O Estado de S.Paulo
Afastamento de Witzel por decisão monocrática e sem ouvi-lo acende luz amarela entre governadores
O Ministério Público acertou ao investigar e descobrir maracutaias
justamente na área de saúde no Rio de Janeiro, mas o Superior Tribunal
de Justiça (STJ) errou ao decidir monocraticamente o afastamento do
governador Wilson Witzel por 180 dias, sem nem sequer ouvir o que ele
tem a dizer sobre as acusações, feitas a partir de uma delação premiada.
Combater a corrupção, sim, mas abrir um precedente perigoso contra
governadores, não. Por isso, o julgamento de terça-feira no plenário do
STJ é tão importante. [todos os gastos realizados por governadores e prefeitos durante a pandemia e no exercício de atribuições especiais outorgadas aos mesmos por decisão do STF, devem ser rigorosamente auditados e qualquer falha rigorosamente punida - até mesmo a lentidão na execução de obras essenciais ao combate à covid-19, lerdeza que fará que obras sejam concluídas, ou mesmo iniciadas, ao término da epidemia = ser corrupto, desviar recursos públicos é crime, mas usar mal dinheiro público, também é crime e deve ser punido = não pode haver tolerância com o administrador que conclui uma obra quando não há mais necessidade.
Mas ouvir o acusado é indispensável em qualquer processo.]
Desde sexta-feira, há intensa troca de telefonemas e mensagens entre
governadores, para analisar a situação e a operação que pegou Witzel de
jeito. Ninguém defende Witzel, até porque eles não viram o processo e
não conhecem as provas, mas todos defendem ferrenhamente a legalidade.
Que o MP investigue e faça o que tem de fazer e que a Justiça decida,
julgue, puna.
Mas um único ministro afastar um governador eleito?
Sem
dar a ele acesso às acusações?
Se hoje é Witzel, amanhã pode ser qualquer um. Há motivos para a
preocupação. Na fatídica reunião ministerial de 22 de abril, a ministra
Damares Alves disse, em bom e alto som, que estava tudo pronto para
pedir a prisão de governadores e prefeitos. A deputada bolsonarista
Carla Zambelli, do PSL, sabia de véspera das primeiras buscas e
apreensões contra Witzel. O senador Flávio Bolsonaro avisou com
antecedência que o vice-governador assumiria. Witzel lembrou que a
subprocuradora-geral Lindôra Araújo é bolsonarista e amiga de Flávio.
Amigo do meu inimigo é meu inimigo? [comentando um pequeno detalhe: a decisão foi do Poder Judiciário, que não nenhum de seus membros citados nesta parágrafo.
E a conduta recente de magistrados, especialmente de ministros do Supremo Tribunal Federal, acende o sinal de alerta de que caminhamos para tribunais absolutos, com juízes autocratas.
Sempre conveniente ter presente que tudo teve inicio,quando um deputado em pleno e regular exercício dos mandatos de parlamentar e presidente da Câmara dos Deputados teve o mandato parlamentar suspenso, sendo expulso da presidência por ato monocrático de um ministro do Supremo.]
É um óbvio subterfúgio de réu que, sem resposta para os fatos,
desqualifica acusadores. Mas serve de alerta para MP e Justiça serem
milimetricamente rigorosos, sem abrir brechas ao acusado nem gerar
desconfiança entre governadores.
Uma coisa, legal, elogiável, é
investigar roubalheiras e punir responsáveis.
Outra é aproveitar erros
de um governador para generalizar, jogar a opinião pública contra todos e
criar ambiente para afastamentos, buscas e apreensões, até prisões.
Todo cuidado é pouco nessa hora, com o presidente Jair Bolsonaro em
campanha e com tudo engatilhado para despejar sobre os governadores
todas as culpas por 120 mil mortos, pandemia, economia, desemprego,
queimadas, (falta de) educação. Bolsonaro vai posar de vítima, os
governadores serão os réus. Bolsonaristas compram qualquer versão do
“mito”. E os demais? [não se trata de comprar versão do 'mito' - aliás, mitos não existem, se existissem não teriam versões.
FATO: O Supremo decidiu que os governadores e prefeitos estariam à frente das ações de combate à pandemia, especialmente, sem limitar, as concernentes ao isolamento e distanciamento sociais.
Governadores e prefeitos se perderam - os 120.000 mortos demonstram a incompetência dos mandatários - e não encontraram a quem passar a culpa.
Aliás, quando o presidente Bolsonaro comandou a caravana que visitou o Supremo, registrou para o mundo inteiro o papel de cada um dos atores.]
Witzel é uma das estrelas da “nova política” que invadiu governos
estaduais e Congresso pelo PSL e PSC e na onda Bolsonaro. Nunca se
ouvira falar num tal de Witzel e nem se sabia pronunciar o nome daquele
juiz que caiu de paraquedas na eleição num dos três principais Estados
do País, com direito a vídeo de apoio do general Augusto Heleno, um dos
mentores da candidatura Bolsonaro. O discurso de Witzel foi o mesmo que varou o País, com neófitos em
Minas, DF, Norte, Sul, Centro-Oeste: Congresso, Supremo, política e
políticos são uma porcaria, nós somos os bons, os salvadores da Pátria.
Mas Witzel não é o único que sucumbe antes de completar dois anos de
mandato. Aliás, como estão os processos contra Flávio Bolsonaro? [falando sobre paradeiro: onde anda o governador do DF?]
Por tudo isso e as provas que se acumulam, a repetição primária dos
métodos do condenado Sérgio Cabral e a transformação de Helena Witzel na
nova Adriana Ancelmo, os procuradores do Rio merecem aplausos,
descortinando a corrupção, demolindo o discurso fraudulento. Mas não
pode haver dúvidas quando Witzel se diz “massacrado politicamente”. Em
vez de réu por corrupção, ele quer se passar por vítima do bolsonarismo.
Se o STJ e o MP forem impecáveis, esse discurso não para em pé. Se não,
o que é questão de justiça pode virar oportunismo político e ameaçar os
governadores. [tentaram, em várias frentes fazer o mesmo com o presidente Bolsonaro = só que o principal argumento para alijar um governador é acusá-lo de corrupção, valendo o mesmo no que se refere ao presidente da República.
Tiveram que desistir, contra o presidente Bolsonaro nada existe que sustente qualquer acusação - as provas costumar surgir só quando os fatos que provam, acontecem.]
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo
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