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sexta-feira, 18 de novembro de 2022

Os manés estragaram a suprema boca-livre - Augusto Nunes

Revista Oeste

Superministros descobrem em Nova York que caminhar pelas ruas ficou perigoso

Ministros do STF participam de uma conferência em NY | Foto: Divulgação/Lide

Ministros do STF participam de uma conferência em NY | Foto: Divulgação/Lide 

Mesmo celebridades disputadas a cotoveladas e pilhas de dólares por organizadores de palestras achariam o convite bom demais para ser verdadeiro. Mas era: em troca de um falatório de dez minutos na sessão inaugural do Lide Brazil Conference, meia dúzia de brasileiros supostamente providos de notável saber jurídico e reputação ilibada desfrutaria em Nova York do feriadão que começou em 12 de novembro, um sábado, atravessou o domingo, engoliu a segunda-feira e só terminou na noite de terça-feira, dia da Proclamação da República. 
Os ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski, todos pertencentes à bancada que controla o Supremo Tribunal Federal, teriam direito a acompanhante, viagens aéreas em poltronas da classe executiva e hospedagem em suítes do Sofitel, além de almoços e jantares (bebida incluída) nos melhores restaurantes da capital do planeta — tudo sem desembolsar um único e escasso cent.
 
A gastança foi bancada pelo anfitrião João Doria, que a afoiteza de político amador devolveu à vida de empresário bem-sucedido. Se fosse menos superlativo, Doria teria promovido por aqui o seminário ocorrido no Harvard Club, na Rua 44. 
Além dos participantes dos dois painéis, expressavam-se em português os 250 empresários que pagaram uma bolada de bom tamanho para acompanhar a poucos metros de distância a sequência de discurseiras sobre o presente e o futuro do País do Carnaval. 
Mas discorrer sobre o Brasil nos EUA é bem mais chique. 
Se fosse menos autoconfiante, o dono do Lide teria levado em conta a taxa de risco embutida na exposição pública de seis destaques do mais impopular elenco de supremos ministros da história. Foi uma péssima ideia, confirmou já no domingo o início do cortejo de situações constrangedoras impostas aos viajantes por centenas de brasileiros, parte dos quais vive nos Estados Unidos.

Salvou-se apenas Cármen Lúcia, que não foi vista em lugar nenhum. Talvez se tenha trancado no hotel. Talvez tenha ficado trancada em Brasília. Os outros cinco foram fustigados todo o tempo por xingamentos, insultos, palavrões de variado calibre, ameaças, vaias ligeiras, demorados apupos e palavras de ordem que traduziam o descontentamento dos manifestantes com a parcialidade do Timão da Toga durante a campanha eleitoral. 

Se mesmo grandes atores costumam fracassar quando tentam esconder com camuflagens faciais o tumulto emocional decorrente de agressões verbais ao ar livre e com testemunhas, nada teve de surpreendente o fiasco dos canastrões do Pretório Excelso.  
Todos mergulharam no silêncio. 
Mas o rosto e os gestos falaram aos berros. 
Nunca foram tão reveladores o sorriso amarelo de Gilmar Mendes, os esgares impotentes de Alexandre de Moraes, os tchauzinhos assustadiços de Ricardo Lewandowski ou a sisudez falsificada de Dias Toffoli, que acentua o jeitão de pior aluno da classe.
 
Entorpecidos pelas salvas de palmas que jamais ficam fora das cerimônias na realidade paralela de Brasília, alguns alvos demoraram a entender que andam muito mal no retrato desenhado por gente comum.  
Se tivessem alguma intimidade com as ruas do Brasil, saberiam que milhões de cidadãos enxergam no STF um partido que apoia Lula, sempre foi hostil a Bolsonaro, mandou às favas a Constituição e os códigos legais, acha que manda no Brasil, ameaça a liberdade e anda fazendo o que quer.  
O decano Gilmar Mendes, por exemplo, nem suspeitou da tocaia iminente quando uma jovem abriu o diálogo aparentemente inofensivo. Com leve sotaque espanhol, declarou-se otimista com a vitória de Lula, e animada com o afastamento de Bolsonaro, antes de empalidecer Gilmar com a interrogação inesperada: “O crime compensa no Brasil?”. Depois de intermináveis cinco segundos, o ministro murmurou duas palavras — “Não sei…” — e caiu fora com cara de quem sabe direitinho a resposta: claro que compensa.

Tampouco Barroso pressentiu que estava a um passo da areia movediça quando foi reconhecido numa esquina pela anônima compatriota: “Olha só quem tá aqui!… Como vai o senhor, juiz?”. Barroso retribuiu o que lhe parecera um cumprimento: “Tudo bem, senhora. Feliz pelo Brasil”. A tréplica soou pouco gentil: “Mas nós vamos ganhar essa luta!”. Desconcertado com a mudança de tom, Barroso foi acossado pelo som da fúria até encerrar a conversa com a dupla reprimenda: “Não seja grosseira, não seja grosseira”. A voz de Barroso, por sinal, foi a única a ser ouvida na rua. Os companheiros de viagem guardaram a garganta para as palestras. Mesmo assim, o advogado e amigo do terrorista italiano Cesare Battisti dominou o noticiário da terça-feira valendo-se de apenas quatro palavras. Tanto bastou para deixar em frangalhos o código que deveria reger o comportamento de ministros do Supremo.

No último dia do seminário e do feriadão, Sua Excelência caminhava logo atrás de Moraes quando um brasileiro às suas costas quis saber alguma coisa do presidente do Tribunal Superior Eleitoral. Moraes cruzou a porta do hotel e desapareceu. [não pode ser olvidado um pequeno contratempo que teve o ministro Moraes - desentendeu-se com uma brasileira, cidadão americana, menor de idade, o que motivou o pai da garota acionar a polícia americana para conter os ímpetos do supremo  ministro.] Ao transferir a pergunta para Barroso, o persistente inquisidor fez transbordar o copo até aqui de cólera. No suave vocabulário dos jornais amigos, o ministro perdeu a paciência: “Perdeu, mané! Não amola!”. Caminhou três metros e, antes de desaparecer hotel adentro, mirou outro manifestante à sua direita e reincidiu: “Não amola!”.

Nunca foram tão reveladores o sorriso amarelo de Gilmar Mendes, os esgares impotentes de Alexandre de Moraes, os tchauzinhos assustadiços de Ricardo Lewandowski ou a sisudez falsificada de Dias Toffoli, que acentua o jeitão de pior aluno da classe

A primeira frase comunica que Barroso acompanha de perto as mutações na gíria da bandidagem. “Perdeu, mané” é o que diz à vítima o ladrão que acabou de consumar o roubo do carro, do celular ou do relógio.  A segunda atesta que o ministro foi filhinho de papai antes dos anos 1970. Foi nessa década que caiu em desuso a expressão “não amola”, declamada por meninos que fugiam de brigas alegando que seriam repreendidos pela mãe caso voltassem para casa com o branco das meias detonado pelo contato com a terra das ruas à espera do asfalto. Tão palavroso no plenário no Supremo, tão loquaz em palestras — sempre divididas em três temas, todos alicerçados em três argumentos, com uma gracinha no parágrafo final —, Barroso foi extraordinariamente sucinto na passagem por Nova York. Falou pouco. Mas o pouco que falou virou manchete.

Foi assim com o falatório no painel de segunda-feira. Para desespero de João Doria, que em nome da pontualidade interrompe em seus eventos até o jogo de vôlei no último ponto do tie break, Barroso ultrapassou em quase 120 segundos o limite de dez minutos fixado para cada palestrante. Nesse espaço de tempo, conseguiu atacar o presidente Jair Bolsonaro, desejar bom governo a Lula, condenar ao fogo do inferno detratores do mais perfeito sistema eleitoral do universo, recomendar cadeia para quem maltrata retoricamente supremos doutores e, no clímax do desfile de vogais e consoantes, identificar a prioridade número 1 da República brasileira: o combate à pobreza e à fome. “Um país que tem gente passando fome precisa parar tudo e ir cuidar disso”, caprichou Barroso na expressão beatífica do coroinha que acabou de comungar. “Tem 33 milhões de pessoas em insegurança alimentar”, mentiu um dos generais da guerra concebida para varrer da face da terra a praga das fake news.

Certamente por não crer no que diz, essa angustiante imensidão de famintos não lhe reduz o apetite, nem o impele a alimentar-se no boteco da esquina. Durante o feriadão de ricaço, Barroso foi visto em restaurantes de fina linhagem, todos bem mais agradáveis que as companhias que escolhe. 
Num jantar nas imediações do Sofitel, por exemplo, manuseou garfos e facas ao lado de Cristiano Zanin ele mesmo, o advogado que suou de tal forma a camisa no esforço para tirar Lula da cadeia que provocou em Gilmar Mendes a comoção que resulta no pranto convulsivo sem lágrimas. Gente como Zanin só diz o que o cliente quer ouvir. 
Por conviver com figuras assim, ministros do Supremo custam a entender que podem muito, mas não podem tudo. 
No momento não podem, por exemplo, caminhar em sossego por qualquer rua de qualquer lugar do país ou de qualquer cidade do mundo onde existam brasileiros. O autoritarismo que rasga a Constituição amputou o direito de ir e vir dos superjuízes. Não deixa de ser uma forma de prisão.

Leia também “A novilíngua da transição”


sexta-feira, 7 de outubro de 2022

O gol contra de Moraes - Revista Oeste

Augusto Nunes

Ministro corintiano não vê diferenças entre uma questão judicial e um jogo de futebol 

Rosa Weber, Alexandre de Moraes e Rodrigo Pacheco, em entrevista coletiva sobre as eleições | Foto:  Antonio Augusto/Secom/TSE

Rosa Weber, Alexandre de Moraes e Rodrigo Pacheco, em entrevista coletiva sobre as eleições | Foto: Antonio Augusto/Secom/TSE  

“Eu sou corintiano, como todos sabem”, começou o mais curto, surpreendente e destrambelhado pronunciamento de Alexandre de Moraes desde que descobriu os superpoderes concedidos a titulares do Timão da Toga. Sem esclarecer a abrangência do pronome indefinido plural — todos os parentes, todos os amigos, todos os demais torcedores ou todos os brasileiros? —, o governador-geral das eleições partiu para a evocação do trauma, sofrido quando tinha 8 anos de idade, que explica a origem do seu estilo tiro-porrada-e-bomba: “Até hoje eu contesto a vitória do Internacional contra o Corinthians em 1976, aquela bola que bateu na trave e bateu fora e foi dado o gol”.

Feito o misterioso preâmbulo, chutou de bico no pau de escanteio: “Só que eu fico com a minha contestação pra mim mesmo. É assim que o Tribunal Superior Eleitoral vai tratar quem contestar as eleições”.  
Enfim se soube que um gol que Moraes tenta digerir há quase 50 anos poluiu a cabeça baldia com certezas tão esquisitas quanto um baile a rigor no meio do Deserto do Saara.

Para o presidente do TSE, por exemplo, não há diferenças entre uma questão judicial no Brasil do século 21 e um jogo de futebol de antigamente. Mais: o despacho injusto de quaisquer excelências do alto comando do Judiciário é tão definitivo e inapelável quanto decisões desastradas dos juízes que suavam nos gramados trajados de preto e calçando chuteiras.

Alguma alma piedosa precisa contar à sumidade em matéria eleitoral que foi para reduzir ao mínimo o volume de erros que os dirigentes do mundo do futebol decidiram socorrer os árbitros com a criação do Video Assistant Referee, o VAR. 
 Caso tivesse ocorrido neste outubro, o gol que segue atormentando o ministro decerto seria anulado pela revisão das imagens. Mas Moraes prefere um TSE sem VAR ou qualquer outro instrumento de correção. A usina de decisões monocráticas, frequentemente sem pé nem cabeça, não admite contestações protagonizadas por quem se considera prejudicado. E vive perdendo a paciência com quem constata que os doutores a serviço da Justiça Eleitoral são tão imparciais como mãe de candidata a miss na noite do desfile final.
 
“Seremos implacáveis com divulgadores de fake news”, recita Moraes desde a festa de posse em que foi aplaudido de pé por meia dúzia de reputações ilibadas e uma imensidão de prontuários.  
Mas só quem vota em Jair Bolsonaro comete esse pecado capital, informa a enxurrada de punições impostas a quem publica notícias que possam prejudicar o ex-presidente Lula. 
Até os bebês de colo sabem que o chefe do Mensalão e do Petrolão passou meses engaiolado em Curitiba. 
Mas o TSE proíbe que o qualifiquem de ex-presidiário. 
Até napoleões de hospício compreendem que as mortes ocorridas durante a pandemia foram causadas por um vírus chinês em todos os países do mundo. 
Menos no Brasil, concorda o tribunal. Aqui só se morreu de Bolsonaro, singularidade que libera adversários do candidato à reeleição para acusá-lo de “genocida”.

Ninguém errou tanto quanto os pajés do Datafolha e do Ipec. Nenhum voltou a agir com a rapidez do velho Ibope com novo codinome

Como comprova J.R. Guzzo na análise do tema de capa desta edição de Oeste, a Gazeta do Povo foi censurada por registrar que Lula é um velho amigo de Daniel Ortega o ditador nicaraguense que, depois de prender um a um todos os que ousaram inscrever-se como candidato numa eleição de araque, agora deu de prender padres, freiras e bispos católicos. 
Não pode, resolveu o juiz Paulo de Tarso Sanseverino, outro impetuoso artilheiro do TSE. 
O companheiro Ortega e o companheiro Lula só se conhecem de vista. Quem acha o contrário quer induzir o eleitorado a acreditar que, se Lula conseguir regressar ao palco dos crimes incontáveis, vai declarar guerra ao Vaticano, estatizar igrejas e transformar púlpito em palanque. Às favas a liberdade de imprensa, os fatos, a sensatez, a verdade e a Constituição.
O batalhão de advogados, chefiado pelo inevitável Cristiano Zanin, consegue 11 decisões favoráveis a cada dez pedidos de remoção de notícias incômodas. 
E vence 101 a cada 100 ações destinadas a vetar o conteúdo ou interditar peças de propaganda eleitoral concebidas pela equipe de Bolsonaro. Alguém aí se surpreendeu? 
Zanin obrigou Gilmar Mendes a consumir barris de água para não desandar na choradeira exigida pelo desempenho de um advogado disposto a tudo para libertar o cliente bandido. 
Tão comovido quanto o decano do Supremo, Lula vai infiltrar Zanin no Pretório Excelso se alcançar um terceiro mandato.  
Para adular um possível colega, Moraes delegou ao ministro Benedito Gonçalves, aquele que Lula contempla publicamente com tapinhas no rosto, a missão de irritar Bolsonaro com o atrevimento dos antigos juízes de futebol.

Gonçalves proibiu a primeira-dama Michelle Bolsonaro de aparecer com destaque no horário eleitoral, proibiu o marido de gravar lives na residência oficial do casal, proibiu o presidente da República de documentar com imagens a presença no funeral de Elizabeth II em Londres, proibiu a reprodução de trechos do discurso na sessão de abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, em Nova Iorque. Haja insolência. E haja esperteza, berra a impunidade dos mais ativos parteiros de mentiras deste ano eleitoral: os donos das lojinhas de porcentagens disfarçadas de “institutos de pesquisa”.

Lula vai liquidar a disputa no primeiro turno, mentiram em 1º de outubro apresentadores de telejornais e redatores de primeiras páginas, todos amparados em pesquisas divulgadas por sete das nove empresas em ação no Brasil. 
No dia seguinte, a apuração dos votos escancarou em 21 das 27 unidades da federação diferenças de proporções siderais entre os prognósticos dos videntes de galinheiro e a verdade das urnas
 Além de atropelados pela ascensão de Bolsonaro, os fabricantes de índices foram espancados pela desmoralizante inversão de posições nas disputas por governos estaduais e vagas no Senado. Ninguém errou tanto quanto os pajés do Datafolha e do Ipec. Nenhum voltou a agir com a rapidez do velho Ibope com novo codinome.

Neste 5 de outubro, os vigaristas da estatística reapareceram com mesma fantasia. Segundo o Ipec, Lula está na frente, Bolsonaro corre arfante quilômetros atrás. O TSE não vê nada de mais. O favorito se fecha em casa, o azarão mobiliza multidões. Os doutores em eleição fecham os olhos ao que acontece na margem esquerda do rio. Só vigiam o outro lado. Mas não percebem que o povo se move à direita. Tampouco sabem que o povo pune.

Leia também “Abraço de afogado”  

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

 

sexta-feira, 2 de setembro de 2022

Faltou alguém no debate - Revista Oeste

Augusto Nunes

Alexandre de Moraes e seu acervo de arbitrariedades ficaram fora do duelo entre os candidatos à Presidência 

Nos minutos iniciais do debate que reuniu seis candidatos à Presidência da República, o jornalista Eduardo Oinegue quis saber de Jair Bolsonaro e Simone Tebet o que farão, caso vençam a disputa nas urnas, para restabelecer a harmonia perdida no convívio entre os três Poderes. Boa pergunta. A poucas semanas da eleição presidencial, nenhum tumor no organismo democrático é mais perigoso que o alimentado por sucessivas intromissões do Supremo Tribunal Federal em territórios e atribuições pertencentes ao Legislativo e ao Executivo.

Os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva, Simone Tebet e Jair Bolsonaro, durante o debate de presidenciáveis na Band (29/08/2022) | Foto:  Suamy Beydoun/Agif/Agência de Fotografia/Estadão Conteúdo
Os candidatos Luiz Inácio Lula da Silva, Simone Tebet e Jair Bolsonaro, durante o debate de presidenciáveis na Band (29/08/2022) | Foto: Suamy Beydoun/Agif/Agência de Fotografia/Estadão Conteúdo

A ofensiva expansionista tornou-se evidente em 2019, quando o presidente da Corte, Dias Toffoli, pariu o inquérito das fake news. 
 O aleijão constitucional nascido meses depois da posse de Bolsonaro foi entregue aos cuidados de Alexandre de Moraes. 
De lá para cá, na gerência da usina de arbitrariedades, decisões insolentes, chicanas e outras agressões ao Estado de Direito, Moraes vem caprichando no papel de Supremo Capataz do Brasil.  
Depois de assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, o impetuoso artilheiro do Timão da Toga aparentemente concluiu que isso tudo ainda é pouco. Haja arrogância.
 
Não é o que pensa a senadora mato-grossense Simone Tebet. Primeira a comentar o tema, a candidata do MDB confirmou que certas manifestações de covardia requerem mais coragem que atos de bravura praticados no clímax de um combate. “É muito simples”, recitou ao iniciar o espancamento do idioma e da verdade. “A harmonia depende excessivamente de um presidente da República que saiba cumprir a Constituição e o seu papel.” 
Sem pausas, acusou o adversário de ameaçar a democracia o tempo todo, por menosprezar a imprensa livre e a independência do Supremo, fora o resto. “A política é que está judicializando o Poder Judiciário”, ficou de cócoras Simone.
Em um minuto, Bolsonaro sepultou o falatório da senadora no jazigo das fantasias. 
Lamentou o ativismo judicial da maioria dos ministros, que transforma qualquer corte em comitê político-eleitoral. Criticou a ingerência do Judiciário em territórios alheios
Deixou claro que o Palácio do Planalto é não a fonte, mas o destinatário das provocações. 
E introduziu no debate, realizado neste 28 de agosto, um fato que em qualquer país sensato teria dominado o debate. 
Dias antes, por ordem do ministro que acumula no monstrengo rebatizado de inquérito do fim do mundo os papéis de vítima, detetive, delegado, promotor, juiz e relator, a Polícia Federal cumprira mandados de busca e apreensão em propriedades de oito empresários que trocam mensagens numa rede social. 
Pena que Moraes se tenha dispensado de participar do debate na Band. Ele não precisa de um único voto para achar que manda no Brasil — e fazer o que lhe dá na telha destelhada.
Na versão do Supermagistrado, baseada em outro atentado à língua portuguesa e ao raciocínio lógico cometido por um sherloque de estimação, evidências robustas demonstram que os alvos da prepotência dormem e acordam sonhando com um golpe de Estado que colocaria Bolsonaro no lugar que já ocupa. 
Depois do flagrante perpétuo, da prisão preventiva sem prazo para terminar, do inquérito sem data para ser concluído, da punição de parentes do autor de crimes secretos, da liberdade de expressão algemadae depois de resolver que falar mal de ministros do STF é crime hediondo —, Moraes surpreendeu o mundo com outra assombrosa brasileirice: o golpe de Estado modelo WhatsApp, planejado em recados eletrônicos e executado sabe Deus como. 
Ainda em sua primeira fala no debate, enfim, o candidato à reeleição constatou que a insistência de Moraes em castigar o deputado federal Daniel Silveira é um desafio à graça constitucional concedida ao parlamentar pelo chefe do Executivo.

Sobre a epidemia de vigarices protagonizadas por integrantes do Supremo, nem um pio

O país finalmente vai tratar de perigos reais e imediatos, animaram-se profissionais da esperança. 
A violência que alvejou empresários inocentes,  cujas redes sociais continuam confiscadas, fora considerada excessiva até por editorialistas da imprensa velha, até por jornalistas que se escondem sob rotativas desativadas quando ouvem o nome do carrasco togado, até por entidades de classe que murmuram “amém” ao toparem com qualquer manifesto de rebanho. Os semideuses do Egrégio Plenário enfim seriam confrontados com críticas públicas dos demais participantes do debate, estimulados por perguntas que estão na ponta da língua de profissionais sem medo.
 
Quem sonha com tão improváveis surtos de altivez deve esperá-los sentado. Nenhum outro jornalista formulou outras perguntas vinculadas ao assunto mais importante do ano eleitoral. Nenhum outro candidato desperdiçou seu tempo com genuínos golpistas. Alexandre de Moraes não teve o nome mencionado uma única vez. O que se ouviu foi o estridente silêncio dos cúmplices. Além dos previsíveis ataques a Bolsonaro, prontamente rebatidos pelo alvo preferencial de novo condenado por crimes futuros, a noitada apresentou aos espectadores o imposto único louvado por Soraya Thronicke, o pungente esforço de Simone Tebet na CPI em que estreitou a amizade com Renan Calheiros e Omar Aziz, o calote sideral planejado por Ciro Gomes em favor dos brasileiros endividados
A pandemia que acabou há muitas semanas foi revisitada várias vezes. Sobre a epidemia de vigarices e patifarias protagonizadas por integrantes do Supremo e seu atrevido puxadinho batizado de Justiça Eleitoral, nem um pio.
Desde 2019, com o endosso do Alto Comando do Pretório Excelso, Moraes tenta repetir que gente contemplada com o dom da onisciência identifica com clareza solar a mentira e a verdade, o fato e o boato, a informação correta e a notícia enganosa, o que esclarece e o que desinforma. Se é assim, o que espera o ministro que tudo sabe e tudo vê para confirmar, como prometeu no discurso de posse no TSE, que seria “implacável” com difusores de fake news? ]
Até bebês de colo sabem que, desde o tempo das cavernas, seres humanos que se enfrentam em duelos verbais fazem afirmações opostas. Como não há duas verdades antagônicas sobre a mesma coisa, uma afirmação é a certa, a outra é errada. Portanto, uma fake news.
Um Lula cada vez mais bisonho, por exemplo, jurou no debate que foi inocentado pelo Judiciário
Foi informado que a Lei do CEP inventada por Edson Fachin não anulou as condenações aprovadas por nove juízes em três instâncias. Alguém mentiu e Moraes está obrigado a enquadrar o pecador. Também garantiu que Bolsonaro anda vendendo estatais a preço de banana e privatizou a Petrobras, além de uma BR cujo nome não conseguiu lembrar. 
E lembrou que, ao contrário do que fez Ciro Gomes, não fugiu para Paris quando começou o segundo turno da eleição de 2018. Nem poderia, retrucou Ciro: para tanto, teria de escapar da cadeia em Curitiba.  
Gente assim merece ser levada a sério? 
Qual candidato será enquadrado pelo implacável juiz de palanque?
 
Simone Tebet revelou que, quando vê uma mulher tratada com dureza, primeiro procura descobrir em quem vota. 
Se desejar a morte do Grande Satã do Planalto, socorre bravamente a vítima da misoginia. 
Caso a agredida simpatize com o chefe do governo federal, como a doutora Nise Yamagushi, repassa o serviço para a senadora Leila. [por respeito ao nobre esporte praticado por Ana Paula Henkel e a própria, suprimimos o termo do vulgo da senadora do DF.]  
Está certo isso, doutor Moraes? 
No momento, o presidente do TSE não tem tempo para responder a tais miudezas. Está ocupado demais. Precisa impedir que Roberto Jefferson e Daniel Silveira sejam candidatos a qualquer cargo. 
Ou que golpistas digitais usem o 7 de Setembro para desencadear a quartelada que levará Bolsonaro ao cargo que já ocupa. 
Ou, ainda, que extremistas conservadores insistam em difamar a urna eletrônica promovida a orgulho nacional por gente que envergonha o Brasil que pensa e presta.

Terminado o duelo, entraram em cena os analistas de debate. Dez minutos mais tarde, decidiu-se que Simone Tebet triunfara, que Ciro levara a medalha de prata, que Lula só não vencera por falta de explicações para a roubalheira inexplicável. 

O perdedor, claro, fora Bolsonaro, abalado por duas fraturas expostas: a mania de maltratar mulheres que o maltratam e a economia fragilizada.  [o 'capitão do povo' não perdeu o embate, bem foi ao  bate-boca para ganhá-lo e sim para ganhar as próximas eleições.]

Nesta semana, o júri de galinheiro foi empurrado para as cordas pelo cortejo de boas notícias: o PIB cresceu, o desemprego diminuiu, a inflação caiu, o preço dos combustíveis baixou, a renda dos brasileiros aumentou. Os profetas catastrofistas tentaram reagir com um “mas”: no ano que vem as coisas vão piorar.  

Foram nocauteados na sexta-feira, quem diria, por uma pesquisa do Datafolha que finalmente permitiu a Bolsonaro ultrapassar a faixa dos 30%. Falta pouco para a eleição. A apuração dirá se Alexandre de Moraes consegue ser implacável com falsidades publicadas por companheiros de luta.

Leia também “Pedro III e a professorinha”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

sexta-feira, 29 de julho de 2022

Os quatro Moraes - Revista Oeste

Augusto Nunes

Já se registrou nesta coluna a existência de duas versões de Alexandre de Moraes: a escrita e a falada. A primeira se manifesta na penca de livros que assinou, vários deles de leitura obrigatória em dezenas de cursos de Direito. 
Os textos tratam o idioma com gentileza, embora não dispensem enxurradas de latinórios e pedantismos em juridiquês castiço. 
A segunda versão não sobreviveria a uma prova oral de língua portuguesa do Enem. 
Quando fala de improviso, Moraes estaciona em reticências, tropeça em vírgulas errantes, escava fossos entre sujeito e predicado, junta palavras que não conversam entre si e produz sopas de letras intragáveis.
 
Como atestou a sabatina no Senado que aprovou por 19 votos a 7 sua indicação para a vaga no Supremo Tribunal Federal aberta pela morte de Teori Zavascki, a versão falada derrapa em desempenhos bisonhos mesmo quando lê textos redigidos pela versão escrita
Quase 11 horas de perguntas e respostas confirmaram que o sabatinado nunca chega a algum lugar. Ele só chega em
Também ignora a diferença entre onde e aonde, e nem desconfia que os dois advérbios se referem a algum ponto geográfico, nunca a um espaço de tempo. Estou falando da semana aonde me encontrei com o governador, disse mais de uma vez à ilustre plateia. 
E o falatório foi frequentemente truncado por apostos que transformam parágrafos num cortejo de vogais e consoantes que não faz sentido e parece nunca chegar ao fim. 

Depois da posse no Egrégio Plenário, tomaram forma o professor que ensina a coisa certa e o ministro que faz tudo errado

O descompasso entre a versão falada e a versão escrita se desdobraria em outra e mais perturbadora disfunção esquizofrênica: depois da posse no Egrégio Plenário, tomaram forma o professor que ensina a coisa certa e o ministro que faz tudo errado
A tese que o tornou doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo, por exemplo, afirma que não pode ser indicado para a Corte Suprema o ocupante de um cargo de confiança do presidente da República em exercício, “para que se evite demonstração de gratidão política”. Ao aceitar o convite de Michel Temer para substituir Teori Zavascki, ou Moraes não lembrou que era ministro da Justiça ou esqueceu a tese defendida quase 20 anos antes. 
 
Em 21 de fevereiro de 2017, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, o sabatinado jurou combater a praga do “ativismo judicial” — essa insolente mania que têm os ministros de intrometer-se em assuntos que não lhes dizem respeito.  
Baseado em argumentos expostos em livros que assinou, Moraes se dispôs a acabar com esse coquetel de onisciência, onipresença e onipotência. “Não são poucos os que apontam enorme perigo à democracia e à vontade popular na utilização exagerada do ativismo judicial”, constatou. “Um juiz ativista ignoraria o texto da Constituição, a história de sua promulgação, as decisões anteriores da Suprema Corte, que tentaram interpretá-las, e as duradouras tradições da nossa cultura política.” 

 Moraes que louvara a amistosa convivência com o Legislativo pariu o flagrante perpétuo e abortou a imunidade parlamentar para encarcerar o deputado federal Daniel Silveira

É o que Moraes não para de fazer desde 14 de março de 2019, quando o então presidente Dias Toffoli promoveu o impetuoso parceiro a relator do inquérito inventado para investigar a disseminação de fake news e ameaças endereçadas a integrantes do Timão da Toga. “O juiz pode incorrer num perigoso grau de subjetivismo ao interpretar a Constituição impondo seu próprio ponto de vista sobre os demais Poderes”, dissera durante o sarau com senadores o Moraes que já não existia — se é que existiu um dia. 
O candidato ao Supremo que pregava um convívio harmonioso com o Executivo foi o ministro que proibiu Jair Bolsonaro de nomear Alexandre Ramagem para a direção-geral da Polícia Federal — cargo cujo preenchimento é atribuição exclusiva do presidente da República. O Moraes que louvara a amistosa convivência com o Legislativo pariu o flagrante perpétuo e abortou a imunidade parlamentar para encarcerar o deputado federal Daniel Silveira.
 
“É preciso adotar um prazo máximo para prisões preventivas”, sustentou na sabatina. Manteve Daniel na cadeia por cinco meses
E, ao fim do julgamento no STF, celebrou com um sorriso vitorioso a condenação do deputado a quase nove anos de prisão.  
Frustrado com a graça constitucional concedida por Bolsonaro ao perseguido predileto do carcereiro togado, mandou às favas o parecer expedido num vídeo divulgado em 2018. 
Nele, Moraes reafirma que a concessão do indulto seja individual ou coletivo, seja graça constitucional — é atribuição privativa do presidente da República, “goste-se ou não”. Alheio à ressalva, continua aplicando multas escorchantes a um representante do povo transformado em preso político por um ministro decidido a revogar o preceito constitucional: nenhum deputado ou senador pode ser punido por quaisquer opiniões, palavras ou votos. 

 Até incorporar-se ao grupo de superjuízes, havia dois Moraes. Agora são quatro — o mesmo número de pontos de exclamação hasteados depois da última palavra do manifesto concebido por gente que enxerga soldados da democracia em torturadores da liberdade de expressão. 
O texto indigente parece ditado pela versão falada de Moraes, que não pode ficar fora da festa preparada para a leitura oficial do palavrório. Não são citados nomes de candidatos ao Planalto. Mas fica evidente que os signatários veem em Lula a sumidade enviada pela Divina Providência para livrar o Brasil de Jair Bolsonaro. 
 
O ponto de exclamação é a bengala do idioma, feita para avisar aos distraídos que as vogais e consoantes que o precedem devem ser pronunciadas aos gritos. Os autores do manifesto todos ex-alunos da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, como Moraes — usaram um na entrada e quatro na saída.  
Que tal usar um desses sinaizinhos para chacoalhar a cabeça de Celso de Mello, escalado para a leitura inaugural do palavrório mambembe? Em 2012, durante o julgamento do Mensalão, o ainda ministro recitou centenas de vezes que os poderosos patifes envolvidos naquela ladroagem não tinham um programa de governo. Tinham um projeto criminoso de poder. 
Com a bengalada, o Pavão de Tatuí talvez consiga lembrar que o chefe do bando era Lula, que agora pretende devolver à cena do crime.

Leia também “De olho no Supremo” 

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste

 

sábado, 7 de maio de 2022

A Constituição estuprada - Revista Oeste

Augusto Nunes

Alexandre de Moraes comanda os trabalhos de parto do indulto sem perdão

Alexandre de Moraes, ministro do STF -  Foto: Aloisio Mauricio/Fotoarena/Estadão Conteúdo
 
Em 2019, o ministro Alexandre de Moraes repetiu numa sessão do Supremo Tribunal Federal o que ensinava o professor Alexandre de Moraes em salas de aula e nos vários livros que assinou. A fala eternizada num vídeo que faz sucesso nas redes sociais é curta e grossa:

“A questão do indulto, esse ato de clemência constitucional, é um ato privativo do presidente da República. Podemos gostar ou não gostar. Assim como vários… várias parlamentares também não gostam quando o Supremo Tribunal Federal declara a inconstitucionalidade de emendas e leis. O ato de clemência constitucional não desrespeita a separação de Poderes. Não é uma ilícita ingerência do Poder Executivo na política criminal genericamente estabelecida pelo Legislativo e concretamente aplicada pelo Judiciário. Até porque indulto — seja graça ou perdão presidencial, seja o individual, seja coletivo — não faz parte da política criminal. É um mecanismo de exceção, contra o que aquele que tem competência, o presidente da República, entender como excessos da política criminal”.

Ponto final. Não há dúvidas a dirimir, pontos obscuros a eliminar.  
A aplicação das formas de indulto é coisa do presidente da República, adverte Moraes. Privativa, pessoal e intransferível. Se alguém não gostar do beneficiário ou de quem concedeu o perdão, deve espelhar-se na imagem de Nelson Rodrigues: resta sentar-se no meio-fio e chorar lágrimas de esguicho. Ou vá queixar-se ao bispo, recorrer ao Papa, talvez afogar as mágoas no botequim da esquina.  
O que não se pode fazer é contestar o decidido por quem lida com o assunto: o chefe do Poder Executivo, mais ninguém. 
O Judiciário e o Legislativo têm de calar-se o mais silenciosamente possível, porque a concessão do indulto “seja graça ou perdão, seja individual ou coletivo” é decisão pronta e acabada.
 
A menos que o indultado seja o deputado federal Daniel Silveira, resolveu na quarta-feira o onipresente Alexandre de Moraes em resposta a uma solicitação da vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo. O papelório produzido pelo estuprador da Constituição ecoa o som da fúria, confirma a opção preferencial pela perversidade e informa aos berros que o Supremo destes tempos estranhos é controlado por juízes fora da lei, que têm em Moraes sua mais truculenta tradução.  
Com o apoio da maioria dos titulares do Timão da Toga, o carrasco do Pretório Excelso insiste em transformar um deputado federal protegido por normas constitucionais e pela imunidade parlamentar em hóspede do seu cativeiro particular, alvejado por violências que espantariam senhores de escravos.

Na questão do indulto, o ministro mentiu em 2019 ou está mentindo agora?

Em 25 de abril, valendo-se do que o Moraes do vídeo considera ato privativo do chefe do Executivo, Jair Bolsonaro concedeu a graça presidencial a Daniel Silveira. Com a publicação do indulto no Diário Oficial da União, o deputado tornou-se um homem livre, voltou a exercer em sua plenitude o mandato parlamentar e não tem contas a acertar com a Justiça. O Moraes do Supremo resolveu revogar o que sempre afirmou o professor, pelo menos até encarnar simultaneamente cinco personagens inconciliáveis: vítima, investigador, delegado, promotor e juiz

Obcecado pelo sonho de punir Daniel Silveira com quase nove anos de prisão, multas escorchantes, tornozeleiras eletrônicas, proibição de acesso a redes sociais ou contatos com eleitores, perda do mandato e outras medidas fora da lei, inscreveu-se na história nacional da infâmia com uma sopa de letras que colide frontalmente com o vídeo:

“O tema relativo à constitucionalidade do Decreto de Indulto será analisado em sede própria, pois, conforme definido por esta Suprema Corte, apesar de o indulto ser ato discricionário e privativo do Chefe do Poder Executivo, a quem compete definir os requisitos e a extensão desse verdadeiro ato de clemência constitucional, a partir de critérios de conveniência e oportunidade, não constitui ato imune ao absoluto respeito à Constituição Federal e é, excepcionalmente, passível de controle jurisdicional, pois o Poder Judiciário tem o dever de analisar se as normas contidas no Decreto de Indulto, no exercício do caráter discricionário do Presidente da República, estão vinculadas ao império constitucional (grifo meu). Tradução em língua de gente: indulto é atribuição do chefe do Executivo, mas a última palavra será transferida para os superjuízes caso o presidente se chame Jair Bolsonaro e tenha livrado da cadeia alguém que ofendeu os integrantes do Egrégio Plenário.

Moraes seviciou princípios elementares do Direito com o inquérito das fake news. Se consegue enxergar a olho nu o que é verdade e o que é mentira, está convidado a desfazer a interrogação que desenhou: na questão do indulto, o ministro mentiu em 2019 ou está mentindo agora? Depois de seviciar a Constituição com a invenção do flagrante perpétuo e da prisão preventiva em regime fechado e sem prazo para acabar, o impetuoso promotor que virou juiz por vontade de Michel Temer agora comanda os trabalhos de parto do indulto sem perdão

 Estimulado por parceiros que habitam um universo paralelo onde é possível comer lagosta todo dia (acompanhada por cálices de vinhos premiados), Moraes lidera a marcha da insensatez que pode desembocar no confronto entre dois Poderes.

Se o STF persistir na tentativa de algemar o presidente da República, para impedi-lo de deliberar sobre um assunto privativo do chefe do governo, estará configurado um impasse que será solucionado pelas Forças Armadas. É o que determina o artigo 142 da Constituição, como vem alertando há tempos o jurista Ives Gandra Martins.  
Desde a promulgação da Constituição de 1988, o comportamento de oficiais e soldados tem sido impecável. Fora o ministro Luís Roberto Barroso, que anda enxergando quarteladas em gestação contra o sistema eleitoral, até os doidos de hospício que proliferam na esquerda brasileira admitem que as três Armas são orientadas por um profissionalismo exemplar. Mas convém registrar que seus comandantes não levam em conta arreganhos de denisses e lindôras.  
Tampouco se impressionam com surtos de megalomania que transformam juízes do Supremo em Mussolinis de ópera-bufa.

Leia também “Duelo na Praça dos Três Poderes”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste


sexta-feira, 25 de março de 2022

Juiz de porta de avião - Revista Oeste

Luiz Inácio Lula da Silva e Rosemary Noronha | Foto: Montagem/ Revista Oeste
Luiz Inácio Lula da Silva e Rosemary Noronha - Foto: Montagem/ Revista 

Fazer o que faz o homem encarregado de lidar com suas redes sociais, liquidou a questão Bolsonaro no primeiro encontro com jornalistas excitados com o prosseguimento do duelo entre o chefe do Executivo e o artilheiro do Timão da Toga.  
Como a usina de insolências não pode parar, Moraes resolveu atacar com mais cobranças. 
Quer saber de onde saiu o dinheiro que pagou as despesas de Carlos. Do bolso do viajante? 
Ou de algum cartão corporativo usado indevidamente? 
O ministro também desconfia que a conta pode ter sido espetada no misterioso Gabinete do Ódio, assombração ainda homiziada em lugar incerto e não sabido, mas provida de munição digital suficiente para desequilibrar eleições e instalar no Brasil uma ditadura fascista.

Bolsonaro informou que o filho não foi socorrido por um único e escasso centavo. Mas Moraes é duro na queda: segue à caça de interrogações tão importantes quanto as dúvidas que me assaltam quando tento lembrar a escalação completa do Clube Atlético Taquaritinga, o “Leão da Araraquarense”, naquele jogo contra o Radium de Mococa disputado no verão de 1958. Já desisti de brigar com a memória. Bem mais teimoso é o parteiro do inquérito que há mais de três anos combate fabricantes de fake news, atos antidemocráticos, atentados a instituições e falatórios que deixam mal no retrato o Pretório Excelso.

Se acordar com o pavio alguns milímetros mais curto, o ministro pode expedir um mandado de prisão em flagrante perpétuo e trancafiar numa cela o piloto do avião que levou Carlos à Rússia. 
Se perder o sono, talvez seja assaltado pela ideia de indiciar no inquérito do fim do mundo a comissária de bordo que serviu cafezinho ao investigado. 
Por isso, e antes que aumente o calibre do surto de prepotência, convém desviar as atenções do impetuoso superjuiz para as comitivas que abrigaram Rosemary Noronha, a Rose, alojada de 2004 a 2012 na chefia do escritório da Presidência da República em São Paulo.

Durante sete anos, a mulher de temperamento esquentado desfrutou dos grandes e pequenos prazeres ao alcance de uma Segunda Dama

Não foi esse cargo que fez da ex-secretária de José Dirceu e ex-assessora de Lula uma assídua freguesa do Aerolula. Ela chegou lá por ocupar o posto de Segunda Dama.

As medidas preventivas adotadas pelo casal procuravam apenas evitar acessos de fúria da Primeira. Rose só viajava quando Marisa Letícia ficava em casa. Como seu nome era excluído da lista de passageiros publicada no Diário Oficial, a clandestina dispensada de esconder-se virou a penetra com mais horas de voo do planeta. Os parceiros de comitiva conheciam os reais motivos da presença a bordo daquela mulher cujas ancas desafiavam poltronas acanhadas e com uma franja na testa que dilatava as maçãs do rosto. A missão de Rose era garantir que Lula acordasse com a expressão satisfeita de quem passara boa parte da noite sobrevoando nuvens extraordinariamente azuis.

A bordo, o expediente de Rose começava quando anoitecia: risonha, avançava pelo corredor em direção aos aposentos presidenciais — para regressar ao fundo da aeronave depois do café da manhã. Em terra, seguia a programação oficial em silêncio, com o olhar distraído de quem se dispensa de saber se está no litoral do Caribe ou num deserto africano. Terminado o jantar, os dois partiam rumo às suítes contíguas do hotel cinco-estrelas. 

A porta entre as duas alcovas permanecia entreaberta. Foi assim nos mais de 30 países que Rose conheceu em mais de 20 viagens no Aerolula. Entre uma e outra, os encontros ficavam mais complicados. De todo modo, a frequência bastou para conferir ao escritório da Presidência, onde uma ampliadíssima foto de Lula fantasiado de atacante no momento do pênalti enfeitava um bom pedaço de parede, a fama de maior garçonnière da capital paulista.

(...)

E então o que parecia um romance extraconjugal virou caso de polícia.

A vida mansa acabou em 23 de novembro de 2012, quando a Operação Porto Seguro, desencadeada pela Polícia Federal, alcançou a Segunda Dama e seus protegidos, batizados pela imprensa de “Bebês de Rosemary”.  Assustado com a ampliação do acervo de maracutaias, Lula fez o que sempre faz quando precisa costurar algum álibi menos cretino: perdeu a voz e sumiu, agarrado à esperança de sobreviver sem fraturas ao primeiro escândalo que não poderia terceirizar. Não havia bodes expiatórios a convocar. Nem respostas aceitáveis para perguntas especialmente constrangedoras. Passou a primeira semana enfurnado no Instituto Lula. Passou as duas seguintes longe do Brasil, driblando repórteres com escapadas pela porta dos fundos ou pela cozinha do restaurante.

(......)

Cansados das tentativas de prender o gângster Al Capone pelos medonhos crimes que praticara, policiais de Chicago conseguiram condená-lo a uma interminável temporada na cadeia por ter lesado o Fisco.  
Como Rose e seus parceiros escaparam do castigo reservado a torturadores do Código Penal, a última esperança do Brasil que pensa e presta é, quem diria?, a cabeça tumultuada de Alexandre de Moraes. A perseguição movida contra Carlos Bolsonaro informa que, aos olhos do ministro, juntar-se a comitivas presidenciais pode ser considerado ato criminoso. 
Por que o ministro não reexamina o papel desempenhado por Rosemary Noronha depois de embarcar no Aerolula? 
É o que já teria feito se Rose, decepcionada com o sumiço de Lula, declarasse que vai votar em Jair Bolsonaro.

Leia também “O prepotente, o dissimulado e o ególatra”

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sexta-feira, 12 de novembro de 2021

Um deputado é o alvo predileto do carcereiro fora da lei - Revista Oeste

Deputado federal Daniel Silveira | Foto: Michel Jesus
Deputado federal Daniel Silveira -   Foto: Michel Jesus

O general argentino Leopoldo Galtieri e o ator americano George C. Scott

Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal, acha-se parecido com o ator Yul Brynner, que em 1960 fez bonito no papel do pistoleiro do bem Chris Adams em Sete Homens e um Destino. (O título original é ainda mais excitante: The Magnificent Seven. A tradução literal resultaria em algo como Os Sete Magníficos, Os Sete Gloriosos, Os Sete Soberbos ou Os Sete Grandiosos. Não é pouca coisa.) O protagonista, vivido por Brynner, é contratado por moradores de um lugarejo na fronteira com o México, atormentados pela opressão da quadrilha chefiada pelo brutal Calvera, e cumpre a missão de libertá-los da rotina de violências liderando outros seis anti-heróis. Pelo que anda fazendo, Moraes também parece enxergar no espelho não um sósia de Yul Brynner, mas um Chris Adams de toga.

Alexandre de Moraes e o ator russo Yul Brynner | Fotos: Divulgação
Os acordes da lira do delírio que já há alguns anos ditam o ritmo da trilha sonora do STF se tornaram especialmente agudos quando Dias Toffoli, então presidente da Corte, promoveu Moraes a gerente do inverossímil inquérito das fake news. 
Impetuoso como um Leopoldo Galtieri à paisana, o ministro fez da maluquice conhecida como “inquérito do fim do mundo” a arma mais letal na guerra contra solertes inimigos do STF, das instituições e da democracia
Na fase de aquecimento, o juiz durão pendurou no peito uma imaginária estrela de xerife para censurar revistas digitais, intimar meia dúzia de possíveis admiradores de ditaduras e colocar na alça de mira sites infectados por ideias caras ao presidente Jair Bolsonaro. 
No passo seguinte, Moraes procurou inibir com arbitrárias temporadas na cadeia quem usa a internet para criticar o Supremo. 
No começo deste ano, acumulando os papéis de vítima, investigador, acusador e juiz de todos os processos que tratem de fake news, a versão nativa de Chris Adams enfim encontrou seu Calvera na figura de Daniel Silveira, eleito deputado federal em 2018 pelo PSL do Rio de Janeiro.
 
O mais imbecil dos alunos da pior faculdade de Direito do Brasil sabe recitá-la em latim, vertê-la para o português e apreender o significado da frase que resume um irrevogável mandamento jurídico: Nullum crimen, nulla poena sine praevia lege. Perfeito: “Não há crime, nem pena sem lei anterior que o defina”. [que também consta  no art. 5º, inciso XXXIX, da CF e no artigo 1º do Código Penal.]  
O gordo currículo de Alexandre de Moraes avisa que o futuro jurista deve ter declamado esse latinório dois minutos depois de aprender a falar. 
O autor de uma pilha de livros sobre temas associados ao Direito Constitucional está cansado de saber que um “mandado de prisão em flagrante”, como o que expediu para engaiolar Silveira, tem o mesmo valor de uma cédula de R$ 4.  
Sabe que o instituto da imunidade parlamentar impede que um integrante do Congresso seja punido por palavras que pronunciou ou escreveu, opiniões que emitiu ou votos que efetivaram alguma opção. Sabe que a proibição de ser juiz em casos em que se é vítima é um dos pilares do Poder Judiciário
Mas Moraes também sabe que, no Brasil destes tempos estranhos, ministros do Supremo são tão inimputáveis quanto os bebês de colo, os índios de tribos isoladas ou os Napoleões de hospício.

Aos olhos das autoridades americanas, o jornalista apenas exerceu o direito à liberdade de expressão

Disposto a tudo para mostrar quem manda no País do Carnaval, o ministro resolveu que a melhor maneira de manter a democracia intocada era mandar às favas o Estado Democrático de Direito. 
Inventou o flagrante perpétuo, demitiu por justa causa a imunidade parlamentar, exonerou princípios jurídicos seculares, atropelou cláusulas pétreas da Constituição e, com a insolência de um fora da lei de nascença, deformou o Código Penal e o Código de Processo Penal com interpretações paridas às pressas.  
Ao concluir as manobras que resultaram no encarceramento de Daniel Silveira, Moraes havia ressuscitado a figura do preso político, incompatível com o regime que simultaneamente louva e espanca. Óscar Arias, ex-presidente da Costa Rica contemplado com o Prêmio Nobel da Paz, ensina que “não existem presos políticos nas democracias. Se houver algum, o país não é democrático”. Na América Latina, só há presos políticos em Cuba, na Venezuela, na Nicarágua e, graças ao STF, no Brasil.
 
No momento, permanecem ilegalmente na cadeia o ex-deputado Roberto Jefferson e o caminhoneiro Zé Trovão. O jornalista Allan dos Santos teria engordado a lista se não estivesse vivendo nos Estados Unidos
Para abrandar a frustração, o carcereiro compulsivo transformou Allan em foragido, determinou sua inclusão nos cartazes da Interpol e solicitou à Justiça americana que o extraditasse. 
Só então descobriu que o tratado subscrito pelo Brasil e pelos Estados Unidos restringe a extradição a autores de atos considerados criminosos por ambos os países. Aos olhos das autoridades americanas, o jornalista apenas exerceu o direito à liberdade de expressão. 
Se o caso chegasse à Corte Suprema dos EUA, Alexandre de Moraes é que viraria réu por abuso de autoridade. E acabaria enquadrado nos artigos que tratam de juízes que perseguem e punem sem a indispensável participação do Ministério Público, sem o acesso dos advogados aos autos, sem o devido processo legal, sem o direito de ampla defesa — quem ousar dizer ou escrever coisas que pareçam ofensivas a algum titular do Timão da Toga ou à equipe inteira.
 
No começo desta semana, ao decretar o fim da “prisão preventiva” de Daniel Silveira, o ministro deixou claro que é ele o seu perseguido predileto.  
Se fosse assaltado por um surto de humildade, reproduziria a grande imagem de Nelson Rodrigues: sentado no meio-fio, estaria chorando lágrimas de esguicho e pedindo perdão aos transeuntes. 
Se não fosse um prepotente de berço, ele simplesmente determinaria a soltura do deputado — e ponto final. 
Em vez disso, mostrou que nunca perde a chance de afrontar a sensatez, zombar dos genuínos juristas e esticar as filas que se estenderão, no próximo Carnaval, diante das barracas abarrotadas de máscaras que simularão a carranca do campeão de impopularidade. “Os atos criminosos cometidos pelo réu são gravíssimos”, reiterou Moraes, “e ainda serão julgados pelo plenário do STF.”
 
Tais atos, fantasiou, “não só atingiram a honorabilidade e constituíram ameaça ilegal à segurança dos ministros do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, como se revestiram de claro intuito de tentar impedir o exercício da judicatura, notadamente a independência do Poder Judiciário e a manutenção do Estado Democrático de Direito, em claro descompasso com o postulado da liberdade de expressão, dado que o denunciado propagou a adoção de medidas antidemocráticas contra a CORTE, insistiu em discurso de ódio e a favor do AI-5 e de medidas antidemocráticas”. O falatório pernóstico não resiste a três ou quatro perguntas em língua de gente. Por exemplo: se os exageros verbais de Silveira foram “crimes gravíssimos”, em qual categoria figuram as medonhas execuções perpetradas por bandidos que o Supremo vive soltando? 
 Onde o ministro enxergou a iminente interrupção do funcionamento do Judiciário? 
Em que trecho de qual código está escrito que ameaças não consumadas dão cadeia? 
Se sentir saudade do AI-5 é caso de polícia, que castigos merecem os que amam a ditadura do proletariado?
 
A continuação da conversa fiada ressalvou que a soltura chegaria escoltada por duas “medidas cautelares”, e com isso Moraes conseguiu inventar uma brasileiríssima cretinice: o meio solto e meio preso
 
O deputado poderá sair de casa, tomar café no bar da esquina, engraxar os sapatos, até mesmo bronzear-se na praia, tudo isso liberado da tornozeleira eletrônica. 
É provável que logo esteja percorrendo os corredores da Câmara (que endossou sua prisão por 364 votos contra 130) e concedendo entrevistas. Mas não poderá fazer tudo o que é permitido aos demais beneficiários do direito de ir e vir. A primeira restrição o proíbe de “ter qualquer forma de acesso ou contato” com outros investigados no inquérito do fim do mundo, a menos que também sejam deputados federais. 
 
A segunda medida cautelar é um desfile de minúcias amalucadas. 
O meio preso e meio solto está proibido de “frequentar toda e qualquer rede social, em nome próprio ou ainda por intermédio de sua assessoria de imprensa ou de comunicação e de qualquer outra pessoa, física ou jurídica, que fale ou se expresse e se comunique (mesmo com o uso de símbolos, sinais e fotografias), em seu nome ou indiretamente, de modo a dar a entender esteja falando em seu nome ou com o seu conhecimento, mesmo tácito”.

Proibir o acesso de um deputado federal a redes sociais equivale a condená-lo à derrota na tentativa de reeleger-se o sonho perseguido desde o berçário.. É precisamente esse o objetivo do advogado formado pela Faculdade do Largo de São Francisco que foi promotor público, procurador-geral do Estado, supersecretário na administração do prefeito Gilberto Kassab, secretário de Justiça e depois da Segurança Pública em dois mandatos do governador Geraldo Alckmin e já parecia a caminho da precoce aposentadoria política quando o destino se somou à sorte e à esperteza para colocá-lo na antessala de um gabinete no Supremo Tribunal Federal — 

Ele era secretário de Segurança do governo paulista quando comandou com a discrição necessária a localização e captura do hacker que invadira o celular de Marcela Temer, mulher de Michel Temer. A gentileza seria retribuída depois que o impeachment da presidente Dilma Rousseff instalou no Palácio do Planalto o marido agradecido. Promovido a ministro da Justiça, acabou transferido para o outro lado da Praça dos Três Poderes graças à vaga aberta pela morte de Teori Zavascki.

Para surpresa do doutor em Direito Constitucional Alexandre de Moraes, o político Alexandre de Moraes topou virar juiz do STF antes que Temer terminasse de formular o convite. Na tese que apresentou ao concluir o curso de doutorado na Universidade de São Paulo, o atual ministro sustentou que deveria ser abolida a indicação para o Pretório Excelso de quem ocupa um cargo de confiança do presidente da República. “A vaga na Corte não se presta a demonstrações de gratidão política, nem pode servir de prêmio pessoal para demonstrações de fidelidade político-partidária”, argumentou o premiado pela fidelidade a Michel Temer. Se o Moraes de toga tivesse compromisso com o que escreveu no século passado o Moraes de terno, não teria concordado com a transformação do STF num simulacro de vara criminal que julga questões sem quaisquer vestígios de parentesco com as reais atribuições da Corte. 

No livro Constituição do Brasil Interpretada, o futuro carcereiro supremo afirmou que o STF deveria ser “um tribunal exclusivamente constitucional, deixando de atuar como última instância em causas variadas”. Se ainda pensasse como o homônimo que existiu no século 20, não estaria piorando a imagem da Corte com o caso Daniel Silveira. (E tampouco teria determinado, como fez há dias, o afastamento da presidência nacional do PTB do ex-deputado federal Roberto Jefferson, outro hóspede involuntário do seu cativeiro particular.)

Nosso Chris Adams de chanchada cavalga rumo ao destino em companhia de cinco homens (Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Luís Roberto Barroso e Edson Fachin) e uma mulher (Cármen Lúcia, que se reveza com Rosa Weber)
Pelo desempenho do elenco, pode estar em gestação um clássico do faroeste à brasileira, que sempre termina com o triunfo dos bandidos. No filme de 1960, a vitória do personagem interpretado por Yul Brynner livra os habitantes indefesos da submissão a uma quadrilha. 
Na versão protagonizada pelo Chris Adams de toga, graças às proezas dos sete cavaleiros do Apocalipse brasileiro, o bandido Calvera pode virar xerife do vilarejo.

Leia também “O terrorista tapeou o doutor em fake news”

Augusto Nunes, colunista - Revista Oeste, com   reportagem de Cristyan Costa.