Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER

sexta-feira, 29 de abril de 2022

STF X militares: a guerra pela liberdade - Revista Oeste

J. R. Guzzo

Toda ação do alto Poder Judiciário, na soma dos últimos três anos e meio, é feita sistematicamente contra as leis e a Constituição 

 O que está realmente em disputa, no choque entre o Supremo Tribunal e a Presidência da República, é muito mais do que um teste de força para mostrar quem, no fim das contas, manda neste país. A verdadeira guerra que está aí envolve, diretamente, a liberdade no Brasil. O STF e as forças que o apoiam no atual conflito em torno do perdão concedido pelo presidente Jair Bolsonaro ao deputado Daniel Silveira, e em todos os conflitos anteriores, estão contra a liberdade. 
O governo e as Forças Armadas por trás dele estão a favor. 
É este o problema real que existe no momento. Não há outro.
Luís Roberto Barroso | Foto: José Cruz/Agência Brasil
Luís Roberto Barroso | Foto: José Cruz/Agência Brasil

Toda ação do alto Poder Judiciário, na soma dos últimos três anos e meio, é feita sistematicamente contra as leis e a Constituição — é através desse ataque permanente à legalidade que o STF e seus aliados procuram desmantelar o nosso sistema de direitos individuais e coletivos e criar um “novo normal” na política brasileira. É isso que eles procuram na sua briga de vida ou morte contra o presidente da República: um regime em que “as maiorias populistas” parem de representar um perigo para o STF e o seu entorno. Para isso, elas têm de ser colocadas em ponto morto através da anulação, na prática do dia a dia, da proteção que têm direito a receber das leis. Não se trata de perseguir individualmente este ou aquele. O objetivo real é impedir que a porção majoritária da população brasileira possa construir “um país conservador e autoritário”, como dizem os ministros, que não cabe no modelo de regime democrático que eles próprios, mais a esquerda e os seus subúrbios, têm dentro das suas cabeças.

A esquerda sempre foi uma inimiga, antes de tudo, da liberdade

Não é possível impor esse modelo, nem criar essa “nova ordem” numa sociedade livre. A liberdade é um problema insolúvel para o STF, para a camada superior do Poder Judiciário e para o resto do sistema que os apoia, ou conduz — os partidos de esquerda, as elites inconformadas com sua falta de influência no atual governo e o vasto aparelho do Estado brasileiro, junto com os parasitas que vivem dele, mais o condomínio das entidades da “sociedade civil” que está por aí. 
Liberdade, por exemplo, inclui o direito à livre expressão nas redes sociais — hoje, talvez, o inimigo número 1 do mundo descrito nas linhas imediatamente anteriores. Inclui eleições que o adversário pode ganhar, se o processo de apuração for limpo. 
Inclui o direito à palavra, que é incompatível com um Alexandre de Moraes, digamos. 
Inclui o avanço de valores como a família, a religião, a propriedade privada, o direito de empreender, o patriotismo, escolas sem doutrinação sexual e os consensos da maioria da população o oposto, exatamente, do que o consórcio STF-“oposição” quer para o Brasil.
 
É muito estranho, realmente, que tenhamos chegado a um momento em que os militares, a direita e um político basicamente anticomunista como Jair Bolsonaro sejam os grandes defensores da liberdade no Brasil. Quem diria, não é? Mas é precisamente onde estamos no momento. 
Que a esquerda esteja do lado oposto não é nenhuma novidade: a esquerda sempre foi uma inimiga, antes de tudo, da liberdade. Isso ou aquilo é livre? A esquerda é contra
Não existe nenhum precedente de liberdade em regimes de esquerda, da Rússia a Cuba, da Venezuela à Nicarágua. 
Suas marcas, ao contrário, são censura à imprensa, partido único, ausência de eleições, prisão política, negação do direito de livre expressão, roubo de propriedade, perseguição aos adversários, negação do direito de defesa, proibição do culto — em suma, um mundo muito parecido com aquele que a esquerda quer impor ao Brasil. O que chama a atenção, no momento em que a crise entre os Poderes chega ao seu ponto extremo, é o papel das Forças Armadas a grande garantia, hoje, da liberdade dos cidadãos, da manutenção da democracia e da oposição ao golpe de Estado.
 
Essa é a constatação que resulta do exame objetivo dos fatos no Brasil de hoje. Está positivamente contra a liberdade, para começar, um Tribunal de Justiça que condena a quase nove anos de prisão fechada, por ter levado ao ar um vídeo com ofensas ao STF, um deputado federal no exercício do seu mandato e das suas imunidades legais — alguém que, pelo que está escrito na Constituição, só pode ser julgado pela Câmara dos Deputados, e ninguém mais, seja lá o que possa ter feito. 
Age contra a liberdade quem tranca esse homem durante nove meses numa prisão, quando a lei diz que deputados só podem ser presos em flagrante, e pela prática de crime inafiançável. 
Também representa um ataque grosseiro às liberdades um juiz declarar-se vítima de um crime, como fez o ministro Moraes — e imediatamente assumir os papéis acumulados e simultâneos de policial, promotor e juiz do processo que abriu em causa própria.
 
Ao invés de mandar um pedido de investigação para a Câmara, a fim de que ela mesma decidisse sobre as culpas de Silveira — que como cidadão poderia ter praticado os crimes de calúnia, injúria ou difamação, nenhum dos quais permite pena de prisão —, o ministro abriu um processo penal contra ele.  
O deputado foi proibido de comparecer ao próprio julgamento
Seus advogados estão sendo acusados de má conduta por ter apresentado recursos “demais” a defesa de Lula, o herói do STF e o seu candidato à Presidência da República, apresentou 400 recursos e foi elogiada com lágrimas por um dos ministros. 
O deputado recebeu uma multa ilegal, que atingiu a sua conta-salário — ação absolutamente proibida por lei. Incomodaram a sua mãe. Cassaram seus direitos políticos. Proibiram que se candidate na próxima eleição. Mesmo depois do indulto presidencial, continua sendo perseguido por conta da tornozeleira que não precisa mais usar, já que não tem mais pena a cumprir. É, possivelmente, a mais extravagante sucessão de agressões à lei já feitas em qualquer processo na história do Judiciário brasileiro.

Barroso é um militante político empenhado em destruir Bolsonaro e o seu governo

Se um surto desses não é um ataque à liberdade, o que seria?  Quando a lei vai para o espaço, as liberdades individuais e públicas vão junto — não há como não ser assim. Não apenas o deputado foi atingido; o ataque se estendeu a todos os que pensam ou possam pensar como ele. Não é preciso ficar expondo aqui, uma a uma, todas as violações da lei e da Constituição praticadas pelo STF nos últimos anos. 

O caso Daniel Silveira, com a sua coleção inesgotável de aberrações, é um exemplo suficiente, pronto e acabado, de todo o resto. Na verdade, o ministro Moraes não é um caso isolado — alguém, talvez, que sofreu algum curto-circuito no equipamento cerebral e ficou desse jeito que ele está hoje. Ao contrário, trata-se de um excelente resumo do que são, na média, os seus dez colegas. Teve o apoio maciço de quase todos eles no seu inquérito perpétuo, sem limites e ilegal — inclusive do último nomeado por Bolsonaro, o ministro André Mendonça. (Este não precisou de muito tempo para aprender a trair; para piorar, tentou agradar ao patrono dando uma pena menos pesada para o deputado.) De todos eles, talvez nenhum esteja sendo tão destacado no combate contra a liberdade, neste momento, quanto o ministro Luís Roberto Barroso.

Barroso é contra a liberdade porque age diretamente contra a democracia. Dias atrás, num debate público nos Estados Unidos, o ministro chamou o presidente da República de “inimigo”. Algum tempo antes, também lá, tinha participado de um seminário com o seguinte tema: “Como se livrar de um presidente”
Como o magistrado de uma democracia, que obrigatoriamente tem de ser imparcial, pode dizer coisas assim? 
Barroso é um militante político empenhado em destruir Bolsonaro e o seu governo. Ele mesmo, a propósito, diz que o STF tem responsabilidades políticas e não pode se limitar às funções de árbitro da Constituição — tem o dever, em seu modo de ver as coisas, de exercer um papel “transformador” na sociedade. 
 
No seu ato de militância mais recente, e claramente inconformado com o perdão presidencial a Daniel Silveira, disse, sem prova nenhuma, que “os militares” estavam sendo “instruídos” a interferir no processo eleitoral. Levou um cala-boca do ministro da Defesa foi chamado de “irresponsável”, em nota oficial — e teve de ficar quieto, mas temos aí um sinal dos tempos. Fica claro que as Forças Armadas estão do lado da liberdade quando quem se coloca contra elas é alguém como Barroso.

A ofensiva contra as liberdades, naturalmente, se estende para muito além do STF. Ninguém se aliou tão a fundo aos ministros quanto a mídia. Não se trata, já há muito tempo, da prática de mau jornalismo, dos pontos de vista técnico ou profissional. Como os integrantes do plenário, os jornalistas acreditam que têm a obrigação de desempenhar um papel político em sua atividade ocupacional. Julgam-se portadores de responsabilidades definitivas: em vez de malversar seu empenho no mero exercício “acrítico” do jornalismo, estão convencidos de que têm o dever social, como cidadãos, de utilizar os cargos que ocupam para combater a direita em geral e Jair Bolsonaro em particular. Acreditam que têm essa função perante a sociedade brasileira — e que, por causa disso, desfrutam do direito de não respeitar as realidades. Entende-se, por aí, o negacionismo crescente da imprensa diante da lógica, dos fatos e da racionalidade.  
Não importa se dois mais dois são quatro; se Bolsonaro diz que são quatro, a mídia automaticamente diz que são sete. Foi cômica, no episódio do indulto, a negação da legalidade da medida, sustentada com as opiniões de “especialistas” pescados na Faculdade de Direito de Santo Antônio do Fim do Mundo — para não falar na busca desesperada por diferenças entre o perdão de Bolsonaro ao deputado, que foi “antidemocrático”, e o perdão de Lula ao quádruplo homicida Cesare Battisti, que foi “constitucional”. Não faz sentido, mas e daí? A mídia cumpriu seu dever político.

Este é o Brasil de hoje — a liberdade tem de ser defendida pelo governo e pela tropa armada

A imprensa brasileira talvez seja a única no mundo a defender a censura — apoia integralmente a proibição de publicar “notícias falsas” e punir os seus divulgadores. Mantém “consórcios” para publicar as mesmas notícias, como se faz nos países de jornal único. Age como policial de repressão ao conteúdo, com as suas “agências de verificação da verdade”. É, em sua grande maioria, a favor do projeto de “controle social” da mídia que Lula promete criar no Brasil para calar a voz das redes sociais. 

Provavelmente é a única, também, com sindicatos que apoiam a prisão de jornalistas e uma entidade nacional, como a ABI, que fica contra o perdão a um adversário político. Na esteira da imprensa, na militância aberta contra a liberdade, vem a aglomeração de sempre. É a OAB, que não admite, nem mesmo, a realização de eleições livres para escolher a sua própria diretoria. São as entidades “empresariais”, com as federações e as confederações da vida. São os bispos da CNBB. É a direção da Câmara dos Deputados e a do Senado Federal, que atingem, hoje, níveis clínicos de covardia e de servilismo — algo que não se conheceu nem no tempo dos senadores “biônicos” do regime militar. 

No seu grande momento, ficaram a favor da prisão de um membro do Parlamento — outro caso único no mundo. São todos os partidos de esquerda, a começar pelo PT, que recorrem ao STF para anular o perdão a um colega da política.  
É a universidade pública, onde os professores chamam a segurança para expulsar da sala um aluno que tentou exercer o seu direito a não usar máscara. É toda a polícia que se formou em torno da covid, da vacina e do “fique em casa”. São todos, enfim, que não conseguem pronunciar a palavra “liberdade” sem juntar a ela, imediatamente, a palavra “limites”.

Este é o Brasil de hoje — a liberdade tem de ser defendida pelo governo e pela tropa armada. É isso que separa o país de um golpe de Estado.

Leia também “Mais inimigos”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste


Barroso se acha - Augusto Nunes

Revista Oeste

Augusto Nunes

Um vasto e profundo poço de vaidade inunda a cabeça do ministro

Luís Roberto Barroso acha que enxerga no espelho um pai extremoso, marido amantíssimo e filho exemplar. O Barroso advogado acha que sempre esteve do lado certo. O Barroso juiz acha que não cometeu um único e escasso erro desde o desembarque no Supremo Tribunal Federal. Somadas todas as versões, o ministro se acha. O poço de vaidade que lhe inunda a cabeça é tão vasto e profundo que baleias perdidas por lá não correriam qualquer risco de encalhar numa borda. É compreensível que as sobrancelhas impecavelmente alinhadas sintam orgulho: servem de enfeite para os olhos de alguém que tudo sabe e tudo vê.
Luís Roberto Barroso | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Luís Roberto Barroso | Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Barroso acredita visualizar com nitidez, por exemplo, o certo e o errado. E se imagina capaz de — sem investigar nada, sem consultar provas e evidências, sem perder cinco minutos com reflexões — saber quem é culpado e quem é inocente. Uma sumidade desse calibre precisa de poucos segundos para descobrir o que é informação correta e o que não passa de fake news. É natural que Barroso reivindique a camisa 10 do time que anda demarcando a fronteira que separa a mentira (que ameaça o Estado de Direito) e a verdade (que preserva o regime democrático, as instituições, a lisura do sistema eleitoral e o respeito que merecem a Corte Suprema e os defensores da pátria entrincheirados no Pretório Excelso).

Barroso ataca e defende, é artilheiro e garçom, mata no peito e cabeceia, mas ninguém joga sozinho. No lance que resultou na cassação do mandato do deputado estadual Fernando Francischini, por exemplo, fez bonito o armador Edson Fachin. Para justificar a violência contra o parlamentar paranaense acusado de espalhar fake news na campanha eleitoral de 2018, Fachin desenhou no horizonte uma zona de turbulência invisível a olho nu. “Aqui está em questão, mais que o futuro de um mandato, o próprio futuro das eleições e da democracia”, chutou o especialista em chicanas chiques. Barroso devolveu de trivela: “As palavras têm sentido e poder. As pessoas têm liberdade de expressão, mas elas precisam ser responsabilizadas pelo que falam”.

Barroso recita que há diferenças entre o caso de Daniel Silveira e um condenado à prisão perpétua que tentou manter em liberdade

Ao guilhotinar o mandato de Francischini em nome do respeito a leis inexistentes, os superjuízes de araque aceleraram o ritmo das sevícias impostas à Constituição. Os abusos começaram a multiplicar-se em fevereiro de 2021, com a prisão do deputado federal Daniel Silveira. Para tanto, o carcereiro Alexandre de Moraes inventou o flagrante perpétuo, torturou a imunidade parlamentar, eternizou a prisão preventiva e atirou ao lixo uma penca de livros que assinou em parceria com juristas que os escreveram. O cortejo de iniquidade abjetas continuou em 8 de março com a anulação das condenações de Lula por Edson Fachin, parteiro da Lei do Erro de CEP. 
Prosseguiu em 13 de agosto com a prisão do ex-deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB. 
A arrogância fora da lei chegou ao clímax neste abril, com o julgamento que condenou Daniel Silveira a quase 9 anos de cadeia, fora o resto.
O decreto assinado no dia seguinte por Jair Bolsonaro, que indultou o deputado com o instrumento da graça constitucional, interrompeu a marcha da insensatez. Mas a insolência epidêmica é dura na queda. Alexandre de Moraes avisou que seu prisioneiro particular segue inelegível. Fake news. Barroso declarou que o presidente da República anda induzindo as Forças Armadas a interferirem no processo eleitoral. Fake news. Rosa Weber encaminhou ao Palácio do Planalto mais um ultimato: Bolsonaro tem dez dias para explicar por que se valeu de uma atribuição privativa do chefe do Executivo para livrar Daniel Silveira da ditadura do Judiciário. Haja estupidez.  
O alvo da cobrança deveria enviar à ministra uma cópia do decreto e uma pergunta manuscrita: Rosa, você não tem nada de útil a fazer? Onipotente, onisciente e onipresente, Barroso recita que há diferenças entre o caso do deputado que ofendeu o Supremo e um condenado à prisão perpétua que tentou manter em liberdade. Nas duas ocasiões, o presidente da República obedeceu à Constituição. Mas só Bolsonaro descumpriu a Constituição. Haja cinismo.
 
Entre 13 de abril de 2009, quando assumiu o comando da defesa do terrorista italiano Cesare Battisti, e março de 2019, quando o cliente (e amigo íntimo) confessou os crimes cometidos, o doutor em verdades e mentiras administrou uma usina de fake news. 
Redundante como carpideira, repetiu que Battisti fora apenas um sonhador recrutado pelo grupelho Proletários pelo Comunismo. Rebaixou as operações de extermínio que ensanguentaram a Itália democrática dos anos 70 a peraltices de adolescentes ansiosos por encurtar a chegada ao paraíso socialista. Aspas para o preceptor de revolucionários de galinheiro: “Condenar esses meninos e meninas décadas depois, fora de seu tempo e do contexto daquela época, constitui uma expedição punitiva tardia, uma revanche fora de época, uma vingança da História”.

Ele defendeu Battisti de graça pela beleza da causa: “Libertar um velho comunista, que fazia parte do lado derrotado da História”. E de onde vinha a crença na inocência do homicida? “O Cesare me olha nos olhos e fala: ‘Não participei de nenhum desses homicídios’. Eu acredito no que ele me diz”. Em abril de 2010, a Corte transferiu para o presidente da República a decisão de acolher ou rejeitar o pedido de extradição encaminhado pela Itália. Em 31 de dezembro, Battisti virou asilado político. Na noite de 8 de junho de 2011, nas cercanias da sede do STF, Barroso comoveu-se ao empalmar uma cópia do alvará de soltura do criminoso preferido. Caprichou na pose de homenageado de estátua equestre. Caiu do cavalo quando Cesare revelou que iludira durante dez anos o ministro que se considera um exímio caçador de falsidades.

O presidente que se negou a extraditar o criminoso envolvido em quatro homicídios, dois dos quais como autor, pediu desculpas “à esquerda italiana”. Tarso Genro, ministro da Justiça de Lula e estalajadeiro preferencial do terrorista em recesso, declarou-se “enganado”
Barroso não deu um pio sobre seu desempenho como fiador de mentiras deslavadas. 
Deve estar ocupado demais com a campanha contra Bolsonaro. 
E parece ainda acreditar que é uma espécie de personificação do Bem, como se apresentou a Tabata Amaral no sarau financiado por um bilionário ocioso. 
Também em João de Deus ele vislumbrou o Bem em forma de gente — até que dezenas de mulheres revelassem que o médico formado na faculdade do Além sempre foi um estuprador compulsivo.

O juiz não comenta o caso do curandeiro tarado que vivia louvando. Oficialmente, João de Deus continua responsável por ter livrado o ministro de um câncer. Mesmo depois de cair no conto do terrorista heroico, apesar de tapeado pelo doutor em estupro, Barroso continua se achando. Brasileiros que pensam acham apenas que age no Supremo um presunçoso patológico. É coisa de nascença. É defeito de fabricação. Isso não tem cura.

Leia também “Duelo na Praça dos Três Poderes”

Augusto Nunes, colunista = Revista Oeste 

 

Com indulto e embate entre Defesa e STF, Bolsonaro abre mais uma crise institucional

Com perdão a Daniel Silveira, presidente investe em novo confronto entre os poderes, criado sob medida para mobilizar seus apoiadores, arrastar os militares para a política e tumultuar o processo eleitoral [o confronto não foi criado por Bolsonaro,  que apenas exerceu uma prerrogativa constitucional = agiu dentro das 'quatro linhas da Constituição', tanto que o próprio STF está em silêncio há mais de uma semana, por falta do que dizer/fazer.]


arte Redes

Com a proximidade das eleições, que têm tudo para ser as mais disputadas e problemáticas da história recente, o cenário de polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se consolida, como indicam as pesquisas, e ganha elementos de uma crescente radicalização por parte do atual mandatário. Nos últimos dias, Bolsonaro e seus aliados pisaram mais fundo rumo ao perigoso abismo antidemocrático, atacando em duas frentes: no perdão concedido ao deputado Daniel Silveira e no embate entre o Ministério da Defesa e o ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso. [exercer uma atribuição que a Constituição lhe confere é acelerar rumo a um abismo antidemocrático? o ministro da Defesa criticar uma autoridade que acusa, sem provas,  aquele Ministério é conduzir o Brasil para um abismo antidemocrático?]

Juntas, essas investidas acabam servindo à mesma velha e conhecida estratégia do ex-capitão de jogar fumaça nos problemas reais do país, a exemplo da inflação recorde e do desemprego, e tentar fragilizar o Judiciário, atingindo por tabela a apuração da eleição, organizada pelo Tribunal Superior Eleitoral. Embalado por esse comportamento beligerante, Bolsonaro jogou mais gasolina na chama da guerra com a Justiça e arrastou novamente os militares para o debate político dentro do campo mais perigoso possível, o dos ataques à confiabilidade do sistema eleitoral — tudo isso a cinco meses do pleito.

A má notícia é que a nova peleja entre os poderes tende a se arrastar até outubro. Primeiro, porque o presidente prefere brigar a governar, habilidade pela qual não nutre nenhum gosto ou vocação. Depois, porque ele entende que tal estratégia lhe traga votos. Para piorar, o desfecho em torno do indulto a Silveira não será rápido. Como se sabe, o deputado foi condenado pelo Supremo a oito anos e nove meses de prisão por ameaçar ministros da Corte e incitar a violência contra as instituições. Vários partidos de oposição questionaram a constitucionalidade do ato, alegando desvio de finalidade, em seis ações que serão relatadas pela ministra Rosa Weber — e ela já avisou que levará a decisão ao pleno do Supremo. Mas isso só acontecerá se o caso for pautado pelo presidente Luiz Fux. [ops... até que uma decisão válida do STF declare que a graça concedida é inconstitucional, vale o Decreto de Graça. Para considerar a graça inconstitucional é preciso reescrever os artigos 53 e 84 da CF.] Assim, não é possível dizer ainda se a graça concedida por Bolsonaro é constitucional, se ela já está valendo ou se só terá efeito a partir do trânsito em julgado da sentença, contra a qual ainda cabe recurso.

(...)

O alvoroço deve mesmo se prolongar porque Bolsonaro mostra disposição infinita para tal confronto. Na quarta 27, ele reuniu Daniel Silveira e deputados da base no Salão Nobre do Palácio do Planalto para uma solenidade de assinatura do decreto de indulto e voltou a disparar contra o STF ao dizer que há autoridades que “podem muito, mas não podem tudo”. Também repetiu que “joga dentro das quatro linhas da Constituição”, uma referência que faz com frequência ao Supremo. “Quem estiver jogando fora, é nossa obrigação trazê-­los para dentro das quatro linhas”, declarou. O evento, batizado de “ato cívico pela liberdade de expressão”, teve transmissão ao vivo pela TV Brasil.

A dobradinha Planalto-base aliada também gerou uma iniciativa classificada como “deboche” pela oposição: o PTB indicou Silveira para ser titular da Comissão de Constituição e Justiça, um dos principais colegiados da Câmara, responsável por analisar a viabilidade jurídica de projetos que tramitam na Casa. Na mesma quarta, sob protestos, ele assumiu a função. [além da CCJ, Daniel Silveira foi ELEITO titular em quatro outras Comissões.] No dia seguinte, o presidente voltou à carga, dizendo que a apuração dos votos costuma ser feita numa sala secreta do TSE (o que é mentira) e sugeriu que as Forças Armadas façam neste ano uma apuração paralela.

Como sempre ocorre na era Bolsonaro, a estratégia do tumulto é guiada por um cálculo político — na verdade, um cálculo digital, na expectativa de conquistar likes e engajamento nas redes. Em menos de uma semana, o indulto dado a Silveira gerou 1,45 milhão de postagens no Facebook, no Instagram e no Twitter, sendo 52% delas favoráveis à medida, segundo levantamento feito pela Quaest Consultoria com exclusividade para VEJA. Ainda que parte desse montante venha de robôs, a empresa conclui que o presidente “conseguiu mobilizar sua base aliada de forma efetiva, protagonizando o debate”. Outro estudo, da Diretoria de Análise de Políticas Públicas (DAPP) da FGV, que também se dedica a estudar o comportamento das redes, identificou que o caso ocupou 11,24% das menções no Twitter entre os perfis de direita — o pico de tuítes (100 000) foi às 18 horas do dia 21, quando saiu o decreto. O tom das menções mostrava que o discurso enviesado do presidente sobre a defesa da liberdade de expressão e a tentativa de fixar a pecha de autoritário no STF colaram entre o seu público e embasaram a maioria das mensagens (veja o quadro).

(...)

A nova série de ataques ao STF ganhou impulso após um seminário promovido por uma universidade alemã no domingo 24, com a presença do ministro Luís Roberto Barroso. Na ocasião, ele disse que as Forças Armadas “estão sendo orientadas” a atacar o processo eleitoral. Ainda que tenha sido bem-intencionada, a declaração não pegou bem, algo reconhecido depois até dentro do STF. 
Em nota dura, o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, classificou a fala como uma “ofensa grave”. Uma ironia é que foi o próprio Barroso quem levou as Forças Armadas para dentro do processo eleitoral ao convidar os militares para integrar a Comissão de Transparência do TSE em 2021. No início deste ano, no entanto, a coisa desandou quando o general Heber Portella, membro da comissão, fez vários questionamentos sobre as urnas ao TSE. Bolsonaro usou isso para dizer em live que o Exército havia identificado “dezenas de vulnerabilidades” (mais uma mentira do presidente). Apoiadores passaram então a disseminar pelo Telegram mensagens sobre as supostas fragilidades.
REAÇÃO - Paulo Sérgio: o ministro da Defesa viu “ofensa grave” contra os militares -
REAÇÃO - Paulo Sérgio: o ministro da Defesa viu “ofensa grave” contra os militares – Alan Santos/PR

Em meio à crise, e acertadamente, o Supremo decidiu submergir. A interlocutores do STF, Barroso tem dito que suas falas foram tiradas de contexto. De fato, o ministro afirmou que existem tentativas de politização das Forças Armadas, mas ressalvou que, nos últimos 33 anos de democracia, elas foram “uma instituição de onde não veio notícia ruim”. Mesmo assim, a mensagem caiu mal entre diferentes setores militares, de acordo com altos oficiais que conversaram com a reportagem de VEJA, na condição de anonimato. Na opinião de um deles, causou profundo incômodo que as declarações tenham sido dadas em um evento no exterior, o que teria prejudicado a imagem da instituição lá fora. Mas os oficiais buscaram minimizar os impactos do episódio nas relações entre as Forças Armadas e o Supremo, dizendo considerar que as afirmações de Barroso refletem uma visão pessoal dele. Destacaram também que militares são legalistas e defendem saídas institucionais para as crises.

O problema adicional é que não se sabe mais onde acabam as Forças Armadas e onde começa o governo. Ao responder a Barroso, o general de quatro estrelas Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira falava como ministro, mas ele é também o mais alto superior hierárquico das Forças Armadas, abaixo apenas de Bolsonaro. [óbvio que falava como ministro e não tinha outra forma; as Forças Armadas foram caluniadas - mais grave ainda, no estrangeiro - e a obrigação de defendê-las é sempre do ministro que as comanda = ministro da Defesa.]  Outro integrante da ala militar instalado no Palácio do Planalto, o general Luiz Eduardo Ramos, da Secretaria-Geral da Presidência, também rebateu o ministro. “Eleições democráticas e transparentes fazem de nós um país soberano, por isso, nossas Forças Armadas estarão sempre vigilantes”, escreveu em rede social, como gosta o bolsonarismo. Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional, também cutucou. “As Forças Armadas, convidadas para participar do processo eleitoral, estão sendo orientadas, como sempre, a ajudar a lisura do evento”, escreveu — o post teve 45 000 curtidas,       10 000 compartilhamentos e quase 1 000 comentários.

.(...)

Além da origem em comum, o ex-­paraquedista Bolsonaro promove tamanha mistura entre governo e militares também de olho em dividendos eleitorais. Pesquisa Datafolha de setembro de 2021 apontou as Forças Armadas como a instituição mais confiável para a população, com uma taxa de 76%. Para quem acompanhou a debacle da ditadura e a péssima imagem que eles tinham nesse período, trata-se de uma nova realidade. “O desgaste dos políticos não atingiu os militares, que ficaram às margens com uma imagem ‘técnica e apolítica’”, avalia o historiador e professor da UFF Daniel Aarão Reis. Do outro lado, no mesmo levantamento do Datafolha, o trabalho do Supremo foi apontado como regular por 35% e ruim ou péssimo por 35% dos entrevistados pelo Datafolha em setembro. “Os ministros do STF atual se expõem mais do que no passado, o que os deixa mais vulneráveis, com divisões internas mais aparentes”, diz Maria Tereza Sadek, cientista política da USP e especialista em Judiciário.

O histórico de envolvimento das Forças Armadas com a República vem desde a sua proclamação, quando o Exército ajudou a encerrar o Império e emplacou os dois primeiros presidentes: os marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto. No episódio mais recente, e de profundo impacto na história do país, os militares promoveram o golpe que depôs João Goulart e deram início ao mais longo regime autoritário do Brasil, que duraria 21 anos e foi um desastre em termos econômicos. “A sociedade brasileira atingiu um nível de complexidade que não permite a repetição de um golpe nos moldes de 1964”, acredita Aarão Reis. O ex-ministro da Defesa no governo Dilma Rousseff — e à época comunista — Aldo Rebelo concorda. “Minha relação com os militares era tranquila. O que mudou foi a intenção de Bolsonaro de usá-los como aparato político”, entende.

(...)

MOBILIZAÇÃO - Ato bolsonarista em São Paulo: pregação do presidente encontra eco nas rede sociais -
MOBILIZAÇÃO - Ato bolsonarista em São Paulo: pregação do presidente encontra eco nas rede sociais – Alexandre Schneider/Getty Images

 (...)

Insuflado o tempo inteiro pelo bolsonarismo radical, o clima de polarização supera hoje o de 2018, quando o então candidato do PSL e Fernando Haddad, do PT, ficaram com 75% dos votos no primeiro turno. No último pleito, o capitão triunfou apostando forte no antipetismo e nas pautas de costumes. Na eleição deste ano, porém, há diferenças preocupantes, a começar pelo fato de Bolsonaro largar em desvantagem. Além disso, ele não é mais um projeto fake de outsider. Tem o comando das Forças Armadas e o apoio de generais encastelados no poder. Por fim, é chefe de um poder em disputa aberta com o STF. O país e suas instituições, que já provaram a sua resiliência diante de devaneios golpistas, precisarão mostrar — mais uma vez — a sua maturidade diante da perigosa marcha promovida pelo presidente.

Publicado em VEJA, edição nº 2787 de 4 de maio de 2022

Em Política - VEJA - MATÉRIA COMPLETA

 


 

Extradição barrada - Não houve gritaria quando Lula abrigou o terrorista Cesare Battisti

Vozes  - J.R. Guzzo

 

Lula jogou a culpa pela falha na avaliação do caso Cesare Battisti no ex-ministro da Justiça Tarso Genro (foto).| Foto: Ricardo Stuckert/Instituto Lula

Um dos melhores passatempos que estão disponíveis no momento na praça política é o estado de agitação nervosa e de revolta improdutiva contra o decreto presidencial que deu ao deputado Daniel Silveira o perdão para as penas que lhe foram impostas pelo STF. Pensaram em tudo, menos nisso – e agora, sem saber o que fazer, gastam energia numa daquelas revoltas sem causa que sempre levam a lugar nenhum.

Não há o que fazer, na prática. O decreto é à prova de bala do ponto de vista constitucional; não se pode mexer nele, a menos que se faça uma virada geral de mesa. Como disse o ministro Alexandre de Moraes em 2018, quando o presidente Michel Temer deu exatamente a mesma “graça” para um lote de condenados por corrupção na Lava Jato: perdão presidencial, “goste-se ou não”, tem de ser cumprido.

A oposição, a maior parte da mídia e o que se poderia chamar de “partido do Supremo” estão revoltados: foram ao próprio STF, aliás, pedir que seja anulada a anulação das penas do deputado. É uma alucinação
Está escrito na Constituição que o presidente da República tem o direito de dar esse perdão para quem quiser, na hora que quiser, de forma individual ou coletiva. 
Não precisa apresentar nenhuma justificativa para a sua decisão. 
Não precisa pedir licença a ninguém. 
Mais que tudo, não precisa submeter o decreto à apreciação de nenhuma “instância superior”. 
Não existe “desde que”, nem “salvo se” – é isso aí.

Aparecem então, no desespero, argumentos de nível ginasiano. A circunstância de Temer era “diferente”, alegam, embora não se explique qual poderia ser a diferença. O presidente agiu de “má intenção”, dizem, e “más intenções” invalidam o que está na Constituição. Quis “beneficiar” um aliado – e por acaso Temer, ao dar o seu indulto tido como impecável, quis prejudicar os perdoados? É daí para baixo.

O momento mais divertido, porém, ficou por conta do herói de quase todos os inconformados com o perdão ao deputado – o ex-presidente Lula. Como se viu, ele ficou quietíssimo quando o decreto saiu. Depois veio com a história de que “não quis dar cartaz ao Bolsonaro”, mas aí não deu para segurar: teve, sim, de falar no assunto maldito.

O fato é que Lula, antes de deixar a presidência, deu um "perdão" igual ao vetar a extradição do terrorista italiano Cesare Battisti, que assassinou quatro pessoas na Itália e depois se refugiou no Brasil. E agora: está errado perdoar Daniel Silveira, que gravou um vídeo com xingatório contra o STF, e está certo livrar Battisti, que matou quatro?

Lula piorou as coisas, como sempre, jogando nos outros a culpa pelo que fez – no caso, disse que o culpado foi o seu ex-ministro da Justiça, Tarso Genro, que lhe garantiu que Battisti era “inocente”. Àquela altura a justiça da Itália, em todas as suas instâncias, tinha decidido que ele era culpado por quatro crimes de homicídio – e isso, não pesou nada na avaliação de Lula? Quer dizer que “Tarso Genro falou, tá falado”?

O ex-presidente e candidato nas próximas eleições presidenciais acusou também o próprio Battisti; o “companheiro”, nas suas palavras, mentiu para ele ao dizer-se inocente. Lula acreditou na história do terrorista, coitado, e acabou cometendo o engano de mantê-lo no Brasil. Esse é Lula.

Esse é Lula. Esse é o seu passado
. Ele volta o tempo todo para interferir no presente e deixar mudos os seus devotos – tão indignados com o perdão a Daniel Silveira, e tão esquecidos do "perdão" a Cesare Battisti.

J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

Uma surra na Constituição - Gazeta do Povo

Vozes  - Luís Ernesto Lacombe

Está tudo errado. Dá para parar e começar de novo? Um recomeço, com cada um no seu quadrado, com harmonia e independência, todos conduzidos por leis mais do que suficientes. É impossível admitir a pressão política e ideológica, os trancos e empurrões como parte de uma guerra contra um governo, seus apoiadores, contra um país, seu povo, contra, enfim, a democracia.  
E não falem em nome dela, se artigos, parágrafos, tópicos, incisos, se a Constituição Federal não lhes permite interpretação, apropriação delirante, subjetividade criminosa, intenção maligna.
 
Viva a liberdade de expressão! Não dá para entender que aceitem a censura como forma de defesa da democracia. Não dá para entender que aceitem o sufocamento de ninguém, incluindo Allan dos Santos. 
Agora, Alexandre de Moraes, desprezado pela Interpol, determinou que a Anatel impeça o acesso de brasileiros ao site do jornalista... 
É a sanha do STF travestido de vítima, denunciante, investigador, acusador e julgador
O dono da verdade, o “editor do Brasil”, o “poder moderador”, nosso pai, nosso tutor, papai, mamãe, titia, aquele que “empurra a história”. O tribunal que se esparrama, com sua nódoa, pelos outros poderes da República, que ataca até as Forças Armadas.

Um tribunal que é refém de um movimento político não pode, ao mesmo tempo, querer estabelecer equilíbrio e justiça. Não há tribunal que se sustente quando disfarçadamente age politicamente, muito menos quando se assume abertamente um “ator político”,

É mais do que perseguir, é mais do que tentar calar, banir, é quase um linchamento. A ideia é desqualificar e desumanizar os “inimigos”. Contra um fascista, um nazista, um genocida vale tudo. Contra Daniel Silveira vale tudo... e um pouco mais. Vale prendê-lo, ignorando a imunidade parlamentar por “quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”... E não dá para ignorar a palavra “quaisquer”, incluída por emenda em 2001, quer dizer “todos” (ou todas, ou todes), é tudo, sem exceção. Aí inventam mandado de prisão em flagrante, flagrante perpétuo, vão rasgando a lei até um julgamento bizarro.

O réu, impedido de entrar no tribunal. Seu advogado intimidado, multado por supostos abusos nos pedidos de recursos... Não, claro que Paulo Faria não emocionou os juízes da suprema corte. Nada que se diga baseado em leis parece mesmo importar para eles. Está escrito, é só ler, é só abandonar a militância. Um tribunal que é refém de um movimento político não pode, ao mesmo tempo, querer estabelecer equilíbrio e justiça. Não há tribunal que se sustente quando disfarçadamente age politicamente, muito menos quando se assume abertamente um “ator político”, que se pinta de boa gente e aponta para o malvadão, o inimigo. E Cristiano Zanin, advogado de Lula, leva Gilmar Mendes à emoção, às lágrimas...

Veja Também:Juízes, verdades e democracia

O “abortoduto” adiado e a batalha pela vida no Congresso
  

A graça presidencial a Daniel Silveira tenta restabelecer a ordem constitucional, desfaz uma injustiça que se arrastava como uma corrente de abusos. “O decreto da graça e do indulto é constitucional e será cumprido. No passado, soltavam bandidos, e ninguém falava nada. Hoje, eu solto inocentes”, disse o presidente Bolsonaro. 
E os magistrados sabem que o indulto é uma prerrogativa do presidente; cabe somente a ele definir os critérios. Então, tomem tenência, seus juízes! 
Chega de defender a “democracia” de vocês e agredir, atacar, socar, espancar a Constituição todos os dias. 
Para a Câmara e o Senado, recado curto: tomem uma atitude! Caso contrário, serão cúmplices daqueles que têm rasgado leis.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Luís Ernesto Lacombe, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

 

A pior sofística tornou Lula reelegível - Sérgio Renato de Mello

Numa extensão temporal antes de Cristo (até 500 anos), Sócrates, Platão e Aristóteles, que dispensam apresentação, disputavam com os sofistas conhecimento, sabedoria, verdade e, por fim, virtude. Não que todos os sofistas buscavam isso. O que eles queriam mesmo era o pagamento pelas aulas que davam. Virtude e felicidade vinham em segundo plano ou disfarçadas pela retórica enganadora deles, como certos advogados e políticos de hoje, que relativizam em nome de um sonho, uma utopia, uma vida melhor. 

Alguns sofistas se destacaram. Eles pensavam alto, sim, como os filósofos. Era o trigo no meio do joio. Foi preciso que mentes mais elevadas surgissem para além do debate botequeiro, fantasioso, fraudulento e interesseiro. Só a reflexão individual desinteressada ou o diálogo humilde e cortês levava à virtude, bem pretendido naquela cultura.

Esta assombrosa realidade veio também para os julgamentos por atos delituosos daquela época. 

Certo da injustiça da acusação de ateísmo e sedução de jovens que pesava contra Sócrates e indignado com seu julgamento, Platão escreveu a seguinte carta:

"Outrora, na minha juventude, experimentei o que muitos jovens experimentam. Planejara, assim que alcançasse minha independência, começar imediatamente a participar dos assuntos públicos. Então aconteceram alguns incidentes com relação a esses assuntos. Como nossa Constituição do Estado estivesse sendo alvo de muitas críticas, ela estava sofrendo reformulações. Essa reformulação era conduzida por cinqüenta e um homens, que atuavam como seus autores […]. Ora, ocorria que alguns desses homens eram meus parentes ou conhecidos, e eles solicitaram que eu tomasse parte imediatamente nos negócios do Estado naquilo que me fosse pertinente. Como isso ocorresse na minha juventude, não causou espanto. Eu acreditava, no entanto, que eles administrariam o Estado de maneira que o conduzisse de uma situação de injustiça a uma forma de vida justa, de modo que aguardava sua deliberação com grande expectativa. Logo percebi, porém, que esses homens em pouco tempo faziam o antigo estado de coisas parecer uma idade de ouro. Entre outras coisas, enviaram Sócrates, um velho e caro amigo, que não hesito em declarar o homem mais justo daqueles que então viviam, acompanhado de outros, a um cidadão, com a intenção de levá-lo à força à execução ele [Sócrates] não lhes deu ouvidos, preferindo expor-se aos piores perigos a tornar-se cúmplice de ações criminosas. Em vista dessas coisas e de outras semelhantes e não menos importantes, indignei-me e afastei-me do mau regime de então.

Não muito tempo depois, porém, o mandato dos Trinta sofreu um duro golpe e, com ele, toda a Constituição do Estado. Senti então novamente, embora menos entusiasmado, o desejo de participar dos assuntos coletivos e políticos. Também aqui, em conseqüência da confusão, aconteceram coisas capazes de despertar a indignação […l. Infelizmente, algumas pessoas poderosas arrastaram diante dos tribunais nosso […] amigo Sócrates, levantando contra ele uma acusação das mais graves e no mínimo imerecida: alguns o acusaram de ateísmo, outros o consideraram culpado e executaram um homem que não quisera participar da detenção criminosa de um de seus amigos, outrora […] banido. A medida que voltava minha atenção para isso e para os homens que conduziam a política, e também para a boa educação e as leis, e quanto mais eu me entregava a essas observações e também avançava em idade, mais me parecia difícil a condução dos negócios do Estado; […] de tal modo que eu, antes cheio de ardor para trabalhar para o bem público, considerando tudo isso e vendo a comunidade sob todos os aspectos em completa desordem, acabei ficando aturdido e, apesar de não desistir de pensar […] num modo de melhorar a administração como um todo, esperando sempre o momento oportuno para agir, finalmente compreendi que todos os Estados atuais são mal governados [ I Fui então irresistivelmente levado a louvar a verdadeira filosofia e a proclamar que somente à sua luz se pode reconhecer a justiça nos assuntos públicos e individuais e que, portanto, as dificuldades do gênero humano não cessarão antes que a cooperação dos puros e autênticos sábios chegue ao poder ou que os chefes por aça divina, ponham-se de fato a filosofar" (disponível na excelente obra História da filosofia, de Christoph Helferick).

Sócrates insistia em perguntas que ele sabia sem respostas por amor a um método próprio dele, contrariando os sofistas, que, enganosamente, tinham respostas para tudo. Sócrates perguntava, fazia pensar, pensar, e depois não respondia. Não respondia não porque era ignorante. Não respondia porque a pergunta não tinha resposta. Conceitos importantes, como “virtude”, até hoje, são impossíveis de responder. Todavia, mesmo acabando em nada seus questionamentos, o Oráculo de Delfos o elegeu o homem mais sábio. Eu o chamo de O rei da aporia.

Por certo que isso irritava os sofistas e demais influentes da época.

Lendo a carta de Platão e analisando o julgamento de Sócrates lembro do julgamento da história do Brasil, envolvendo Lula.

No Brasil, em tempo de eleições presidenciais, a pergunta que desassossega corações e mentes é quem vencerá o certame. Pesquisas para lá de suspeitas apontam Lula na frente.

Se Sócrates usava a maiêutica (uma homenagem à sua mãe parteira) como arte de parir uma verdade, o judiciário brasileiro de mais de dois mil anos depois aborta uma falsidade, uma mentira. O STF tornou possível a elegibilidade de um condenado criminal, sem a etiqueta da culpa nos autos, mas com o certificado de corrupto na testa. Lula não é inocente nem aqui nem na China. Esta é a certeza que emana do coração de uma realidade clara e indiscutível.

No que o Supremo Tribunal Federal acreditou para anular o processo de Lula e trazê-lo ao mundo novamente? Peguei o costume socrático de perguntar sempre. Mas, aqui, acredito que temos a resposta, e ela não é nada convincente.

O STF, o moderador brasileiro por escolha própria, ou seja, sem voto, deve ter ouvido de algum oráculo por aí que os seus ministros são os homens mais sábios que existem e que Luis Inácio Lula da Silva é o melhor e fará realizar o sonho da utopia da felicidade (que, nos dias de hoje, equivale a impedir Bolsonaro de se reeleger). E eles acreditaram. A soltura de Lula é prova disso, pelo que constou do habeas corpus n. 193.726.

A mera anulação e soltura deu a impressão de que Lula não roubou o povo. Pura mentira. O povo tem esta representação do que aconteceu, uma ideia, uma imagem, é tudo, e é suficiente para desmistificar o Luladrão. 

Só restou ao povo brasileiro lamentar os “bons” advogados de Lula e os iluminados ministros do Supremo Tribunal Federal, todos unidos e crentes que Lula é a melhor solução para o Brasil. 
Lula é a medida de todas as coisas! Bradam eles, em imitação bem grosseira a Protágoras, o maior sofista contemporâneo das grandes mentes da antiguidade.

E, ainda, os sofistas podem contar com mais ajudantes nesta busca das “verdades”, a classe jornalista e certos “institutos de pesquisa”.

Se a conclusão das tais pesquisas estiver certa, uma verdade surge, enfim: a humanidade não evoluiu nada e a felicidade está cada vez mais longe de cada um de nós.

 Sérgio Renato de Mello  - O autor é Defensor Público de Santa Catarina


A “harmoniosa” divisão entre os poderes - Alex Pipkin, PhD

Nesse país de “democracia” ainda jovem, embora os cidadãos tenham direito a votar, característica marcante da democracia, os donos do poder são quase sempre os mesmos, de forma que o povo elege sistematicamente o que se poderia classificar como sendo “os mesmos”.
Sobrevivem no Brasil sistemas eleitoral e partidário disfuncionais, inibindo francamente o surgimento de novas lideranças embasadas em princípios, conceitos e ideias claras e efetivamente progressistas.

Nosso “Estado de Direito”, por sua vez, já deu várias mostras de que os donos do poder e a “elite” tupiniquim do estamento burocrático são de péssima qualidade, e diferentes dos meros comuns perante ao sistema legal verde-amarelo.
É importante lembrar que a divisão do governo em três poderes remete à Grécia Antiga.

Já a Constituição nacional, aparenta ter como modelo à norte-americana, da mesma maneira que de forma republicana, importamos o sistema de freios e contrapesos, em que cada um dos três poderes, que devem ser autônomos, pode exercer o controle sobre o outro, evitando os chamados abusos de poder.

Muito se alude ao equilíbrio entre os poderes, o que é desejável, uma vez que o Executivo tem o dever de aplicar as leis, o Legislativo é quem formula as leis, e o Judiciário julga as leis à luz da Constituição.
A divisão dos poderes, estabelecido os limites adequados entre eles, tornaria muito difícil a formação de um regime autoritário.
Sem que nenhum poder se sobreponha ao outro, em tese, teríamos um sistema de governança harmonioso.

No entanto, o que o povo brasileiro presenciou nos quatorze anos de governos do PT, foi exatamente isso, uma relação “harmoniosa” entre os poderes, inclusive capaz de se cegar para o maior assalto que ocorreu aos cofres públicos nacionais e, quiçá, mundial.

Hoje, transparentemente, vê-se um grave conflito entre o Poder Executivo e o Poder Judiciário, em que os membros do STF extrapolam ativamente suas funções, legislam rasgando à Constituição, e com abissal ativismo judicial, tomam decisões que afrontam o Legislativo e atacam flagrantemente o Executivo.

O país chegou a uma notória situação de agigantamento e avanço do Judiciário sobre os demais poderes, uma genuína ditadura da toga, em que aqueles que não são eleitos pelo povo, mandam e desmandam de acordo com seus interesses.   
Neste aspecto, caberia indagar, quem exerce o controle sobre o STF, ou seja, quem vigia o vigiador?

Claramente, há uma série de decisões do STF abusivas e inconstitucionais, que têm atuado descaradamente de forma política e enviesada, contra o presidente da República, para evitar uma eventual reeleição do mandatário.
Tal fato é extremamente grave, já que é o Judiciário aquele poder que deveria promover o equilíbrio entre os Poderes Executivo e Legislativo.
A pior composição do STF de todos os tempos, acaba de condenar o deputado Daniel Silveira por quase nove anos de prisão, pena completamente absurda e desproporcional, que fez com que o Executivo e o Legislativo tomassem iniciativas enfáticas, a fim de colocar o STF “no seu justo lugar”.

Há quem se contente - e esbraveje - com o “mecanismo processual”, com a demagógica retórica da “democracia e do Estado de Direito”, e com a suposta “harmonia entre os poderes nas relações de governança”.
Veja-se agora, com o decreto da graça concedida pelo presidente ao parlamentar Daniel Silveira, que contempla por si só as razões de tal ato, a semideusa togada ministra Rosa Weber, abriu dez dias para que o Presidente da República explique seu decreto. Explicar o quê?

Objetivamente, a usurpação do Poder Judiciário parece ser clara para quase todos os indivíduos e, especialmente, para o presidente, que embora atacado por grande parte dos políticos ministros do STF e pela mídia marrom, tenta adequadamente ajustar um julgamento político e desproporcional, e pelo Parlamento, agora reavivado frente os constantes abusos e sobreposições da Corte Superior.

O sistema se protege, e o pensamento e a ação corporativa do STF, ofusca o pensamento crítico dos togados, inclusive daqueles autodenominados “iluministas”, desautorizando-os de reconsiderar rotundos equívocos e de atuar de forma livre e independente.
Tomara que esse momento seja um prenúncio do fim da ditadura da toga e o começo de um efetivo sistema republicano de freios e contrapesos.

 Alex Pipkin - PHD

 

Rejeitado no passado, apoio a armas conquista líderes evangélicos no governo Bolsonaro - O Globo

Eduardo Gonçalves

Armamentismo ganha espaço na agenda de líderes evangélicos

Até dentro da bancada evangélica do Congresso, que chegou a se posicionar contra decretos pró-armas editados pelo presidente no passado, o assunto hoje divide opiniões 

A questão voltou ao debate nesta semana com o episódio envolvendo o ex-ministro da Educação, Milton Ribeiro, pastor presbiteriano, que disparou um tiro acidental na área de check-in do aeroporto de Brasília. Graduado em teologia, ex-reitor do Mackenzie e professor de Direito, Ribeiro tem porte de arma expedido pela Polícia Federal e registro de Caçador, Atirador Desportivo ou Colecionador (CAC) emitido pelo Exército.

O ex-ministro, no entanto, não está sozinho no movimento cristão armamentista. Pastor pentecostal da Assembleia de Deus e ex-vereador pelo Republicanos, Cláudio Ferreira virou coordenador do grupo Pró-Armas em Sergipe. Em vídeos publicados nas redes, ele explica como tem estruturado o movimento no Estado, procurando apoio e patrocínios de donos de clubes de tiro e lojas de arma, além de pessoas dispostas a defender a agenda em cargos políticos.

— A grande maioria abraçou a causa aqui. (...) Nós [o pró-armas] já crescemos uns 70%, 80% do que éramos no passado. (...) Sabemos que hoje o pró-armas é a esperança de adquirirmos algum direito — diz ele, ressaltando a organização de caravanas para protestar em Brasília. Ferreira não foi localizado para comentar as postagens.

Em Pernambuco, o pastor e vereador pelo PP, Junior Tércio, e a sua mulher, deputada estadual Clarissa Tércio (PP), também incorporaram a pauta à sua agenda. Em postagens recentes nas redes sociais, o casal exibe fotos em que aparecem armados de pistola e escopeta num clube de tiro. Em uma delas, incluíram a seguinte mensagem: “Juntos enfrentaremos todas as guerras, seja no mundo espiritual ou material”.

Líder da Igreja Ministério da Fé, o pastor Fadi Faraj é outro propagador da tese de que o “direito de defesa é bíblico”.

— A questão é defender nossos valores e família. A Bíblia não contradiz defender a família. Por exemplo, quando a Palavra diz “não matarás”, é “defenderás” também — afirma Faraj.

quinta-feira, 28 de abril de 2022

Para não dizer que não falei das flores - Evaristo de Miranda

O Brasil produz 15.000 hectares de flores, o que representa  8% da produção mundial

A capacidade de sedução das flores é fundamental para a reprodução e a sobrevivência da planta. As flores são belas e perfumadas para seduzir seus polinizadores: insetos, aves e morcegos. Até os humanos são atraídos pelo perfume e pela beleza das flores, capazes de um verdadeiro encantamento. Eles seguiram o exemplo dos vegetais. Em sinal de afeto, amor e paixão, oferecem flores. Para seduzir, perfumam-se com fragrâncias e aromas retirados das flores.

Campo de calêndulas | Foto: Shutterstock

Diversos papiros do Egito antigo atestam a fabricação de perfumes e unguentos aromáticos a partir de lírios e várias flores. São muitas menções a perfumes na Bíblia. É emblemático o gesto da mulher rompendo um vaso de alabastro, repleto de perfume de nardo, lá das proximidades do Himalaia, e derramando-o sobre Jesus, ungindo-o da cabeça aos pés (Mt 26,7).

Maria Madalena derramou um frasco de alabastro, repleto de perfume de nardo, nos pés de Jesus Cristo | Foto: Reprodução

No passado, os perfumes eram extraídos de rosas, jasmins, lírios, laranjeiras e outras flores através do vapor, da fumaça. Daí a origem latina da palavra: per fumum, “pelo fumo”, pela fumaça, pelo vapor. E por meio de borrifadas vaporizadas, per fumum, as fragrâncias ainda se espalham no corpo humano e no ambiente.

O Livro da Química de Perfumes e Destilados, escrito pelo químico árabe Alquindi no século 9, apresenta centenas de receitas de óleos de fragrâncias, águas aromáticas ou imitações para drogas caras, além de mais de uma centena de métodos e receitas para a perfumaria. Essa presença árabe segue no nome de instrumentos da produção de perfumes, como alambique. No século 10, o médico e químico persa Avicena sistematizou a extração de óleos de flores pela destilação. Seus ingredientes e sua tecnologia da destilação marcaram a perfumaria ocidental até hoje.

A produção de flores é uma das obras-primas praticadas por pequenos agricultores. No Censo Agropecuário do IBGE de 2017, dos 5 milhões de estabelecimentos agropecuários recenseados no Brasil, 12.000 declaram ser floricultores lato sensu (flores, folhagens, mudas, sementes…), presentes em quase metade dos municípios brasileiros (mapa 1). Parte significativa desses floricultores possui uma organização empresarial e tecnológica avançada e intensiva. Atividade competitiva, nessa floricultura moderna estão mais de 8.000 floricultores profissionais. Seus cultivos têm área média de 1,5 hectare, segundo o Instituto Brasileiro de Floricultura. A área total da floricultura ultrapassa 15.000 hectares. Parece pouco, comparado à de soja ou milho. Não é. A área mundial é da ordem de 190.000 hectares. A brasileira representa cerca de 8%.

Além desse grupo, existe uma fração de floricultores, de 3.000 a 4.000, em escala muito local, menos integrada aos mercados. Segundo pesquisa da Embrapa Territorial, em janeiro de 2022, dos pequenos agricultores com Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), 3.152 declararam-se produtores de flores, além de outras atividades, com expressiva presença no Nordeste e até na Amazônia (mapa 2).

No Brasil, aproximadamente 9% das flores e plantas são cultivadas em estufas, 3% sob telados ou sombrite e 88% em campo aberto ou ao ar livre. Das 350 espécies e suas 3.000 cultivares, nativas e exóticas, 30% são flores e folhagens de corte, 39% são plantas e flores de vaso e 31% plantas ornamentais e para paisagismo.

Intensiva em capital e mão de obra, a floricultura emprega, em média, 3,8 trabalhadores por hectare. A cadeia de produção e comercialização envolve diretamente 200.000 pessoas: 50% nas propriedades, 40% no varejo, 4% na distribuição e o restante em atividades complementares. Nas pequenas propriedades, apenas 20% da mão de obra é familiar, os outros 80% são contratados. Boa parte da mão de obra é feminina. As mulheres demonstram maior destreza, habilidade e cuidado no manuseio de flores e plantas. Floriculturas vendem beleza e embelezamento, associados à presença de mulheres nos pontos de venda.

A Lei de Proteção de Cultivares, de 1997, viabilizou a entrada no mercado brasileiro de novos cultivares e lotou as prateleiras de floriculturas e pontos de venda com uma gama ampla de cores e formatos até então desconhecidos dos brasileiros, aumentando a oferta e a diversidade.

O valor bruto da produção passou de R$ 0,3 bilhão, em 2004, para R$ 11 bilhões, em 2021. São Paulo responde por praticamente 70% desse valor. O consumo de flores cresceu, no mesmo período, de R$ 15/habitante/ano para cerca de R$ 65 (US$ 12), ainda muito aquém do consumo na Suíça (US$ 174), na Alemanha (US$ 98), na França (US$ 69) e nos EUA (US$ 58).

O faturamento do setor cresce entre 12% e 15% anualmente. São cerca de 600 empresas atacadistas no mercado de flores e mais de 25.000 pontos de venda. Mais da metade do consumo se concentra no Estado de São Paulo e 85% no Sudeste. O mercado nacional absorve 97,5% da produção. Só uma pequena porcentagem é destinada à exportação. Os principais polos de produção estão no Estado de São Paulo, em Arujá, Atibaia, Holambra e Ibiúna. Outros em Andradas, Barbacena, Munhoz (MG); Nova Friburgo, Petrópolis, Serra da Mantiqueira (RJ); Vale do Caí (RS); Joinville (SC); e Serra da Ibiapaba (CE). Flores e folhagens tropicais são produzidas em localidades no litoral do Nordeste (AL, PE, RN e BA).

Ambiente de trabalho ornado com flores não é mais exclusividade de mulheres. Homens presenteiam e são presenteados com flores

A floricultura sofreu com os lockdowns no início da pandemia: cancelamento de festas, casamentos, batizados, bodas e outros eventos. Houve queda brutal na demanda por decoração com flores de corte (rosas, crisântemos, astromélias, lírios…). O tratamento do consumo de flores como algo supérfluo no início da pandemia foi revertido graças a campanhas intensas dos produtores, sobretudo no varejo, em supermercados e floriculturas.

Pessoas em home office, confinadas, buscaram maior reconexão com a natureza. Os floristas propuseram opções: da decoração com flores e até no cultivo limitado de plantas ornamentais, para tornar o ambiente de trabalho mais prazeroso e dar maior aconchego e bem-estar às casas. Durante o isolamento, a jardinagem passou a ser praticada nas casas e se tornou um hobby de muitos brasileiros. Isso ampliou e diversificou a demanda. E exigiu novas soluções em buquês, ramalhetes e plantas, além do comércio de vasos, ferramentas, pequenos sistemas de irrigação, estufas e outros. Flores de vaso, orquídeas, suculentas, cactos, antúrios e até bonsais ampliaram as vendas.

Jardinagem e plantas para decoração ajudaram no crescimento do mercado de flores entre 2020 e 2021. E, mesmo com o recuo da covid, jardins e ambientes com flores ainda se mantêm. Somaram-se a essa demanda, novos hábitos. Ambiente de trabalho ornado com flores não é mais exclusividade de mulheres. Homens presenteiam e são presenteados com flores.

A floricultura e os floristas investiram e inovaram em comunicação e comércio digital. Criaram sites, ampliaram sua inserção em redes sociais, telemarketing e aperfeiçoaram os serviços de delivery. Cresceu a venda no varejo. Floristas já eram pioneiros em entrega de flores em domicílio, mesmo à distância. Agora, ganharam uma escala maior e mais sofisticada.

Após as perdas, as vendas de 2021 superaram as de 2020 e, em alguns segmentos, até de anos anteriores. A demanda cresceu. Maio é um mês das flores, com o Dia das Mães. Junho também, com o Dia dos Namorados. As duas festas somam quase 40% das vendas ao longo do ano. Aqui, o Dia dos Namorados é na véspera da festa de Santo Antônio, e não no dia de São Valentino.

Associar flores, namorados e Santo Antônio é natural. Ele foi um pregador culto e apaixonado, com grande devoção aos pobres. Veneradíssimo no Brasil como o santo dos amores e dos casamentos, ele abre o ciclo das festas juninas. Ao tornar-se monge, ele adotou o nome Antônio ou “flor nova”, anto nous: do grego ánthos “rebento, broto, flor”, presente em antúrio, e da expressão latina novus “novo”. Antônio foi mesmo uma nova floração para o Cristianismo na Europa e um expoente da Ordem dos Franciscanos.

Flores decoram imagem de um santo católico
Flores decoram imagem de Santo Antônio | Foto: Reprodução

Na floricultura, todo dia se planta e se colhe. A busca da perfeição é absoluta. Não pode haver defeito ou mancha nas flores. Se não, são descartadas. Esse perfeccionismo é associado à sustentabilidade. Nas estufas, se a temperatura sobe demais, o floricultor a resfria, e vice-versa. A água gerada pelos sistemas de refrigeração ou das chuvas é recuperada e utilizada na produção. Cada vez gasta-se menos água por vaso produzido, graças à eficiência dos sistemas de irrigação, à gestão dos melhores horários para irrigar etc. O setor investe muito em energia solar. Teme falta de energia ou um fornecimento de má qualidade, capaz de comprometer seus equipamentos sofisticados.

Em São Paulo, a Feira Internacional de Paisagismo, Jardinagem, Lazer e Floricultura reúne mais de 200 expositores nacionais e internacionais. Outros cartões-postais da floricultura são a Expoflora, em Holambra (SP), e a Festa das Flores de Joinville (SC). Esses eventos técnicos e turísticos reúnem milhares de produtores, fornecedores de equipamentos, insumos e centenas de milhares de visitantes. Como as feiras agropecuárias e as de peão, as festas das flores são vitrines para o consumidor urbano da potencialidade da agropecuária e dos pequenos agricultores tecnificados.

Uma frase conhecida dos floristas foi adotada por muitos. As flores transformam uma casa em lar. Vale para o agro e para o país.

Flor Pink Rose, em Holambra | Foto: Tamy Atamay/Shutterstock

Leia também “O Brasil não precisa importar trigo”

Evaristo de Miranda, colunista - Revista Oeste