa causa insana está destruindo a sexualidade natural humana e por conseguinte também o casamento e a família. Estas páginas, dedicadas a examinar essa destruição, contêm uma rara profundidade de percepção.


Mas há um outro tema que corre através das páginas deste livro: a obra dessa insana liberdade tem uma estratégia precisa, pois está sendo dirigida, guiada e governada em nível global. Qual é essa estratégia? É aquela d’O Grande Inquisidor, de Dostoyevsky, que diz a Cristo: Você dá a eles liberdade eu dou-lhes pão. Eles me seguirão.” A estratégia é clara: dominar o homem formando um pacto com um de seus instintos básicos. O novo Grande Inquisidor não mudou a estratégia. Ele diz a Cristo: “Você promete regozijo no prudente, íntegro e casto exercício da sexualidade; eu prometo o gozo desregrado. Você verá que eles me seguirão.” O novo Inquisidor escraviza através da ilusão do prazer sexual completamente livre de regras.


Se, como acredito, a análise de Gabriele Kuby é algo que é compartilhado, há apenas uma conclusão. O que Platão previu acontecerá: liberdade extrema conduzirá à mais grave e feroz tirania. Não é coincidência que a autora fez dessa reflexão platônica a epígrafe do primeiro capítulo: um tipo de chave interpretativa de todo o livro. E os clérigos? Não é incomum que eles se contentem em ser facilitadores dessa eutanásia da liberdade. E ainda, como Paulo nos instruiu, Cristo morreu para nos tornar verdadeiramente livres.


Eu espero que este grande livro seja lido por aqueles que têm responsabilidades públicas, por aqueles que têm responsabilidades educacionais, e pelos jovens, as primeiras vítimas do novo Grande Inquisidor.


Cardeal Carlo Caffarra, Arcebispo Emérito de Bolonha.


(1) Em inglês, intensifying verb. Essa expressão foi um problema tanto para o tradutor como para o editor (Heitor). Esta solução é do editor.


http://www.heitordepaola.com