Artigo: Carta ao general Braga Netto
"Não autorize seus soldados a se transformarem em assassinos fardados que, ao ingressar nas comunidades, primeiro atiram e depois interrogam"
"General,
o Rio precisa de intervenção cívica, e não militar. O Estado fluminense e a
prefeitura carioca estão acéfalos.
Em 10
anos de implantação das UPPs houve tempo suficiente para evitar que uma geração
de crianças e jovens escapasse das garras do narcotráfico. Cometeu-se o
equívoco de instalar postos policiais nas comunidades, e não escolas, cursos
profissionalizantes, quadras de esportes, oficinas de dança, teatro, música e
literatura.
O
Exército brasileiro acumula uma história de fracassos. Promoveu um genocídio no
Paraguai, e até hoje os arquivos da guerra no século XIX são mantidos secretos
para não envergonharem a nossa história militar. Fez uma matança desnecessária
em Canudos para evitar que os nordestinos se livrassem da tutela dos donos de
engenhos.
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Deixou-se
manipular pela Casa Branca, em 1964, para derrubar o governo democraticamente
eleito de Jango, e implantou uma ditadura que durou 21 anos.
Não
permita, general, que haja novo fracasso. Não autorize seus soldados a se
transformarem em assassinos fardados que, ao ingressar nas comunidades,
primeiro atiram e depois interrogam.
Sua
missão será tão inútil quanto a das UPPs se acreditar que a violência que
assola o Rio é culpa apenas do narcotráfico, dos bandidos e das milícias. [a principal causa da falha monumental, criminosa da política das UPPs - na época Unidade de Polícia Pacificadora, hoje, Unidade de Perigo ao Policial - está exatamente na tentativa de extinguir um ponto essencial no combate ao crime: 'Polícia é polícia, bandido é bandido'.
Não adianta tentar misturar. O morador da favela - em que pese que nem todos são bandidos - não pode gozar de total confiança da polícia, por diversos fatores: alguns dos moradores são bandidos mesmo, outros não são assumidamente bandidos mas torcem pelos bandidos, outros ficam contra a polícia por temor aos bandidos.
As alternativas que recomendam confiar, sempre desconfiando, da maior parte dos moradores das favelas são várias o que impõe seguir a prudente regra: CONFIAR, DESCONFIANDO.
O crescimento da criminalidade, o domínio, ainda crescente, sobre as favelas, tira nos tempos atuais a validade, mesmo a conveniência, do policial do bairro e outros eufemismos.]
As causas
é que precisam ser urgentemente combatidas: a desigualdade social, o
sucateamento da escola pública, o desemprego, a falência do sistema de saúde.
Não
admita que seus soldados e oficiais sejam corrompidos, como ocorre a tantos
policiais e autoridades que engordam a conta bancária ao fazer vista grossa
para o crime organizado. De onde procedem as sofisticadas armas em mãos dos
bandidos? Quem os mantém previamente informados das operações repressivas?
Os
problemas não estão apenas nos morros. Estão sobretudo no asfalto, onde residem
os que alimentam o narcotráfico, os políticos corruptos, os que permitem que o
nosso sistema carcerário seja sede do comando do crime.
Salve a
imagem do Exército, general. E convença os governantes do povo fluminense e
carioca a renunciarem, para que sejam convocadas eleições antecipadas. A
democracia é sempre a melhor alternativa!"
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