Colapso à vista: a China tem fome - Ataque Aberto
A
China nunca comprou tanta comida. No Brasil, muita gente comemora o
fato de que, justamente em meio à pandemia de Covid-19, quando todo
mundo retraiu o consumo, os chineses elevaram sua participação nas
importações do agronegócio. Se em janeiro o país comprava 33% das
exportações brasileiras de carnes e grãos, chegou em julho respondendo
por 39% das vendas do setor agrícola brasileiro para o exterior. Quer
dizer que os chineses estão comendo mais? Paradoxalmente, não.
Ao
contrário do que Pequim quer fazer parecer, os chineses não estão
comprando mais porque as coisas andam bem por lá ou porque se tornaram
mais comilões na quarentena. Eles estão avançando nos estoques globais
de alimentos para evitar uma catástrofe dentro de suas fronteiras: a
fome. Um
estudo feito pela Academia de Ciências Sociais da China, divulgado em
agosto, estima que o déficit de fornecimento doméstico de alimentos será
de 130 milhões de toneladas até 2025. O que reforça que a profunda
dependência da China quanto aos mercados produtores de grãos como os
Estados Unidos, Brasil e Argentina está bem longe de ser resolvida.
Apesar
de a insegurança alimentar ser um problema crônico para China, a
recente voracidade dos chineses sobre os estoques de carne e grãos no
Brasil e na Argentina é resultado do iminente colapso do abastecimento
de alimentos no país. Enquanto
diplomatas chineses fazem propaganda para mostrar como a China é bacana
com o mundo – mantendo o ritmo de compra de commodities agrícolas e, em
muitos casos, aumentando –, o Partido Comunista Chinês faz mil e uma
piruetas para pintar com tons de solidariedade e liderança global o que,
em essência, é um movimento colossal para a manutenção do regime,
marcado pela instabilidade.
O
ano de 2020 não começou apenas com a descoberta de que a China era
nascedouro de uma pandemia que empurraria a economia global para o
abismo. O país foi atingido por uma praga de gafanhotos que se alastrou
por algumas das principais áreas produtivas chinesas. Somente na
província de Yunan, os insetos devoraram plantações que cobriam 90
quilômetros quadrados, uma área de mais de 9 mil campos de futebol. A
praga de gafanhotos veio acompanhada de uma outra infestação.
Insetos
conhecidos pelos agricultores brasileiros pelo nome de lagarta do
cartucho foram detectados em quase toda a extensão da China. Apenas
cinco províncias ainda estão livres dos bichos, que têm a destrutiva
habilidade de devorar sem piedade lavouras inteiras. A perda de parte
importante da safra chinesa está diretamente associada à elevação dos
preços do milho no mercado chinês, que chegou ao nível mais alto dos
últimos cinco anos.
As
pragas chinesas vieram acompanhadas de uma peste suína que dizimou 180
milhões de aninais, o equivalente a 40% do rebanho, bem como de dois
fenômenos climáticos superlativos: uma das maiores enchentes da história
recente da China, na porção Sul do território, e secas severas no
Norte. As
inundações, que começaram no início de junho, continuam nas bacias dos
rios Yangtzé, Huai e Amarelo, localizadas nas maiores regiões produtoras
de grãos. A quebra na safra impactou diretamente no preço dos alimentos
nos supermercados chineses. Em média, eles estão 10% mais caros em
comparação ao mesmo período de 2019. A carne de porco, importante
ingrediente da dieta chinesa, está custando 86% mais do que no ano
passado.
A
situação é tão séria que o presidente Xi Jinping precisou convocar a
população para aderir a uma campanha contra o desperdício de alimentos.
Chamada de “Prato limpo”, a ação é um esforço para evitar o racionamento
de comida. E sendo fiel ao mais genuíno estilo ditatorial comunista, a
TV estatal CGTN divulgou o seguinte: “Embora a China tenha colhido grãos
suficiente por anos, ainda é necessário ter a consciência de uma crise
de segurança alimentar. O impacto da pandemia de Covid-19 este ano soou o
alarme para nós.” Nem quando precisa assumir um problema grave, Xi não abre mão de mentir.
Essa
foi a segunda vez que o líder chinês falou sobre a necessidade de
economizar alimentos. A primeira foi na última semana de julho, quando
as enchentes sequer haviam atingido o seu pico. “Quanto
mais riscos e desafios enfrentamos, mais precisamos estabilizar a
agricultura e garantir a segurança dos grãos e dos principais alimentos
não básicos”, disse Xi. Os
números das importações chinesas no Brasil são evidentes. Eles não veem
o gigante sul-americano como um parceiro comercial. O Brasil (e não
falo da soja) é um grande recurso estratégico.
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