Análise: Fachin quebra a
defesa de Lula no Supremo
Ao negar habeas corpus ao ex-presidente e remeter
caso ao plenário, ministro compra tempo para que os desembargadores de Porto
Alegre decidam sobre a prisão do petista
[Tática da defesa do condenado Lula, capitaneada pelo milagreiro Sepúlveda Pertence, de visitar ministro relator foi um tiro no pé da defesa, resultando em mais uma derrota para o hepta-réu. Não foi inteligente a manobra da defesa do sentenciado Lula de 'esquecer' a existência da Súmula 691 do STF.
No encerramento não brilhante de sua carreira, Pertence constata que a 'advocacia' da conversa não funciona mais. ]
Foi
estratégica a decisão do ministro Edson Fachin de enviar o caso do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao plenário do Supremo Tribunal
Federal (STF). Ao negar o habeas corpus ao petista, uma atitude já
esperada diante do histórico de decisões do ministro na Lava-Jato [e da plena vigência da Súmula 691]
Fachin impediu, na mesma decisão, uma derrota na Segunda Turma do tribunal.
Também em virtude do comportamento dos ministros da Segunda Turma nos últimos
meses, é altamente provável que Lula conseguisse derrubar a decisão de Fachin.
O ministro trocou uma derrota quase certa por uma possibilidade de vitória no
plenário — uma vitória que confirmaria, em definitivo, a prisão do
ex-presidente.
Fachin
frustrou, assim, a estratégia da defesa de Lula. Não por acaso, os advogados do
ex-presidente haviam pedido a Fachin que, em vez de decidir sozinho, levasse o
recurso à discussão na Segunda Turma. Nela, Fachin e a Procuradoria-Geral da
República têm acumulado derrotas. Os ministros Gilmar Mendes, Ricardo
Lewandowski e Dias Toffoli têm votado contra Fachin. O decano, ministro Celso de
Mello, oscila em seus votos. O habeas corpus de Lula, no entanto, envolve uma
questão jurídica cara ao decano: a execução provisória da pena após condenação
em segunda instância. Celso de Mello defende há anos que a execução da pena —
no caso, prisão — só possa ocorrer após o chamado trânsito em julgado, no
Supremo. Hoje, Gilmar, Lewandowski e Toffoli concordam com esse entendimento —
Gilmar mudou de ideia no ano passado. Fachin, portanto, poderia perder de 4 a 1
na Segunda Turma, mesmo que se limitasse a negar o habeas corpus de Lula.
Ao
remeter o caso ao plenário do Supremo, Fachin remete, também, a discussão de
fundo — a execução provisória da pena após condenação na segunda instância.
Nessa etapa, Fachin tem uma aliada fundamental: a presidente do Supremo,
ministra Cármen Lúcia. Ela não só concorda com a manutenção do atual
entendimento do tribunal, pelo qual condenados em segunda instância podem ser
presos, como luta para separar qualquer reexame da corte sobre esse assunto do
caso específico de Lula. Como presidente do tribunal, Cármen Lúcia é
responsável pela pauta do plenário. Cabe a ela decidir, portanto, se e quando
levar o habeas corpus de Lula à discussão entre os 11 ministros. (Há atalhos
jurídicos disponíveis à defesa de Lula para atropelar a presidente do tribunal,
mas são atalhos de difícil acesso; não são grandes as chances de que os
advogados consigam forçar o debate no plenário sem a anuência de Cármen Lúcia.)
Cármen
Lúcia tem um excelente argumento para não pautar o habeas corpus de Lula no
plenário. Os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ainda não
analisaram o mérito de um recurso da defesa do petista. Os advogados tentam
impedir que o ex-presidente seja preso após o julgamento dos embargos de
declaração no Tribunal Regional Federal da Quarta Região (TRF-4) — o que deve
acontecer nas próximas semanas. Pela jurisprudência das cortes superiores, a
avaliação do mérito do habeas corpus no plenário do Supremo só poderia
transcorrer após uma decisão definitiva do STJ. Ainda não há certeza sobre
quando o STJ fará isso. Mas o relator do caso de Lula na corte, ministro Félix
Fischer, talvez seja o mais severo dos juízes da Lava-Jato. Não agirá em favor
do ex-presidente.
A questão
que se impõe, neste momento, é de timing: boa parte dos ministros do Supremo só
querem discutir o caso de Lula quando ele já estiver preso, caso o TRF-4
confirme a execução da pena, como se espera. Nesse cenário, diminuiriam o custo
político e social da decisão colegiada. Com Lula já preso, seria mais simples, jurídica
e politicamente, somente manter a decisão das instâncias inferiores. Se tiverem
que julgar o caso de Lula com o petista ainda em liberdade, o custo será muito
maior, assim como a pressão. Há ministros que querem mudar o entendimento sobre
a prisão após a segunda instância, mas não desejam garantir a liberdade a Lula.
Acreditam que conspurcariam uma tese jurídica que consideram fundamental para o
país com a tinta do casuísmo inevitável.
Com a
decisão de Fachin, portanto, os desembargadores de Porto Alegre ganham tempo
para tomar a decisão que a maioria dos ministros da Suprema Corte esperam,
reservadamente: assegurar a execução provisória da pena de Lula antes que o
tribunal de Brasília seja obrigado a enfrentar o caso.
Diego Escotesguy - O Globo
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