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terça-feira, 12 de novembro de 2019

Só Congresso poderá mudar o entendimento do STF – Editorial

Valor Econômico

Chances de emenda à Constituição reinstituir prisão após condenação à segunda instância são pequenas

Pela terceira vez em uma década, o Supremo Tribunal Federal mudou sua posição sobre a possibilidade de um réu ser preso após condenação em segunda instância. Os ministros do STF, após o escândalo do mensalão e o sucesso da Operação Lava-Jato, oscilaram de acordo com os ventos políticos. Ao avanço da Lava-Jato correspondeu a decisão de fevereiro de 2016, que alterava outra de 2009, permitindo o cumprimento da pena a partir do julgamento em segunda instância, reafirmada em pelo menos mais um julgamento. Os desvios do script legal da Lava-Jato, apontados pelo The Intercept, ajudaram a produzir nova reviravolta, em direção à posição anterior, de a prisão só ocorrer esgotados todos os recursos - que no sistema judicial brasileiro são muitos.

A questão ganhou maior relevância porque entre os presos que poderiam ser beneficiados pela medida estava o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão sobre o tema acabou seguindo o timing político da Corte. O presidente Dias Toffoli a colocou em julgamento apenas depois que Lula já podia deixar a prisão e cumprir a pena em regime semi-aberto. Lula usou seu faro político ao não aceitar a progressão para o regime semi-aberto e esperar a possibilidade, que afinal veio, de poder recorrer da decisão livremente. [o condenado petista continua  condenado, com seus crimes sobre suas costas, sentença validada pelo STJ.
E também impossibilitado de ser candidato, devido a Lei da Ficha Limpa, que proíbe a candidatura de  criminosos condenados por órgão colegiado.]

O artigo 283 do Código de Processo Penal sempre foi claro a respeito da prisão apenas em última instância, o que podia ou não estar de acordo com a Constituição, compatibilidade a que os ministros aplicaram toda a sabedoria hermenêutica para afirmar que não havia, e depois, que havia. A forma definitiva de tirar as dúvidas, disse Dias Toffoli no fim do julgamento de quinta-feira, era que o Congresso deixasse explícito que a prisão se tornaria possível após a segunda instância.

No Senado, há uma proposta de emenda constitucional nesse sentido, esposada por parlamentares do PSL. As chances políticas dela prosperar, porém, são inversamente proporcionais à possibilidade de dezenas de políticos envolvidos no petrolão e outros casos de corrupção serem condenados. Na Câmara dos Deputados, tudo indica que ela não passa. No Senado, há algum espaço para isso. O entendimento atual do STF é o da volta a um passado que em boa medida protege criminosos do colarinho branco. A necessária mudança em direção a padrões mais rígidos parece ter sido enterrada a curto prazo pela reação do Supremo contra os procuradores da Lava-Jato e seus expedientes heterodoxos e pela atitude de autoproteção dos políticos.

O resultado imediato dessa novela é que o governo de Jair Bolsonaro que, por falta de oposição, criara uma dentro de seu próprio partido, o PSL, agora terá de combater um adversário popular e hábil que não pôde enfrentar nas urnas em 2018. Lula, por sua vez, terá contra si o governo de um político de direita agressivo, que chegou ao Planalto exatamente pela desmoralização que os escândalos de corrupção causaram ao PT, e que pretende ir até aonde for possível para impedir Lula de recriar para a esquerda uma perspectiva de poder.

Há indícios de que a polarização será retomada, mas também de que essa página da história pode ser virada. As manifestações contra a decisão do STF, em São Paulo, exibiram críticas aos filhos de Bolsonaro, refletindo um racha já existente no PSL e nas forças da direita. E Lula terá de enfrentar grande rejeição e mostrar-se interessado em agrupar a esquerda em torno do PT, quando o movimento contrário parecia prevalecer. Por obra de Lula, o PT não abriu mão até hoje da primazia da condução da disputa pelo Planalto, deixando na sombra o PSB, Ciro Gomes e Psol.

A disputa presidencial é muito prematura e não se definirá logo. Com Lula na raia da esquerda e Bolsonaro na da direita, sobra para o centro político a bandeira do “novo”, que Bolsonaro na verdade não poderia empunhar. Os caminhos se estreitaram para Ciro Gomes e João Doria, mas há trilhas para novatos como Luciano Huck. O estado da economia vai decantar possibilidades.

Lula escolheu como alvo a política econômica em um momento em que ela começa a dar resultados mais visíveis, no crescimento e no emprego, sem que os programas sociais tenham sido dizimados, como o PT previa. Colocar todos os males nas costas de Guedes só colará se a economia continuar patinando. Foi a imponente ruína legada por Dilma Rousseff que trouxe consigo os males que Lula aponta. O PT não tem outro discurso. As linhas políticas terão de ser redesenhadas.
Editorial - Valor Econômico


segunda-feira, 28 de outubro de 2019

O julgamento que nunca termina - Folha de S. Paulo

Vinicius Mota 

Segunda instância, o julgamento que nunca termina

Desapreço pela estabilidade das regras do jogo no STF sugere novas reviravoltas

Rosa Weber tornou-se o modelo a que todo magistrado deveria aspirar. Só fala nos autos, respeita e aplica a jurisprudência assentada, mesmo contra a sua convicção, e não alimenta guerras de vaidades no supremo tribunal dos narcisos. Foi divertido ver quem a criticou por negar o habeas corpus do ex-presidente Lula, em abril de 2018, agora soltar fogos pelo seu voto nas ações diretas de constitucionalidade que pleiteiam o cumprimento da pena de prisão só após o fim dos recursos.

Rosa foi exemplo de coerência no supremo tribunal dos inconstantes. Disse em 2018 que aquela ação de habeas corpus não era própria para rever a orientação de fundo do STF. li só cabia aplicar a jurisprudência vigente, que validava a prisão após condenaçãoem segundo grau, sob pena de colocar em risco a estabilidade e a credibilidade das orientações proferidas pelo próprio Supremo para as instâncias inferiores.

Já nesta quinta (24), quando se questionava a constitucionalidade abstrata de um dispositivo do Código de Processo Penal, então estava dada a ocasião para reavaliar a jurisprudência ela mesma. Rosa Weber, votando de acordo com seu entendimento da Carta, rechaçou a possibilidade de execução da pena antes do chamado trânsito em julgado. Mas no Supremo há apenas uma Rosa preocupada de fato com a estabilização das regras do jogo, e por isso a questão da segunda instância não há de ser encerrada tão cedo.

Como Dias Toffoli achou normal pautar o tema pela sexta vez (!) desde 2009, seu sucessor na presidência a partir de setembro de 2020, Luiz Fux, dificilmente hesitará em organizar a sétima votação. Logo depois, em novembro, aposenta-se o ministro Celso de Mello, da ala “garantista”, e o provável posicionamento de seu substituto será o oposto. Os adeptos da execução da pena após a segunda condenação terão o controle da pauta, com Fux, e retomarão a maioria na corte. A suprema metamorfose ambulante vai atacar novamente. Rosa nos acuda. [Em suma: a Suprema Corte decide conforme a conveniência do seu presidente.
Vale lembrar que nada garante que as supremas excelências nada decidirão este ano, especialmente sob a presidência do ministro Dias Toffoli.]
 
Vinicius Mota, colunista - Folha de S. Paulo 


terça-feira, 18 de junho de 2019

A euforia incontida do STF

Setores do Supremo comemoram os embaraços a Sergio Moro e aos procuradores de Curitiba. Não por acaso: sempre quiseram enquadrar os condutores da Lava Jato e anular processos envolvendo corruptos

Um dos debates mais acalorados da história do Supremo Tribunal Federal (STF) ocorreu em abril de 2009, entre os ministros Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes. Em discussão um tema relativamente simples: o sistema de Previdência dos servidores do Paraná. Mesmo com a análise de uma questão marginal, Barbosa conseguiu prever algo que aconteceria no futuro. “Vossa Excelência está destruindo a Justiça desse país”. Em seguida, emendou. “Saia à rua, ministro Gilmar, saia à rua”.

Na esteira da revelação da troca de mensagens entre o ex-juiz e atual ministro Sergio Moro com os membros da Lava Jato, o Supremo, ao que parece, aproveita para, mais uma vez, fazer ouvidos moucos às ruas. Nos últimos dias, setores do tribunal colocaram em marcha manobras jurídicas capazes de macular ainda mais a imagem já desgastada da corte. Dessa vez, uma nódoa indelével.

Conforme ISTOÉ apurou, existe um movimento claro no Supremo de retaliação à Lava Jato. Principalmente pela forma como os procuradores de Curitiba, e também o ex-juiz Sergio Moro, trataram determinadas decisões do STF. Os ministros togados consideram que os integrantes da Lava Jato sempre jogaram a opinião pública contra o tribunal, ao mesmo tempo em que se colocavam como “heróis” perante a nação. Agora, o jogo virou, na avaliação dos togados. O ápice da retaliação pode ocorrer nos próximos dias. Há duas ações em tramitação no STF que podem beneficiar o ex-presidente Lula, hoje preso na carceragem da PF, em Curitiba. Com o petista é considerado uma espécie de troféu pela “República de Curitiba”, soltá-lo agora seria ferir de morte os desafetos.
 
Decisão a “jato”
Uma demonstração dessa movimentação, Gilmar Mendes à frente, é a estratégia que os ministros montaram para relaxar a prisão de Lula, contrariando a decisão do colegiado de garantir o cumprimento da pena após decisão de segunda instância. São duas iniciativas que compõem a articulação. Uma delas também está sendo discutida na Segunda Turma e trata da súmula do TRF-4 que determina o cumprimento de prisões após a sentença em segunda instância. O caso começou a ser analisado no plenário virtual, mas no dia 30 de abril o processo passou a ser discutido presencialmente. A questão é que o julgamento estava em banho-maria e, de uma hora para outra, o HC foi incluído na pauta [do STF] da terça-feira 11.
Em seu voto, Lewandowski deu sinais de que trabalhará pelo fim da execução penal após decisão de segunda instância, beneficiando Lula. “Ao reconhecer que a execução provisória da pena é uma possibilidade, o STF deixou claro que a prisão não é automática, devendo ser necessariamente motivada. E só pode ser decretada com base no Código de Processo Penal”, destacou. O caso vai agora para julgamento no plenário.

O mesmo aconteceu com o julgamento do outro HC impetrado por Lula. Em uma decisão “a jato”, Gilmar marcou, na segunda-feira 10, a continuidade do julgamento para o próximo dia 25. De forma jocosa, Gilmar já antecipou seu voto. Na quinta-feira 13, afirmou que o vazamento das conversas de Moro com os procuradores deve anular o processo do tríplex. “Eu acho, por exemplo, que eles anularam a condenação do Lula”, disse eufórico. Assim, a turma alinhada a Gilmar resolve várias questões com uma cajadada: abala a Lava Jato, desmoraliza Moro e os procuradores, e provoca a revisão da prisão após segunda instância. Há quem diga no STF que vai faltar bolo para tanta festa.

IstoÉ
 

sexta-feira, 14 de junho de 2019

Diálogos não visavam a prejudicar Lula

O hoje ministro Sérgio Moro continua o mais popular do governo Bolsonaro, apesar de algumas pesquisas mostrarem queda de popularidade.

Não é de hoje que há críticas pelo fato de o mesmo juiz, no caso Sérgio Moro, controlar as investigações, como na Operação Lava-Jato, e julgar os processos, dando a sentença final. Não é uma criação nem de Moro nem dos procuradores de Curitiba. É assim que funciona qualquer força-tarefa no Brasil, de acordo com o nosso Código de Processo Penal, ao contrário de outros países, como a Itália, ou países na América Latina, como México e Chile.  Eles têm a figura do “juiz de instrução” ou “juiz das garantias”, que atua apenas na fase inicial das investigações, autorizando ou impedindo ações como quebra de sigilo e interceptações telefônicas, depoimentos e prisões preventivas.

Nenhuma ação dos procuradores do Ministério Público nem da Polícia Federal pode ser feita sem uma autorização do juiz de instrução, que não participa, por impedimento legal,  das investigações, mas as controla.  Por isso Moro disse, logo no primeiro momento da divulgação de suas conversas com o procurador Deltan Dallagnol, que apenas combinou com os Procuradores as etapas das operações que tinham que ser autorizadas por ele, questões logísticas e exigências legais, como formalização de atos.

A Vara de Moro existe desde 2003 quando foi criada por recomendação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para combater os crimes financeiros. Somente em 2014 a Força-Tarefa da Lava-Jato foi criada, por decisão da Procuradoria-Geral da República (PGR). Também a Polícia Federal criou uma força-tarefa própria, que foi esvaziada no governo Temer a ponto de hoje só existir um policial dedicado exclusivamente à Lava-Jato. Quem organizou a Força-Tarefa do Ministério Público foi o procurador Deltan Dallagnol, que já trabalhara com o juiz Moro no caso Banestado, no início dos anos 2000.

O procurador integrou a Força-Tarefa que fez, em 2003, a primeira denúncia contra o doleiro Alberto Youssef. Ao formar o grupo que trabalharia na Lava-Jato, Dallagnol chamou o procurador Carlos Fernando de Souza, que também fez parte do caso Banestado, e outros procuradores com experiência em investigação de crimes do colarinho brancoDallagnol e Moro, portanto, se conhecem há 15 anos, e o papel de cada um sempre foi bem definido: o MP propõe medidas, e o juiz as aceita ou não. Para isso, tem que conversar, saber se é a melhor hora para fazer tal ação, se é possível atender aos pedidos dos procuradores e da Polícia Federal, se está bem embasado o pedido de prisão, autorizar quebra de sigilo.

Há uma proposta para a adoção do “juiz de garantias” no Congresso, em tramitação desde 2010, e provavelmente o caso das conversas reveladas pelo Intercept vai apressar uma decisão favorável.  Em todas as conversas reveladas pelo hackeamento do celular do procurador Deltan Dallagnol não há um só momento em que se flagre uma combinação entre ele e Moro para prejudicar o ex-presidente Lula ou outro investigado qualquer.

O fato de o Intercept ter publicado o que diz ser a íntegra das conversas ajudou a confirmar a percepção de que os dois só têm conversas a respeito de procedimentos, e o que parece uma participação indevida do juiz Moro, na verdade é a discussão de decisões sobre as investigações, ou a comunicação de uma testemunha que havia revelado um crime.  Mesmo as conversas entre os dois, que não são diretamente ligadas a casos específicos, são sobre o combate à corrupção, e como ela está arraigada na sociedade brasileira. Afinal, a Força-Tarefa da Lava-Jato existe para isso.

O hoje ministro Sérgio Moro continua o mais popular do governo Bolsonaro, apesar de algumas pesquisas mostrarem queda de popularidade.  A criação da figura do “juiz de garantias”, por outro lado, não é incontroversa. O Instituto dos Advogados do Brasil, por exemplo, é contrário. Diz um parecer do IAB: “Na prática, juízes, em razão da liderança funcional na condução de inquéritos, acabam por exercer atividades policiais e, com o tempo, tornam-se vítimas do fenômeno da “policização”, invertendo, muitas das vezes, seus originários e nobres objetivos”.


Correção

O desembargador Abel Gomes é do TRF-2 e não do TRF-4, como escrevi ontem. Ele julgou recursos da Lava-Jato do Rio de Janeiro.


Merval Pereira, jornalista - O Globo

quarta-feira, 12 de junho de 2019

Diálogos permitem várias versões

Interpretações

Como a palavra escrita não tem entonação, é possível ter-se versões diferentes sobre o mesmo tema

A decisão do Conselho Nacional de Justiça de não levar adiante um pedido de investigação sobre o hoje ministro Sérgio Moro, sob a alegação de que ele não é mais juiz e, portanto, não está sob a jurisdição do CNJ, retira qualquer possibilidade de punição no campo jurídico a respeito das conversas reveladas pelo site Intercept. A questão agora fica por conta do Supremo Tribunal Federal (STF), que vai julgar no dia 25 um pedido de suspeição do juiz Moro feito pela defesa do ex-presidente. Esse pedido já foi rejeitado em diversas instâncias da Justiça, e a única novidade são as conversas reveladas agora.

A Segunda Turma, como fez ontem com o pedido de anulação dos julgamentos do TRF-4, deve mandar para o plenário a decisão dessa nova ação da defesa de Lula, pela gravidade de suas conseqüências. As conversas, mesmo não fazendo parte da ação que será julgada, certamente afetarão a decisão dos juízes. É difícil imaginar que o presidente da Corte, Dias Toffoli, e o ministro Alexandre de Moraes, aceitem julgar com base em provas recolhidas ilegalmente, já que eles são os líderes de uma ação singular do Supremo contra as fake news, e a atuação de hackers nas redes sociais. O que mais impactou quem leu a troca de mensagens entre o então juiz Sérgio Moro e o chefe dos procuradores da Lava-Jato, Deltan Dallagnol é a informalidade com que tratam de assuntos relacionados ao processo do ex-presidente Lula.


Jornalisticamente é compreensível que o Intercept tenha escolhido trechos sobre o ex-presidente Lula para abrir o que deve ser uma série. Não há registros, porém, de conversas sobre investigados de outros partidos políticos que, como ressaltou o procurador Dallagnol em defesa da Lava-Jato, já acusou só em Curitiba políticos e pessoas vinculadas ao PP, ao PT, ao PMDB, ao PSDB, ao PTB, e só a colaboração da Odebrecht nomeou 415 políticos de 26 diferentes partidos.

O trecho do Intercept em que Moro claramente sugere que os procuradores ouçam uma testemunha sobre uma suposta transferência ilegal de imóveis de filho do ex-presidente Lula, parece ser o mais próximo de um aconselhamento, o que é proibido pelo Código de Processo Penal e, teoricamente, pode ser motivo de anulação do julgamento.

“Então. Seguinte. Fonte me informou que a pessoa do contato estaria incomodado por ter sido a ela solicitada a lavratura de minutas de escrituras para transferências de propriedade de um dos filhos do ex Presidente. Aparentemente a pessoa estaria disposta a prestar a informação. Estou então repassando. A fonte é seria”, escreveu Moro. “Obrigado!! Faremos contato”, respondeu Dallagnol pouco depois. “E seriam dezenas de imóveis”, acrescentou o juiz. O que está sendo considerada uma sugestão indevida, na verdade, segundo fontes ligadas aos procuradores de Curitiba, foi uma maneira informal de oficiar ao Ministério Público a ocorrência de um possível crime que precisava ser apurado.

Qualquer pessoa, sobretudo um servidor público, [redundante destacar que mesmo um  juiz sendo considerado MEMBRO do Poder Judiciário, ele é antes de tudo um SERVIDOR PÚBLICO, além do que a obrigação de comunicar se estende a QUALQUER PESSOA.
Se ocorreu o tal diálogo Moro estava apenas cumprindo um DEVER LEGAL.]  tem o dever legal de encaminhar a denúncia ao Ministério Público. Não se sabe se Moro formalizou o ofício depois, ou achou suficiente essa comunicação através de mensagem de celular. Mais adiante, segundo a transcrição do Intercept, o procurador disse que ligou para a fonte, mas ela não quis falar. “Estou pensando em fazer uma intimação oficial até, com base em notícia apócrifa”, cogitou Dallagnol. Ao que tudo indica, diz o Intercept, o procurador estava considerando criar uma denúncia anônima para justificar o depoimento da fonte.

O juiz Sergio Moro endossou a gambiarra, na interpretação do Intercept: “Melhor formalizar então”, escreveu Moro. Assim como essa interpretação leva a um desvio de conduta, outras podem revelar uma relação informal, mas dentro da lei. Moro, alegam as mesmas fontes, quando escreveu “melhor formalizar, então”, estava advertindo Dallagnol de que teria que oficializar esse pedido, incluindo seu ofício aos procuradores. Como a palavra escrita não tem entonação, é possível ter-se versões diferentes sobre o mesmo tema.

Moro já disse que não tem condições de confirmar a veracidade das conversas, mas não negou que elas tenham acontecido. A certeza de que as conversas são editadas pelo site Intercept, revelada por ele, se deve, entre outras coisas, ao fato de estranhar que não haja nomes citados nessa suposta conversa. Ainda mais quando Dallagnol diz que vai mandar procurar a tal testemunha.

Merval Pereira, jornalista - O Globo

 

sexta-feira, 10 de maio de 2019

A volta de Temer à prisão é uma soma de aberrações; eis o caminho do abismo

A cassação do habeas corpus concedido ao ex-presidente Michel Temer é uma aberração legal a endossar outra. Dois dos três integrantes da 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 2ª Região resolveram manter a prisão preventiva de Temer, decretada no dia 19 de março pelo juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio. A prisão aconteceu no dia 21 daquele mês e se estendeu até o dia 25, quando, então, o desembargador Ivan Athié concedeu uma liminar libertando o ex-presidente. Na votação desta segunda, Athié reafirmou o seu voto, mas foi vencido por Abel Gomes e Paulo Espírito Santo. Temer volta para a prisão nesta terça. Agora, sua defesa tem de entrar com um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça. Um sinal da tragédia destes tempos: os dois juízes que cassaram a liminar reconheceram que a prisão não tem amparo na lei. Tratar-se-ia, como deixaram claro, de uma satisfação à sociedade. Creiam: como país, vamos sorrindo para o abismo.

Quando Bretas decretou a prisão preventiva de Temer, ele já mandou às favas o Artigo 312 do Código de Processo Penal. Sua decisão está aqui. Como afirmei, então, é uma leitura porca do texto legal que tem permitido essas prisões arbitrárias. O que diz mesmo a lei? Terei de relembrar:

"A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria"

Para decretar uma prisão preventiva, é preciso que, dada a circunstância, então, do crime comprovado e do indício de autoria, esse possível autor esteja incidindo NO PRESENTE, NO TEMPO EM QUE SE DECRETA A PRISÃO, em ao menos uma das quatro transgressões
a) praticando crime contra a ordem pública,
b) contra a ordem econômica, 
c) tentando dar sumiço a provas ou assediando testemunhas ou, ainda, 
d) dando indícios de que pretende fugir, o que impediria a aplicação da lei penal.

Como já destaquei neste blog, das 46 páginas do despacho em que manda prender Temer e outros, Bretas gasta ao menos 34 tentando explicar a prisão. Sem conseguir. Afrontou gostosamente o direito, a língua e a lógica. Não tendo como justificar o ato arbitrário, Bretas apela, então, à condição social do preso, o que tem se tornado prática corriqueira na Lava Jato. Escreveu:

"Avaliando os elementos de prova trazidos aos autos, em cognição sumária, considero que a gravidade da prática criminosa de pessoas com alto padrão social, mormente políticos nos mais altos cargos da República, que tentam burlar os trâmites legais, não poderá jamais ser tratada com o mesmo rigor dirigido à prática criminosa comum."

Aí está admitido, então, o que ele mesmo considera um rigor incomum. Mas notem: Bretas continua apegado apenas à suposta existência do crime com indício de autoria. Nem Ministério Público nem juiz foram capazes de apontar que risco Temer representaria à sociedade e à investigação se estivesse livre.  Estamos diante do mais escancarado e desastroso populismo judicial. Observem: eu, pessoalmente, acho ridículas as acusações contidas contra Temer no pedido de prisão preventiva apresentado pelo Ministério Público. Não custa lembrar: o MP o acusa de pertencer a uma organização criminosa que estaria em vigor há, pasmem!, 40 anos, que já teria se envolvido com operações da ordem de R$ 1,8 bilhão entre propinas pagas e prometidas. Há 40 anos, ele era professor de direito em Itu e nem tinha iniciado carreira da vida pública. Como é que se chegou a esse cálculo estúpido? A propósito: como se faz a conta, ao longo de quatro décadas, de propinas pagas e prometidas?

Acontece, meus caros, que havia a disposição para prender. E ponto. Na absurda entrevista coletiva que se seguiu à prisão, em que MPF e PF acusaram Temer de práticas criminosas que não estavam no pedido de prisão nem no despacho de Bretas, o coordenador da Lava Jato no Rio, Jorge El-Hage, afirmou a seguinte pérola:

"É preciso deixar claro aqui que estranho seria se Michel Temer não tivesse sido preso. A prisão dele é decorrência lógica de todos os crimes que ele praticou durante uma vida inteira, pertencendo a uma organização criminosa muito sofisticada"

PRISÃO PREVENTIVA NÃO É JULGAMENTO 
Notem: vocês podem até estar entre aqueles que acham que todas as acusações são verdadeiras. Ocorre que estamos falando sobre prisão preventiva. Se o crime aconteceu ou não, se há provas ou não, isso tudo tem de ficar para o julgamento, quando, então, se dá a sentença. Para prender alguém preventivamente antes da condenação, é preciso que a pessoa esteja cometendo crimes no presente, que esteja atrapalhando a instrução criminal ou que esteja prestes a fugir.

Bretas admite que o ex-presidente não está fazendo nada disso e que mandou prendê-lo por ser uma pessoa de "alto padrão social". Abel Gomes e Paulo Espírito Santo mantiveram a decisão para dar uma satisfação à sociedade. Vale dizer: manda-se alguém para a cadeia, ao arrepio da lei, porque um monte de gente que faz barulho na Internet acha ser i
sso o certo.

Blog do Reinaldo Azevedo


A volta de Temer à prisão é uma soma de aberrações; eis o caminho do abismo ... - Veja mais em https://reinaldoazevedo.blogosfera.uol.com.br/2019/05/09/a-volta-de-temer-a-prisao-e-uma-soma-de-aberracoes-eis-o-caminho-do-abismo/?cmpid=copiaecola

terça-feira, 26 de março de 2019

Desembargador demole decisão de Bretas

O desembargador Antonio Ivan Athié levou quatro dias desde a prisão do ex-presidente Michel Temer e de outras nove pessoas na Operação Descontaminação para ler as 384 páginas do requerimento do Ministério Público, as 46 da decisão do juiz Marcelo Bretas, outras tantas dos habeas corpus impetrados pela defesa dos presos e os documentos juntados. 

Quando finalmente o fez, no recesso do lar, tratou de perceber que não havia sequer uma justificativa amparada pelo Código de Processo Penal a norteá-las, como diz, cheio de “vênia”, na sua própria decisão, e tratou de demolir a peça do juiz, a nova “estrela” da Lava Jato na ausência de Sérgio Moro. É um escândalo que um desembargador de segunda instância alegue falta de tempo de ler o processo para marcar para uma quarta-feira da semana seguinte a análise de habeas corpus de pessoas presas preventiva e temporariamente.

Graças à falta de tempo do integrante do TRF-2, as pessoas passaram quatro dias presas. Não houve nenhuma circunstância posterior às dadas na quinta-feira para que Athié antecipasse sua decisão, dispensando a decisão colegiada que convocara para amanhã. Assim, se com argumentos ele mostra que era no mínimo frágil – para não dizer “exagerada” na narrativa ou baseada em “confusão ou “deturpação deliberada”, como ele mesmo aventa – a decisão de Bretas, com a demora em revogá-la investe também ele, juiz de segundo grau, contra as garantias e os direitos individuais que a Justiça deveria preservar.

E presta um descabido tributo à Lava Jato, que soa como uma tentativa de se blindar preventivamente das críticas por soltar Temer e contrariar a opinião pública.
 

sábado, 23 de março de 2019

Prisão de Temer é uma aberração legal

Temer foi preso não pelas razões que a lei exige, mas por ser quem é

A prisão do ex-presidente Michel Temer e de outros, dados dos termos do despacho do juiz Marcelo Bretas, é uma aberração. O lava-jatismo arreganha os dentes mais uma vez. E numa hora difícil para a turma do Tribunal do Santo Ofício. Leiam a decisão. Para justificar o ato atrabiliário, ele desenvolve uma espécie de tese-manifesto sobre o artigo 312 do Código de Processo Penal, a saber: “A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria”. Para que fique claro: são quatro os motivos, não cinco. Haver “prova do crime e indício de autoria” não é um quinto. Essa é a circunstância necessária. Existindo, é preciso que esteja dada ao menos uma das quatro razões. E não está.

Ainda que todas as imputações feitas ao ex-presidente fossem verdadeiras, não há uma só evidência de que esteja pondo em risco a ordem pública ou econômica” —isto é, cometendo crimes—; constrangendo testemunhas ou eliminando provas, o que ameaçaria a instrução criminal, ou dando sinais de que pretende fugir, o que impediria a aplicação da lei penal. E só por essas razões se pode prender alguém preventivamente. As que motivaram a denúncia devem ser avaliadas na hora do julgamento, acompanhadas de provas.

O despacho de Bretas tem 46 páginas. Está à disposição. O autor consome nada menos de 34 delas tentando justificar por que pediu a prisão preventiva de Temer e de outros investigados. Repete as acusações feitas pelo Ministério Público, apela a tratados internacionais em favor do combate à corrupção, mas sem conseguir dizer por que, agora, o ex-presidente e outros representariam risco à sociedade ou à investigação. No momento em que mais se aproxima de fazê-lo, escreve: “Considero que a gravidade da prática criminosa de pessoas com alto padrão social, mormente políticos nos mais altos cargos da República, que tentam burlar os trâmites legais, não poderá jamais ser tratada com o mesmo rigor dirigido à prática criminosa comum”.
Vale dizer: Temer foi preso não porque esteja dada ao menos uma das quatro razões para fazê-lo, como exige a lei, mas por ser quem é.

O Partido da Polícia vinha amargando algumas derrotas na Justiça nos últimos dias. Sua mais fulgurante estrela, o ex-juiz Sergio Moro, apagou-se no governo, restando-lhe, como ficou claro no embate de quinta com Rodrigo Maia (DEM-RJ), presidente da Câmara, falar uma linguagem abertamente populista e eleitoreira. E olhem que 2022 ainda está longe. Moro foi à Câmara dar pitaco no andamento dos trabalhos da Casa. Levou um chega pra lá de Maia e reagiu com uma nota em que diz: “Talvez alguns entendam que o combate ao crime pode ser adiado indefinidamente, mas o povo brasileiro não aguenta mais”. E encerrou sua mensagem com um “Que Deus abençoe esta grande nação”. Como se percebe, Deus também foi capturado.

Sei o que me custou, e me custa ainda, quando, já em 2014, no ano de nascimento da Lava Jato, comecei a perguntar em que documento legal se baseavam as prisões preventivas. Apontei os abusos. Carimbaram em mim a pecha de “inimigo da força-tarefa” e, ora vejam!, até de petista. Alguns bobos de esquerda e as hostes bolsonaristas comemoram a prisão de Temer. É a prova de que não aprendem nada nem esquecem nada e de que se estreitam num abraço insano. Aplaudiram também a de Beto Richa, decretada pela Justiça Estadual do Paraná. Nesse caso, escreveu o juiz Fernando Bardelli Silva Fischer, depois de reconhecer que fazia uma leitura, digamos, pessoal do artigo 312 do Código de Processo Penal: “Cabe ao Poder Judiciário [...] deixar de entoar os velhos mantras, e, em um processo de resistência ética, repelir os altos precedentes que não se alinhem aos ideais de uma justiça equânime para, enfim, construir um direito mais democrático e assentando no intersubjetivismo refletido”.

Dito de outro modo: Bretas, Fisher e outros, a exemplo do que já fez Moroque serve a Bolsonaro e o aterroriza—, prendem quem lhes der na telha, pouco importando o artigo 312 do Código de Processo Penal. Quem não concorda com eles estaria apenas entoando “velhos mantras” a serviço da corrupção. Reformas? O Brasil tem coisa mais urgente a fazer: prender pessoas ao arrepio da lei.

“Que Deus abençoe esta grande nação”, como disse o nosso Salvador.

Podem entrar na fila da guilhotina.
 
Reinaldo Azevedo - Coluna na Folha de S. Paulo