Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador chantagem. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador chantagem. Mostrar todas as postagens

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Eliane Cantanhêde - Ceará, caso exemplar

O Estado de S. Paulo


Presidente não pode calar nem governador ceder, para evitar ideia de que motim vale a pena

Se foi rápido no gatilho para falar do capitão Adriano, um dos maiores líderes de milícias do Rio de Janeiro, morto num cerco policial na Bahia, o presidente Jair Bolsonaro até ontem não havia dito uma só palavra sobre os policiais militares que fazem motim no Ceará, aquartelados, armados, encapuzados e atacando carros da própria polícia. [lembrete: logo após a execução do ex-capitão do Bope, toda a imprensa criticava o silêncio do presidente Bolsonaro e seus familiares - buscavam passar a imagem de ser o silêncio motivado por um (inexistente) temor de se manifestar.
Agora pretendem da mesma forma que o presidente se manifeste, de forma açodada, sobre a greve = é aquele negócio, se o presidente da República fala, malham, se cala, apanha.] 

Pode-se pensar que Bolsonaro fala de um caso e ignora o outro em defesa das polícias, mas não se trata disso. Se ele chamasse de “heróis” e defendesse os policiais honestos que têm uma missão difícil, trabalham em condições adversas e arriscam suas vidas em prol da segurança, seria louvável. Mas o foco dele, na fala e no silêncio, é a banda podre, que faz milícia, faz motim, comete crime militar.  Isso é absurdo para um presidente da República, mas condiz com a história de Jair Bolsonaro, acusado e processado por ter planos e croquis para bombardear quartéis militares. Depois, conquistou mandato de deputado com votos de policiais e evangélicos e desperdiçou 28 anos na Câmara com questões corporativistas.

Num dos maiores motins policiais do País, em 2017, no Espírito Santo, Bolsonaro não se limitava a defender os amotinados. Reportagem do Estado de 25 de fevereiro daquele ano, sob o título “Rede de Bolsonaro na teia do motim”, mostra que o grupo do então deputado estava por trás da grande rede de divulgação do movimento. Num vídeo visualizado por dois milhões de pessoas, ele defende os revoltosos e fala da possibilidade de o movimento se espalhar para outros Estados.

O que se espera, agora, é que Jair Bolsonaro entenda que, como presidente, não pode apoiar motins militares nem movimentos que comprometam a Constituição, a ordem pública e as já tão combalidas contas públicas. Não pode aplaudir ou fechar os olhos para os desmandos de uma categoria específica, sabendo que o prejuízo é da sociedade brasileira. As polícias estão empoderadas, com assentos em governos e legislativos e achando que, com Bolsonaro, podem tudo. O problema começa quando uma parte delas – a pior – sente que tem costas quentes, pode descumprir a Constituição e se recusar a garantir a segurança dos cidadãos. Isso não corresponde a empoderar as polícias, mas sim a dar sorte ao azar com multiplicação de milícias e ataques ao Orçamento público como o governador Romeu Zema, por medo, inexperiência ou má assessoria, fez em Minas Gerais.
[Romeu Zema, foi o campeão da irresponsabilidade, com concessão de reajuste de 41%; 
o governador do Ceará propôs aumento de 13% - recusado pelos representantes dos policiais. Considerando o percentual proposto - 13% - se percebe que o governador,  petista, fez apologia do seu partido.
A grande culpa é na realidade da leniência com que o motim do Espírito Santo, Rio e outros estados, especialmente do primeiro -  foi tratado por governadores, o presidente da época (lembrando o óbvio = o presidente da República não era o presidente Bolsonaro - por favor, não tentem responsabilizá-lo) e o Congresso Nacional  - que foram coniventes com a baderna durante, deixando correr, e após, aprovando leis anistiando os amotinados.]

No caso do Ceará, o governo federal fez o que tinha de fazer: destacou a Força Nacional, decretou Garantia da Lei e da Ordem (GLO) e enviou os ministros da Defesa, general Fernando Azevedo, e da Justiça, Sérgio Moro, para verificar a situação in loco. Isso, porém, visa a segurança da população, não os PMs amotinados, que são problema do governo do PT e mandaram o comércio fechar portas, atacaram carros da própria polícia e atiraram no peito de um senador, em ações mais de bandido do que de policial. [tudo bem que os policiais militares que atiraram em um senador licenciado, possam ter agido como bandidos, só que o senador - até pelo fato de ser um senador da República, ainda licenciado - conseguiu ser mais irresponsável, mais bandido que os policiais que o alvejaram.] 

A questão tem de ser tratada como ela é: motim militar, com os amotinados sujeitos à lei, à justiça e às devidas penas. O presidente não pode se calar e os governos não podem ceder à quebra da lei e negociar anistia. Senão, o recado estará dado para todas as polícias do País, ou melhor, para a parte ruim das polícias: “façam motim, vale a pena”. A questão, portanto, é exemplar. Chantagem por chantagem, nada é pior do que a chantagem armada, que lida com a vida e a morte. [a última frase, se pronunciada pelo presidente Bolsonaro,  seria interpretada como um aval presidencial à chantagem de grande parte dos parlamentares federais e denunciada pelo general Heleno.] 

Quanto ao bate-boca dos irmãos Gomes com os irmãos Bolsonaro, é melhor não ver, não ouvir, não comentar, porque nada de útil sai daí. Perdemos todos, perdem eles, perde a civilidade, já tão rara nesses nossos tempos bicudos. Afinal, o que esses dois lados pretendem?

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

O sequestro continua – Editorial - O Estado de S. Paulo

STF volta a adiar sua decisão sobre a constitucionalidade do tabelamento  do frete

O governo [sic] conseguiu mais uma vez procrastinar o julgamento das ações que questionam o tabelamento do frete para transporte rodoviário no Supremo Tribunal Federal (STF). Por obra e graça do relator, Luiz Fux, o País seguirá refém de um cartel flagrantemente inconstitucional. Em maio de 2018, insatisfeitos com os reajustes nos preços dos combustíveis, os caminhoneiros não só paralisaram seus serviços, como sabotaram os de todos os brasileiros, bloqueando rodovias em todo o País. Com a escassez de combustíveis e de insumos como alimentos e remédios, a redução do movimento das frotas de ônibus e aviões e a paralisação de indústrias, serviços e escolas, o Ministério da Economia estimou as perdas em R$ 15,9 bilhões.

Mas o maior dano foi ao tecido institucional do País. O governo de Michel Temer não só foi incapaz de punir os responsáveis, como cedeu até mais do que pediram os chefes do movimento paredista. O grande butim foi a fixação do preço dos fretes por medida provisória logo sacramentada pela Lei 13.703/18. A depreciação nos valores dos fretes resultava de uma intervenção indevida no mercado: os subsídios à frota de caminhões que geraram uma oferta excessiva de transporte. Sob pressão para corrigir as distorções desencadeadas por essa anomalia, o poder público, ao invés de arrancá-la pela raiz, suplementou-a com outra: a legalização de um cartel que assegura aos caminhoneiros os preços pelos quais teriam de batalhar, como faz a iniciativa privada, por meio de negociações e acordos.

Os efeitos desse atentado ao princípio constitucional da livre concorrência logo se fizeram sentir. Às majorações de preços resultantes da paralisação, acrescentaram-se outras, derivadas do valor fixado para o frete, 7,4% acima do preço de mercado, segundo estudo da Confederação Nacional da Indústria (CNI). Inflacionando cada elo da cadeia produtiva, estes custos criados artificialmente para garantir o lucro dos caminhoneiros são repassados ao consumidor, com prejuízo maior aos mais pobres. Segundo a CNI, o tabelamento acarretou só em 2018 uma perda de R$ 20,3 bilhões no PIB.

Isso era previsível e foi advertido à época pelo Ministério da Fazenda e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica. Entre as diversas contestações na justiça, três Ações Diretas de Inconstitucionalidade foram ajuizadas na Suprema Corte, que, representada por Luiz Fux, tem relutado em julgá-las por omissão, já que não há complexidade processual ou probatória que justifique a demora em apreciar o mérito da questão.

Agora, Fux retirou o julgamento da pauta do dia 19, acolhendo um pedido da Advocacia-Geral da União de convocar uma “audiência de conciliação” entre as partes. É mais um disparate. Primeiro porque não há “partes”, como se se tratasse de um litígio civil: o Supremo não é câmara de conciliação e, de resto, os autores das ações já manifestaram nos autos sua contrariedade ao adiamento, declarando que só esperam da Corte que ela cumpra sua obrigação de se pronunciar sobre a constitucionalidade do frete.

Entre a sofreguidão de uns e a morosidade de outros, é difícil apontar qual dos Poderes da República tem mais responsabilidade pelos prejuízos à Nação: se o Executivo, que, incapaz de impor a lei e a ordem, gestou essa monstruosidade econômica e jurídica; se o Legislativo, que a pariu e consagrou em lei; ou se o Judiciário, que (com o apoio do governo Bolsonaro) permite que ela viceje há quase dois anos, submetendo a economia e as instituições à chantagem de privilegiados constituídos em cartel. [o Judiciário tem se destacado por, de forma recorrente, prescindir do apoio do governo Bolsonaro.]
 
o assunto só pode ser tratado de uma forma:
- a curto e médio prazo não negociar com os caminhoneiros e para tanto adotar as medidas que estão disponíveis - no governo Temer, sob holofotes muitas punições foram aplicadas aos grevistas e também aos donos de transportadora (pelo cometimento do crime lock-out;
apagaram os holofotes e as punições foram esquecidas, especialmente as multas que não foram cobradas e, por óbvio, não pagas - e os inquéritos contra os empresários,  engavetados.
- a médio e longo prazo, levar a sério o incremento do transporte ferroviário - caminho demorado e caro para ser implantado, mas, o único capaz de 'desarmar' os caminhoneiros. 
Demora, mas, o importante é começar. ]

Ante a possibilidade de se restaurar a livre concorrência, o líder caminhoneiro Wallace Landim, dito Chorão, exprimiu exemplarmente este estado de anomia: “Não concordo, porque ganhamos a lei”. Ou o Supremo impõe a Lei Maior ou mais grupos de pressão ávidos por “ganhar” seus nacos no grito e na força se sentirão livres para depredá-la como predadores sobre sua presa.
 
Editorial -  O Estado de S. Paulo 


quarta-feira, 26 de junho de 2019

Decidiu, cumpra-se!

“As decisões do Supremo precisam ser respeitada por bolsonaristas e petistas. A Corte não pode decidir sob chantagem, com medo de um golpe de Estado, não importa o réu. O nome já diz tudo: Supremo”

[o grande problema é que muitas vezes o que o Supremo decide hoje é revogado amanhã, ou na semana ou mês seguinte e pelo próprio Supremo;

uma decisão do Plenário da Corte Supremo é muitas vezes objeto de recurso impetrado junto a uma turma - instância inferior ao Plenário - e se a turma aceita analisar, o faz por ter poder de revogar;

outras vezes um ministro toma uma decisão monocrática, sem apoio em nenhuma lei e a mesma é aceita.

Tudo isso deixa os brasileiros inconformados com a decisão do Supremo e o inconformismo é um péssimo conselheiro que pode alimentar uma vontade de descumprir. O termo Supremo, segundo Rui Barbosa, tem também o sentido de: 'a corte que pode errar por último'.]

 O presidente Jair Bolsonaro foi eleito por um triângulo de demandas majoritárias da sociedade: ética, família e segurança. Essas são as palavras-chave sobre as quais assentou sua estratégia de campanha. O sucesso de seu governo, portanto, está pendurado nesses eixos. Ocorre que o governo precisa transpor uma linha que não estava no imaginário dos seus eleitores: a crise fiscal, cuja resolução depende da aprovação da reforma da Previdência. Por causa dela, Bolsonaro enfrenta dificuldades na economia e vê sua popularidade ser corroída.

Com inflação zero, crescimento zero e uma massa de 12 milhões de desempregados (ampliada com os precarizados e os que desistiram de trabalhar são 25 milhões de pessoas em grandes dificuldades), entretanto, Bolsonaro completa seis meses de um governo errático, que ainda não conseguiu organizar seu meio de campo. Atua como aquele artilheiro que pretende ganhar o jogo sozinho e desarruma todo esquema tático do time, que sofre substituições frequentes e joga muita bola para os lados e para trás, sem falar nos passes errados.

As pesquisas de opinião mostram o crescimento contínuo da desaprovação do governo e a queda dos índices de aprovação, o que levou o presidente da República a reagir em três níveis: voltou a ter uma agenda de rua típica de campanha, agarrou com as duas mãos a bandeira da Lava-Jato e recrudesceu no tema da posse do porte de armas. Está dando certo: a aprovação voltou a subir. Mas a sociedade está mais polarizada entre os que aprovam e desaprovam o governo, o número dos que consideram o governo regular, diminui.

Ontem, por exemplo, Bolsonaro revogou dois decretos assinados em maio que facilitaram o porte de armas de fogo. No lugar, editou três novos decretos e enviou um projeto de lei ao Congresso Nacional sobre o mesmo tema. O Decreto nº 9.844 regulamenta a lei sobre a aquisição, o cadastro, o registro, o porte e a comercialização de armas de fogo e de munição, o Sistema Nacional de Armas e o Sistema de Gerenciamento Militar de Armas; o nº 9.845, a aquisição, o cadastro, o registro e a posse de armas de fogo e de munição em geral; e o nº 9.846, o registro, o cadastro e a aquisição de armas e de munições por caçadores, colecionadores e atiradores.

Bolsonaro não quer dividir com o Congresso a agenda da segurança pública. Tem dificuldades de dividir qualquer agenda, exceto aquelas que possam ter ônus eleitorais. Por isso, não digeriu a derrubada do decreto da venda de armas pelo Senado e não quis sofrer nova derrota na Câmara. Muito menos aceita que o Congresso tenha a iniciativa de pôr outro decreto em seu lugar, mesmo patrocinada pela chamada “bancada da bala”. Essa uma espécie de reserva de mercado eleitoral que pretende monopolizar. Não é assim que as coisas funcionam numa democracia. Para ser o pai da criança, Bolsonaro precisa articular a sua própria maioria no Legislativo, o que não fez até agora, e aprovar seus projetos.

O caso da Previdência é emblemático. Nove entre 10 economistas dizem que, sem essa reforma, não há como resolver a crise fiscal. A retomada do crescimento, com geração de mais empregos, depende de esse nó ser desatado. Nunca houve um ambiente tão favorável para a aprovacão da reforma. Está tudo certo para que isso ocorra, de forma mitigada, sem mexer com aposentadorias rurais e Benefícios de Prestação Continuada para os trabalhadores de mais baixa renda. O plano de capitalização proposto pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, porém, não rolou. Nunca foi bem explicado para a sociedade, o que costuma ser um obstáculo a mais no Congresso. O fundamental — o aumento do tempo de contribuição e da idade mínima, além da redução de privilégios dos servidores públicos — será aprovado.

Julgamento
Toda vez que a Previdência avança na Câmara, porém, surge uma nova polêmica ou várias criadas por Bolsonaro que não têm nada a ver com esse assunto. Qualquer estrategista diria que está faltando foco ao governo. Será isso mesmo? O mais provável é que Bolsonaro não queira colar sua imagem à reforma: ele a defende nos pequenos círculos empresariais que frequenta; quando vai para a agitação na sua base eleitoral, que é muito corporativa, muda completamente de eixo. O caso agora da Lava-Jato, então, caiu do céu.


No mundo jurídico, a revelação das conversas do ministro da Justiça, Sérgio Moro, com os procuradores da Lava-Jato provocou uma estupefação. É tudo o que não se aprende nas faculdades de direito. Ocorre que a Lava-Jato virou uma força da natureza, com amplo apoio popular, transformou o ex-juiz de Curitiba num ícone da ética e da luta contra a corrupção. Bolsonaro montou nesse cavalo e se mantém firme na sela, porque é aí que pode melhorar um pouco mais seus índices de aprovação.

Entretanto, da mesma forma como tenta jogar a opinião pública contra o Congresso no caso do decreto das armas e, mais recentemente, das agências reguladoras, os partidários de Bolsonaro pressionam o Supremo Tribunal Federal (STF) no caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Qualquer que seja o desfecho do julgamento de Lula, a decisão do Supremo precisa ser respeitada por bolsonaristas e petistas. A Corte não pode decidir sob chantagem, com medo de um golpe de Estado provocado por uma decisão sobre um habeas corpus, não importa o réu. O nome já diz tudo: Supremo. Decidiu, cumpra-se!

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB 


segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Raquel Dodge enfrenta levante de procuradores



[procuradores querem os 16,38% - que vem automático - e mais um 'penduricalho' para compensar o auxílio-moradia que recebiam sem sequer ter direito.]


A procuradora-geral da República Raquel Dodge enfrenta um levante de sua corporação. A sublevação tem motivação salarial. Procuradores que integram grupos de trabalho e coordenações estaduais ameaçam abandonar os cargos a partir desta segunda-feira. Cobram o pagamento de gratificação por "acúmulo de funções." Em ofício endereçado aos colegas em pleno domingo, Raquel Dodge fez um "chamamento ao diálogo." A pressão por gratificação tem origem numa decisão do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal. Ele revogou, em dezembro de 2018, as liminares que permitiam o pagamento de auxílio-moradia de R$ 4,3 mil para juízes e procuradores. Fez isso em troca de um reajuste salarial de 16,38%. A turma da Procuradoria pede agora uma gratificação capaz de repor a perda do bolsa-teto.

Na mensagem deste domingo, Raquel Dodge atribuiu a organização do levante à Associação Nacional de Procuradores da República. Insinuou que, além de flertar com a desmoralização, a corporação desgasta a imagem da própria instituição. A procuradora-geral anotou: "Respeitosamente, entendo que o propósito de 'defesa da integridade do Ministério Público Federal e de seus componentes' dispensa a exposição gratuita da instituição à opinião pública, consequência natural de eventual entrega de funções por membros do Ministério Público, em razão da pauta de reivindicações apresentada."

Tomada pelas palavras, Raquel Dodge parece avaliar que a reivindicação dos procuradores não orna com uma conjuntura em que se misturam tragédias, ruína fiscal e desemprego.  "Devo zelar para que a exposição pública já desencadeada pelo extravasamento de pauta reivindicatória corporativa – reitero – de difícil compreensão por formadores de opinião e pela sociedade, não seja compreendida como ato contrário à lei, nem desproporcional ao justo, e muito menos indiferente à fase da vida nacional marcada por grandes tragédias evitáveis, por elevado deficit público e por milhões de desempregados e excluídos." 

A certa altura, Raquel Dodge adotou um timbre que foi recebido por alguns procuradores como ameaça. Ou chantagem. Ela informou aos colegas que o motim já aguçou a curiosidade da imprensa. "Estarei atenta para que o movimento da classe —que está levando os jornalistas a pedirem esclarecimentos à PGR (…)— não leve ao descrédito de qualquer membro, nem da instituição." Na sequência, a procuradora-geral deixou no ar a hipótese de levar à vitrine os dados tóxicos que estão escondidos no porão do seu estabelecimento. "A transparência pública e o direito constitucional à informação exigem que a administração disponibilize as informações que vierem a ser solicitadas, inclusive sobre eventuais impedimentos legais, bem como sobre as consequências para o modo de prestação de serviço pelo Ministério Público Federal."

Seja qual for o desfecho —diálogo ou confronto—, Raquel Dodge deveria render homenagens aos brasileiros que financiam a folha da Procuradoria, ligando o ventilador.

Blog do Josias de Souza


 





quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

O dever de agir

É inaceitável deixar o País refém da chantagem de uma categoria, como os caminhoneiros

Em maio deste ano, caminhoneiros paralisaram o País por dez dias. No início, protestavam contra o preço do óleo diesel, mas, com o tempo, ampliaram suas reivindicações. Ao fim, já não era possível afirmar com precisão quais eram suas demandas. Bem conhecidas ficaram as consequências das paralisações. O governo demorou a agir e o bloqueio das estradas provocou o caos. A economia foi seriamente afetada. O Ministério da Fazenda estimou perdas de R$ 15,9 bilhões decorrentes da paralisação dos caminhoneiros. Houve desabastecimento de combustíveis e alimentos, e muitas pessoas foram tolhidas em seu direito de ir e vir. [as multas aplicadas tanto aos caminhoneiros, pessoas físicas = proprietários dos veículos multados, quanto as transportadoras que aderiram à greve - no caso lockout - foram pagas? Foram, para exigir o mínimo, cobradas?
A pressa do ministro Fux em suspender as aplicações de multas, se estendeu àquelas multas?
Dispensar o pagamento das multas decorrentes da paralisação vale como um estímulo, irresponsável, à nova paralisação.
Dispensar o pagamento de multas aplicadas a grevistas (especialmente seus sindicatos) qualquer que seja a categoria - prática que Justiça do Trabalho faz continuamente (se um décimo das multas estipuladas pela JT fossem cobradas, muitos sindicatos já teriam fechado) faz com que greves fiquem impunes e o recurso de aplicar multas, desmoralizado.]

Agora, os caminhoneiros ensaiam nova paralisação. O motivo imediato é a liminar do ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedida no dia 7 de dezembro, que suspendeu a aplicação de multas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) às empresas que descumprirem os preços mínimos estabelecidos na tabela de frete para o transporte de mercadorias por caminhões. No dia 10 de dezembro, houve protestos em três Estados contra a decisão do ministro Luiz Fux. Foram registradas manifestações na Via Dutra na altura de Barra Mansa, no acesso ao Porto de Santos (SP), em Pindamonhangaba (SP) e em Minas Gerais. Na Via Dutra, um caminhoneiro foi ferido na testa por uma pedra jogada contra seu veículo por alguns piqueteiros. Agentes da Polícia Rodoviária Federal precisaram utilizar armas de choque para controlar o distúrbio e dois manifestantes foram presos. Houve congestionamentos e as paralisações afetaram o abastecimento da Ceasa do Rio de Janeiro. 

Diante do atual risco de novas paralisações por parte dos caminhoneiros, não cabe ao governo alegar, como em maio passado, que foi surpreendido. Se naquela ocasião já foi difícil entender como o governo não previu as dimensões e as consequências do movimento dos caminhoneiros, agora são notórios os danos que podem ser causados por bloqueios nas estradas. [sem contar que a natural preocupação da população em estocar alimentos, combustível, gás de cozinha  provoca uma demanda artificial e a consequente elevação de preços.]
O País tem muito a perder se o governo não atuar com a devida diligência. É imperioso, portanto, impedir que o País fique refém uma vez mais de uma categoria profissional. Não cabe tolerar nenhum início de piquete ou paralisação nas estradas. É preciso, também, com a ajuda dos órgãos de inteligência, identificar as pessoas que coordenam, planejam e estimulam essas criminosas paralisações. Sendo conhecida a ousadia dos caminhoneiros [a impunidade provocada pela omissão covarde, mesmo criminosa, do Poder público, estimula tal ousadia.] - não temem parar o País como forma de impor suas reivindicações -, seria criminoso que o poder público se omitisse na sua tarefa de zelar pela paz e ordem pública. Não cabem desculpas. O Estado tem os meios legais para atuar a tempo, prevendo e impedindo bloqueios, ataques e piquetes. 

Num Estado de Direito, bloquear estradas não é um meio legítimo para reivindicações políticas. Até porque, como se viu em maio deste ano, a paralisação de caminhoneiros pode causar danos irreversíveis ao País. Foram muitos os setores da economia que se viram seriamente afetados pelo bloqueio das estradas e pela falta de combustíveis. Sofreram consequências especialmente graves a pecuária, a agricultura, o comércio e a construção civil. Houve também desabastecimento de remédios e insumos farmacêuticos em hospitais e postos de saúde.[ainda neste dezembro, alguns produtos continuam com preços bem acima os dos praticados antes da paralisação, devido a "inflação da greve dos caminhoneiros." ]
É inaceitável deixar o País refém da chantagem de alguns membros de determinada categoria profissional. Além do mais, a tabela de fretes mínimos é acintosamente inconstitucional, já que afronta o princípio da livre iniciativa. Não há, assim, nenhum sentido em tolerar a violência de quem deseja impor pela força medidas inconstitucionais. Todos devem se submeter à lei, sem nenhuma exceção. Por isso, todos têm direito de manifestar-se e de reivindicar suas pretensões, mas ninguém tem o direito de travar o País. Cabe ao ministro Fux, em primeiro lugar, dar sequência ao julgamento que interrompeu. E cabe ao Poder Executivo, se o Judiciário não o fizer, revogar a medida inconstitucional que patrocinou e que só pode produzir maus frutos.

Opinião - O Estado de S. Paulo


quarta-feira, 14 de novembro de 2018

Reajuste do Supremo virou um balé de elefantes

A encrenca do reajuste salarial dos ministros do Supremo Tribunal Federal transformou-se num balé de elefantes. A coreografia estava momentaneamente paralisada. Imaginou-se que o próximo passo seria executado por Michel Temer, a quem cabe sancionar ou vetar a proposta que elevou os vencimentos das togas supremas de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil. De repente, o ministro Luiz Fux, vice-presidente do Supremo, atravessou no palco declarações muito parecidas com uma chantagem.

A cúpula do Judiciário farejou na demora de Temer uma insinuação de que o reajuste não será sancionado enquanto o Supremo não extinguir o auxílio-moradia de R$ 4.377 pagos mensalmente a juízes e procuradores. Diante do cheiro de queimado, Luiz Fux cuidou de esclarecer que o julgamento das ações que questionam há cinco anos o pagamento do bolsa-moradia só o ocorrerá depois que o presidente da República liberar o reajuste dos contracheques dos magistrados.

Até a semana passada, tudo parecia simples como o ABC. A, o Supremo reivindicava um reajuste. B, o Tesouro Nacional está quebrado. C, o Senado mantinha o pedido da Suprema Corte no freezer desde 2016. De uma hora para outra, os elefantes de Brasília começaram a dançar à beira do abismo. O Supremo pressionou, os senadores cederam, Temer entrou na dança e Fux converteu uma reivindicação sindical em instrumento de desmoralização do Supremo.

O Supremo alega que não pede aumento, mas reposição da inflação. Justo, muito justo, justíssimo. O problema é que um empregado não pode exigir do empregador o que ele nãio pode pagar. E o Tesouro já está endividado até a raiz dos seus cabelos, caro contribuinte. Os juízes do Supremo, se quiserem, podem trocar a folha do Estado por uma banca privada. Sem essa alternativa, os 12,5 milhões de brasileiros desempregados preferem um Estado equilibrado, que não atrapalhe a recuperação da economia.

Blog do Josias de Souza

LEIA TAMBÉM: Lula constrói com método sua própria Waterloo


 

sábado, 2 de junho de 2018

Retrocesso populista

Governo está impotente diante da chantagem imposta à sociedade, pronto a sacrificar avanços na política econômica



Levará algum tempo até que se possa ter compreensão clara do vertiginoso retrocesso por que passou a condução da política econômica no país, em menos de dez dias, a partir da segunda-feira, 21 de maio. Mas na história completa desse desastre não poderá faltar a constatação de que atores políticos importantes já vinham desfraldando bandeiras populistas desde a semana anterior.  Já no início da tarde da sexta-feira, 18, a Agência Estado reportava que o ministro de Minas e Energia, Wellington Moreira Franco, se permitira declarar que era preciso repensar a política de preços de combustíveis. Não foi uma manifestação isolada. Na manhã da segunda-feira, 21, o - cumprindo o que adiantara na véspera pelo Twitter, anunciou, em conjunto com o presidente do Senado, Eunício Oliveira, a criação de uma comissão geral do Congresso para debater “as sucessivas elevações de preços de combustíveis”.  No mesmo dia em que os protestos de caminhoneiros começaram a ganhar corpo país afora.

Tais fatos deixam mais do que claro que, tendo em vista a estreita ligação de Moreira Franco com o Planalto e a patente insegurança do presidente com o Congresso, a equipe econômica e a Petrobras estavam fadadas a entrar totalmente “vendidas” no jogo pesado que teve lugar na semana passada. Sem chance de contar com o respaldo do Planalto.  Quaisquer que possam ter sido suas intenções, ao se dispor a reabrir a caixa de Pandora da política de preços de combustíveis, o governo logo perdeu controle da situação. Começou a semana acuado e terminou-a rendido.  Ainda é cedo para se avaliar com nitidez a real extensão do retrocesso populista em curso. Mas uma avaliação preliminar já revela uma perda devastadora de credibilidade da mudança do regime fiscal. A reconstrução da Petrobras, fundada na institucionalização de uma política clara, coerente e duradoura de preços de derivados, era um dos pilares da credibilidade dessa mudança.

Tal política estava bem fundamentada na lógica de formação de preços de bens transacionados internacionalmente em uma economia aberta. Na ideia de que preços internos de derivados devem estar alinhados a preços externos. Exatamente como ocorre com outras commodities, como trigo, soja, alumínio ou celulose. Como derivados podem ser importados ou exportados, esse alinhamento tem a dupla virtude de gerar preços que dão a quem demanda tais produtos noção correta do que sua decisão custa à economia, e de manter o poder de mercado da Petrobras sob controle.  Mas os caminhoneiros estão convencidos de que fazem jus a um subsídio. E o curioso é que querem que o diesel seja subsidiado para que possa amenizar as agruras que agora enfrentam, em decorrência de outro programa de subsídio: o generoso financiamento subsidiado de caminhões promovido pelo BNDES , durante o governo passado, por insistência das montadoras. Combinada à recessão, a expansão excessiva da frota deprimiu fretes. E muitos caminhoneiros vêm enfrentando dificuldades para pagar os caminhões que adquiriram a prazo.

Esse problema de excesso de oferta só será resolvido com a retomada do crescimento da economia. Subsídio não é a solução. E torna a retomada mais difícil. Nas atuais condições, o mais provável é que a concorrência acirrada entre os caminhoneiros faça com que o subsídio ao diesel acabe em boa parte repassado aos demandantes de serviços de transporte rodoviário, não obstante a absurda tabela de preços mínimos de frete exigida pelos grevistas.  Seja como for, o que agora se vê é um governo fragilizado, impotente diante da chantagem que foi imposta à sociedade, pronto a sacrificar avanços de grande importância na condução da política econômica, para conceder subsídios indefensáveis, em meio ao alarmante quadro fiscal que enfrenta o país. Subsídios que, só em 2018, deverão montar a cerca de R$ 14 bilhões.  O que ainda não se sabe é que novas pilhagens sofrerão o Tesouro e o país, nos próximos meses, na esteira do sucesso que tiveram os caminhoneiros.

Rogério Furquim Werneck, economista e professor da PUC-Rio


 

terça-feira, 5 de setembro de 2017

Gilmar chama Janot de 'delinquente' e diz que procurador fez 'chantagem' com o STF

Ministro está em Paris e retorna ao Brasil no feriado de 7 de setembro

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, afirmou nesta terça-feira que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, "fez uma chantagem" com a Corte. Ao "Poder 360", o magistrado ainda voltou a chamar Janot de "delinquente".— O procurador-geral da República, mais uma vez, deu curso à sua estratégia de delinquente e fez uma chantagem com o Supremo Tribunal Federal — disse Gilmar, que está em Paris e tem retorno ao Brasil previsto para quinta-feira, no feriado de 7 de setembro.
 
Rodrigo Janot abriu investigação interna nesta segunda-feira para rever a delação premiada de três dos sete executivos da JBS: Joesley Batista, Ricardo Saud e Francisco de Assis e Silva.  Em conversa gravada aparentemente sem querer, os dois primeiros citam membros do Supremo num contexto que pode indicar irregularidades, segundo Janot. É a esse ponto específico que Gilmar se refere como "chantagem". Os delatores ainda teriam dito que tinham sido ajudados pelo ex-procurador da República Marcello Miller na elaboração da proposta de colaboração assinada com a Procuradoria-Geral da República (PGR).


Há indícios de que a conversa foi gravada em 17 de março, quando Miller ainda era procurador da República. Em 5 de abril, ele se afastou da instituição e logo depois passou a atuar como advogado dos delatores.  — Áudios de conteúdo grave, eu diria gravíssimo, foram obtidos pelo Ministério Público Federal na semana passada. A análise de tal gravação revelou diálogo entre dois colaboradores com referências indevidas à Procuradoria-Geral da República e ao Supremo Tribunal Federal. Tais áudios também contêm indícios, segundo esses dois colaboradores, de conduta em tese criminosa atribuída ao ex-procurador Marcelo Miller — afirmou Janot.

Enquanto o áudio, que tem duração de aproximadamente quatro horas, continuar sob sigilo, não é possível saber quais ministros foram implicados na gravação. Cabe ao ministro Edson Fachin, do STF, decidir sobre a manutenção ou não desse sigilo.

Fonte: O Globo


 

segunda-feira, 24 de abril de 2017

E os “heróis” do MPF? o que vale por uma chantagem, certo?

E os “heróis” do MPF lideram resistência à reforma da Previdência

É o fim da picada! Aqueles que se apresentam como os salvadores da pátria agora pressionam parlamentares, o que vale por uma chantagem, certo?

Já escrevi aqui algumas vezes que a pior reforma da Previdência é a impossível — e tudo, pois, ficaria como está, com o país quebrado. E a melhor é a possível. Mas desde que se mude o suficiente para tornar o sistema ao menos viável. Penso que o presidente Michel Temer está certo quando afirma que as mudanças que o governo imprimiu ao texto não caracterizam um “recuo”. Trata-se de negociação.

Negociadores, com efeito, não recuam, mas cedem diante de circunstâncias apresentadas pelos interlocutores.
E, agora sim, cumpre dizer: o governo já cedeu o que podia. A partir do ponto a que se chegou, já se caminharia para a descaracterização de um texto que, reitero, busca a solvência do sistema. E, ora vejam!, sabem quem está na linha de frente da resistência às reformas, a fazer lobby desbragado no Congresso, a pressionar parlamentares, a apelar, queira ou não, a uma espécie de chantagem? O Ministério Público Federal!

Sim, senhores! Esse ente que hoje se apresenta como o salvador da pátria, que reivindica o monopólio da virtude, que pretende ser o Poder Moderador do Brasil — ou, quem sabe, o Poder Único (PUN)… Bem, esse valente defensor dos nossos interesses não quer a reforma da Previdência. A atuação se dá, vamos dizer, nas sombras. Já chego lá.

Concessões
Sim, o governo entrou na reforma consciente de que enfrentaria dificuldades. Tentou criar um modelo para durar, sei lá, uma quatro décadas. Não vai conseguir. Se o texto passar como está, é possível que, em 15 ou 20 anos, o debate se recoloque. Bem, mas que se busque então a solvência para esse tempo. É melhor do que o desastre de hoje, é certo!
– No texto original, propunha-se idade mínima de 65 anos, independentemente de gênero. Agora, a das mulheres caiu para 62;
– na primeira versão, na prática, a aposentadoria de 100% requereria 49 anos de contribuição; caiu para 40;
– o limite de 62 anos para mulheres e 65 para homens vale também para os servidores, com exigência de 25 anos de tempo mínimo de contribuição;
– na primeira versão, professores e policiais estavam sujeitos às mesmas regras dos trabalhadores do setor privado; agora, professores se aposentam aos, 60 e policiais, aos 55 anos;
– a proposta para o trabalhador rural no texto original era 65 anos de idade mínima. Caiu para 57 para mulheres e 60 para homens. Exigia-se um tempo mínimo de contribuição de 25 anos; caiu para 15.
– a pensão por morte seria desvinculada do salário mínimo. Não será mais, até um limite de dois mínimos para quem acumula pensão e aposentadoria;
– o Benefício de Prestação Continuada não estaria vinculado ao salário mínimo, e a idade inicial para recebê-lo passaria de 65 para 70 anos. O mínimo continua a ser a referência, e a idade para o BPC passa a ser 68;
– Antes, havia uma idade mínima para o contribuinte entrar nas regras de transição. Não mais. Haverá 30% de pedágio sobre o tempo que ainda falta para o trabalhador cumprir a regra atual:
  1. a) 35 anos de contribuição para homens e 30 para mulheres;
  2. b) será preciso ter a idade mínima, segundo uma tabela, que muda a cada dois anos. Em 2017, por exemplo, é de 53 anos para mulheres e 55 para homens. Em 2036, será de 62 anos para as mulheres; em 2028, de 65 para os homens.
Ambiente hostil
O que se vê acima é um governo com disposição de negociar. Até porque a reforma é inadiável, mas não poderia ser feita em ambiente político mais hostil. Afinal, a direita xucra vitupera contra os políticos — quaisquer políticos, sob o estímulo do Ministério Público Federal —, e a esquerda (com o auxílio de direitistas, sim!) tenta inviabilizar a mudança previdenciária. Deputados e senadores, e serão eles a votar, desse modo, são intimidades pelo berreiro cretino de uns e de outros.
Foi preciso, sim, negociar mais do que seria razoável em tempos normais. Mas não estamos em tempos normais. Como se encontra, ainda que menos efetiva do que se pretendia, a reforma segue sendo essencial para o país.

Pressão
Mais eis que aqueles que se apresentam como o braço armado (de ira santa) do povo; que abusam de sua autoridade e gravam vídeos contra o projeto que aperfeiçoa a lei que pune abuso de autoridade; que abusam de sua autoridade e criam páginas na Internet sobre a operação, como se investigados em inquérito já fossem condenados (mais um abuso de autoridade), eis, então, que os bravos senhores do Ministério Público, por intermédio de suas seções internas e associações de caráter sindical, resolveram se opor à reforma.

E a pressão é exercida sobre deputados e senadores. Vale dizer: os valentes tribunos do povo do Ministério Público querem manter inalterados os privilégios de que dispõem hoje. Acontece, e todos sabem — também os parlamentares —, que o MPF tem poder de vida e morte sobre os políticos. Com a devida vênia, a coisa assume ares de chantagem e ameaça.

Como?
Ah, você não acredita? Acha que estou pegando no pé do Ministério Público?
Então clique aqui e acesse a “Nota Técnica” que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão enviou ao Congresso. Algumas das alterações acima ainda não haviam sido feitas, é verdade, mas elas não mudam o espírito do texto, que quer mesmo é deixar tudo como está.

Uma das entidades mais combativas contra a reforma — é um troço que, com absoluta certeza, só existe no Brasil (e confesso que nem procedi a uma pesquisa para assegurá-lo): chama-se “Frentas”. É uma, atenção!, “Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público”. Vocês entenderam direito: em Banânia, quem investiga e acusa forma uma entidade de caráter sindical com quem julga. Só falta agora chamar a polícia!
A tal frente está empenhada em combater a reforma e em pedir reajuste de salários… Num encontro havido no fim do mês passado, estavam presentes representantes da Associação Nacional do Membros do Ministério Público (Conamp), Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), e Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT), Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e Associação dos Magistrados do Brasil (AMB).

Encerro
É isso aí, meu bom brasileiro!
Saia às ruas brandindo fotos de Deltan Dallagnol, Carlos Fernando, Rodrigo Janot e Sergio Moro. Afinal, eles estão fazendo um meritório trabalho de combate à corrupção. E estão mesmo! É uma evidência. Mas pertencem à categoria daqueles que, hoje, têm a certeza de que lhes cabe o governo do Brasil.

E, como é sabido, todos aqueles que outorgam a si mesmos o poder absoluto começam sempre por preservar os próprios privilégios.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo - VEJA