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domingo, 30 de agosto de 2020

Legalidade sempre! - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Afastamento de Witzel por decisão monocrática e sem ouvi-lo acende luz amarela entre governadores

O Ministério Público acertou ao investigar e descobrir maracutaias justamente na área de saúde no Rio de Janeiro, mas o Superior Tribunal de Justiça (STJ) errou ao decidir monocraticamente o afastamento do governador Wilson Witzel por 180 dias, sem nem sequer ouvir o que ele tem a dizer sobre as acusações, feitas a partir de uma delação premiada. Combater a corrupção, sim, mas abrir um precedente perigoso contra governadores, não. Por isso, o julgamento de terça-feira no plenário do STJ é tão importante. [todos os gastos realizados por governadores e prefeitos durante a pandemia e no exercício de atribuições especiais outorgadas aos mesmos por decisão do STF, devem ser rigorosamente auditados e qualquer falha rigorosamente punida - até mesmo a lentidão na execução de obras essenciais ao combate à covid-19, lerdeza que fará que obras sejam concluídas, ou mesmo iniciadas, ao término da epidemia = ser corrupto, desviar recursos públicos é crime, mas usar mal  dinheiro público, também é crime e deve ser punido = não pode haver tolerância com o administrador que conclui uma obra quando não há mais necessidade.
Mas ouvir o acusado é indispensável em qualquer processo.]

Desde sexta-feira, há intensa troca de telefonemas e mensagens entre governadores, para analisar a situação e a operação que pegou Witzel de jeito. Ninguém defende Witzel, até porque eles não viram o processo e não conhecem as provas, mas todos defendem ferrenhamente a legalidade. 
Que o MP investigue e faça o que tem de fazer e que a Justiça decida, julgue, puna. 
Mas um único ministro afastar um governador eleito? 
Sem dar a ele acesso às acusações? 
Se hoje é Witzel, amanhã pode ser qualquer um. Há motivos para a preocupação. Na fatídica reunião ministerial de 22 de abril, a ministra Damares Alves disse, em bom e alto som, que estava tudo pronto para pedir a prisão de governadores e prefeitos. A deputada bolsonarista Carla Zambelli, do PSL, sabia de véspera das primeiras buscas e apreensões contra Witzel. O senador Flávio Bolsonaro avisou com antecedência que o vice-governador assumiria. Witzel lembrou que a subprocuradora-geral Lindôra Araújo é bolsonarista e amiga de Flávio. Amigo do meu inimigo é meu inimigo? [comentando um pequeno detalhe: a decisão foi do Poder Judiciário, que não nenhum de seus membros citados nesta parágrafo.
E a conduta recente de magistrados, especialmente de ministros do Supremo Tribunal Federal,  acende o sinal de alerta de que caminhamos para tribunais absolutos, com juízes autocratas.
Sempre conveniente ter  presente que tudo teve inicio,quando  um deputado em pleno e regular exercício dos mandatos de parlamentar e presidente da Câmara dos Deputados teve o mandato parlamentar suspenso, sendo expulso da presidência por ato monocrático de um ministro do Supremo.]

É um óbvio subterfúgio de réu que, sem resposta para os fatos, desqualifica acusadores. Mas serve de alerta para MP e Justiça serem milimetricamente rigorosos, sem abrir brechas ao acusado nem gerar desconfiança entre governadores. 
Uma coisa, legal, elogiável, é investigar roubalheiras e punir responsáveis. 
Outra é aproveitar erros de um governador para generalizar, jogar a opinião pública contra todos e criar ambiente para afastamentos, buscas e apreensões, até prisões.

Todo cuidado é pouco nessa hora, com o presidente Jair Bolsonaro em campanha e com tudo engatilhado para despejar sobre os governadores todas as culpas por 120 mil mortos, pandemia, economia, desemprego, queimadas, (falta de) educação. Bolsonaro vai posar de vítima, os governadores serão os réus. Bolsonaristas compram qualquer versão do “mito”. E os demais? [não se trata de comprar versão do 'mito' - aliás, mitos não existem, se existissem não teriam versões.
FATO: O Supremo decidiu que os governadores e prefeitos estariam à frente das ações de combate à pandemia, especialmente, sem limitar, as concernentes ao isolamento e distanciamento sociais.
Governadores e prefeitos se perderam - os 120.000 mortos demonstram a incompetência dos mandatários - e não encontraram a quem passar a culpa.
Aliás, quando o presidente Bolsonaro comandou a caravana que visitou o Supremo, registrou  para o mundo inteiro o papel de cada um dos atores.]

Witzel é uma das estrelas da “nova política” que invadiu governos estaduais e Congresso pelo PSL e PSC e na onda Bolsonaro. Nunca se ouvira falar num tal de Witzel e nem se sabia pronunciar o nome daquele juiz que caiu de paraquedas na eleição num dos três principais Estados do País, com direito a vídeo de apoio do general Augusto Heleno, um dos mentores da candidatura Bolsonaro. O discurso de Witzel foi o mesmo que varou o País, com neófitos em Minas, DF, Norte, Sul, Centro-Oeste: Congresso, Supremo, política e políticos são uma porcaria, nós somos os bons, os salvadores da Pátria. Mas Witzel não é o único que sucumbe antes de completar dois anos de mandato. Aliás, como estão os processos contra Flávio Bolsonaro? [falando sobre paradeiro: onde anda o governador do DF?]

Por tudo isso e as provas que se acumulam, a repetição primária dos métodos do condenado Sérgio Cabral e a transformação de Helena Witzel na nova Adriana Ancelmo, os procuradores do Rio merecem aplausos, descortinando a corrupção, demolindo o discurso fraudulento. Mas não pode haver dúvidas quando Witzel se diz “massacrado politicamente”. Em vez de réu por corrupção, ele quer se passar por vítima do bolsonarismo. Se o STJ e o MP forem impecáveis, esse discurso não para em pé. Se não, o que é questão de justiça pode virar oportunismo político e ameaçar os governadores. [tentaram, em várias frentes fazer o mesmo com o presidente Bolsonaro = só que o principal argumento para alijar um governador é acusá-lo de corrupção, valendo o mesmo no que se refere ao presidente da República.
Tiveram que desistir, contra o presidente Bolsonaro nada existe que sustente qualquer acusação  - as provas costumar surgir só quando os fatos que provam, acontecem.]

Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo



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