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quarta-feira, 10 de janeiro de 2018

Urgência da hora

A história fiscal do país foi quebrada em 2014 com a entrada na era dos déficits altos e crescentes. A série do Banco Central, iniciada em 1991, mostra que no período Dilma-Temer o país entrou numa anomalia tão grande que exige o uso de armas mais poderosas do que os pequenos pacotes de ajuste. Houve uma mudança na natureza da crise, é preciso muito mais ousadia para enfrentá-la.

Durante os 23 anos que vão de 1991 a 2013 o país teve superávit primário em 22 deles e um pequeno déficit de 0,25% do PIB em 1997. Nessa longa temporada de mais de duas décadas, o país incorporou na contabilidade parte da dívida que estava fora das estatísticas e assumiu os chamados esqueletos. Por isso a dívida aumentou inicialmente. Os superávits permitiram que ela ficasse estável e, depois, caísse. Nos últimos anos, entrou numa escalada que atingiu níveis perigosos. Este é o quinto ano de déficit. Estão projetados resultados negativos para os próximos dois. Serão, então, sete anos de vermelho nas contas. Descontrole desse tamanho só aparece nas contas dos países atingidos pelas crises bancárias de 2008, como Espanha, Grécia, Islândia, Irlanda, Portugal. Aqui não houve crise bancária, apenas uma calamitosa administração econômica nos anos Dilma, cujos erros o atual governo não conseguiu reverter e, às vezes, repete.

O ano de 2019 é o ponto que não se pode ultrapassar. Há uma barreira no caminho chamada “regra de ouro”. Ela foi pensada exatamente para ser parada obrigatória. Suspendê-la no momento da crise é um erro. Mesmo que o governo queira cercar a decisão com outras propostas. O fato de haver essa pedra no caminho serve para mostrar que o país tem que olhar mais profundamente o que fazer para superar a crise fiscal.

Medidas como contingenciar, cortar investimentos, limitar as viagens, aumentar IOF, elevar a alíquota de alguns produtos, mudar a época da cobrança de impostos, tudo já se esgotou. Foram úteis quando o que se precisava era menor. Agora é preciso uma proposta ampla para reformular completamente o gasto público. Por isso, o governo, em vez de propor a quebra de uma regra disciplinadora, tem que fazer a coisa certa e propor uma radical mudança no Orçamento e na estrutura dos gastos públicos.

Um país que precisa de um ajuste de 2% do PIB, entre R$ 180 bilhões a R$ 200 bilhões, não pode dar 4% do PIB para empresários. O Banco Mundial recentemente mostrou que as transferências para o capital saíram de 3% para 4,5% de 2003 a 2015. O dinheiro vai para empresas na Zona Franca de Manaus, para a indústria automobilística, para setores que foram desonerados, para empresas que entraram na lista ampliada do Simples. Alguns subsídios mais absurdos, como o PSI, foram cortados, mas os que permanecem são gigantes.

A reforma da Previdência é indispensável. Mas a proposta foi sendo modificada para ser aceita pelos mais diversos lobbies, principalmente de setores do funcionalismo. O governo capitulou logo no início diante da pressão dos militares. A Previdência brasileira como está não se aguenta em pé. As despesas com o pagamento de pensões e aposentadorias cresce a cada ano de R$ 40 bilhões a R$ 50 bilhões. Isso é equivalente a tudo o que o governo investiu no ano passado.
Um país cujo governo só tem como mexer em 8% do Orçamento precisa ter a ousadia de mudar leis, alterar a Constituição e mudar radicalmente a forma de distribuir o dinheiro coletivo. Essa não é uma crise fiscal a mais. É a maior.

Coluna da Miriam Leitão 
 

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