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segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018

Alguém topa fazer a conta de quantos bilhões custou ao país e ao Rio a demora de Fux em liberar uma liminar e um voto-vista?

Discretamente, como quem procurava esconder o malfeito, o ministro Luiz Fux, do Supremo, liberou para votação outra causa sobre a qual estava sentado: os privilégios absurdos concedidos aos senhores desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio. No país inteiro, na esfera estadual e federal, os mimos com que são beneficiados os senhores togados são de fazer corar os despudorados. Mas é no Rio que a, como posso chamar?, insensibilidade com os miseráveis atinge o estado de arte. E notem: estamos falando de um Estado quebrado.  Mas os membros do TJ-RJ, estejam certos, vivem no paraíso. Já volto ao ponto. Antes, algumas considerações.

Não há dúvida de que há roubalheira no Brasil. Fui e sou crítico do autoritarismo messiânico da Lava Jato, mas sempre reconheci que a operação tocava e toca num cancro da vida nacional. Daí a mandar a política e a institucionalidade para o abismo e a superestimar a importância da corrupção nos desastres nacionais, bem, esses são outros bilhões. A corrupção tem de ser combatida sem tréguas. Mas não há safadeza no país que faça frente, por exemplo, ao assalto aos cofres públicos representado pela Previdência do funcionalismo. A corrupção tem de ser combatida sem tréguas. Mas não há safadeza no país que faça frente aos ganhos nababescos da elite dos servidores, onde se encontram juízes e membros do Ministério Público. E, no entanto, essas coisas ainda estão debaixo do tapete, não é mesmo? Só o auxílio-moradia das duas categorias custa aos brasucas desdentados R$ 1,6 bilhão por ano.

Os levantamentos são constrangedores. As respostas dadas por alguns juízes são nauseantes. O tal Marcelo Bretas, que gosta de dar aula de decência a Sérgio Cabral, tornado seu brinquedo judicial, recebe, em companhia da mulher, também juíza, dois auxílios-moradia. Recorreu à Justiça para ter direito ao duplo benefício, embora o Conselho Nacional de Justiça tenha definido que, em casos assim, o dito-cujo será pago apenas uma vez. Bretas considerou discriminação. E ganhou! A decisão foi tomada por juízes que recebem auxílio-moradia.

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Sérgio Moro, que está longe de ser um rapaz necessitado até porque quem “mora com Moro” é pessoa igualmente bem-sucedida no ramo do direito —, explicou por que, embora resida em imóvel próprio em Curitiba, recebe auxílio-moradia. É que, disse ele, o ganho compensa o reajuste de salário que não houve. Entenderam? O juiz da moral reta, estrita, ilibada; que é implacável com o deslize alheio, quase irascível; que hoje é a esperança dos indignados, especialmente os sem informação, bem, este cavaleiro sem mácula confessa que, para ele, auxílio-moradia é mesmo ganho salarial. E ponto.

Reportagem da Folha deste domingo informa que há 2.275 juízes atuando na cidade de São Paulo, considerando a Justiça estadual, federal, do trabalho e militar: “Desses, 30% (680) recebem os R$ 4.378 mensais de auxílio para moradia mesmo tendo imóvel na capital. Considerando apenas o universo de juízes que recebem o auxílio, 43% possuem imóvel na capital.” O jornal informa ainda: “Os dados mostram que 215 desses magistrados têm mais de um imóvel em seu nome. O campeão é o desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo José Antonio de Paula Santos Neto, que tem 60 imóveis registrados em seu nome na base do IPTU.”

O doutor concede entrevista ao jornal. E, sim, ele diz considerar impróprio o pagamento, mas também apela à tal falta de reajuste e diz que recebe, porque, afinal, está na lei. Entendi. Se está na lei, por que o proprietário de 60 imóveis dispensaria o auxílio-moradia, né?
Não há como justificar. Ponto final. Por isso, os doutores não têm o que falar.

De volta Fux
Em 2014, como sabemos, o ministro Luiz Fux estendeu o indecoroso auxílio-moradia a todos os juízes e a todos os membros do Ministério Público. Ele o fez em caráter liminar e ficou lá, segurando a medida. Só agora liberou para votação, o que deve acontecer em março. Mas Fux fez mais do que isso.
Nenhum Tribunal de Justiça do país conta com as mamatas de que goza o do Rioonde os senhores desembargadores têm direito a refeitório privado, por exemplo, com serviço gourmet da alta gastronomia. Recebem ainda auxílio-saúde, adicional de permanência, gratificações, pagamento para fazer cursos no exterior etc.  O então ministro Ayres Brito, relator de uma Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade), considerou tais benefícios inconstitucionais. Isso se deu no ano da graça de 2012. Fux pediu vista e só agora decidiu liberar seu voto. Entenderam? Os tais ganhos estão sendo pagos há quase seis anos. A cada cinco anos, os doutores, no TJ-RJ, têm direito a três meses de licença remunerada. Isso nada tem a ver, é claro!, com as férias de 60 dias…

O TJ-RJ é aquele integrado pela filha de Fux, Marianna. Em 2016, aos 35 anos, ela foi nomeada desembargadora pelo governador Luiz Fernando Pezão. Sua candidatura chegou a ser impugnada por falta de “prática jurídica”. Vale dizer: ninguém conhecia a atuação da moça nem mesmo como advogada. Seu nome chegou a ser recusado pela OAB. Para provar que trabalhara na área, apresentou uma carta de Sérgio Bermudes, um medalhão da advocacia. Ele atestou Marianna atuara no seu escritório fazendo “consultoria e assessoria jurídica”. Ah, tá… Mas sem nem um processo pra chamar de seuLembrete: estagiários também fazem “consultoria” e “assessoria jurídica”. Doutor Bermudes não mentiu, entendem?

Fux não descansou. Reportagem da Folha informou que o homem ligou para os conselheiros da OAB para defender o nome da filha. E, sabem como é, lembrou as causas que os doutores tinham lá no Supremo. Deu certo. Marianna concorreu à cadeira que cabe à Ordem no chamado quinto constitucional – pela Constituição, um quinto das vagas dos tribunais deve ser preenchido por advogados, indicados pela OAB, e por representantes do Ministério Público. Quando foi indicado por Dilma Rousseff para a vaga de ministro do Supremo, Fux beijou os pés de Adriana Ancelmo, mulher do então governador Sérgio Cabral, em sinal de gratidão pelo apoio recebido. Os dois eram muito, muito amigos. Não sei se no caso da filha alguém foi beneficiado com um ósculo…
Mais de cinco anos segurando com um voto-vista…
Mais de três segurando um liminar…
Ah, Fux, Fux, Fux…
Alguém se dispõe a fazer a conta de quantos bilhões custaram ao país e o Rio as procrastinações de Fux?

Blog do Reinaldo Azevedo

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