Correio Braziliense - Coluna Alexandre Garcia
"O triste nisso, além do carnaval mantido e o mau conselho inicial do Ministério da Saúde, [gestão Mandetta = ficar em casa até sentir falta de ar] é a desigualdade de chances entre os que têm meios para se prevenir e se curar rapidamente e os que ficam à mercê da sorte"
Segunda-feira, na Fundação Oswaldo Cruz, o ministro Pazuello disse que
não é correto aconselhar a ficar em casa com sintomas, até sentir falta
de ar. Lembrou que o essencial é o diagnóstico precoce e o tratamento
imediato. A propósito, o maior erro de Mandetta foi ter recomendado que,
ao sentir sintomas da covid, a pessoa ficasse em casa por 14 dias e só
procurasse auxílio quando sentisse falta de ar. Ora, a falta de ar já
indica uma fase adiantada da doença, em que os pulmões estão com
líquido, e o ar inspirado não oxigena o sangue o suficiente. E houve
outro grande erro anterior: o de não terem cancelado o carnaval, numa
época em que era cancelado o ano-novo chinês. As aglomerações em blocos
inocularam o país, principalmente a partir do Rio e de São Paulo.
Agora, as notícias sobre mais de 100 mil vidas perdidas
para a covid deixam dúvidas. A Itália é o quarto país mais atingido
pelo vírus — 582 mortes por milhão de habitantes (o Brasil é o nono, com
476 mortes por milhão). Estudos italianos, comparando o atestado de
óbito com o prontuário, revelam que, em média, os que morreram tinham
outras três doenças.
É bom considerar que no Brasil morreram, no ano
passado, 140 mil pessoas por infecções das vias respiratórias
inferiores, como gripe e pneumonia, não contando casos crônicos.
"O triste nisso, além do carnaval mantido e o mau
conselho inicial do Ministério da Saúde, é a desigualdade de chances
entre os que têm meios para se prevenir e se curar rapidamente e os que
ficam à mercê da sorte."
Há os que têm acesso a preventivos, como o zinco
e a vitamina D, e à receita para ivermectina; havendo sintomas, têm
acesso a receitas para hidroxicloroquina e azitromicina com o médico de
família — e isso nem entra nas estatísticas. Mas a maciça maioria da
população não tem essa proximidade com médicos nem recursos, por
exemplo, para ir a uma farmácia de manipulação com pedido de zinco. A
propósito, o ministro Pazuello disse que “a gente precisa compreender
como parar o sangramento”.
Para diminuir essa desigualdade, há médicos em
voluntariado. Em Brasília, dois grupos de 492 médicos estão se dedicando
a comunidades carentes de prevenção e tratamento da covid. Há,
inclusive, conta bancária recebendo contribuições para comprar os
medicamentos para quem precisa. E evitam-se internações. Iniciativas
assim se espalham pelo Brasil, para “parar o sangramento”. Mais de 100
mil vidas perdidas são uma voz que clama por respostas sobre o que se
fez, o que não se fez e por quê.
Alexandre Garcia, jornalista - Correio Braziliense
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