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domingo, 4 de dezembro de 2022

A religião do ódio - J. R. Guzzo

Revista Oeste

No Brasil de hoje a virtude passou a ser a recusa em admitir o ponto de vista do outro. Dia após dia, o ódio vai sendo transformado num atributo moral 

 O Brasil está se tornando um país cada vez mais intolerante — e isso é uma novidade muito ruim. A sociedade brasileira tem tido uma longa história de prudência e de serenidade na gestão dos seus rancores, diferenças e conflitos; chegamos aos 522 anos sem nenhuma guerra de verdade, dessas que deixam mortes, feridos e destruição, por causa de religião, ou de raça, ou de nacionalidade, ou de língua, ou de qualquer outra escolha. Sempre houve, de um modo geral, a disposição de admitir ações, pensamentos, crenças, sentimentos ou hábitos diferentes entre si, qualquer que fosse o ambiente político.

Alexandre de Moraes | Foto: Montagem Revista Oeste

Alexandre de Moraes -  Foto: Montagem Revista Oeste 
 
O Brasil nunca foi uma democracia de verdade — mas, mesmo nos seus momentos de ditadura aberta e declarada, a inclinação predominante tem sido a de aceitar o princípio de que cada um tem direito à sua própria vida, ao seu modo de pensar e ao seu comportamento pessoal
Não mais. No Brasil de hoje a virtude passou a ser a recusa em admitir o ponto de vista do outro
Há cada vez menos adversários e cada vez mais inimigos. Dia após dia, e de forma mais e mais agressiva, o ódio vai sendo transformado num atributo moral — ou numa exigência para a prática correta da atividade política e social.

É um sinal destes novos tempos escuros, de supressão de liberdades e de repressão à divergência que alguém como o ministro Moraes seja promovido à posição de apóstolo da “democracia

Em nenhuma outra área da sociedade a intolerância prospera tanto quanto nessa nebulosa frouxa, disforme e sem princípios que é a esquerda nacional de hoje. 
Os verbos mais usados ali, a propósito de tudo, são proibir, punir reprimir, prender, multar, penalizar, criminalizar, censurar; fala-se cada vez menos em diálogo, e cada vez mais em castigo. 
Não há nenhuma demonstração tão clara disso quanto o novo herói da esquerda brasileira, o ministro Alexandre de Moraes que segundo a mídia, as classes intelectuais e a elite meia-boca destes trópicos salva dia após dia a democracia popular no Brasil. 
Quanto mais ele transforma o país numa delegacia de polícia, e quanto mais utiliza a sua função pública para reprimir, agredir e calar quem pensa de modo diferente, mais excitação provoca na esquerda; vai acabar virando uma espécie de Che Guevara do judiciário. 
O ministro cassa o passaporte de um jornalista que teve de se exilar nos Estados Unidos para escapar à sua perseguição pessoal. 

Multa em R$ 23 milhões um partido político cujo crime foi apresentar uma petição à justiça eleitoral, com alegações de que houve irregularidades na última eleição. Quer que a polícia acabe à força com as manifestações diante dos quartéis. [destaque-se  que os  comandantes militares - Marinha, Exército e Aeronáutica - em  nota oficial, deixaram claro, os limites que devem ser respeitados e, ainda que a contragosto, o ministro está respeitando - não se conhece nenhum caso de manifestantes pacíficos, ordeiros, que exercem o DIREITO CONSTITUCIONAL de manifestação em   ÁREA SOB ADMINISTRAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS - ÁREA MILITAR - terem sido expulsos ou coagidos por autoridades policiais.] O ministro faz dezenas — dezenas, literalmente — de coisas assim, e a cada uma delas se torna mais sublime para artistas de novela, militantes do PT, PSOL e redondezas, advogados de corruptos, milionários de esquerda, jornalistas etc. etc. etc.

É um sinal destes novos tempos escuros, de supressão de liberdades e de repressão à divergência, que alguém como o ministro Moraes seja promovido à posição de apóstolo da “democracia” e de tudo o que hoje é louvado como correção política.  

Não há precedentes de alguma outra autoridade pública brasileira que tenha, como ele, feito uso tão extensivo do ódio como método de ação política e que tenha sido tão admirado por fazer isso na porção do Brasil que julga a si própria como “progressista”. 
Não se trata apenas de usar a suprema corte de justiça do país para violar sistematicamente a Constituição e o restante das leis em vigor, com garantia de impunidade e na execução de objetivos políticos.     A agravante para esta conduta é a sua carga de rancor em grau extremo. É a recusa do debate livre e a obsessão em destruir quem não concorda; é o senso moral de quem fica no campo de batalha para executar os feridos. Virou, em suma, uma coisa fanática. 
 
Em vez de gerar reprovação, porém, o comportamento de “terra arrasada” de Moraes e de seus colegas de STF gera profundo encantamento na esquerda. O resultado é uma aberração. As mentes virtuosas, que propõem a “justiça social”, a “igualdade” e outras fantasias “progressistas”, aplaudem a repressão policial às manifestações em torno de guarnições militares; é a primeira vez na história mundial que a bomba de gás lacrimogênio se vê elevada à condição de arma em defesa da democracia.

A intolerância radical do Brasil de hoje fica evidente, também, na ideia fixa da esquerda em “criminalizar” tudo e todos que a desagradam. Não falam em outra coisa — “criminalizar”. Gente que se diz democrática, equilibrada e “lúcida” vive fascinada com a mania de criminalizar a homofobia, o racismo, o machismo, o “bolsonarismo”, os protestos em frente aos quartéis, a camisa amarela — tudo que vai contra eles tem de ser crime, tem de ser castigado, tem de “dar cadeia”. 
Deixou de ser uma linha de ação; passou a ser uma neurose. 
A última manifestação desse tipo de demência penal veio de um pequeno senador que vive em estado de permanente histeria em sua conduta política e se tornou, ele também, um ídolo da mídia que faz o “L” e se abraça nas redações, em transe, quando Lula é declarado vencedor da eleição presidencial pelo TSE de Alexandre Moraes. 
 
O senador fala num projeto de lei para punir com cadeia (de um a quatro anos) quem der vaia nele, ou em gente como ele, ou chamar a eles todos de “safado”, “vagabundo” ou coisa que o valha. Ele diz, e a mídia repete, que está preocupado com a “pluralidade” política e o “diálogo republicano”.  
Não enganam com essa conversa nem uma criança de 10 anos. 
Toda a esquerda vai continuar chamando Jair Bolsonaro de genocida, fascista e destruidor da Amazônia. 
Quem protesta nos quartéis continua sendo criminoso, golpista e “antidemocrático”. 
Estudantes de direita continuarão a ser insultados e agredidos nas universidades, com o aplauso dos reitores, diretores e professores. 
O “assédio político” é crime que só o adversário pode cometer.

A esquerda festejou a contusão de Neymar na Copa do Mundo — o que pode ser mais intolerante do que uma coisa dessas? Na verdade, é a hora em que o fanatismo atravessa a fronteira do desequilíbrio mental; tirar prazer do sofrimento físico de alguém, seja ele transitório ou permanente, é um dos pontos mais baixos a que pode chegar um ser humano em sua descida rumo ao mal absoluto. Chegou-se a esse ponto, no Brasil de hoje — e a partir daí não há limite para a depravação. Por que o ódio a Neymar? Porque ele apoiou Bolsonaro para presidente, em público. Para a esquerda, isso é crime; não se admite, ali, a noção do voto livre. É um dos fundamentos de qualquer democracia — sem liberdade de votar, simplesmente não pode haver regime democrático

Mas no Brasil do STF, da esquerda e do Google é exatamente o contrário; para haver o seu modelo de democracia, não pode haver o voto livre. 
É proibido escolher o candidato que você prefere. 
É proibido manifestar a sua opinião em público. 
É proibido pensar com a sua própria cabeça. 
Os próximos passos, por essa lógica de negação da liberdade individual, são o candidato único, o partido único e o jornal único. 
É o país com que a esquerda brasileira sonha.

****

O Google suspendeu a publicação de propaganda programática (os anúncios de outras empresas distribuídos pelo Google) em Oeste
diz que a revista fere a sua coleção de princípios e aponta, entre os motivos, os artigos de quem assina este texto. 
Quais os princípios, objetivamente, que foram feridos? O Google não informa. 
Quais, então, os artigos específicos que estariam em desacordo com as regras de conduta da plataforma? Também não se diz nada a respeito; presume-se que sejam todos, incluindo os que ainda não foram escritos.  
Pelo que deu para entender, o Google não quer que o autor escreva na Revista Oeste
aparentemente, permite que os seus artigos continuem a ser publicados no Estado de S. Paulo e na Gazeta do Povo, onde é colunista fixo e regular, pois, tanto quanto se saiba até o momento, não suspendeu a sua publicidade em nenhum destes dois veículos. 
O que se pode dizer com certeza para o leitor é que a Revista Oeste continuará publicando os textos do autor, exatamente com o mesmo teor de sempre.

Leia também “A democracia em colapso”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste


quinta-feira, 29 de setembro de 2022

A degola da democracia pela elite podre - Rodrigo Constantino

Gazeta do Povo


Em editorial de opinião publicado no WSJ este domingo, Emily Finley resgate Tocqueville para falar da nova "democracia" das elites, que pariu um imenso poder tutelar dos "especialistas" e que despreza a participação popular.

Democracia virou uma palavra vazia para justificar basicamente tudo, mas não conta mais com o povo. Seu nome é utilizado para conceder um mandato "sagrado" para que essas elites façam simplesmente o que der na telha. Vivemos a tirania das elites.

Quando vemos que Celso de Mello também declara apoio a Lula, isso fica mais claro ainda. Para a surpresa de zero pessoas, o “juiz de merda", segundo relato de Saulo Ramos, declara apoio ao chefe da quadrilha organizada, que ele descreveu exatamente nesses termos. Essa gente nem esconde que debanda para o lado de uma quadrilha criminosa.

Enquanto isso, Alexandre de Moraes faz um gesto bizarro durante o voto contrário de uma juíza, algo que carece de urgente explicação - mas ninguém da velha imprensa acha adequado cobrá-la. Imagina só se o empresário bolsonarista” que foi alvo de inquérito arbitrário tivesse, em vez de mandado um simples "joinha" no grupo fechado de WhatsApp, feito um gesto em público de degola de algum desafeto…

Já Gilmar Mendes, aquele que chorou de emoção diante do advogado de Lula que deve ser seu indicado ao STF caso o ladrão volte à cena do crime, suspendeu cobrança de R$ 15 milhões em impostos contra Lula e o Instituto Lula. O multimilionário candidato dos banqueiros vai se safar de mais uma, pois tem companheiros supremos.

Os "donos do poder" estão todos unidos contra um só homem, que nada tem além do povo ao seu lado. Já essa elite podre e corrupta tem a mídia, os sindicatos, os artistas, os banqueiros, os empreiteiros, os invasores de propriedade, as ditaduras socialistas do mundo todo etc; ela só não tem mesmo o povo!

O ministro Paulo Guedes esteve nesta terça no programa Flow, com enorme audiência, pois o brasileiro despertou e está interessado no futuro do país. Guedes deu uma aula! O número de desocupados no Brasil agora é de 9,7 milhões, 8,9% da população, menor taxa desde julho de 2015. E o emprego, nas palavras de Ronald Reagan, é o melhor programa social.

Esse governo vem fazendo o dever de casa com responsabilidade, entregando resultados apesar de lockdown, guerra e sabotagem interna. 
O Brasil está dando certo, mas os monstros do pântano querem a volta da roubalheira. 
Quem escuta a aula do Paulo Guedes e mesmo assim quer a volta de Mantega e Mercadante é um completo energúmeno - ou, claro, um safado oportunista.

O que essa elite podre tem feito é uma verdadeira degola de nossa democracia. 

                              Confira e deduza o que o gesto sugere - vídeo de 58 segundos
 

Mas tudo em nome do povo e da democracia, claro, pois a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude, como sabia La Rochefoucauld...

Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


segunda-feira, 15 de agosto de 2022

A esquerda é um grande teatro farsesco - Gazeta do Povo

Rodrigo Constantino - VOZES

“A hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”, disse o duque La Rochefoucauld. O moralista francês resumiu com perfeição quando alguém tenta sinalizar uma falsa virtude, lembrando que ele, ao menos, sabe o que é a virtude em questão. Daí a hipocrisia, o cinismo, o fingimento.

A esquerda em geral é toda cínica, fingida, e o motivo é simples: ela precisa ocultar sua real agenda radical e revolucionária, pois sabe que se expor tudo de forma transparente, jamais vence uma eleição. O presidente Bolsonaro comentou sobre os recentes esforços petistas de enganar os desatentos: “Soube que o PT agora reza o Pai Nosso e usa bandeiras do Brasil em seus eventos. É um bom começo. Só falta parar de defender aborto, drogas, ideologia de gênero, desencarceramento, controle da mídia/internet, ladrões de celular, financiamento de ditaduras e diálogos cabulosos”. No alvo!

Petistas aparecem em missas de quatro em quatro anos, sempre às vésperas da eleição. 
 Ciro Gomes deixou qualquer pudor para trás e apareceu todo teatral numa atividade solene, carregando objetos sagrados, o mesmo que diz que é preciso ter controle social e o fim da ilusão "moralista". A cor da bandeira que costumam empunhar é vermelha, mas o tom começa a desbotar para o amarelo perto de pedir votos. Se a esquerda fosse sincera, ela deixaria bem claro que despreza o patriotismo, visto como um sentimento “pequeno burguês” ou mesmo fascista.

Se fosse transparente, a esquerda diria que odeia a polícia, que prefere os bandidos, lembrando que sempre age para abrandar punições aos marginais enquanto demoniza a atuação policial e sua “letalidade”. Os partidos de esquerda votaram contra o fim das "saidinhas", essa indecência que acaba levando à fuga de vários criminosos. Mas detonar a polícia e enaltecer os bandidos não rende muitos votos, e a esquerda sabe disso. Por isso muda seu discurso em época eleitoral.

O manto da “democracia” é outra enorme farsa esquerdista 
Assinam cartinhas sem qualquer coerência, uma vez que sempre defenderam ditaduras comunistas, e até hoje o PT de Lula apoia o tirano Maduro na Venezuela, isso sem falar da relação umbilical com Cuba. Ou fazem pior: forjam assinaturas, como denunciou Paulo Skaf, ex-presidente da Fiesp, que teve seu nome incluído sem seu consentimento na cartinha lulista.

Tudo na esquerda é jogo de aparências, é uma farsa calculada para enganar os trouxas. E como notamos essa mudança abrupta de discursos nas semanas que antecedem eleições, podemos concluir que a esquerda sabe muito bem o que são virtudes, mas prefere rejeitá-las por ideologia, oportunismo ou canalhice mesmo.

A tentativa da esquerda é ir comendo pelas beiradas, colocando aos poucos suas verdadeiras pautas, para a população ir se acostumando sem muito choque. É como a situação do sapo escaldado. 
Se a esquerda apresentasse seu verdadeiro projeto de uma só vez, todos sairiam correndo, assustados - e com toda razão. 
Ela sabe disso. E por isso vai cozinhando lentamente suas vítimas, insistindo em seu teatro farsesco, até que um dia os otários acordem na Venezuela: como foi que isso aconteceu?!
 
Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 

quinta-feira, 30 de junho de 2022

Duas histórias tristes - Luciano Trigo

VOZES - Gazeta do Povo

Dois casos bastante tristes mobilizaram as redes sociais na última semana. Infelizmente, os dois episódios demonstram que a disposição das pessoas para julgar e dar palpite em assuntos dos quais apenas ouviram falar, sem conhecer qualquer detalhe, só faz aumentar.

                                  Foto: Reprodução Instagram

As redes sociais empoderaram os ignorantes, os imbecis, os ressentidos, os furiosos. E a internet se torna, cada vez mais, uma arena onde a barbárie corre solta, com todos dando livre vazão aos seus piores instintos. Parece que a razão de viver dessa gente é apontar o dedo e eleger o Judas Iscariotes da vez, para linchar e esfolar – sempre em nome da virtude, da tolerância e da democracia.

Piora as coisas o fato de a turba desconhecer gradações: nos julgamentos sumários que ela promove só existem heróis e vilões, bandidos e vítimas, santos e genocidas. O mundo pelo menos o mundo que se manifesta nas redes sociaisé maniqueísta: não há espaço para contrapontos, nem para a diversidade de opiniões e pontos de vista; não existem tons de cinza, apenas o preto e o branco, o bem contra o mal.

E a sentença é sempre a mesma, aliás executada por quem acusa e julga: o cancelamento e o linchamento virtual. Viramos uma sociedade de abutres, na qual não há preocupação nem empatia sinceras com a dor do outro.

Nos dois casos em questão neste artigo: não há preocupação nem empatia sinceras nem com a menina grávida, nem com a jovem estuprada, nem com o feto descartado como lixo, nem com o bebê entregue para adoção.  Os virtuosos criticam ferozmente a exposição dessas vítimas, mas, justamente para ostentar virtude, as expõem ainda mais. Porque, no fundo, vítimas só interessam como personagens de uma narrativa pré-fabricada, em prol da imposição de uma agenda que em tudo contraria os valores e crenças do brasileiro comum: a agenda da defesa do aborto. Muitos caem de inocentes na manipulação; outros agem de forma mal-intencionada mesmo.

Desnecessário recapitular os dois episódios. Só pretendo chamar a atenção para aspectos relevantes que foram totalmente (deliberadamente?) ignorados pela grande mídia e pelos ativistas das redes sociais (que, aliás, se tornaram os principais pautadores da grande mídia).

No caso da menina grávida, houve sim um crime horrível, e a menina, por óbvio, é a vítima. Mas o crime cometido e seus perpetradores são bem diferentes daqueles inicialmente apontados. A julgar pelo que disse o delegado que investiga o caso, depoimentos indicam que a menina de 11 anos mantinha relações consensuais com o namorado de 13, de quem engravidou, aliás filho de seu padrasto (!?).

Sendo isso verdade, a menina não foi estuprada por um adulto, como fizeram crer as primeiras manchetes. E, sendo o próprio pai da criança gerada menor de 14 anos, surgem complicações jurídicas que tornam o caso muito mais complexo do que nos foi vendido.

Mas o tratamento dado ao caso pela grande mídia não apenas ignorou solenemente esses “detalhes” como ensejou a tentativa de assassinato de reputação de uma juíza, apresentada como criminosa por buscar uma solução alternativa, que preservasse o feto inocente (a antecipação do parto e entrega do bebê para adoção). A este ponto chegou o nosso jornalismo.
Quem contribui para criar um ambiente no qual crianças são erotizadas e os pais não têm mais nenhuma ascendência sobre os filhos?

Eduardo Cabette faz uma análise percuciente do episódio, do ponto de vista legal, neste artigo. Mas o que importa considerar aqui é que a destruição da família e de valores morais compartilhados pela sociedade, processo que avança a pleno vapor, gera situações tão absurdas que a lei já não dá mais conta.

As perguntas que ninguém fez são: 
- onde estavam os pais dessas duas crianças? 
- Estavam cientes das relações sexuais entre elas? 
Fato é que algo assim só pode acontecer em uma sociedade na qual a instituição familiar já está severamente abalada. 
E quanto mais atacarem os valores associados à família, mais frequentes serão esses episódios.
 
Mas quem contribui diariamente para criar um ambiente no qual crianças são erotizadas e os pais não têm mais nenhuma ascendência sobre os filhos? 
São os conservadores? [certamente que não.]
Ou é a militância progressista incrustada nas universidades, nas redações e no Judiciário?

Somente o cinismo e a má-fé podem explicar o fato paradoxal de que justamente aqueles que se dedicam incessantemente a destruir a instituição familiar tentam simular uma indignação histérica quando meninas engravidam e ainda apontam o dedo para quem defende a família.

A alternativa apresentada pela juíza cancelada à menina grávida (supostamente) do namorado foi, aliás, a alternativa escolhida pela jovem atriz, esta sim vítima de estupro – que se viu obrigada a se manifestar publicamente depois que um site expôs sua história de forma calhorda.

Ela também tinha a justificativa legal para um aborto, já que a gravidez foi consequência de um estupro, mas escolheu levar adiante a gestação até o fim e entregar o bebê para adoção. Tudo isso em silêncio, sem posar de heroína. Seguramente foi uma escolha sofrida e que pode ser considerada controversa, mas muito mais humana que a de eliminar o feto.

Fica a pergunta:
por que o tema da entrega para adoção não se faz mais presente no debate sobre o aborto?

Também na semana que passou, na esteira de protestos dos abortistas americanos contra a decisão da Suprema Corte que anulou a garantia federal ao direito de aborto, uma imagem trágica circulou nas redes sociais: a fotografia de uma mulher grávida que rabiscou na própria barriga a frase “not yet a human” (“ainda não é um humano”), referindo-se ao bebê que carrega no ventre
É difícil encontrar palavras para classificar esse gesto: uma mulher que afirma que o ser que ela sente vivo dentro dela, cuja vida ela gera, não é humano.
 
O aborto nunca foi e nunca será um tema trivial, por mais que se esforcem para nos convencer de que um feto “ainda não é um humano”, ou de que eliminar um feto é um direito reprodutivo” da mulher, um ato tão insignificante quanto descartar uma roupa velha ou um objeto indesejado
Qualquer pessoa que já tenha ouvido o coração do seu filho bater durante uma sessão de ultrassonografia, durante uma gestação, sabe, em um nível muito profundo, que isso é apenas uma mentira.

Voltarei ao tema no próximo artigo, em que abordarei as origens intelectuais da agenda abortista – e seus vínculos com o pensamento marxista.

Luciano Trigo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


segunda-feira, 18 de abril de 2022

Liberdade cristã - Gazeta do Povo

Rodrigo Constantino

Estamos em época de Semana Santa, então creio que seja adequada uma reflexão sobre a importância da fé cristã para a liberdade. O historiador Rodney Stark, em A Vitória da Razão, resume bem: “O sucesso do Ocidente, incluindo a ascensão da ciência, repousa inteiramente sobre fundações religiosas, e as pessoas que o tornaram possível eram cristãs devotas”. Tocqueville estaria de acordo. Muitos revisionistas, porém, tentam separar o legado ocidental de sua raiz cristã, num esforço ideológico que distorce a realidade.

O próprio conceito de liberdade, nesse ambiente dominado pelo iluminismo, tem sido subvertido por uma ideia de libertinagem, que aproxima os seres humanos de animais irracionais. É como se “dar vazão” aos impulsos mais primitivos fosse o ápice da liberdade, o que não faz qualquer sentido. O homem livre, no sentido cristão, é livre dentro de um contexto divino, em relação com o próximo, e não uma ilha separada do restante.

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Quem defendeu muito bem esse sentido da liberdade foi o papa João Paulo II, que, ao lado de Ronald Reagan e Margareth Thatcher, formou o trio heroico no combate ao comunismo soviético, a “essência do mal” materialista. O papa e Reagan sofreram atentados que quase os mataram numa distância de apenas seis semanas, e esses eventos marcaram muito suas vidas, assim como a crença inabalável de que sobreviveram por um “plano divino” para agir contra esse mal. E assim o fizeram.

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Para ambos, liberdade não era “ser deixado em paz” apenas, mas sim uma liberdade atrelada ao sentimento de fé. A dignidade humana vinha dessa noção de vida sagrada feita à imagem de Deus, e o comunismo ateu era o seu oposto. Tanto o papa católico como o presidente protestante se enxergaram, com humildade, como parte de um desígnio divino, como instrumentos de uma causa maior e mais nobre. Essa crença fez toda a diferença em suas atitudes corajosas para enfrentar o inimigo totalitário.

Ambos foram atores antes de assumir as novas posições. E as ações do ator carregam significado. Karol Wojtyła e Ronald Reagan entenderam isso. Ao se posicionar contra o comunismo, eles repetidamente transmitiram uma verdade interna com uma ação externa. Ambos eram contra o individualismo radical e o coletivismo. A liberdade, para eles, não é apenas o que eu quero fazer. A liberdade é uma questão de fazer a coisa certa e fazer isso como uma questão de hábito. Essa seria uma liberdade genuinamente humana.

A liberdade não deve ser tratada como o fim supremo; o fim mais elevado, ou virtude, é como se age com o dom dessa liberdade. Uma liberdade com propósito elevado, eis o segredo. “A única liberdade verdadeira, a única liberdade que pode realmente satisfazer, é a liberdade de fazer o que devemos como seres humanos criados por Deus de acordo com seu plano”, disse o papa. Reagan estaria de acordo. Aprendizado, fé e liberdade: cada um reforça os outros, cada um torna os outros possíveis. Pois o que eles são um sem o outro?

Rodrigo Constantino, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

terça-feira, 28 de dezembro de 2021

O BRADESCO E A TURMA DO “CARBONO NEUTRO”

 J. R. Guzzo

Campanha de publicidade

O Bradesco levou ao ar recentemente, através das redes sociais, uma campanha de publicidade com a pretensão de promover a ideia do “carbono neutro”. A campanha é mais uma repetição daquilo que fazem hoje, com o dinheiro das grandes empresas que pagam a conta, os departamentos de marketing, agências de propaganda e produtoras de comerciais para salvar o mundo do capitalismo destruidor da natureza – e dos delitos ambientais cometidos pelos próprios clientes dessas mesmas empresas, em suas vidas nocivas ao “planeta” e carentes de consciência ecológica.

O conteúdo é aquilo que se pode imaginar: um amontoado de aulas de conduta com teor de inteligência nas vizinhanças do zero, pregando essas superstições disfarçadas de verdade científica tão na moda nos dias de hoje. Até aí, é oportunismo direto na veia. De um lado, executivos da área de criatividade, de imagem e de “responsabilidade social” ganhando dinheiro com as causas em circulação na praça. De outro, um banco que quer, ao mesmo tempo, tirar vantagem da ideologia ambientalista barata que cresce pelo mundo afora e fingir que está prestando um serviço de interesse público.

Só que, desta vez, deu errado. A campanha do “carbono neutro”, num dos seus vídeos, mostra três comunicadoras, ou algo assim, dizendo que a pecuária é uma inimiga da natureza e que as pessoas deveriam comer menos carne para reduzir o carbono que está destruindo o mundo. Seria apenas mais uma estupidez. Mas é uma estupidez paga e promovida pelo Bradesco, e aí a coisa muda de figura.

Os pecuaristas, sobretudo os que são clientes do Bradesco, ficaram indignados: quer dizer que o seu banco, no qual depositam seu dinheiro e sua confiança, está dizendo que eles são delinquentes ambientais? Com a falta de coragem típica da falta de convicção que marca essas campanhas, o Bradesco tirou imediatamente o tal comercial do ar. Em nota oficial, lamentou profundamente o que estava dizendo, pediu desculpas aos pecuaristas e prometeu providências “internas” para que o desastre não se repita. [esperamos que as providências internas comecem, incluam, a demissão sumária de todos os que de alguma forma colaboraram  para o absurdo.]

É este, precisamente, o grau de honestidade que marca a maior parte da comunicação pretensamente “social” das grandes empresas no Brasil de hoje. Por causa da covardia, preguiça e insuficiência mental dos seus presidentes e principais imediatos, a coleção de princípios e valores das maiores corporações brasileiras foi abandonada em favor do primeiro zé-mané executivo que ganha a vida sendo, ou fingindo ser, politicamente correto.

Os acionistas não mandam mais nada nessa área. É a turma do “carbono neutro” e a favor do extermínio da pecuária que decide o que a empresa tem de dizer para o público. É ela que proíbe a divulgação de publicidade nos veículos de imprensa carimbados como “de direita”. É ela que corta patrocínios e manda demitir atletas deste ou daquele clube. É ela que define a virtude e o pecado.

J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


terça-feira, 20 de julho de 2021

VIRTUDE PESSOAL E VIRTUDE INSTITUCIONAL - Percival Puggina

Li "O homem medíocre", de José Ingenieros, pela primeira vez, em 1999 quando topei com ele na biblioteca de meu pai, que falecera dois anos antes. Era uma edição argentina de 1917. Um capítulo do livro, em especial, chamou-me a atenção por parecer escrito para aquela realidade. Ele tratava da diferença entre a mera honestidade e a virtude, bem como da falsa honestidade daqueles que a exibem como troféu. “Em todos os tempos, a ditadura dos medíocres é inimiga do homem virtuoso. Prefere o honesto e o exibe como exemplo. Mas há nisso um erro ou mentira que cabe apontar. Honestidade não é virtude, ainda que não seja vício. A virtude se eleva sobre a moral corrente, implica uma certa aristocracia do coração, própria do talento moral. O virtuoso se empenha em busca da perfeição. O honesto, ao contrário, é passivo”.

"Não há diferença entre o covarde que modera suas ações por medo do castigo e o cobiçoso que age em busca da recompensa", afirma o filósofo portenho enquanto sentencia sobre o homem medíocre: "Ele teme a opinião pública porque ela é a medida de todas as coisas, senhora de seus atos".

Quantos existem, de uns e de outros, na vida social! Estão nas empresas disputando postos, nas salas de aula ansiando pelos favores dos mestres, na vida pública buscando aplauso e voto. Súditos da maioria, apontam seu dedo cobiçoso ou covarde sempre que vislumbram, nos demais, algo que possa ser apontado como falha ou falta. Cada sucesso por essa via é um passo na direção do que denominam vitória e um recuo em relação à verdadeira virtude. Continua Ingenieros: "A sociedade proclama: 'Não faças mal e serás honesto'. Mas o talento moral tem outras exigências: 'Persegue a perfeição e serás virtuoso'. A honestidade está ao alcance de todos; a virtude é uma escolha de poucos. O homem honesto suporta o jugo a que o prendem seus cúmplices; o virtuoso se eleva sobre eles com um golpe de asa". São palavras que queimam a palha da mediocridade e incendeiam a alma dos que buscam a virtude porque é nela, e não na simples honestidade, que se medem os valores da aristocracia moral.

É preciso distinguir a virtude que se alcança por adesão voluntária a um determinado bem, da virtude intrínseca a modelos institucionais que inibem a conduta não virtuosa. A fidelidade será, sempre, um produto da vontade humana. O pérfido só renunciará a perfídia quando ela se mostrar inconveniente. O venal pode trocar de camiseta, mas só não terá preço se não houver negócio a ser feito. É por esse motivo que quando o STF proclamou a constitucionalidade da Lei da Ficha Lima, eu disse que estávamos trocando de fichas, mas não estávamos acabando com a sujeira que, logo iria encardir outras tantas.

Por quê? Porque essa lei assume como verdadeiro que a corrupção tem apenas causas intrínsecas aos indivíduos, mas isso é falso. Ela tem, principalmente, causas de natureza institucional. E, mesmo no plano das individualidades, só teremos pessoas virtuosas em maior número quando a virtude for socialmente reconhecida como um bem a ser buscado e quando as famílias, as escolas públicas e os meios de comunicação compreenderem a relação existente entre o desvario das condutas instalado na vida pública e o estrago que vêm fazendo na formação da consciência moral e na vida privada.

Não há virtude onde não há uma robusta adesão da vontade ao bem. E isso não acontece por acaso. A busca da virtude exige grande empenho.

Contudo, a democracia (governo de todos), não é necessariamente aristocracia (governo dos melhores). E será sempre tão sensível à demagogia quanto a aristocracia é sensível à oligarquia. Portanto, numa ordem democrática, como tanto a desejamos, é necessário estabelecer instituições que, na melhor hipótese, induzam os agentes políticos a comportamentos virtuosos ou, com expectativas mais modestas, inibam as condutas viciosas.

Ora, o modelo político brasileiro parece ter sido costurado para compor guarda-roupa de cabaré.

Não há como frear a corrupção que se nutre de um modelo institucional que a favorece tão eficientemente, seja na ponta das oportunidades, seja na ponta da impunidade cada vez mais escorada por leis de proteção.  Não estou falando de leis que a combatam, mas de um modelo político que a desestimule. Como? Libertando a administração pública dos arreios partidários, por exemplo. Ao entregar para o aparelhamento partidário a imensa máquina da administração (que a mais elementar prudência aconselharia afastar das ambições eleitorais), o Brasil amarra cachorro com linguiça e dá operosidades e dimensões de serraria industrial ao velho e solitário "toco". "É politicamente inviável fazer isso no Brasil", estará pensando o leitor destas linhas em coro com a grande maioria dos que, entre nós, exercitam poder político. Eu sei, eu sei. Não sou ingênuo. Está tudo errado, mas não se mexe. As coisas são assim, por aqui.

Do mesmo modo como a fusão do Governo (necessariamente partidário e transitório) com a Administração (necessariamente técnica e neutra porque permanente no tempo) cria problemas e distorções de conduta, a fusão do Governo com o Estado (que, por ser de todos, não pode ter partido) faz coisa ainda pior no plano da política interna e externa. Desde a proclamação da República, os governantes tratam de aparelhar o Estado e exercer influência sobre suas estruturas.

Todos os cidadãos, toda a mídia, todos os prefeitos, todos os governadores, todos os vereadores e deputados estaduais sabem que se produziu uma brutal concentração de poder e de recursos na União e na capital da República. Tal concentração é incompatível com a própria forma federativa de Estado, que, entre nós, virou um arremedo de si mesma. É grave. Gravíssimo. Mas tem coisa ainda pior na falência da Federação. Onde se reconheça que o Princípio da Subsidiaridade é irmão gêmeo da Liberdade, sabe-se, simetricamente, que a centralização de poder é irmã gêmea do totalitarismo. E, como ele, inimiga figadal da democracia. Mas eu sei: é politicamente inviável, no Brasil, retomar a boa forma federativa valorizando o poder local. Vai-se pelo viés oposto. Centraliza-se tudo, dos exames vestibulares aos recursos públicos. Depois, se descentraliza em conta-gotas, nas doses suficientes para gerar relações de dependência e submissão.

Em nosso sistema de governo, o presidente da República, uma vez eleito, deve buscar maioria parlamentar constituindo um arco de alianças formado por partidos minoritários. Com efeito, face à quantidade de legendas que disputam os pleitos parlamentares (há mais de duas dezenas de partidos representados na Câmara dos Deputados), todas as bancadas resultam minoritárias. Não existe maioria natural. E não havendo maioria natural, a "base" precisa ser adquirida pelo governo mediante um largo estoque de moedas de troca - entre outras, as mais valorizadas: cargos, liberação e pagamento de emendas parlamentares, verbas para nebulosas organizações não-governamentais, concessões de emissoras de rádio e televisão e dispensas de licitação. Os desdobramentos dessas operações acabam, mais cedo ou mais tarde, nas páginas policiais.

Em Brasília se decidem, como consequência, todos os contratos, todos os favores, todas as leis e todas as exceções às leis instituídas, atraindo corruptos e corruptores como pote de mel atrai abelhaResumindo: enquanto não enfrentarmos os vícios do sistema político e as deformações morais administradas em doses crescentes à sociedade, estaremos a uma distância da virtude que há de fazer o maligno esfregar as mãos em puro contentamento.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site  mel atrai abelha, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


terça-feira, 12 de maio de 2020

Ramagem nega relação 'pessoal' com clã Bolsonaro e critica Moro: 'Intransigente' - Veja - Radar

Por Robson Bonin 





[Lealdade é uma honra, uma virtude difícil de ser encontrada e praticada e que poucos possuem.]

Em depoimento, diretor da Abin disse que só foi perseguido pelo ex-ministro por não fazer parte do seu ‘núcleo restrito de delegados’

Segundo Ramagem, enquanto não representava uma ameaça a Moro na Polícia Federal, ele era elogiado pelo então ministro. “É de conhecimento do depoente que o ex-ministro Moro constantemente elogiava o seu trabalho, convidando-o para diversas reuniões de inteligência de cúpula, auxílio nas questões de segurança de alguns estados da federação”, disse.


No longo depoimento que prestou à Polícia Federal nesta segunda, o chefe da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alexandre Ramagem, negou ter proximidade com o clã presidencial e aproveitou o interrogatório para bombardear Sergio Moro, definido por ele como “intransigente” e insubordinado por ter desrespeitado a hierarquia ao bater de frente com o presidente da República sobre a troca de comando na PF.
“O ex-ministro Moro, ao adentrar ao Executivo federal, e tratar especificamente de Polícia, poderia se ater a princípios e valores de hierarquia, lealdade e preferência da lei, até porque não houve qualquer comando ilegal emanado do Presidente da República”, disse Ramagem.
Para o delegado, o então ministro da Justiça só não aceitou seu nome e passou a desqualifica-lo perante a opinião pública porque ele não fazia parte do “núcleo restrito de delegados de Polícia Federal próximos ao então ministro, uma vez que, diante dos fatos ora relatados, não haveria um impedimento objetivo que pudesse conduzir à rejeição de seu nome” para o comando da corporação.

“Sérgio Moro não falou mal do nome do depoente em seus pronunciamentos mas fez questão de desqualificar o depoente para a posição de diretor-geral da Polícia Federal. A desqualificação ocorreu através de argumento inverídico de intimidade familiar nunca antes tido como premissa ou circunstância, apenas como subterfúgio para indicação própria sua de pessoas vinculadas ao seu núcleo diretivo de sua exclusiva escolha".
Ramagem ainda negou manter laços de amizade com o clã presidencial. Ele disse ter “ciência de que goza da consideração, respeito e apreço da família do presidente Bolsonaro pelos trabalhos realizados e pela confiança do presidente da República no seu trabalho, mas não possui intimidade pessoal com seus entes familiares”.
Radar - Blog em Veja

sábado, 6 de julho de 2019

Nada de útil

Enquanto o mundo avança cada vez mais em busca da inteligência artificial, nossa elite está fazendo o possível para descobrir justo o contrário


Publicado na edição impressa de VEJA

A elite pensante do Brasil, que se imagina capaz de saber o tempo todo o que é o melhor para cada um de nós, frequentemente lembra o personagem do samba “Mocinho Bonito” o clássico pé rapado de uma Copacabana de outras eras, que passa a vida fingindo ser o que não é. O mocinho, para quem nunca ouviu a história, é o “perfeito improviso do falso grã-fino”, que no “corpo é atleta, no crânio é menino”, e “além do ABC nada mais aprendeu”. Como conta a letra da canção, ele tem “pinta de conde” mas nessa pinta só “se esconde um coitado, um pobre farsante que a sorte esqueceu”. Olha a nossa elite aí. Ela convenceu a si própria, e tenta convencer o resto do Brasil, que é a única classe de gente neste país realmente capacitada a pensar e, por via de consequência, como gostava de dizer um antigo político de Minas Gerais, a responsável exclusiva por definir o que é virtude e vício, e separar o certo do errado. Mas na vida real não é nada disso. As cabeças que hoje pretendem falar por todos os brasileiros são puro dinheiro falso; por trás da sua pose de conde o que existe é apenas a média da mediocridade nacional vigente.

O que é, na prática, essa elite ou quem faz parte dela? Não é, com certeza, a “zelite” do ex-presidente Lula, um ente em estado gasoso que ele mesmo jamais conseguiu definir. (Como não explica, supõe-se que a “zelite” seja apenas o conjunto dos seres humanos que não esteja de acordo com ele porque milionário, gente que manda, empresário “campeão”, empreiteiro de obra e o resto dessa turma nunca tiveram um amigo de fé-irmão-camarada tão dedicado quanto Lula.) Também não é aquilo que os livros de sociologia definem como “burguesia nacional”, nem o pessoal que vai à shopping center, nem a “classe A” dos institutos de pesquisa, ou, simplesmente, quem tem mais dinheiro que você. A elite a que se refere este artigo é a classe social descrita por ela mesma como civilizada, instruída, progressista, “antenada” as pessoas que se consideram habilitadas, em suma, a dizer como o Brasil deve ser governado e como o brasileiro deve se comportar. Antigamente, nos países considerados cultos, esse bioma social era chamado de intelligentsia. Aqui, considerando-se a soma do que pensam, querem e dizem, formam a burritsia.


Basicamente, faz parte da elite pensante quem influi em alguma coisa, ou se acha capaz de influir. É quem aparece no jornal, fala no rádio e dá entrevista na televisão. É o “especialista” quer dizer, o sujeito que se especializa, quase sempre, em dizer aquilo que os comunicadores sociais querem que ele diga. É quem dá aula na universidade ou, pelo menos, está em sua folha de pagamento. Em geral consideram-se “europeus”, embora tomem Nova York, Harvard e as vanguardas americanas do que se chama “diversidade” como santuários da civilização moderna. Acham que o povo brasileiro é altamente insatisfatório. Gosta de combate à corrupção, quando deveria gostar da OAB. Gosta de político ladrão na cadeia, quando deveria gostar do Congresso. Gosta da polícia, quando deveria gostar da Anistia Internacional, da CNBB e do STF. Não sabe votar, quando elege candidatos proibidos por quem tem qualificação para pensar corretamente em política; por conta de sua ignorância, despreparo e maus hábitos, acaba escolhendo gente errada para governar o país. Têm horror a Donald Trump. Vivem preocupados com o avanço da direita mundial. Nunca vão a manifestações de rua desautorizadas ou seja, tidas como ameaça potencial às instituições.

Qual a utilidade de se falar disso? Uma delas é sugerir uma regra que pode ajudar o leitor a economizar tempo e ansiedade: se a maioria da elite pensante, a autoridade intelectual e os “especialistas no assunto” estão dizendo alguma coisa, pela mídia ou em seus discursos, acredite no exato contrário. Dificilmente você estará errado. Na mesma linha, quando lhe disserem que 2 mais 2 são 22, coisa que acontece com frequência cada vez maior, não se impressione; estão dizendo apenas um disparate. Continue acreditando que são 4 é garantido que você vai se dar bem. Nove vezes em dez, o que parece ser a lógica será mesmo a lógica. É bom sempre ter em mente, enfim, quem está dizendo uma boa parte do que se ouve o tempo todo por aí. Parecem figuras muito sérias. Mas são apenas o perfeito improviso do falso entendido, que por trás da pose de conde nada têm a oferecer de útil a alguém. Enquanto o mundo avança cada vez mais em busca da inteligência artificial, nossa elite está fazendo o possível para descobrir justo o contrário.

Veja