O Estado de S. Paulo
Bolsonaro e Lula vão disputar o mesmo eleitorado, num faroeste sem mocinhos
Nos
fenômenos políticos brasileiros dos últimos 20 anos Luiz
Inácio Lula da Silva e Jair Messias Bolsonaro exibem uma
importante característica em comum: foram vendedores de esperanças frustradas.
[uma diferença gritante, que não empalidece: - o mais velho deles, o escalado para perder, vencedor por engano e agora condenado a perder sempre e sempre, foi condenado por duas sentenças, a primeira delas confirmada em todas as instâncias - entre elas: TRF, STJ e STF, e a segunda = mais cadeia = em fase de confirmação, condenações essas que foram anuladas em decisão monocrática do ministro do STF, Edson Fachin, que por vários anos teve as condenações sob seu olhar e só agora decidiu anulá-las, mas optou opor não adentrar ao exame do mérito.
O outro, o mais jovem, em primeiro mandato - sabotado e boicotado pelos inimigos do Brasil, que encontraram grande aliado na maldita peste - NUNCA FOI CONDENADO.
RESUMO DA ÓPERA: um é criminoso, com vários processos responder - incluindo os dois citados.
O outro CIDADÃO, ficha limpa = PESSOA DE BEM. Um FAROESTE com um mocinho e um criminoso condenado e em fim de carreira.] As diferenças ideológicas e de estilo entre eles empalidecem diante do fato de
que assumiram prometendo grandes transformações e acabaram governando com a
mesma massa amorfa de forças políticas empenhadas em acomodar interesses
setoriais, cartoriais, corporativistas e regionais às custas dos cofres
públicos ou de pedaços da máquina pública – plus/minus a roubalheira
petista.
O
fator excepcional agora é o alargamento e aprofundamento de crises simultâneas
de saúde pública, economia estagnada e liderança política. Elas são causa e
consequência ao mesmo tempo do esgarçamento do tecido social (perigo de
anomia), da deterioração do equilíbrio dos poderes (Judiciário emasculando os
demais) e da incapacidade generalizada de elites econômicas de enfrentar a
estagnação de produtividade e competitividade da economia (já nem se fala mais
de PIB ruim de ano para
ano, mas de PIB ruim de década para década).
Diante
da tragédia da saúde e de seu impacto na economia – claudicante já antes da
pandemia –, o problema para Bolsonaro e Lula é qual esperança vão vender. [claudicante por herança maldita deixada pelo mais velho e pela parceira que o sucedeu.] As
bandeiras do lulopetismo estão manchadas não só pela corrupção adotada como
forma de governo, mas, e ainda mais decisivos, pelo espetacular fracasso no
intervencionismo e dirigismo da economia e a incapacidade de resolver mazelas
sociais. São graves pois derivam de ideias equivocadas, em boa parte abraçadas
por setores das elites empresariais.
Sem
ideias próprias, Bolsonaro abandonou sucessivamente qualquer conjunto coerente
de postulados emprestados por Paulo Guedes, além de deixar para lá ou atuar
contra as bandeiras da luta anticorrupção, da reforma e enxugamento do Estado
e, de forma também espetacular, parou de se empenhar por destravar a economia
do País. Que, ainda por cima, enfrenta o agravamento do sufoco fiscal, questão
não meramente conjuntural (gastos com pandemia). [praticamente todos os projetos apresentados pelo presidente foram travados ou por decisão do ex-primeiro ministro autonomeado, deputado Maia, ou judicialização. Quando o presidente pensou em respirar aliviado veio a pandemia, a cassação branca dos seus poderes e outras mazelas que, aos poucos, começam a ser superadas.]
A
tripla crise é particularmente grave para a vida nacional, pois reforça um
angustiante estado de paralisia no qual se destaca a percepção generalizada de
que nada anda direito – inclusive criar alternativas políticas aos fracassados
vendedores de esperanças. Paira um sentimento (sim, coisa subjetiva, mas
política é coisa subjetiva também) de que impera por toda parte uma
extraordinária hipocrisia:
Um STF que só toma decisões ao sabor da política,
dizendo que não toma decisões políticas.
Um Centrão que só pensa nos próprios
interesses setorializados, quando fala que defende interesses do País.
Um
presidente que só pensa na reeleição e na própria família, quando diz falar
pela coletividade, cujo sofrimento pouco o comove.
Por
uma desagradável ironia, Bolsonaro e Lula (ou as forças que representam) estão
hoje na situação de terem de disputar a mesma parcela do eleitorado mais
dependente de assistencialismo, mais arriscada a cair na miséria total se
faltar a mão do Estado, mais ignorante e com a situação agravada pela falta de
acesso a serviços básicos e educação de qualidade. Quadro piorado pela
pandemia.
É
uma dura constatação, mas que até aqui não levou as diversas elites dirigentes
brasileiras (entendidas como os grupos “que pensam” na economia, no ambiente
cultural no sentido amplo e na condução de agrupamentos políticos) sequer a um
diagnóstico comum, quanto mais a linhas de ação. A noção de que “a corrupção”
seria a grande causa e a explicação para o nosso atraso relativo foi derrubada
agora com o “desmascaramento” da Lava Jato (juntando na mesma trincheira
safadeza com defesa de princípios da ordem democrática). “Mais saúde e
educação”, as palavras de ordem de 2013 viraram slogans vazios de conteúdo. Dizer
que estamos vivendo um faroeste sem mocinhos é repetir Maquiavel, cuja
originalidade estava na afirmação de que em política não se consegue realizar
princípios. O problema é quando vira um faroeste sem esperanças.
William Waack, jornalista - O Estado de S. Paulo