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domingo, 23 de agosto de 2020

A QUE PONTO O GOVERNO É RESPONSÁVEL? - Percival Puggina


Leitor escreve perguntando “até que o ponto o governo pode ser responsabilizado pelo mato sem cachorro no qual se enfiou”. 
Ele considera que isso aconteceu “mesmo diante de muitos avisos, deixando-se o governo engolir pelo STF, pelos políticos da velha política e, talvez o pior, pela ala militar”. A pergunta é importantíssima e a reprodução da resposta solicitada por muitos leitores.


A responsabilidade pessoal do presidente ou de seu governo é nula nesse particular. A história da República mostra que governo sem maioria parlamentar ou não governa, ou não conclui o governo. Getúlio Vargas, Jânio Quadros, João Goulart, Fernando Collor, Dilma Rousseff e Michel Temer contam essa história. 


[no caso do presidente Bolsonaro, além da falta da maioria  parlamentar ocorreram outras dificuldades - animosidade, boicote, má vontade, até mesmo sabotagem.
Destacamos dois exemplos:
- má vontade do STF em qualquer assunto que pudesse, ainda que remotamente, favorecer o presidente da República.
Um exemplo:
A decisão dando o protagonismo no combate à covid-19 a governadores e prefeitos, seria o tiro de misericórdia. O que seria a bala de prata para os inimigos do presidente = inimigos do Brasil, da democracia e da liberdade.
Só que uma ação que deveria ter um comando único, centralizado, ser pulverizada em mais de 5.000 pontos  - bagunçou tudo, abre aqui, fecha acolá, fecha de manhã abre de tarde - fez com que os indicados, de felizardos passaram a fugir do protagonismo.
Na fuga,  tentam acusar o governo do capitão,  acusação que não se sustenta seja no Brasil ou em Haia.
- busca do deputado Maia pelo destaque rumo ao sonho de suceder o capitão: via eleições em 2022 ou em um golpe branco.
Só que a popularidade do presidente Bolsonaro voltou a crescer e o céu é o limite.]

Isso quanto às duas casas do Congresso. 
Já o Supremo, como tenho escrito, só deixará de se antepor, sobrepor e pospor ao governo quando houver alterações em seu plenário. 
É preciso entender que todos os atuais ministros amargaram derrota pessoal na eleição presidencial. Todos votaram contra o Bolsonaro e, pelo menos oito dos 11, são tão de esquerda quanto qualquer “intelectual” petista. Não ocultam essa condição nem a correspondente animosidade, que já ultrapassou os limites do escandaloso. Mínima alteração ocorrerá em novembro, quando o presidente indicar o substituto de Celso de Mello. Câmbios mais consistentes dependerão, como tenho dito, de um trabalho da sociedade sobre o Senado para que este dê curso às denúncias de crime de responsabilidade (impeachment) ali engavetadas por Alcolumbre.

Quanto aos militares, afora algumas raras opiniões do vice-presidente desalinhadas do governo, como no caso do aborto, não os vejo complicando a vida do presidente. Eles apenas deixam claro que se negam a fazer o que não devem (intervenção) nos outros poderes em relação aos quais não têm prerrogativas constitucionais e nunca foram nem serão a isso solicitados pelo presidente. Essa é uma questão exaurida. Apostar nela é alimentar o discurso dos inimigos nacionais e internacionais do governo (incluída a grande mídia que adora jogar o assunto no colo do presidente) e atrasar o que de fato precisa ser feito, a pressão política através dos cidadãos, sobre o Senado, para que cumpra seu papel em relação aos desvios de conduta do STF.

No nosso modelo institucional o presidente é totalmente impotente em relação a esses aspectos. A única ação que lhe cabe é trazer o centrão para um jogo limpo. 
O resto não está em sua alçada. No entanto, pergunto? 
Que dizer da inércia da sociedade? 
Por que, em cada estado, os eleitores não confrontam seus três senadores para que cumpram seu dever? 
Eles não o farão espontaneamente se a sociedade não lhes der e impuser o exemplo por democrática pressão popular. 

Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus brasileiros. Integrante do grupo Pensar+.


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