Folha de S. Paulo
Criação de vagas em julho é bom começo, mas vigor da retomada segue incerto
A volta da criação de empregos com carteira assinada em julho foi uma
rara boa notícia na pandemia. A abertura de 131 mil postos sinaliza que
uma retomada econômica pode ganhar corpo ao longo do segundo semestre,
conforme prossiga a volta gradual das atividades. A levar em conta a experiência internacional, é razoável imaginar uma
aceleração das contratações nos próximos meses, depois da perda de 1,1
milhão de vagas acumulada entre março e junho.
Embora não esteja clara a perspectiva de uma retração geral da Covid-19,
é perceptível o retorno de setores menos afetados pelas restrições de
contato social. Conforme os dados parciais de junho, cerca de metade da queda da
atividade já se encontra revertida. As projeções para o ano vêm
melhorando e apontam para retração do Produto Interno Bruto próxima dos
5%, menos devastadora que a temida há algumas semanas.
Está em curso uma certa descompressão, que confere uma impressão de
retomada rápida nos momentos iniciais. Tomar o início como tendência
seria precipitado, contudo. Restam muitas incertezas, a começar pela
provável redução do valor do auxílio emergencial a partir de outubro.programa foi bem-sucedido em defender a renda e o consumo de
trabalhadores informais e famílias pobres em geral, e não se sabe se a
economia terá vigor para compensar a progressiva retirada de
transferências governamentais.
Além do auxílio, foi importante o mecanismo de flexibilização de
contratos de trabalho, com redução de jornada e salários, parcialmente
compensados pelo governo. Visando evitar perdas de postos formais, o programa foi orçado em R$
51,6 bilhões e até agora cerca de R$ 23 bilhões foram utilizados em 16,3
milhões de acordos. A prorrogação da regra por dois meses, até outubro,
deve dar algum fôlego adicional aos setores mais atingidos.
Mas o vigor do emprego será posto à prova quando esses mecanismos
cessarem, o que ocorrerá nos próximos meses, dadas as restrições do
Orçamento público. As transformações econômicas que estão em andamento, da digitalização
acelerada a novos hábitos e focos de consumo, ainda poderão provocar
demissões conforme as empresas se ajustarem.
Tudo isso sugere que mesmo uma arrancada inicial, ainda por se
confirmar, poderá sem demora dar lugar a um ritmo mais lento. O dano da
crise, evidente, também poderá ser durável. Não por acaso, o ponto central das expectativas de crescimento do PIB
para 2021 nas pesquisas do Banco Central é de apenas 3,5%, insuficiente
para recuperar o nível da atividade de antes da crise. Projeções
melhores dependerão, mais uma vez, do avanço da agenda de reformas
econômicas.
Editorial - Folha de S. Paulo
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