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terça-feira, 15 de agosto de 2023

Sem limites, STF e Lula querem intimidar advogados que apoiam Bolsonaro J. R. Guzzo

Vozes - Gazeta do Povo


Sem limites, STF e Lula querem intimidar advogados que apoiam Bolsonaro - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A Polícia Federal, que desde o dia 1º. de janeiro de 2023 passou a cumprir ordens ilegais e servir como polícia política do governo (antes disso estava servindo apenas ao STF), invadiu há pouco a residência de um advogado que está tratando de um caso junto à essa mesma polícia e a esse mesmo STF. 
O caso é o das “joias do Bolsonaro” policiais e juízes, além de incriminar o suspeito, querem agora incriminar também o advogado do suspeito. Seria um recado aos advogados brasileiros em geral? Tipo: “Cuidado com os clientes que vocês aceitam. Se algum deles estiver na nossa lista negra, quem pode se complicar é você. Vamos fazer busca e apreensão na sua casa às 6 horas da manhã, levar seu computador e celular e soltar a Rede Globo em cima da sua vida”
Não se sabe. O que se sabe é que já existem no Brasil, além de outros casos de duplicidade legal, dois tipos de advogados. 
A maior parte não tem problemas. São os que não cuidam da área política, ou então trabalham para o governo Lula e a sua gente – estes, aliás, estão sempre ganhando todas na justiça brasileira.
A segunda classe de advogados reúne os que defendem acusados de “atos antidemocráticos” ou, pior ainda, de “bolsonarismo”. Estes são tratados como se tivessem cometido os crimes de que os seus clientes são acusados.

    Imaginem se a PF tivesse invadido a casa do advogado Cristiano Zanin, que defendia Lula nos seus processos por corrupção e lavagem de dinheiro

A invasão da casa do advogado de Bolsonaro foi feita, é claro, com uma ordem judicial. Mas e daí – que diferença faz? 
 No Brasil de hoje, por lei aprovada no Supremo, o judiciário não se limita a julgar e a polícia a investigar. Viraram uma coisa só, e acrescentaram às suas funções o papel de Ministério Público – de maneira que investigam, acusam e julgam ao mesmo tempo.  
Este parece ser o sistema jurídico ideal para a OAB, o grupo “Prerrogativas” do ministro Flávio Dino, que surgiu para defender as prerrogativas de Lula e dos corruptos enrolados com a operação Lava Jato, os “garantistas” etc. etc. etc. 
Não dizem jamais uma sílaba de protesto diante das sistemáticas violações aos direitos dos advogados que defendem os perseguidos pelo sistema Lula-STF. 
É uma surpresa, na verdade, que ainda não tenham lançado uma “Carta Aos Brasileiros de Apoio aos Inquéritos Policiais em Defesa do Estado Democrático de Direito”. 
A mídia, então, está à beira de participar das batidas da Polícia Federal.
 
Imaginem se a PF tivesse invadido a casa do advogado Cristiano Zanin, que defendia Lula nos seus processos por corrupção e lavagem de dinheiro – o que iriam dizer a OAB, a imprensa e o Papa Francisco?  
Mais: 
- e se tivessem feito uma busca e apreensão nas residências de algum dos advogados do indivíduo que quis assassinar o ex-presidente da República com uma facada no estômago?  
- Ou o “caso das joias” é mais importante que tentativa de homicídio? 
No Brasil de 2023 há realmente duas categorias de advogados
- Os que estão do lado certo têm direito a tudo. A mulher do hoje ministro Zanin, para ficar num exemplo só, tem catorze causas do STF do marido; ninguém acha nada demais.
 Os que estão do lado errado têm direito à invasão de suas casas pela polícia.

J.R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


quarta-feira, 10 de maio de 2023

OAB, cadê você? - Marcel van Hattem

Vozes - Gazeta do Povo 


 Lula CPMI
Prerrogativas dos advogados de 8 e 9 de janeiro estão sendo violadas.| Foto: Andre Borges/EFE

Advogados de presos nos dias 8 e 9 de janeiro por ordem do ministro do Supremo Alexandre de Moraes estiveram nesta terça-feira (9) no Salão Verde da Câmara dos Deputados para denunciar os abusos e desrespeitos de suas prerrogativas que estão sofrendo. Desalentados, sem a quem recorrer uma vez que sequer a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) lhes dá suporte – isso quando não demonstra estar aliada aos algozes dos profissionais que deveria representar e defender –, buscaram no Congresso Nacional espaço para dar voz a suas angústias. Felizmente, encontraram.
 
Em quase uma hora e meia de evento público, defensores regularmente constituídos revezavam-se com parlamentares para denunciar, diante da imprensa e dos demais presentes que se aglomeravam no salão, os abusos e desrespeitos às suas prerrogativas.  
Desde a negativa de acesso dos advogados às pessoas presas quando ainda estavam na Academia da Polícia Federal até o fato de que Alexandre de Moraes antecipou seu julgamento pelo Twitter qualificando todos os presos como terroristas e criminosos, indistintamente, e, mesmo assim, não ter se declarado suspeito para julgá-los, a lista de abusos elencados pelos representantes vai literalmente de A a Z, incluindo K, W e Y.

    Alexandre de Moraes trata seus perseguidos políticos pior do que a animais de abate, aos quais no Brasil também são garantidos direitos em lei.

Pior do que pau que nasce torto, o inquérito 4879, dos ditos “atos antidemocráticos”, não só é impossível de endireitar: ele também enverga nossa Constituição aos ditames de um único senhor.         Além da manifesta incompetência de um ministro da Suprema Corte de processar quem não tem foro privilegiado, é também humanamente impossível que Alexandre de Moraes, e apenas ele, cuide bem dos milhares de processos hoje em suas mãos
Ainda mais humanamente impossível é que uma decisão do magistrado de tornar réu um preso preventivo se dê apenas cinco minutos após o upload da sustentação oral de seu advogado, em uma decisão de 24 laudas. Cinco minutos, 24 laudas. A total ausência de critério e análise é patente, a perseguição política é inquestionável.

E é a esse lamentável ponto que chegamos: a preferência política dos presos, a maioria dos quais agora réus de baciada, é o que está claramente a determinar sua sina. Por terem se manifestado contrariamente à eleição e posse de um candidato à Presidência da República, algo que sempre foi garantido à oposição de qualquer partido ou candidato no Brasil, cidadãos seguem presos ou, os que soltos já foram, com restrições de liberdades como o uso de tornozeleira eletrônica e apresentação periódica às autoridades de suas circunscrições. Refiro-me obviamente a quem nada depredou e contra quem até o momento nem uma única prova de que teve participação nos eventos violentos do dia 8 foi produzida pelo Estado.

Tratar pessoas pacíficas, ordeiras, com profissão lícita e residência fixa, pior do que são tratados criminosos da pior espécie é negar-lhes o mais básico dos direitos humanos
Alexandre de Moraes trata seus perseguidos políticos pior do que a animais de abate, aos quais no Brasil também são garantidos direitos em lei. Infelizmente, não há sinal de recuo ou de reconhecimento do arbítrio e do abuso. Pelo contrário: pessoas com câncer e outras comorbidades, algumas das quais definhando no cárcere injusto após terem perdido mais de 15 quilos ; famílias destruídas, humilhadas por um Estado de exceção que as persegue até mesmo do lado de fora da prisão; e advogados que não contam nem com o apoio da OAB para enfrentar tamanho desrespeito com a própria profissão e ofício. Nada disso, até aqui, abalou a injusta e ilegal sanha persecutória de um ministro.
 
Esta é a íntegra da petição dos advogados presentes ontem à coletiva de imprensa. Infelizmente, apesar da grande presença de meios de imprensa nacionais no evento, até o momento a repercussão restringiu-se apenas aos veículos que já têm, felizmente, dado atenção ao assunto. Por outro lado, as redes sociais não param de replicar o clamor dos advogados por justiça e pelo respeito às suas prerrogativas
Por que será mesmo que Lula e o STF, com apoio vergonhoso de grande parcela da mídia, querem censurar as plataformas de mídias sociais?

É preciso seguir denunciando a ditadura do Judiciário que funciona a pleno vapor no Brasil. No caso do desrespeito das prerrogativas dos advogados, a Constituição é clara em seu artigo 133: "o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão nos limites da lei". 

Diante de tantas violações às prerrogativas daqueles que são fundamentais para que se faça verdadeiramente justiça no Brasil, pergunta-se: OAB, cadê você?

Marcel van Hattem, deputado federal em segundo mandato - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 19 de novembro de 2022

Seccionais da OAB se manifestam contra Moraes

Advogados criticam bloqueio de contas bancárias de 43 supostos financiadores de protestos de caminhoneiros ao redor do Brasil

Dez seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) se manifestaram contra a decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de bloquear contas bancárias de 43 supostos financiadores (pessoas físicas e jurídicas) de protestos de caminhoneiros ao redor país. [pouco  a pouco a desaprovação, a contestação das decisões do presidente do TSE passam a ser expressas pelos mais diferentes setores da sociedade;
- antes tais decisões eram apenas chororô dos bolsonaristas e explosões de raiva do presidente Bolsonaro - agora além dos protestos se expandirem em número, localidades e formas, começam a surgir manifestações de solidariedade às vítimas do supremo arbítrio - casa das seccionais que não protestam contra as eleições, e sim contra as medidas para combater os que protestam contra o processo eleitoral; 
- os comandantes militares se manifestaram impondo, ainda que de forma sutil, limites ao que pode ser determinado para combater os manifestantes;
- prender, maltrata os que são presos, mas para cada preso muitos outros aderem aos protestos;
- as multas de R$100 mil/hora, são inócuas, incobráveis,  - alcançam todos os tipos de veículos e no Brasil mais da metade dos veículos de passeio valem menos de R$ 50 mil - meia hora parado em um bloqueio pode resultar na aplicação de multa em valor superior ao do veículo. 
O cara abandona o veículo e vão cobrar a multa de quem?
De concreto, é a intensificação dos movimentos - caminhoneiros estão parando menos, mas de forma esparsa, o que dificulta o próprio combate aos bloqueios - multar o diretor-geral da PRF,  por suposta omissão, não vai funcionar = mesmo que viva 100 anos não vai  ganhar o suficiente para pagar multas a razão de R$2,400.000,00/dia.] 
Representações regionais da OAB acionaram o Conselho Federal da entidade
Representações regionais da OAB acionaram o Conselho Federal da entidade | Foto: Nelson Jr./SCO/STF

No documento, as seccionais observam que, ao congelar os recursos, Moraes não notificou o Ministério Público Federal, previamente, tampouco os que estariam por trás das manifestações. “Dessa forma, houve afastamento dos consagrados princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório”, constataram as seccionais, em um documento enviado ao Conselho Federal da OAB, na sexta-feira 18, e obtido por Oeste.

Adiante, as seccionais lembram que a canetada do ministro afetou uma série de trabalhadores vinculados às empresas, que, agora, estão impedidas de realizar pagamentos de salários e honrar dívidas com fornecedores.

Também o documento menciona que os advogados dos alvos de Moraes não conseguem acesso aos autos do processo, de modo a entenderem o que está ocorrendo. Por isso, o pedido das seccionais afirma que as prerrogativas dos advogados estão sendo violadas no país, o que é totalmente inconstitucional.

Por fim, as seccionais pedem à OAB que analise, em regime de urgência, a constitucionalidade da decisão de Moraes, “considerando possível malferimento, em tese, de preceitos constitucionais consagrados, em especial os artigos 5º, LIV, LV e 93, IX da Constituição, bem como, do fundamento basilar da dignidade da pessoa humana, que também merece especial atenção”.

“Solicitamos que sejam avaliadas medidas para que se evitem violações às prerrogativas da advocacia, em especial no que se refere o acesso aos autos em que foram proferidas as decides ora mencionadas, garantindo desta forma o amplo e irrestrito exercício profissional”, conclui o texto, assinado pelas seccionais do Acre, Distrito Federal, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Sul e Rondônia.

Redação - Revista Oeste


segunda-feira, 6 de setembro de 2021

OAB reage à convocação de advogada de Bolsonaro pela CPI

A entidade ressaltou que o sigilo profissional legal do advogado não pode ser "relativizado ou colocado em segundo plano"

Após a advogada Karina Kufa, defensora do presidente Jair Bolsonaro, ser convocada a depor na CPI da Covid, a Ordem dos Advogados do Brasil classificou como "inequívoca violação das prerrogativas da advocacia" e "tentativa inaceitável de criminalização da profissão" a eventual aprovação de requisições para que defensores deponham sobre fatos que eles tiveram conhecimento através do ofício.
 

 Crédito: Reprodução - Facebook
 
A entidade ressaltou que o sigilo profissional legal do advogado não pode ser "relativizado ou colocado em segundo plano", uma vez que se configura como uma "garantia em prol do cidadão, para assegurar o estado de direito, bem como para evitar que a defesa se transmude em acusação". "Nas situações que existirem advogados exercendo regularmente sua profissão, independente da parte que ele defenda ou da sua posição processual, estará a Ordem dos Advogados do Brasil atuando na preservação de suas garantias profissionais, e reagirá energicamente sempre em defesa dos seus inscritos", registrou em nota a Procuradoria Nacional de Defesa das Prerrogativas da OAB.
 
Os advogados de Karina haviam reagido na mesma linha, classificando a convocação como uma "tentativa de constrangimento" em razão de seus clientes. Após seu nome ser citado durante sessão marcada pelo depoimento do empresário José Ricardo Santana, a própria advogada reagiu. Na ocasião, foi levantado que ela teria dado um jantar em que Santana teria conhecido o lobista Marconny Ribeiro. Juntos, Ribeiro e Santana enviaram ao Ministério da Saúde um "passo a passo" de como fraudar licitações.
"Fazer churrasco não é crime. Conhecer pessoas não é crime. O anfitrião não está obrigatoriamente vinculado aos atos, anteriores ou posteriores, dos convidados", afirmou a advogada em nota na ocasião.
 
Política - Correio Braziliense

quarta-feira, 30 de junho de 2021

Quem pode investigar o presidente da República

Thaméa Danelon - Gazeta do Povo

CPI da Covid já quis convocar o presidente Jair Bolsonaro para depor, mas isso não é possível pela legislação vigente.

O chefe máximo do Poder Executivo apresenta algumas imunidades e prerrogativas no que se refere à pratica de crimes comuns. Em se tratando de crimes de responsabilidade, que na verdade é uma infração político-administrativa e não de fato um crime, o presidente da República pode sofrer um processo de impeachment perante o Poder Legislativo. A Câmara dos Deputados aprecia a admissibilidade da acusação, e o processo e julgamento ocorre perante o Senado Federal.

Os crimes de responsabilidade estão previstos na Lei do Impeachment, que é a Lei 1.079/50. Havendo a condenação pela prática de crime de responsabilidade, o presidente da República sofre duas penalidades: a perda da função pública e a inelegibilidade por 8 anos. Por outro lado, caso um presidente venha a praticar um crime comum, ou seja, aqueles previstos no Código Penal ou em leis especiais, a investigação e eventual processo tramitará perante o Supremo Tribunal Federal (STF), Corte onde o chefe máximo do Executivo apresenta foro privilegiado.

Contudo, o presidente da República possui algumas imunidades, pois ele somente pode ser processado por crimes relativos ao exercício de sua função. Caso o procurador-geral da República venha a processar o presidente pela prática de crimes relativos à sua função, antes do STF analisar o pedido de abertura de ação penal, é necessário que a Câmara dos Deputados analise essa acusação; assim o presidente somente poderá ser processado se a Câmara permitir.

Essa análise é política, logo não é exclusivamente jurídica, assim, ainda que os deputados se convençam de que há provas da prática de crime, eles podem entender que politicamente não seria conveniente dar início à uma ação penal contra o presidente. Para que o processo penal possa ser iniciado, é necessário que 2/3 dos deputados federais autorizem a abertura da ação criminal. [342 deputados precisam aprovar o inicio do processo - havendo apenas 341 deputados presentes, a sessão sequer é aberta.]

Ilustrando a questão, em setembro de 2017, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, processou por duas vezes o presidente Michel Temer (MDB) pela prática de crimes de organização criminosa e corrupção passiva, dentre outros, no episódio envolvendo o empresário Joesley Batista, da JBS, e descobertos na Operação Patmos. Contudo, a Câmara dos Deputados não autorizou a abertura das ações penais.

Essa análise feita pela Câmara dos Deputados é um exemplo concreto do sistema de freios e contrapesos da nossa democracia, onde o Poder Legislativo analisa a abertura de um processo judicial que será julgado pelo Poder Judiciárioenvolvendo o chefe do Poder Executivo. Havendo a autorização da Câmara para a abertura de processo criminal contra o presidente, e sendo recebida a denúncia pelo STF, o presidente da República ficará suspenso de suas funções por 180 dias, assumindo seu posto o vice-presidente da República.

Uma outra prerrogativa concedida ao presidente diz respeito à prisão,
pois ele só poderá ser preso quando for condenado, não havendo a possibilidade de prisão em flagrante delito e nem preventiva. [em outras palavras: nenhuma instituição ou autoridade poderá determinar a prisão preventiva do presidente da República, ou efetuar sua prisão em flagrante delito = a regra se aplica também ao Supremo, de forma coletiva ou monocrática, o que impede que o presidente seja alcançado pela criação do ministro Alexandre de Moraes = o mandado de prisão em flagrante, que equivale, na prática a criação do flagrante perenemente possível.] Assim, a imunidade prisional do presidente da República é ainda maior que a dos deputados federais e senadores, pois estes podem ser presos em flagrante delito de crimes inafiançáveis.

CPI pode investigar o presidente?
E no que se refere às CPIs?  
Elas podem investigar um presidente da República? 
No meu entendimento não, pois a Constituição prevê que o chefe do Poder Executivo somente poderá ser investigado pela prática de crime comum pelo procurador-geral da República e perante o STF; logo não cabe às Comissões Parlamentares de Inquérito investigar atos eventualmente praticados pelo presidente.

Nesse sentido, o presidente não poderia ser convocado para prestar depoimento em uma CPI, sob pena de violação ao Princípio da Tripartição dos Poderes. O presidente somente poderia depor perante o Poder Legislativo caso estivesse respondendo a um processo por crime de responsabilidade; então, neste caso, haveria a possibilidade de ser ouvido perante o Senado Federal, contudo, não em uma CPI.


Thaméa Danelon, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


quinta-feira, 21 de maio de 2020

As razões dos militares - William Waack

O Estado de S.Paulo

Eles suportam um governo que embarcou numa perigosa aventura 

Os militares que estão no governo aparentemente não comandam. Por motivo simples: uma coisa é a aptidão técnica e a formação intelectual para planejar e executar considerando meios e fins. Para isso os militares foram muito bem preparados em suas academias, que equivalem a escolas de business comparáveis às melhores lá de fora.

Outra coisa é o exercício da política, aprendizado que não está nos currículos dessas academias. Tem sido mais fácil para os militares no governo se apegar a seu padrão ético de “cumprir a missão”, “obedecer ao comando hierárquico” e “não abandonar o barco em dificuldades” do que enxergar que prestígio e respeito pacientemente recuperados pelas Forças Armadas após o regime que instauraram e conduziram por 21 anos estão naufragando pelo suporte que emprestam ao que hoje, sob Bolsonaro, deriva numa aventura rumo ao abismo.

O que os levou a pular para a carruagem do atual presidente, que estava longe de ser a primeira escolha deles, foi a noção de esgarçamento do tecido social e de desagregação institucional ilustrada por dois episódios significativos ainda no início da campanha eleitoral de 2018. O primeiro foi o fica ou sai de Lula da cadeia em Curitiba, devido a uma sequência de canetadas do Judiciário. Bagunça que por um triz não levou à desordem. O segundo foi a bagunça mesmo criada pela greve dos caminhoneiros.

[consertar o Brasil, desmontar o mecanismo é realmente uma missão perigosa, só que: "MISSÃO DADA,MISSÃO CUMPRIDA."        Questionar uma missão, ainda que pela primeira vez, é algo que tem que ser cuidadosamente analisado, em todas as suas implicações, caso contrário estará se abrindo as portas para quebra da HIERARQUIA e DISCIPLINA.]

A um candidato sem planos, além de frases de efeito, os militares levaram seriedade, confiabilidade e gente experiente em logística, gestão de recursos, planejamento, disciplina e hierarquia. Acharam que a onda disruptiva que destruiu a reputação de políticos, partidos, imprensa e várias instituições se traduziria num “momento” político capaz de fazer prosperar mesmo num Legislativo hostil a reformas, à transformação do Estado e por aí vai. Não estavam sozinhos nessa mescla de fé e esperança, combinadas a um pouco de cálculo.

Faltou o lado político, pelo qual Bolsonaro enveredou da pior forma possível. Preferiu renunciar ao exercício de seu maior poder, que é ditar a agenda. Preferiu concentrar-se no afago à suas parcelas de seguidores incondicionais, que estão diminuindo. Jogou fora várias oportunidades de se tornar uma voz pregando convergência, união, pacificação, concentração de esforços. Perdeu tempo e, com a pavorosa crise do coronavírus, perdeu também a moral.

Na mais recente grande crise do governo, a da saída de Sérgio Moro, os militares encontraram como conveniente justificativa para tolerar um governo no mínimo errático a postura do STF de limitar as prerrogativas do Executivo. Além de legislar, o Judiciário em alguns casos até governa, ou não deixa governar. Há um forte debate jurídico e acadêmico sobre o tema, mas militares e políticos, e não só os do Centrão, avaliam esse fato como usurpação de prerrogativas.

Portanto, sob essa ótica, é até “compreensível” o flerte nada discreto do presidente com a crise institucional que os militares não querem que aconteça. O problema político que eles não resolveram é traçar a linha entre o que é “suporte institucional” a um governo destrambelhado e o que é cumplicidade com o destrambelhamento. É o tipo de coisa, porém, que só fica bem clara depois.

Parece evidente neste momento que está além da formação técnica e doutrinária dos militares resolver um nó que é político na mais pura essência. O símbolo de tudo isso é um general, que não é médico, liberando [autorizando.] no Ministério da Saúde um documento contendo protocolo de tratamento que médicos que o antecederam não quiseram assinar – e se recusaram a fazê-lo por razões técnicas, e o general o fez por razões políticas do presidente da República.  São razões que passaram a ser, por conivência, conveniência ou inércia, as razões também dos homens que vestiram ou vestem fardas.

William Waack, jornalista - O Estado de S. Paulo


terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Pedras na Geni - O Globo

Antonio Pedro Pellegrino 


Há privilégios que precisam ser extintos no funcionalismo, mas prerrogativas, que de privilégio nada têm, precisam subsistir

No Brasil de hoje, quando se fala em serviço público, nos deparamos com um verdadeiro festival de barbaridades. Se, num dia, assistimos boquiabertos a um procurador de Justiça esbravejar contra o seu “miserê” de 24 mil mensais, noutro, os salvadores da pátria de plantão não deixam o nosso espanto esmorecer: o funcionalismo público é parasitário, proclama-se em alto e bom som. Essas duas manifestações representam bem o embate no qual o Brasil está imerso. De um lado, os funcionários públicos, esses marajás que ganham muito e trabalham poucovociferam alguns; de outro, uma parcela significativa da sociedade que, debaixo de discursos como o da eficiência, escondem um ódio capaz de fazer quem o sente perder as estribeiras. É justamente a origem desse ódio que pretendo investigar nas próximas linhas.


Antes de prosseguir, diga-se o óbvio: no meio do funcionalismo, realmente, há privilégios que precisam ser extintos, como também, por outro lado, prerrogativas institucionais que de privilégio não têm nada, e que, portanto, precisam subsistir. Contudo, não é objetivo deste artigo analisar se isso ou aquilo deve ser mantido ou não. Foquemos, pois, no que interessa.

Eis o meu argumento: a Constituição de 88, na medida em que exigiu concurso para o provimento de cargos públicos, constituiu para grande parcela da sociedade brasileira uma brusca ruptura, já que abalou a tradição brasileira de ver no Estado uma extensão da família. A propósito, veja-se que, já no Império, Joaquim Nabuco via no funcionalismo o asilo das antigas famílias ricas e fidalgas.

Com a República, a ocupação do espaço público por apadrinhados, ao contrário do que se poderia supor, não diminuiu, bastando tomar como exemplo as famílias que, por gerações e gerações, tiravam suas fortunas de cartórios, os quais lhes eram, não raro, presenteados pelos políticos da ocasião. Porém, com a Constituição de 88, a farra acabou, passando-se a exigir concurso público para o exercício da atividade cartorária.

O ódio, pois, com relação ao funcionalismo público nasce, em grande parte, de uma perda de espaço, isto é, cargos outrora ocupados por quem achava que a eles tinha direito por uma questão de sangue passaram a ser ocupados por “estrangeiros”, pessoas que, criadas em famílias sem contatos no “andar de cima”, dependiam única e exclusivamente de seu suor para conquistar o que almejavam.

No ponto, escutemos Freud, para quem, nas massas, a impressão do passado permanece conservada no inconsciente. O esquecido, assim, não é apagado, mas apenas recalcado, o qual, diante de certas circunstâncias, vem à tona com uma força avassaladora. Aplicando-se a teoria à nossa realidade, temos que o ódio ao funcionalismo público, em estado de latência desde que a Constituição de 88 democratizou o acesso aos cargos públicos, encontrou sua válvula de escape na reforma administrativa do governo Bolsonaro.

Nesse sentido, declarações como a do ministro Paulo Guedes de que, além de parasitas, os funcionários públicos filiados a partidos políticos não deveriam ter estabilidade, pelo absurdo de seu teor, as colocam na categoria de ato falho. Nessa condição, elas põem a nu o que de fato anima o ministro Guedes na sua cruzada contra o funcionalismo: a produção de funcionários públicos nos moldes do “Amanuense Belmiro”, de Cyro dos Anjos, isto é, cabisbaixos, inofensivos, domesticáveis e, obviamente, sem dinheiro para ir à Disney. É preciso resistir.

Antonio Pellegrino, procurador  - O Globo


quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Cristiane Brasil sai, mas o precedente fica

Com o recuo do PTB, [recuo avalizado pelo presidente da República, que  foi desautorizado com a contestação da sua autoridade, de forma indevida, ilegal (de tal modo que a ministra presidente do STF, a falta de argumentos, engavetou o processo, quando o correto seria submeter ao Plenário da Suprema Corte)  - e ofensiva à Constituição Federal ] fica consagrado o perigoso entendimento que permite interferências indevidas do Poder Judiciário em atos de competência exclusiva do chefe do Poder Executivo

O impasse sobre a nomeação da deputada federal Cristiane Brasil (PTB-RJ) para o Ministério do Trabalho, terminou. O PTB, “dono” da pasta, nesse peculiar arranjo que caracteriza o “presidencialismo de coalizão” brasileiro, recuou e já procura outro nome para ser confirmado pelo presidente Michel Temer. A ala ligada a Roberto Jefferson, pai de Cristiane, quer efetivar o interino Helton Yomura, mas outros petebistas são refratários ao nome, inclusive Ronaldo Nogueira, o ex-titular da pasta. A dificuldade de emplacar um deputado estaria no fato de que quase todos eles querem disputar algum mandato nas eleições de outubro, e por isso precisariam deixar o ministério em pouco tempo.

Mas o nome do novo titular é o que menos interessa quando se discute as implicações do recuo petebista no arranjo institucional brasileiro: criou-se um perigoso precedente que dá ao Judiciário o poder de atropelar o Executivo em nomeações que, como diz a Constituição em seu artigo 84, são competências privativas do presidente da República.

Desfere-se um golpe decisivo contra as prerrogativas do presidente da República
Em primeiro lugar, há de ser dito que, em uma República decente, Cristiane Brasil jamais seria considerada para um ministério. Mas sólidos critérios morais na escolha dos ocupantes da Esplanada dos Ministérios são algo que tem passado longe do Planalto, nesta gestão e nas anteriores. Ainda assim, o caso de Cristiane Brasil, com seus processos e acordos na Justiça do Trabalho, nem de longe configurava o atentado à moralidade que foi alegado por Leonardo Couceiro, da 4.ª Vara Federal de Niterói (RJ), o primeiro a conceder uma liminar suspendendo a posse marcada para 9 de janeiro. 


Condenações na Justiça do Trabalho são algo tão frequente no país – situação para a qual também contribuíam o engessamento da legislação antes da reforma trabalhista e o viés de setores da magistratura que apenas uma minoria daqueles que já assinaram alguma carteira de trabalho na vida passaria incólume a esse escrutínio. De maneira nenhuma isso seria uma circunstância inabilitante. Isso sem mencionar que, anteriormente, dois juízes já tinham negado pedido semelhante, alegando a necessidade de preservar “a própria forma de funcionamento da República”, nas palavras de Ana Carolina de Carvalho, da 1.ª Vara Federal de Magé (RJ).

O governo perdeu todos os recursos no Tribunal Regional Federal da 2.ª Região, mas reverteu a decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Por fim, ainda durante o recesso judicial, a presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, provocou nova reviravolta e suspendeu novamente a posse de Cristiane, que estava prestes a ocorrer depois da decisão do STJ. Na semana passada, Cármen Lúcia manteve a suspensão e ainda decidiu que a competência para analisar o caso era do STF, não do STJ. [caberia à ilustre ministra, caso não tivesse a certeza de que sua decisão seria derrubada no Plenário do STF, ao decidir que a competência era do STF, e não do STJ, já pautar o exame da matéria pela Corte Suprema, mas,não pautou, deixou o assunto para as calendas gregas.]

Com o recuo do PTB, parece pouco provável que o plenário do Supremo julgue o caso; assim, para todos os efeitos o entendimento adotado daqui em diante será o que prevaleceu até agora: 

o de que o Judiciário pode, sim, barrar nomeações com base no critério da moralidade. [se um patrocinador de ações descabidas tipo aquele senador da Rede - líder dele mesmo - requerer a um juiz de primeiro grau a suspensão da intervenção federal no Rio de Janeiro e este juiz deferir;
a intervenção será suspensa? Dúvida atroz, já que da mesma forma que a nomeação de um ministro, a decretação da intervenção federal é da competência do presidente da República.]

Ressalte-se que não estamos falando de casos em que a ilegalidade está na própria nomeação como ocorreu quando Dilma Rousseff tentou fazer de Lula seu ministro da Casa Civil, em evidente desvio de finalidade –, mas de casos em que um magistrado julga que certa pessoa é moralmente inepta para assumir um cargo ministerial.

Desfere-se um golpe decisivo contra as prerrogativas do presidente da República. “Não entendo possível que a disfunção no funcionamento de um dos poderes possa ser substituída por decisões judiciais. Caso contrário, seria possível a impugnação de quaisquer nomeações por desafetos políticos ou por questões ideológicas, o que criaria grande insegurança na administração da coisa pública”, completou a juíza Ana Carolina de Carvalho. É até onde as consequências do caso de Cristiane Brasil podem nos levar.

Gazeta do Povo - PR