A
prerrogativa de autoridades dos três poderes serem julgadas em instâncias
especiais — presidente, ministros, deputados e senadores pelo Supremo, por exemplo
— tem uma fundamentação. Por ocuparem cargos que envolvem interesses políticos,
tirá-los de instâncias inferiores os protegem de ações movidas por má-fé. À medida,
porém, que o enfrentamento da corrupção se ampliou, a começar pelo mensalão do
PT e principalmente no petrolão, esmiuçado até hoje pela Lava-Jato, o foro se
revelou um dispositivo frágil. Até conveniente para corruptos.
É
emblemático que, quando a Lava-Jato começou a cercar o ex-presidente Lula, a
presidente Dilma Rousseff tenha sido flagrada acertando a nomeação dele para a
Casa Civil, com o objetivo de dar-lhe a proteção do foro especial, a fim de
livrá-lo da 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba, parte da Lava-Jato e onde
atua Sergio Moro. Lula e tantos outros querem fugir desta jurisdição, devido à
tramitação dos processos sem entraves e pelo devido e correto rigor das
sentenças. Os desdobramentos desde março de 2014, quando a operação foi
lançada, deram razão a Lula e a Dilma.
Outro
aspecto é que o foro, como aplicado, serviu de rota de fuga para políticos
processados e prestes a serem denunciados. Bastava renunciar ao cargo, para a
ação ser endereçada à primeira instância. Bons advogados, bem pagos, manobram
com os meandros da legislação brasileira, repleta de possibilidades de recursos
protelatórios, e resta ao cliente apenas esperar a prescrição do crime. O foro
também tem ajudado políticos porque os tribunais superiores não estão
preparados para fazer tramitar ações penais. E enquanto elas se acumulam no
STF, Sergio Moro, em Curitiba, e bem como Marcelo Bretas no Rio, dão veredictos
numa velocidade de invejar ministro do STF e do Superior Tribunal de Justiça.
Levantamento
feito no ano passado constatou que havia 500 processos de políticos no Supremo.
Era e é muito. Ajuda na manobra da prescrição. Há pouco, o senador Romero Jucá
(PMDB-RR) pôde comemorar que uma denúncia contra ele de corrupção prescreveu 14
anos depois de chegar ao STF. Mas há
chance de avanço. Não pelo projeto que tramita no Congresso para acabar com
todo foro privilegiado, que parece mais uma vingança contra juízes e
procuradores. Trata-se do julgamento no Supremo de uma causa, em que o ministro
Luís Roberto Barroso apresentou proposta de limitar o foro à função da
autoridade.
Crimes cometidos sem qualquer relação com a função vai para a
primeira instância. Deve esvaziar as Cortes mais elevadas, para que possam
tratar dos processos que lhes cabem. Já há
maioria de oito dos 11 votos da Corte a favor da fórmula. Resta o ministro Dias
Toffoli, que pediu vista do processo, devolvê-lo. O ministro alegou querer
evitar que a Corte trate de um assunto da pauta do Congresso. Pode ser. Ao
menos, sabe-se que existe uma solução razoável bem encaminhada no STF.
Editorial - O Globo
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