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sexta-feira, 16 de junho de 2023

O sétimo continente - Revista Oeste

 Evaristo de Miranda

A cada minuto o equivalente a um caminhão de lixo plástico é lançado nos oceanos. A quantidade aumentou 50% nos últimos cinco anos

Grande mancha de lixo no Oceano Pacífico | Foto: Reprodução/Caroline Power
 
Revista Oeste - Cortesia

A palavra “continente” tem origem no polissêmico verbo “conter”, do latim con e tenere (“ter”). A continência, ao contrário da incontinência, expressa a capacidade fisiológica, psicológica, social e até política de limitar-se, de parar, de deter-se. “Continente” deriva de continens (“contínuo, ininterrupto”) e entis (particípio presente de continere: “conter, abranger”). E, na geografia, designa amplas extensões contínuas de terra, cercadas por oceanos.

Os seis continentes levaram milhões de anos para se constituir. Agora, em menos de um século, um sétimo continente, de geometria variável, com mais de 2 milhões de quilômetros quadrados, se constitui entre a Califórnia e o Havaí. Os outros são feitos de rochas e terra. O sétimo “continente” está a se formar com resíduos plásticos, no centro de um vórtice de correntes marítimas.

(...)

Partículas com mais de 5 milímetros são chamadas de macroplásticos; e as inferiores, de microplásticos. As com menos de 10 milésimos de milímetro são nanoplásticos. Um nanômetro é igual a 1 bilionésimo de 1 metro. São mais de 5 mil categorias de polímeros, com 10 mil substâncias químicas incorporadas aos plásticos, em coquetéis de dez a 30 diferentes aditivos, em função de seus usos. E persistirão no ambiente por centenas de anos. A concentração média de plásticos é da ordem de 0,5 quilo por quilômetro quadrado de oceano. Os maiores valores estão nos Atlânticos Sul e Norte (1,2 e 0,8 quilo por quilômetro quadrado) e no Mediterrâneo (0,7 quilo por quilômetro quadrado). O desafio é global.

Essas partículas com poluentes persistentes acabam no estômago de peixes, águas-vivas, tartarugas, mamíferos marinhos e aves. E terminam por envenenar seus órgãos externos e internos. Mais de 300 espécies são afetadas por esse vórtex ou “sopa” de lixo plástico. O giro fluidodinâmico deixa escapar um pouco do conteúdo por dois braços, em direção ao Japão e aos Estados Unidos.

O conteúdo estomacal de um filhote morto de albatroz, alimentado por seus pais, inclui detritos marinhos de plástico. A fotografia foi tirada no Midway Atoll National Wildlife Refuge, no Pacífico, em setembro de 2009 | Foto: Chris Jordan/Greenpeace
(...)
Muitos animais marinhos são atraídos para esta pilha de detritos, em busca de comida | Foto: Divulgação/Greenpeace
Uma garrafa de plástico transparente é encontrada à deriva no oceano. Vivendo nessa única garrafa estavam briozoários, nudibrânquios, caranguejos e cracas | Foto: Justin Hofman/Greenpeace

Enquanto o mundo urbano busca soluções, a agropecuária brasileira é exemplar na gestão dos resíduos plásticos. Além da busca do lixo zero no processo produtivo, o correto destino das embalagens plásticas de insumos agrícolas mobiliza a cadeia produtiva desde a década de 1980. Os debates evoluíram até a aprovação da Lei Federal nº 9.974/2000 e a criação do Instituto Nacional de Embalagens Vazias (inpEV), em 2001. O inpEV, entidade sem fins lucrativos, integra o Sistema Campo Limpo e é responsável pela operacionalização da logística reversa das embalagens em todo o país. Integram o inpEV mais de 100 empresas e entidades do setor.

Como publicado na Revista Oeste, o manejo e a destinação ambientalmente corretos das embalagens vazias de defensivos agrícolas têm como regra as responsabilidades compartilhadas entre os agentes da produção: agricultores, canais de distribuição e cooperativas, indústria e poder público. Os usuários de defensivos agrícolas lavam, inutilizam (furam e cortam) e devolvem as embalagens vazias aos comerciantes. Estes indicam o local da devolução das embalagens pós-consumo, as mantêm e comprovam o recebimento. Os fabricantes se responsabilizam pela logística e pela correta destinação.

ÍNTEGRA DA MATÉRIA

Área desmatada para produção de cereais em região de fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina
Produção de cereais em região de fronteira entre Brasil, Paraguai e Argentina | Foto: Xico Putini/Shutterstock

Leia também “Planeta carnívoro e antropofágico”

 

Evaristo de Miranda, colunista - Revista Oeste


segunda-feira, 14 de fevereiro de 2022

Os sabotadores do agronegócio - Branca Nunes

Ataques sucessivos envolvem ONGs, jornalistas, governos estrangeiros e as chamadas revistas especializadas

Secas prolongadas e chuvas em excesso. Pragas e ervas daninhas, além de muita saúva. Foi-se o tempo em que esses eram os grandes inimigos do agronegócio brasileiro. Hoje, no Brasil, os sabotadores da agricultura e da pecuária são igualmente nocivos, mas combatê-los é bem mais difícil. Eles nascem em organizações não governamentais, brotam em redações jornalísticas, desenvolvem-se em agências de publicidade, crescem em gabinetes de Brasília, proliferam em governos estrangeiros e se camuflam nas chamadas “revistas especializadas”.

Em outubro de 2017, por exemplo, um artigo publicado pelo Psol qualificou de “ecocida” o agronegócio brasileiro, acusado de ter provocado um incêndio no Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros. Fernando Tatagiba, então diretor do parque, também tentou envolver na fogueira os fazendeiros da região, mesmo confessando que não existiam elementos suficientes para identificar culpados. “O fato de o incêndio ter surgido no interior do aceiro (espécie de trilha aberta no meio da vegetação ou próximo a estradas para tentar conter o avanço do fogo) me leva a crer que alguém adentrou no parque e botou fogo”, disse Tatagiba. “Não temos elementos para dizer quem é o responsável, mas podemos dizer, com certeza, que é criminoso.”

Uma reportagem do Estadão mostrou que a resposta não era tão singela. Os fazendeiros classificaram de absurda a acusação. “Estão politizando o incêndio, querendo criminalizar os produtores, quando o responsável por isso é o tempo seco”, disse Pedro Sérgio Beskow, produtor rural em Cavalcante e presidente da Associação Cidadania, Transparência e Participação, entidade que reúne pequenos e médios ruralistas da região. O texto não descartava a hipótese de o fogo ter-se originado de causas naturais.

Em outubro de 2021, militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) invadiram a sede da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), em Brasília, depredaram o local e picharam frases como “Agro é morte”, “Agro é fome” e “Soja não mata a fome”. O surto de vandalismo teve repercussão internacional — traduzida em manifestações de apoio aos baderneiros.

Em março passado, a fabricante de cervejas Heineken aderiu ao Dia Mundial sem Carne. “Que tal comer e beber mais verde?”, propunha uma postagem nas redes sociais da marca. “A cerveja feita com água, malte, lúpulo e nada mais é a opção perfeita para o acompanhamento de hoje.” Nove meses depois, o Bradesco teve uma ideia parecida. Num informe publicitário, o banco resolveu relacionar o aquecimento global à pecuária brasileira. No vídeo, três influenciadoras de YouTube sugeriam uma versão nacional da Segunda-Feira sem Carne, com o objetivo de preservar o meio ambiente.

As ofensivas também vêm do outro lado do Atlântico. “Depender da soja do Brasil é endossar o desmatamento da Amazônia”, delirou Emmanuel Macron, em janeiro de 2021.[o gênio francês é também o autor de plantar em segundo andar no território do país que preside.] O presidente da França conclamava os países europeus a produzir e consumir sua própria soja, para evitar a compra do grão que, na sua cabeça, “era feito a partir da floresta destruída”.  
 
Também essa declaração ecoou na imprensa historicamente desinformada. 
Além de não serem grandes produtoras de soja, as propriedades rurais localizadas na Amazônia são obrigadas a preservar 80% de sua área. 
“É como se você tivesse um carro, mas só pudesse usar o banco do motorista”, compara Michel Muniz, assessor do projeto Farmun, que estimula pesquisas científicas ligadas ao agronegócio em escolas de Mato Grosso. “Ou como uma casa de cinco cômodos, em que só um pode ser ocupado. Os outros devem ser arrumados e mantidos em ordem, mas ninguém pode usá-los.”

Entre os incontáveis sabotadores do agro brasileiro, os engajados em ONGs talvez sejam os mais agressivos. Em outubro do ano passado, a organização austríaca AllRise chegou à estratosfera: denunciou o presidente Jair Bolsonaro ao Tribunal de Haia por crime ambiental, em razão dos desmatamentos na Amazônia. Numa reportagem da BBC, a ONG afirmou que “as emissões de gases do efeito estufa advindas de queimadas e da pecuária em escala industrial na floresta são agora maiores que o total de emissões anuais da Itália ou da Espanha e estão levando a Amazônia em direção ao ponto de desequilíbrio, para além do qual a floresta entraria em estado de seca”. Para justificar o “crime contra a humanidade”, a ONG atribui ao desmatamento no Brasil “as ondas de calor e os incêndios florestais que se repetem no sul da Europa, em regiões do Oceano Pacífico da América do Norte e na Austrália, além de enchentes e outros problemas climáticos na Alemanha, Estados Unidos e China”.

Ciclo vicioso
“Em 2009, durante a convenção do clima, foi pactuado que os países ricos iriam mobilizar US$ 100 bilhões por ano para serem investidos nos países em desenvolvimento e pobres, para que eles pudessem fazer transformações tecnológicas”, lembra Eduardo Lunardelli, produtor rural e ex-secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente na gestão de Ricardo Salles. Estamos falando de R$ 1,2 trilhão. Só que eles não aportaram até agora nem sequer US$ 12 bilhões. Ou seja, 1% do prometido.” 
(...)

Essa dinheirama, contudo, acaba nas mãos de meia dúzia de ONGs. “Em muitos casos, é vetada a doação do dinheiro para a iniciativa privada, seja para pequenas empresas, cooperativas, tribos indígenas e outros agentes econômicos que não sejam ONGs”, diz Lunardelli. “Dessa forma, não há cooperação, inovação, inclusão, fomento ao empreendedorismo e à livre-iniciativa. Isso não beneficia quem está na ponta, não é usado contra o desmatamento nem para socorrer índios ou proteger a fauna e a flora silvestres. Os recursos são consumidos em estudos, workshops e viagens”.

Lunardelli acusa também a existência de um grande esquema envolvendo forças à esquerda.
“Se eu tivesse sido secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente no governo do PT, hoje estaria na FAO”, exemplifica. “Receberia o dinheiro para a locação, ficaria lá dois ou três anos, depois montaria uma ONG e iria para a ponta recebedora. Ou alguém realmente acredita que esses países estão doando dinheiro a fundo perdido para resolver um problema climático, ambiental?” 
 
Golpe baixo

Entre os beneficiários dessas doações, Lunardelli inclui dois dos 12 signatários de um artigo que configurou o mais recente golpe baixo contra o agronegócio brasileiro: Raoni Rajão, professor da UFMG, e o climatologista Carlos Nobre. Rajão é fundador do Laboratório de Gestão de Recursos Ambientais (Lagesa), integrado ao Departamento de Engenharia de Produção da Escola de Engenharia (Laesa, da UFMG), que tem estreitas relações com o Observatório do Código Florestal e com instituições ligadas aos governos da Noruega, dos Estados Unidos, da Alemanha. O Observatório é composto das ONGs WWF, Rede de ONGs da Mata Atlântica (RMA), SOS Mata Atlântica, The Nature Conservancy e Kanindé. JP Morgan, Intel e Ford são algumas das empresas envolvidas nessa rede.



Publicado na revista Biological Conservation, vinculada à empresa holandesa Elsevier, o artigo procura alvejar a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e um de seus mais respeitados membros: Evaristo de Miranda. 
Doutor em Ecologia e chefe-geral da Embrapa Territorial até dezembro do ano passado, Miranda é um dos mais respeitados especialistas em meio ambiente e agronegócio.
(...)
Para tentar desqualificar Miranda, que colaborou com todos os governos desde o presidido por José Sarney, o artigo começa por referir-se a ele como “guru ambiental de Bolsonaro”. A expressão foi usada pela revista Piauí em março de 2021. O conteúdo dos dois textos sugere que seus autores trocaram ideias intensamente.
 
Ficção e realidade
Entre as acusações infundadas a Miranda, está a de que sua influência contribuiu para o “afrouxamento de normas ambientais”. Outra crítica mira o novo Código Florestal, considerado pelo mundo inteiro — com exceção dos autores da Biological Conservation — o mais rigoroso do planeta. “O Código Florestal foi uma tentativa bem-sucedida de proteger o meio ambiente e, ao mesmo tempo, garantir segurança jurídica aos agricultores”, resumiu Aldo Rebelo, relator do código e ex-ministro dos governos Lula e Dilma Rousseff. “Ele é extremamente severo com os agricultores. É só pesquisar o tamanho da reserva legal que um proprietário sueco, por exemplo, destinada ao meio ambiente. No Brasil, são em média 50%.”

A Embrapa contribuiu para que o Brasil, importador de alimentos na década de 1970, se transformasse num dos maiores exportadores de produtos agrícolas

Para Gustavo Spadotti, chefe da Embrapa Territorial, uma das provas do sucesso do código é que nem ambientalistas nem produtores rurais ficaram totalmente satisfeitos. “Talvez tenha sido a lei mais debatida da história”, observa. “Foram cerca de 200 audiências públicas até se atingir o equilíbrio entre produção e preservação.” Nesta quinta-feira, 10, a Embrapa soltou uma nota em que divulga as mais de 15 manifestações de apoio que recebeu das principais entidades agropecuárias do país desde a publicação do artigo.

O currículo de Miranda mostra que é possível conciliar o agro com a preservação ambiental. “Existe o agro antes e depois do livro Tons de Verde”, conta Lunardelli. “Escrito por Miranda, a publicação comprova que somos muito melhores do ponto de vista ambiental do que qualquer outro produtor rural do mundo. Podemos falar com orgulho que, para cada metro quadrado que o brasileiro planta, outro é dedicado à conservação.”

Essa realidade ajuda a entender a fúria de governos estrangeiros: os fatos desmontam a falácia que responsabiliza o agronegócio pelo desmatamento no Brasil. Lunardelli registra que o Brasil possui a maior reserva de água potável, terras agricultáveis não exploradas, biodiversidade e jazidas de minério do planeta. “Para os países desenvolvidos, sempre foi interessante articular estratégias para impedir a ocupação territorial do Brasil, que é basicamente uma reserva global”, diz. “Se um dia faltar minério no mundo, haverá na Amazônia. Se acabar água, a Amazônia terá de sobra. Especialista em análise de uso e ocupação territorial, Miranda provou que dois terços do território nacional são cobertos por vegetação nativa — e que 50% dessas áreas estão dentro dos imóveis rurais. A verdade é que ninguém quer salvar o planeta. Tudo é 100% interesse econômico.”
 
O país que alimenta o mundo

A Embrapa contribuiu para que o Brasil, importador de alimentos na década de 1970, se transformasse num dos maiores exportadores de produtos agrícolas. Projeções feitas por Elisio Contini e Adalberto Aragão, pesquisadores da Embrapa, atestam que o país alimentou, só com grãos, cerca de 800 milhões de terráqueos em 2020 — quase 10% da população mundial. Somente em grãos, foram 31 quilos de comida por habitante da Terra. Campos de soja, girassol e milho | Foto: Shutterstock

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os frangos existentes no país somaram 1,5 bilhão de cabeças em 2020. Em segundo lugar aparecem os 220 milhões de bovinos. O terceiro lugar fica com os mais de 40 milhões de suínos. Essa trinca gerou 30 milhões de toneladas de carnes, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Caso fosse consumido exclusivamente em hambúrgueres, esse colosso abasteceria 500 bilhões de sanduíches — 65 por habitante no planeta. O Brasil também é o maior fornecedor mundial de açúcar, soja, café e suco de laranja. 

Produção com preservação

Paralelamente a essas cifras superlativas, o país preserva quase 67% do seu território: 10% desse total são unidades de conservação. Outros 14% são terras indígenas e outros 10%, “terras devolutas e não cadastradas”. Mais de 33% — ou seja, um terço do país — de áreas dedicadas à preservação da vegetação nativa estão em propriedades rurais, em terras privadas. Estudos da Embrapa revelam que fazendas e sítios brasileiros preservam uma área de floresta equivalente à soma de dez países europeus: Irlanda, Reino Unido, Portugal, Espanha, França, Bélgica, Luxemburgo, Alemanha, Áustria e Itália.



O agronegócio utiliza menos de 30% das terras brasileiras (250 milhões de hectares). Desse total, pouco mais de 21% são ocupados por pastagens. As lavouras não chegam a 8% do território brasileiro. O 1% restante são florestas plantadas, sobretudo eucalipto. Nos Estados Unidos, quase 75% do território é destinado à agropecuária. Os agricultores brasileiros sabem explorar a terra como poucos: em 2022, enquanto a média mundial alcança menos de 3 toneladas de soja por hectare, a brasileira atinge incríveis 3,5 toneladas colhidas por hectare.

Não é surpreendente que esses números atrapalhem o sono de dezenas de países incapazes de competir com o Brasil. O que lhes resta é o jogo sujo. Para reduzir a pujança do agro brasileiro, no entanto, será preciso muito mais que manifestos publicados na Biological Conservation. Ou na revista Piauí. 

Leia também “Agricultura lidera a preservação ambiental”

Com reportagem de Artur Piva
 
 

quarta-feira, 29 de setembro de 2021

A lenda da agropecuária como vilã da crise hídrica - Revista Oeste

Sabrina Nascimento 

Especialistas esclarecem que o baixo volume de água nos reservatórios brasileiros é consequência do ciclo natural da chuva 

Não é novidade que o Brasil passa por uma das piores crises hídricas dos últimos 91 anos e que o Serviço Nacional de Meteorologia emitiu um alerta de emergência hídrica para a Bacia do Paraná, que abrange as Regiões Sudeste e Centro-Oeste do país. Especialistas apontam o baixo volume de chuva dos últimos dez anos como o responsável por esse cenário. No entanto, ambientalistas a serviço da desinformação encontraram outro culpado: a produção agrícola no Cerrado.

Cenário das Cataratas do Iguaçu, em Foz do Iguaçu, no Paraná, no dia 16/6/2021 | Foto: Luis Moura/WPP/AE
Cenário das Cataratas do Iguaçu, em Foz do Iguaçu, no Paraná, no dia 16/6/2021 | Foto: Luis Moura/WPP/AE

Atualmente, o Cerrado é o segundo maior bioma do país, atrás apenas do bioma Amazônia, e tem cobertura de 2 milhões de quilômetros quadrados, o que corresponde a 204 milhões de hectares mais de 200 milhões de campos de futebol. O bioma inclui os Estados de Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Maranhão, Piauí, Bahia, Minas Gerais, São Paulo e o Distrito Federal, mas também está presente em pequenas coberturas no Paraná e em Rondônia.

E, apesar de sua maior cobertura ficar na região central do país, nas últimas semanas parte da imprensa relacionou a produção agrícola e pecuária no bioma com o baixo volume de água nas Cataratas do Iguaçu, localizadas em Foz do Iguaçu, no Paraná.  Mas, afinal, as Cataratas do Iguaçu têm alguma relação com a produção agropecuária na Região Centro-Oeste do Brasil? “Nada!”, explica Luiz Carlos Baldicero Molion, professor e pesquisador aposentado da Universidade Federal de Alagoas. “Como o próprio nome diz, as cataratas são do Iguaçu, que divide o Paraná e Santa Catarina. Não tem nada a ver com o Centro-Oeste. É um argumento falso, que não sei se foi feito por ignorância ou de propósito.”

Molion explica que, para entender a atual situação, é preciso olhar o regime de chuvas. Desde o segundo semestre de 2020 até o começo de maio de 2021, a Região Sul ficou sob efeito do fenômeno La Niña, responsável por deixar o tempo mais seco e com pontos de estiagem em algumas localidades. O La Niña, ao contrário do El Niño outro fenômeno climático —, diminui a temperatura da superfície das águas do Oceano Pacífico tropical central e oriental, gerando uma série de mudanças nos padrões de precipitação (queda de água do céu) e também em relação à temperatura.

Quando esse fenômeno está vigente, o que acontece é uma mudança no padrão de ventos, que se tornam mais ou menos intensos, o que muda a chegada das frentes frias. Como efeito, há redução no volume de chuvas na Região Sul, enquanto no Norte e no Nordeste há aumento.  Mas esses baixos volumes de chuva na principal estação úmida não foram registrados somente nos últimos meses. “Se fosse só um ano, aí, tudo bem, é uma crise passageira, mas como é o acumulado dos últimos dez anos, o problema fica um pouco mais grave”, esclarece o pesquisador, que fez uma análise nacional da precipitação no período 2011-2020, comparada com o ciclo de 1981-2010 (média usada pela Organização Meteorológica Mundial):

No mapa, é possível ver o efeito ao longo do país. O leste (cor verde-abacate), por exemplo, apresentou reduções de até 30 milímetros de chuva por mês, em média. Isso resulta em uma baixa anual da precipitação de 360 milímetros. “Como houve uma tendência entre 2010-2021 de a pressão atmosférica aumentar nessa região entre Bahia, Centro-Oeste, na Bacia do São Francisco, na costa leste brasileira como um todo — e isso vai desde São Paulo, norte do Paraná até lá no Rio Grande do Norte, Maranhão, Piauí —, por toda essa faixa leste o país apresentou nos últimos dez anos uma redução de chuva”, diz Molion. “A problemática é exatamente essa: a chuva. As Cataratas do Iguaçu não têm nada a ver com a agricultura.”

Brasil mais seco?
Recentemente, algumas pesquisas mostraram que regiões brasileiras estariam perdendo água da superfície, com destaque para o Pantanal, conhecido pelas enchentes causadas pela alta do nível dos rios durante o trimestre chuvoso (entre novembro e janeiro). Isso, de fato, é verdade, pois houve uma “redução de chuva na ordem de 10% no país desde 2010”, destaca Molion. Porém, não é a expansão de áreas destinadas à produção agropecuária no Cerrado ou o desmatamento da Amazônia que provocam esse efeito. “A floresta existe porque chove, e não o contrário”, ressalta. “Uma árvore não é uma ‘máquina’ de produzir água, apenas recicla a água da chuva que caiu anteriormente e que estava armazenada no solo.”

A agricultura irrigada também tem sido alvo de críticas nesse momento de baixo volume de água nos reservatórios

Vale lembrar que, em anos anteriores, o país já passou por quadros hídricos semelhantes ao atual. Em 1926, por exemplo, quando nem se falava em desmatamento da Amazônia e o Brasil não era um grande exportador de alimentos, a população vivenciou um período de seca causado pelo fenômeno climático El Niño. Já em 1964, foi o Oceano Atlântico tropical norte mais quente que provocou a deficiência de chuva. Essa última “variabilidade natural” é o agente causador da seca de 2021. “Portanto, o desmatamento não afeta as chuvas no restante do país.

Como se trata de um ciclo que se repete ao longo dos anos, a irregularidade climática tem um início e um fim. Os mais pessimistas acreditam que uma regularidade só será vista a partir de 2040. Entretanto, Molion estima que “entre 2030 e 2035 já poderemos ver uma normalidade”, sem eventos excepcionais, como secas extremas. O último longo período de precipitação baixa foi entre 1946 e 1975.

Uso da água para irrigação
A agricultura irrigada também tem sido alvo de críticas nesse momento de baixo volume de água nos reservatórios. A categoria corresponde a menos de 20% da área total plantada no Brasil e produz mais de 40% dos alimentos, de acordo com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Atualmente, os pivôs centrais (estrutura de irrigação suspensa com motor e rodas para que haja o deslocamento na lavoura) são o principal sistema de irrigação brasileiro, superando o método de inundação adotado para o cultivo do arroz na Região Sul.

Originalmente, os pivôs centrais começaram a ser usados para o cultivo de grandes culturas, como soja e milho. Porém, já são encontrados em plantações de batata, cenoura, café nas áreas de Cerrado, cebola, alho e cana-de-açúcar. “Esses equipamentos são também indutores do cultivo das culturas de inverno, como o trigo e a cevada na região do Cerrado”, comenta Daniel Pereira Guimarães, pesquisador da Embrapa Milho e Sorgo. “Sob condições irrigadas, o trigo tem apresentado alta produtividade, inclusive no semiárido brasileiro, indicando o potencial da irrigação para a redução das importações desse cereal.”

Apesar dessa contribuição, o aumento da rigidez na gestão de distribuição da água por parte de governos estaduais volta seu olhar para os agricultores que utilizam a técnica. Há um receio por parte do poder público e de ONGs do uso excessivo de recursos hídricos com os pivôs. No entanto, eles se esquecem de que muitos produtores rurais têm açudes (tanques) em suas propriedades para armazenamento de água no período de abundância. Além disso, “sistemas eficientes de irrigação podem inclusive contribuir para a mitigação da deficiência hídrica nos períodos de estiagem”, explica o pesquisador.

Diante desses fatores, ao que tudo indica, o único setor que registrou crescimento econômico em 2020, mesmo durante uma pandemia global, continuará a ter pela frente inúmeros desafios, não só climáticos, que atingirão diretamente a produção no campo. Apesar de seu protagonismo mundial na produção de alimentos — ou justamente por isso —, terá de lidar com críticas de ambientalistas que atribuem ao setor a responsabilidade pelo desmatamento e pela falta de chuva no país

Leia também “Agricultura lidera a preservação ambiental”

Sabrina Nascimento, jornalista - Revista Oeste


sábado, 25 de setembro de 2021

Método de Paulo Freire não é uma proposta de ensino, é um manifesto político do começo ao fim - J. R. Guzzo

JovemPan

Metodologia criada por ele não se destina a ensinar os alunos a ler, escrever ou contar, seu objetivo é formar servidores obedientes à ‘ditadura popular-proletária-camponesa’ que existe nos desejos do autor

A esquerda nacional tentou com grande empenho nos últimos dias, embora com bem pouco sucesso de público, ressuscitar para o Brasil de 2021 um desses ídolos culturais, mais um, que ela fabrica regularmente de tempos em tempos e exige que sejam venerados pelo país inteiro como se fossem os Doze Apóstolos, ou a Santíssima Trindade, ou ambos ao mesmo tempo. Nunca importa, realmente, o que o sujeito fez – sua obra, seu talento ou os resultados concretos da sua atividade. Só interessa, para os agentes culturais do “campo progressista”, a devoção à figura escolhida para o papel de santo. É como na religião, e como em quase tudo o que a esquerda promove. Não pergunte nada; ajoelhe-se e reze. Nessa balada, vão socando em cima do público, com embalagem de herói, as figuras criadas por sua imaginação. A levar a sério o que sai na mídia, nas classes intelectuais e nos “projetos de luta” de ONGs à caça de verbas, são grandes vultos da nossa história. Vai se ver de perto e é tudo uísque paraguaio.

Você está cansado de saber quem são eles todos, pois os comandantes da nossa cultura vêm enfiando o nome de cada um na sua cabeça desde o curso primário Oscar Niemeyer, o geógrafo Milton Santos, Zumbi dos Palmares e mais do mesmo. Na ofensiva feita agora, o escolhido foi o professor Paulo Freire; decidiram que o Brasil todo teria de prestar homenagem a ele pelo centenário do seu nascimento. O retratinho de Freire apareceu na página de abertura do Google. Uma juíza do Rio de Janeiro proibiu que fossem feitos “atentados contra a dignidade” do professor – pelo que deu para entender, é ilegal discordar do seu “método” de educação, embora a Constituição Federal permita, ao que parece, a exposição de mais de uma ideia sobre o tema. Os “formadores de opinião” lotaram as redes sociais e as mesas-redondas de televisão com uma maciça ofensiva de cânticos em louvor a Freire.  

Em nenhum momento ficou claro por que, em termos práticos, ele deveria ser louvado – o que, no fim das contas, o homem fez de útil para a educação brasileira, ou para qualquer outra coisa? Nada que alguém tenha conseguido saber até hoje. Mas, como acontece com todos os heróis da esquerda nacional, isso é um detalhezinho à toa; basta dizer que o sujeito é um dos educadores “mais importantes” do país, e mesmo do mundo, e pronto. Importante por quê? Não interessa.

Paulo Freire, segundo o evangelho da esquerda brasileira, é um educador essencial para a alfabetização e para os demais campos da atividade didática neste país. De acordo com os nossos arquiduques culturais, ele criou um “método” de educação – o “método Paulo Freire” que, por aquilo que nos dizem, é o mais decisivo avanço da cultura humana desde a invenção da escrita. Quando se olha a coisa de perto, porém, não é nada disso. O método de Freire, na verdade, não é uma proposta de ensino – é um manifesto político do começo ao fim
 
Não se destina, não para valer, a transmitir aos estudantes, de alguma forma mais eficiente que outras, conhecimentos de português básico, de ciência ou das quatro operações matemáticas; serve apenas para socar na cabeça das crianças e adolescentes as crenças políticas do autor. Não é preciso ser nenhum Sherlock Holmes para descobrir, em 30 segundos, que crenças são essas – as que pregam um mundo coletivista, com o Estado mandando em tudo, e mais todo o bonde das invenções tidas como “socialistas” ou “comunistas”. Os professores, por essa visão, não têm de ensinar nada; devem ser “agentes de transformação política”. O “método Paulo Freire” não se destina a ensinar os alunos a ler, escrever ou contar. Seu objetivo é formar servidores obedientes à “ditadura popular-proletária-“camponesa”-etc. que existe no mundo mental e nos desejos do autor. É um mundo em que Che Guevara é citado como “exemplo de amor” e a família é descrita como um sistema de “opressão”.

Paulo Freire não faz parte das possibilidades de solução para problema algum

O “método Paulo Freire” jamais foi adotado por nenhum país desenvolvido, ou que tenha um mínimo de sucesso no seu sistema educacional. 
Serve para um país pobre, então? 
Menos ainda – com esses é que não funciona mesmo. É muito significativo que o Brasil, um dos países mais atrasados do mundo em sua educação pública, seja também o que concentra o maior número, ou a quase totalidade, dos admiradores do método. (É claro que todos eles, através dos sindicatos de professores, foram os defensores mais extremados do fechamento das escolas brasileiras durante mais de um ano, por conta da Covid. Querem o “método Paulo Freire”. Mas não querem dar aula.)  
 
O fato, no fim de todas as contas, é que se trata de um mecanismo desenhado, nos seus mínimos detalhes, para dar errado a cada vez que alguém tenta aplicar alguma coisa que se prescreve ali. Freire chamava suas propostas de “pedagogia do oprimido”. Com certeza, na vida como ela é, tornou-se a pedagogia do fracasso. Como diria Theodore Dalrymple: se dessem a Paulo Freire, ou aos educadores brasileiros de esquerda, a administração do Oceano Pacífico, no dia seguinte já iria estar faltando água salgada no mundo. 
 
Como em todos os casos dessa família, o grande ou o único argumento de defesa do universo intelectual brasileiro é dizer que fulano ou sicrano “desfrutam de reconhecimento internacional”. E daí? Nada é mais barato, hoje em dia, do que ter reconhecimento internacional. O único argumento que realmente interessa, em toda essa discussão, são os resultados concretos – e os resultados concretos do “método” são um triplo zero. Paulo Freire não faz parte das possibilidades de solução para problema algum. Faz parte, isso sim, da tragédia permanente da educação no Brasil.
 
 J. R. Guzzo, colunista - JovemPan

quinta-feira, 23 de setembro de 2021

Geniais no fracasso - Revista Oeste

Theodore Dalrymple

Existem jornalistas que são excelentes guias para o mundo, contanto que você acredite exatamente no contrário do que escrevem
 
Existem pessoas que são geniais no fracasso. Conheço algumas cuja habilidade de perder dinheiro em um mercado em alta não se equilibra pela habilidade de ganhar dinheiro em um mercado em baixa: elas só perdiam dinheiro em todas as circunstâncias. Essas pessoas não tinham déficit de inteligência nem mesmo de informação; na verdade, pareciam ter uma vontade de fracassar, como se o sucesso fosse um tanto vulgar. Como seres humanos, não eram pessoas não atraentes.

Sugeri que um deles escrevesse uma newsletter financeira, colocando a ressalva de que os leitores deveriam fazer exatamente o oposto do que quer que fosse recomendado. Mas é provável que até mesmo isso tivesse um mau resultado, porque, assim que todo mundo fizesse o oposto dos conselhos dele, que seriam supostamente ruins, essas recomendações se mostrariam boas e, portanto (diante da ressalva), ruins.

Esse homem fazia os Quatro Cavaleiros do Apocalipse parecerem arautos de boas-novas

Existem jornalistas que são excelentes guias para o mundo, contanto que você acredite exatamente no contrário do que escrevem. Entre eles figura um certo tipo de correspondente estrangeiro britânico que está sempre em busca de algum lugar no qual projetar seus sonhos permanentemente utópicos e adolescentes. Com frequência, são figuras de classe alta, talvez envergonhados das próprias origens privilegiadas, pelas quais buscam se redimir apoiando revoluções em outras partes.

Entre eles, por exemplo, estava um homem chamado Basil Davidson, que tinha uma espécie de genialidade para elogiar ditadores que se deleitavam, ou estavam prestes a se deleitar, com o genocídio, a fome em larga escala ou com a fuga de boa parte da população. Ele elogiou Tito enquanto o ditador consolidava seu poder por meio de um massacre. Elogiou a China comunista pouco antes do Grande Salto para a Frente, que causou uma das piores crises de fome da história da humanidade. E, talvez o mais bizarro, viu na revolução da Guiné-Bissau a esperança de um mundo melhor. Esse homem fazia os Quatro Cavaleiros do Apocalipse parecerem arautos de boas-novas.

Outra figura como essa foi Richard Gott, um especialista em América Latina, editor literário do jornal de esquerda-liberal The Guardian, que nunca conheceu um movimento literário latino-americano que ele não aprovasse, incluindo o Sendero Luminoso, que era claramente marxista com tendência a Pol Pot. Ele escreveu que o Sendero Luminoso não ia tomar o poder, ia simplesmente assumir o poder quando o Estado peruano entrasse em colapso, e claramente achava que isso seria uma coisa boa. A essa altura, ele estudava os movimentos de guerrilha latino-americanos fazia 30 anos, provando que a esperança nunca deixa de brotar no peito de um ideólogo.

Um dos livros do senhor Gott me faz sorrir, não porque o autor fosse intencionalmente um humorista (apoiadores de revoluções raramente o são), mas por causa de seu título maravilhosamente absurdo. O livro se chama In the Shadow of the Liberator: Hugo Chávez and the Transformation of Venezuela (Na Sombra do Libertador: Hugo Chávez e a Transformação da Venezuela, em tradução livre). Foi publicado em 2000.

Não se pode negar que Hugo Chávez de fato transformou a Venezuela. Ele instituiu os tipos de política que, se tivessem sido adotadas no Oceano Pacífico, mais cedo ou mais teriam causado uma escassez de água salgada. Não é exatamente um segredo que a antiga elite política da Venezuela era ruim, mas não é preciso ser Nostradamus para prever que Chávez seria muito pior. Na verdade, era preciso ser um especialista como Richard Gott para não prever isso.

O que me traz ao Afeganistão. Minha breve jornada por lá tem mais de 50 anos. Naquela época, eu não passava de um jovem imaturo que sabia pouco ou nada de história. Mas até mesmo eu podia ver que o Afeganistão — um país de paisagens magníficas e selvagens, e homens magníficos e selvagens — não era exatamente um bom candidato para a democracia parlamentar ocidental. Os obstáculos para isso eram óbvios e numerosos; e quando certos representantes americanos demonstraram surpresa que o regime e seu Exército, fartamente munido de tecnologia militar, tivesse entrado em colapso tão rápido diante de um pequeno exército de fanáticos barbudos, só consegui ficar impressionado com sua falta de realismo.

Os Jogos Olímpicos de 1980 foram realizados em Moscou antes que tivesse havido qualquer melhora real nas relações entre Oriente e Ocidente. Na época, a ortodoxia entre os especialistas era que a União Soviética duraria para sempre, o que significa um século ou dois. Apenas um pequeno número de observadores — entre os quais estavam Andrei Amalrik e Olivier Todd — não acreditava nisso. A maior parte dos especialistas achava que a União Soviética estava no auge de seu poder, com muitos Estados-satélite pelo mundo, em vez de estar em vias do declínio.

Um jornalista esportivo britânico que não era conhecido por suas sofisticadas análises dos eventos mundiais, que não sabia nada sobre a União Soviética e nunca soube nada, deu uma olhada no Aeroporto de Moscou e afirmou: “Isso não pode continuar”. Olhar para o Aeroporto de Moscou foi o suficiente para que ele constatasse que toda a estrutura da União Soviética devia estar economicamente podre. O país estava tentando se exibir, mas não conseguia nem erigir um vilarejo de Potemkin. O jornalista esportivo enxergou algo em poucos segundos que departamentos universitários inteiros não entenderam depois de décadas de estudo.

Não estou sugerindo que o conhecimento detalhado de outro país (ou, na verdade, de qualquer outra coisa) não valha nada, que tudo o que alguém precisa fazer para entender o mundo é olhar em volta por alguns minutos e tirar conclusões sobre problemas complexos. O que estou dizendo na verdade é que é possível alguém, ou um grupo de pessoas, estudar algo por muitos anos e continuar sendo totalmente irrealista sobre isso, enxergar os detalhes sem o mais óbvio padrão para os detalhes. Na verdade, grupos de especialistas podem estar tão grosseiramente errados quanto indivíduos mal informados. Eles se confirmam em seus erros e têm medo de fugir à regra em relação aos colegas.

O ingrediente que falta é o bom senso. Descartes nos diz, ironicamente, claro, que o bom senso é tão amplamente distribuído que ninguém acha que precisa ter mais. 
Como aumentar o bom senso no mundo? 
Existem especialistas no assunto? [por favor,     SEM especialistas; 
os tempos da Covid-19, mostraram que indivíduos, que  nada sabiam, e continuam sem saber, sobre determinado assunto, se apresentavam como especialistas,  prontos a dizer exatamente o que um órgão integrante da mídia militante desejava divulgar; pronto, estava expelido mais um ESPECIALISTA EM NADA.]

Leia também “A verdade no abstrato”

Theodore Dalrymple - Revista Oeste 

 

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

Desembargadora - Juíza recebe “pena” máxima do CNJ: aposentadoria com salário integral - VOZES - Gazeta do Povo

Alexandre Garcia 

 

Desembargadora, na verdade, não foi punida, foi premiada: não precisa mais trabalhar e continua ganhando a mesma coisa. Foto: Bigstock

Pena "rigorosa" para desembargadora
Outro dia eu encontrei num restaurante, em Brasília, um juiz, ministro de tribunal superior, almoçando. E ele tentou se justificar, dizendo que fora injustiçado. Acusado de vender sentença, foi punido com aposentadoria. Estava lá gastando o dinheiro da aposentadoria num bom restaurante.

Conto isso porque o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) puniu com a pena máxima a desembargadora de Mato Grosso do Sul, Tânia de Freitas Borges, que tirou o filho da cadeia por conta própria, num evidente caso de abuso de poder.

O filho tinha sido preso com 130 quilos de maconha e 200 cartuchos de fuzil. 
E ela, como mãe, foi lá, tirou o rapaz da cadeia e botou numa clínica por conta própria. 
Ela então foi punida com a pena máxima pelo CNJ: aposentadoria com vencimento integral. Ora, na verdade, ela foi premiada. Não precisa mais trabalhar e vai continuar ganhando a mesma coisa.

Quem não ajuda não deve atrapalhar
Uma diretora da Eletrobras interpelou o presidente da República com uma carta enviada ao Ministério de Minas e Energia, perguntando se Bolsonaro confirma que disse que ia “botar o dedo” no setor elétrico. O presidente respondeu pegando a medida provisória que acelera a privatização da Eletrobras, e levando pessoalmente ao Congresso. Entregando para o presidente da Câmara e o presidente do Senado. Foi assim que ele respondeu.
 
Bolsonaro dá resposta ao liberais com MP da Eletrobras

É uma moda assim que a gente fica embasbacado, porque o presidente da República foi eleito para governar por quase 58 milhões de eleitores.  
E está cheio de gente dentro da estrutura estatal que acha que pode governar no lugar de presidente. Juiz de primeira instância, diretora da Eletrobras... [E, nenhum deles, teve ou tem votos para tanto. 
Alguns, especialmente os mais bem colocados onde sempre os sem votos, mas com QI de quem indique conseguem se arrumar, se se candidatos fossem,  talvez não tivessem os votos dos familiares mais próximos: algo como esposa e filhos.]

E quem está interferindo também é o pessoal do Supremo
. Partidos pequenos que usam o STF para isso. [definindo melhor:partidos sem votos, sem projeto, sem noção e muitos serão triturados pela cláusula de barreira.] É uma coisa incrível, mas o presidente está respeitando todos eles e agindo conforme determina a lei.

Eu vou repetir que democracia é liberdade, é obediência às leis. As instituições, com exceção do legislativo, não fazem leis. Quem recebeu os nossos votos para fazer isso são os deputados federais e os senadores porque todo poder emana do povo.
 
 
Em VOZES, Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo

domingo, 11 de fevereiro de 2018

Qual a ameaça real do 'torpedo do juízo final', a arma nuclear da Rússia que preocupa os EUA

Sigiloso, implacável e devastador.

Assim é descrito o Sistema Oceânico Multipropósito Status-6, uma arma nuclear russa que está em fase de desenvolvimento e que tem preocupado os Estados Unidos. Em sua Revisão de Postura Nuclear (NPR, da sigla em Inglês) divulgada em 2 de fevereiro, o Departamento de Defesa americano incluiu a arma como uma das ameaças que justificam os EUA modernizarem seu arsenal atômico. 
Submarino russo Yuri Dolgoruky: O sistema nuclear da Rússia deve ser lançado a partir de submarinos adaptados 

O presidente dos EUA, Donald Trump, acredita que o país está sendo alcançado por seus grandes concorrentes - Rússia e China - por causa do que considera "anos de abandono da era Obama".  A NPR, que dita o plano de atuação do governo em relação às armas de dissuasão, caracteriza o Status-6 como "um novo torpedo intercontinental autônomo e submarino, de combustível e armamento nuclear".

Já a Rossikaya Gazeta, o jornal oficial do governo russo, o batizou como o "artefato do dia do juízo final". 


Capaz de atravessar o oceano
O Status-6 foi projetado como um veículo autônomo capaz de atravessar o Oceano Pacífico e lançar um ataque radioativo mortal sobre a costa oeste dos Estados Unidos. Ele é adaptado para mergulhos tão profundos que se tornaria invisível a sistemas de detecção. Sua carga incluiria ogivas nucleares de alta potência. "Sua detonação provocaria uma enorme nuvem radioativa", explica à BBC Mundo, o serviço em espanhol a BBC, Pavel Podvig, autor do blog Russian Forces, que divulga informações sobre armas nucleares, controle de armas e desarmamento na Rússia, baseadas em análises científicas. 

O plano russo é contar com o que os especialistas chamam de "arma de terceira onda" definitiva.
Caso tanto os mísseis balísticos terrestres como submarinos fossem neutralizados por um hipotético ataque inimigo, leia-se americano, o Status-6 teria a capacidade de lançar uma resposta atômica em terreno adversário.
Ele seria lançado a partir de um submarino adaptado para isso.


Explosão nuclear: O Pentágono garante que a Rússia desenvolve ao menos outros dois sistemas de alcance intercontinental | Foto: US Navy 

'Danos enormes'
Hans Kristensen, da Federação de Cientistas Americanos, destaca que os "Estados Unidos têm capacidade para perseguir os submersíveis inimigos, mas, uma vez que se lança um torpedo, a história é diferente".
"Se essa arma fosse concluída, certamente causaria danos enormes", diz Podvig.
Mas a dúvida é justamente essa, se o Status-6 será realidade algum dia.
Apesar de ter sido oficialmente reconhecido como uma ameaça pelo Pentágono, os especialistas encontram muitas razões para ceticismo.
"Não está claro que ele vá ficar operacional", diz Podvig. 

Os Estados Unidos e seus aliados souberam dos planos de desenvolvimento dessa arma durante um encontro do presidente russo Vladimir Putin com seus generais na cidade de Sochi, na Rússia.  Em imagens divulgadas por canais controlados pelo Kremlin, é possível ver rapidamente um dos militares mostrando um documento confidencial a Putin. 

A folha continha desenhos e detalhes do Status-6, desenhado pela Rubin, uma fabricante de submarinos nucleares de São Petersburgo. Logo surgiram especulações sobre se a divulgação das imagens foi acidental ou estratégia para intimidar potenciais adversários.

Kristensen lembra que "os russos fazem frequentemente essas coisas, de manter, durante anos, programas dos quais posteriormente não sai nada".
"Eu não acho que vai ser operacional da maneira como foi descrito", reforçou Podvig.
Então, por que os estrategistas do Pentágono o incluíram em um documento oficial como uma ameaça real para a segurança nacional?
"O Status-6 é tecnicamente possível e, na comunidade de inteligência, eles acham melhor estarem preparados para algo assim", ressalta Podvig.
Kristensen descarta que esse sistema de armas em desenvolvimento tenha sido uma das razões para a revisão da política nuclear de Washington. "Eles o usaram como um dos exemplos assustadores de que os russos são maus e podem obter suas próprias armas para respaldar o argumento de que os Estados Unidos precisam melhorar suas armas nucleares."

De acordo com informações recentes divulgadas pela agência de notícias Bloomberg, Trump espera que o Congresso aprove um aumento de 7,2% no orçamento da Defesa para o próximo ano. Em seu discurso sobre o Estado da União, relatório que os presidentes americanos apresentam anualmente aos parlamentares, ele pediu a construção de um arsenal nuclear "tão forte e poderoso que possa impedir qualquer tentativa de agressão de outro país".


 Míssil balístico de fabricação russa, em Moscou: Especialistas asseguram que as armas americanas não perderam vantagem

Outras ameaças
Embora o NPR tenha citado, além do Status-6, "pelo menos dois outros sistemas de alcance intercontinental", os especialistas fizeram ponderações em relação à fala de Trump sobre uma deterioração das capacidades dos EUA. "O fato de que a Rússia estava há algum tempo modernizando seus equipamentos não significa que os EUA não o fizeram também, mas que isso aconteceu muitos anos antes", diz Povdig. 

Agora, depois de anos de política de não proliferação de armas nucleares em Washington, essa corrida parece prestes a recomeçar. "Já na época da Guerra Fria sempre se citava as armas da grande potência alheias como justificativa para as próprias. É assim que sempre funciona."

BBC Brasil


sábado, 25 de novembro de 2017

Relembre: há 17 anos, submarino russo Kursk desapareceu no Ártico



Tragédia matou 118 pessoas; embarcação foi içada apenas um ano depois

O desaparecimento do submarino argentino AKA San Juan, na última quarta-feira, fez com que muitos se lembrassem de um acidente parecido, no início dos anos 2000, quando o submarino nuclear russo K-141, batizado Kursk, sofreu uma explosão no compartimento de armas, e desapareceu no Mar de Barents, no Oceano Ártico, causando a morte de 118 pessoas. 

 Na foto, o submarino russo Kursk, nos anos 2000 - ITAR-TASS / AFP PHOTO

O acidente até hoje é considerado umas das maiores tragédias subaquáticas da História. O Kursk era na época visto como um orgulho da Marinha russa, uma máquina de guerra equipada com 24 mísseis e, até a tragédia, considerada indestrutível. Ao contrário do acidente mais recente, que foi rapidamente divulgado pelo governo argentino, há 17 anos os russos demoraram dias para ´comunicar ao público a gravidade do acidente. Além disso, as investigações posteriores apontaram que a Rússia recusou as ofertas de outros países para ajudar a resgatar os tripulantes do submarino, pois a embarcação poderia revelar segredos militares'.

FALHA NO RESGATE
Mesmo após a explosão, em 12 de agosto, alguns dos tripulantes conseguiram ir para o compartimento número nove do submarino, localizado na proa, e emitiram sinais de socorro por 48 horas. O Kursk foi localizado a 108 metros de profundidade na madrugada de 13 de agosto. Ainda assim, o governo russo só aprovou a operação internacional de resgate uma semana depois do acidente. Cartas deixadas por alguns dos marinheiros confirmaram a versão de que os marinheiros sobreviveram por algum tempo. Em uma delas, o tripulante Dmitri Kolesnikov dizia que havia 23 tripulantes na proa da embarcação.

Nenhuma autoridade acreditou que marinheiros conseguiriam sobreviver por um período de dois dias após o acidente. Depois de semanas de busca, foram resgatados os corpos de 115 ocupantes do submarino, exceto dos marinheiros Dimitri Kotkov e Ivan Nefedkov, e do técnico Mamed Gadzhiev. O submarino foi totalmente içado apenas em outubro de 2001, mais de um ano após a tragédia. 


ACIDENTES COM SUBMARINOS RUSSOS
Além da tragédia do Kursk, outros dois acidentes com submarinos russos ocorreram nos anos 2000. No dia 30 de agosto de 2003, o submarino atômico K-159 afundou durante uma tempestade, também no Mar de Barents, a uma profundidade de 170 metros e com dez pessoas a bordo, das quais uma foi resgatada com vida.

Em novembro de 2008, uma falha no sistema de incêndio provocou a morte de 20 pessoas num submarino nuclear russo, no Oceano Pacífico. A falha fez com que fossem expelidas substâncias químicas que também deixaram 21 pessoas feridas. No momento do acidente, havia 208 pessoas a bordo, dos quais 81 eram militares.