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sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018

Uma proposta para acabar com a farra de ganhos acima do teto e auxílio-moradia: com vergonha na cara, solução é simples

Não estamos diante de um bicho de sete cabeças. Regulamentar as mamatas dos servidores públicos que estão no topo da pirâmide — carreiras de estado que já contam com a estabilidade no emprego — não é tarefa assim tão difícil. Existe um teto salarial definido pela Constituição? Existe. Há alguma ambiguidade na Carta sobre a possibilidade de eventuais acúmulos de benefícios superar esse teto? Não há. Está no Inciso XI do Artigo 37 da Carta, a saber:
XI – a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos;

Ali está claro que a soma de salário e “vantagens de qualquer natureza” não pode exceder o que ganha um ministro do Supremo. Ninguém precisa operar o “corte” do que exceder, hoje, R$ 33.700. O computador pode fazê-lo.  Também fica fácil coibir a farra de acúmulo de licenças, prêmios ou o diabo, que tenha sido garantido, por exemplo, aos desembargadores do Tribunal de Justiça do Rio. O que ultrapassar o ganho mensal de ministro do STF fere a Constituição. E ponto final. E os que se refestelavam na mamata até agora devem se dar por satisfeitos se não tiverem de devolver o que receberam indevidamente. Defendo que devolvam. A minha proposta: estabelecer um prazo, a depender do valor a ser ressarcido, entre 1 e cinco anos. Que fique claro: receber ganhos, para ficar nos termos da Constituição, “de qualquer naturezas” acima do teto corresponde a assaltar os cofres públicos. [considerando que tais ganhos foram devidamente autorizados por lei, ou norma do CNJ ou decisão judicial, os beneficiados se colocam na categoria de que receberam de boa fé, não configurando infração penal e não pode ser exigido que devolvam.] 
 
O Senado já aprovou em 2016 a regulamentação do teto. A matéria está agora sendo analisada numa comissão especial da Câmara, que deve cuidar também dos marcos para o recebimento do auxílio-moradia. O relator é o deputado Rubens Bueno (PPS-DF). Eis outra matéria igualmente simples de resolver desde que a sem-vergonhice corporativista não tome o lugar do bom senso. Juízes e membros do Ministério Público não estão ocupando funções transitórias, certo? Ninguém é juiz, procurador ou promotor por um tempo, a menos que decida abandonar a carreira. Assim, aquele que exercer sua tarefa na cidade ou região metropolitana em que tem domicílio, proprietário ou não de imóvel, não tem de receber o benefício.

E quando o membro de uma dessas duas carreiras vai exercer sua função em cidade distante de onde reside? Que se pague o auxílio-moradia, mas com condicionantes: a: o valor entra no cálculo para efeitos de teto: b: dar-se-á um prazo de quatro anos; acima desse tempo, cada um com os seus problemas. A pessoa não é obrigada a exercer função pública, certo?

E os deputados, senadores e ministros do executivo? Estes não exercem carreiras de estado. Suas respectivas funções são, por natureza, transitórias. Nesse caso, o auxílio-moradia não têm de contar como salário. Mas calma lá. O limite deve ser de oito anos, que é o tempo de mandato de um senador ou de dois mandatos de um deputado. Se exceder esse limite, o parlamentar perde o direito a qualquer auxílio para morar. A razão é simples: ele terá decidido fazer carreira na política. E deve arcar com as consequências de suas escolhas.

E os imóveis funcionais hoje ocupados por deputados, senadores e ministros de Estado? Têm de ser postos à venda. Com certeza, pagar auxílio-moradia nos termos aqui propostos é mais barato do que a simples administração e manutenção dos 432 imóveis funcionais da Câmara e dos 72 do Senado.
Em síntese: – ninguém, pouco importa a carreira, que tenha domicílio onde trabalha receberá auxílio-moradia; – juízes e membros do MP que tiverem de morar fora da área metropolitana em que firmaram domicílio terão auxílio-moradia por um prazo máximo de quatro anos. O benefício conta para efeitos de teto salarial; – deputados, senadores e ministros de Estado terão direito a auxílio-moradia por, no máximo, oito anos. E se um deputado exerce dois mandatos, não se reelege, mas volta ao Parlamento no período seguinte? Já teve os seus oito anos de benefício. O mesmo vale para senadores e ministros; – ministros de cortes superiores e desembargadores não receberão auxílio-moradia por definição. Afinal, entende-se que firmaram domicílio onde trabalham em caráter permanente; – todos os imóveis funcionais dos Três Poderes serão vendidos. É mais barato pagar o auxílio-moradia do que arcar com o custo de administração e manutenção desses imóveis; – podem ser mantidas as respectivas residências oficiais dos presidentes da Câmara e do Senado.
Assim, aplica-se um choque moral e de caixa na farra.
“Ah, mas assim não vale a pena ser juiz, procurador, promotor, político…” Ok, gente! Quem disse que as pessoas são obrigadas a fazer tais escolhas? Mas posso garantir a vocês que não faltará mão de obra.

[dúvida atroz: o conjunto de medidas apresentado tem que ser objeto de uma lei; 
Lei tem que ser aprovada pelo Congresso - o Poder Judiciário, faz suas intervenções convenientes e virtuais até na Constituição, mas promulgar uma lei inteira é impossível e também desinteressante. Portanto ... a solução é: arquive-se.] 

Blog do Reinaldo Azevedo

LEIA TAMBÉM: Minha coluna na Folha: Dou à turma da nova política e a FHC o conselho de Nelson aos jovens: ‘Envelheçam!’ Mas até a FHC?

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