Se as ruas do Rio enchem com bueiros entupidos e tiros ecoam pela cidade, Crivella vai cantar em Brasília
Não sei por quanto tempo uma cidade consegue
sobreviver sem prefeito. O Rio de Janeiro está tentando. Durante a
campanha, Marcelo Crivella disfarçava seu propósito maior. Mas, na
semana passada, ao cantar, da tribuna no Senado, em Brasília, uma música
de sua autoria, “Perfume Universal”, que exalta o “sacrifício e
coragem” de sua igreja e de seu tio, Edir Macedo, Crivella mostrou a que
veio.
É só o que ele sabe fazer – e suas viagens internacionais para cultos e encontros com representantes da igreja comprovam. Foi assim na África do Sul, na Rússia. Crivella está prefeito, mas é pastor. Seis meses da atual prefeitura deixaram o carioca com uma certeza: não há ninguém no comando da cidade. O pior é que fica por isso mesmo. Diante de inundações ou de tiroteios, Crivella reage da mesma forma. Zero. O rosto não trai emoção. O prefeito não passa no teste.
Se chove a cântaros e as ruas se enchem com bueiros entupidos, ele só aparece depois. No meio do caos, o carro de Crivella bate em outro carro e ele não se digna a abrir a janela, prefere bater em retirada para casa. Tiros ecoam pela cidade, o trânsito dá um nó com protestos por mortes – mas o “prefeito-pastor” não se amofina. Vai cantar na capital. Comanda um culto na Câmara Alta do Congresso, em sessão de homenagem aos 40 anos da Universal. O Estado é laico. Isso não é normal.
Dizia assim a música de Crivella: “Na perseguição que a Universal sofre em todo lugar/Na dor de ver o seu líder levado à prisão/Na força que existe entre nós/Na fé que nos põe de pé/Na união que faz todos irmãos/Ainda existe aquele perfume espalhado no ar”. O tio do prefeito, o bispo Edir Macedo, preso em 1992, acusado de estelionato, foi convidado, mas não compareceu.
Com todo o respeito, o afinado Crivella deveria cantar em casa no chuveiro. Ou em eventos particulares e familiares. Durante seu mandato, que não é divino, teria ao menos de fingir que é prefeito do Rio. A cidade está órfã e precisa que alguém cuide dela. A atual prefeitura teima em desafinar.
Foi uma semana de belas praias e muita violência no Rio. Uma granada lançada por traficante matou um porteiro que almoçava em Copacabana. Houve perseguição e troca de tiros em autoestrada. Teve gente baleada em confrontos com policiais em vários pontos da cidade. A Rocinha bloqueou o túnel que liga o Leblon a São Conrado e parou o trânsito, em protesto contra a morte de um jovem esfaqueado. Um universitário foi assassinado a tiro na Barra da Tijuca ao reagir ao roubo de sua motocicleta. Um policial foi morto em tentativa de assalto em Bonsucesso, Zona Norte.
E onde estava Crivella? O que fez Crivella em seis meses? Meio ano? Além de criar caso com o samba e o Carnaval, fez exatamente o quê? Nomeou o filho Marcelinho para a Casa Civil, um exercício de nepotismo vetado pelo ministro do STF Marco Aurélio Mello. Talvez fosse melhor deixar o Marcelinho assumir. Quem sabe era esse o plano original de Crivella: colocar o filho para trabalhar em seu lugar enquanto viaja e canta. O prefeito entrou com recurso e o ministro negou novamente na semana passada. O caso será julgado pelo plenário do Supremo. Santa paciência tem o STF.
Ok, a população do Rio elegeu o bispo licenciado Crivella como prefeito. Todo mundo já sabia que ele gostava de compor, rezar e amar. Até aí, nada. Seria até positivo ter um prefeito com fé, a mente aberta e dons artísticos. Mas Crivella não é conhecido por sua tolerância à diversidade cultural, sexual ou religiosa. Ao contrário. Que não inviabilize a Parada Gay do Rio com discursos demagógicos, como tenta fazer com o Carnaval, o atual bicho-papão das criancinhas nas creches. O prefeito passa para o eleitorado uma mensagem messiânica. Na surdina, mina avanços e conquistas contra a homofobia.[este é um dos poucos pontos positivos do Crivella, apesar de ser ofuscado pelo deboche que faz a conduta repugnante de um 'bispo' da Igreja Universal ao chutar uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil.
Destaque-se que apesar da má fama que carrega - merecida, por sinal - a Câmara Legislativa do DF acertou uma quando cancelou um estúpido decreto do Rollemberg que pretendia oficializar as aberrações LGBT no DF.]
Continuar lendo em Época
>> Todas as colunas de Ruth de Aquino
É só o que ele sabe fazer – e suas viagens internacionais para cultos e encontros com representantes da igreja comprovam. Foi assim na África do Sul, na Rússia. Crivella está prefeito, mas é pastor. Seis meses da atual prefeitura deixaram o carioca com uma certeza: não há ninguém no comando da cidade. O pior é que fica por isso mesmo. Diante de inundações ou de tiroteios, Crivella reage da mesma forma. Zero. O rosto não trai emoção. O prefeito não passa no teste.
Se chove a cântaros e as ruas se enchem com bueiros entupidos, ele só aparece depois. No meio do caos, o carro de Crivella bate em outro carro e ele não se digna a abrir a janela, prefere bater em retirada para casa. Tiros ecoam pela cidade, o trânsito dá um nó com protestos por mortes – mas o “prefeito-pastor” não se amofina. Vai cantar na capital. Comanda um culto na Câmara Alta do Congresso, em sessão de homenagem aos 40 anos da Universal. O Estado é laico. Isso não é normal.
Dizia assim a música de Crivella: “Na perseguição que a Universal sofre em todo lugar/Na dor de ver o seu líder levado à prisão/Na força que existe entre nós/Na fé que nos põe de pé/Na união que faz todos irmãos/Ainda existe aquele perfume espalhado no ar”. O tio do prefeito, o bispo Edir Macedo, preso em 1992, acusado de estelionato, foi convidado, mas não compareceu.
Com todo o respeito, o afinado Crivella deveria cantar em casa no chuveiro. Ou em eventos particulares e familiares. Durante seu mandato, que não é divino, teria ao menos de fingir que é prefeito do Rio. A cidade está órfã e precisa que alguém cuide dela. A atual prefeitura teima em desafinar.
Foi uma semana de belas praias e muita violência no Rio. Uma granada lançada por traficante matou um porteiro que almoçava em Copacabana. Houve perseguição e troca de tiros em autoestrada. Teve gente baleada em confrontos com policiais em vários pontos da cidade. A Rocinha bloqueou o túnel que liga o Leblon a São Conrado e parou o trânsito, em protesto contra a morte de um jovem esfaqueado. Um universitário foi assassinado a tiro na Barra da Tijuca ao reagir ao roubo de sua motocicleta. Um policial foi morto em tentativa de assalto em Bonsucesso, Zona Norte.
E onde estava Crivella? O que fez Crivella em seis meses? Meio ano? Além de criar caso com o samba e o Carnaval, fez exatamente o quê? Nomeou o filho Marcelinho para a Casa Civil, um exercício de nepotismo vetado pelo ministro do STF Marco Aurélio Mello. Talvez fosse melhor deixar o Marcelinho assumir. Quem sabe era esse o plano original de Crivella: colocar o filho para trabalhar em seu lugar enquanto viaja e canta. O prefeito entrou com recurso e o ministro negou novamente na semana passada. O caso será julgado pelo plenário do Supremo. Santa paciência tem o STF.
Ok, a população do Rio elegeu o bispo licenciado Crivella como prefeito. Todo mundo já sabia que ele gostava de compor, rezar e amar. Até aí, nada. Seria até positivo ter um prefeito com fé, a mente aberta e dons artísticos. Mas Crivella não é conhecido por sua tolerância à diversidade cultural, sexual ou religiosa. Ao contrário. Que não inviabilize a Parada Gay do Rio com discursos demagógicos, como tenta fazer com o Carnaval, o atual bicho-papão das criancinhas nas creches. O prefeito passa para o eleitorado uma mensagem messiânica. Na surdina, mina avanços e conquistas contra a homofobia.[este é um dos poucos pontos positivos do Crivella, apesar de ser ofuscado pelo deboche que faz a conduta repugnante de um 'bispo' da Igreja Universal ao chutar uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil.
Destaque-se que apesar da má fama que carrega - merecida, por sinal - a Câmara Legislativa do DF acertou uma quando cancelou um estúpido decreto do Rollemberg que pretendia oficializar as aberrações LGBT no DF.]
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