O Supremo
Tribunal Federal decidiu por sólida maioria (sete votos em 11) que o foro
privilegiado de deputados e senadores deve ser interpretado de modo restritivo.
Em voto bem definido, a Corte resolveu que os parlamentares só terão direito de
serem julgados no STF por crimes cometidos durante o exercício do mandato e por
atos referentes ao exercício. Claro: se um deputado é processado por uma
declaração em plenário ou por um voto, vai para o STF. Se bate uma carteira ou
agride a mulher, justiça comum, primeira instância, como todos os demais
cidadãos. [certíssimo a interpretação restritiva do STF; só que como já foi dito neste Blog que o STF só tem pressa quando decide contra a Constituição Federal, quando decide a favor da Carta Magna e/ou a favor do cidadão a pressa 'some'.
O 'pedido de vista obstrutivo' é um procedimento que deveria ser interpretado de forma restritiva, ou seja, concedido pelo menor tempo possível, tempo estabelecido no momento da apresentação do pedido e rigorosamente cumprido.
Em tese, cabe à Presidência do STF fiscalizar prazos para o pedido de vistas. Só que a Presidência se omite, o que é provado e comprovado, para tanto basta lembrar um pedido de vistas apresentado pelo ministro Fux (ministro que vota contra liminar que ele mesmo concedeu) referente concessão de auxílio-moradia para magistrados e membros do MP.
Aquele pedido foi apresentado em 2014, final da presidência do ministro Barbosa, passou toda a presidência do Lewandowski e está terminando a da ministra Cármen Lucia, e o pedido continua sendo visto.
Assim, enquanto o ministro Toffoli não desconfiar que está obstruindo a pauta ou alguém o compelir a parar de ver o processo, o assunto foro privilegiado não anda.]
Muito
bem, só que não vale nada.
O
ministro Dias Toffoli, contrário a essa interpretação, pediu vistas do
processo, quando o placar vencedor, os sete votos, já estava feito. O pedido
interrompe o processo até que o ministro o devolva ao plenário. Ou seja, embora
a decisão esteja tomada, o resultado não pode ser proclamado e entrar em
vigor. O
ministro tem prazo dar "vistas" no processo? Tem. Algum juiz do STF
respeita? Não. Aliás, o
pessoal lá diz assim: em tese, tem prazo, mas na prática não funciona.
E quanto
a isso de um ministro solitário barrar a decisão da maioria? É assim mesmo,
respondem. Mesmo que o tema esteja mais do que debatido? Mesmo assim.
Em bom
português: uma decisão importante, tomada solenemente, é letra morta, papel
inútil. Todo
mundo lá sabe desses, digamos, defeitos na produção de justiça. E fica
por isso mesmo. No caso, deputados e senadores podem ficar tranquilos. Em
qualquer caso, de corrupção a roubo de carro, serão julgados no STF, onde a
probabilidade de demora e prescrição é muito grande.
E aquele
decisão do STF era justamente para barrar esse privilégio. Segue a
ciranda. Ainda ontem, o Superior Tribunal de Justiça, instância logo abaixo do
STF, suspendeu o julgamento do governador de Minas, Fernando Pimentel. Aliás,
não é ainda o julgamento. A corte decide se o governador deve ser tornado réu
em crime de corrupção cometido cinco anos atrás. Quer dizer, julga se deve ser
julgado. Por que não vão direto? Ora,
porque não.
Pois
então, quando dois juízes já haviam votado pela aceitação da denúncia, um
terceiro pediu vistas. Mesma coisa. Tem prazo para devolver? Tem. Vale? Não. E lá
segue o governador, a caminho de terminar seu mandato e, mais, candidatar-se à
reeleição.
Agora, se
é assim, a gente deveria estender esse direito aos cidadãos. Já pensou? Você é
intimado pela Receita Federal. Pede vistas. O fiscal
da Receita: olha lá, tem que devolver, hein? E você,
como um ministro das cortes: ok, deixa comigo. (No duplo sentido: deixa que eu
resolvo, deixa comigo mesmo).
E os
supersalários do funcionalismo? Também caem no departamento do “fica por isso
mesmo". A coisa
está no seguinte ponto:a imprensa já descobriu e publicou que um juiz do Mato Grosso recebeu mais de R$ 500 mil em um único mês; que a maioria dos
desembargadores dos tribunais estaduais recebe acima do teto de R$ 33 mil, não
sendo raros os vencimentos que ultrapassam os 100 mil reais; idem para
funcionários da elite do Judiciário e Legislativo federais; que vereadores de
pequenas cidades recebem mais de R$ 3 mil/mês para duas sessões anuais.
No caso
dos supersalários, também já foi mais do divulgado o truque utilizado: tem o
salário, sempre abaixo do teto, e depois as vantagens pessoais e verbas
indenizatórias, que são fora do teto. Na verdade, não têm limite. Era legal
que valesse também para o cidadão. Você diria à Receita: ganho mil reais
por mês. E os outros 50 mil? Dinheiro pessoal e indenizatório. Pode
haver fraude mais clara?
Tome-se o
auxílio-moradia. É prática normal na empresa privada quando o empregado é
transferido para outra cidade. Recebe uma verba para mudar e se estabelecer.
Isso feito, a verba desaparece, claro. É eventual.
No
Judiciário, não. É permanente. E pago inclusive a desembargadores aposentados,
inativos que já ganharam a vida e estão lá nas suas casas... pagas pelo
contribuinte. E muitos aposentados trabalham como advogados.
Mas se
tem preso ganhando auxílio-moradia, o que se pode esperar? Pois é, o deputado
Celso Jacob (PMDB-RJ) está preso na Papuda, caso único de parlamentar federal
julgado, condenado e encanado, e recebe R$ 4.200 mensais da Câmara de auxílio-moradia.
A mesa diretora da Casa ainda está discutindo se um deputado preso tem ou não
esse direito. Qualquer um sabe que não. Mas, sabe como é, é tão raro um
deputado em cana....
Parece
que a presidente Carmen Lúcia não quer que tudo fique por isso mesmo, ao menos
no Judiciário. Decidiu que vai publicar os vencimentos de todos os juízes do
país, especificando salário, verbas e vantagens. O que passar do teto, vai para
o Conselho Nacional de Justiça. [parece que algum ministro pediu vistas da decisão da ministra Carmen Lúcia, visto que a determinação vai fazer aniversário e não foi cumprida.]
Para
cancelar o extratexto?
Não. Para
discutir se pode ou não pode ficar por isso mesmo.
A
transparência pode constranger.
A ver,
mesmo.