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quarta-feira, 17 de novembro de 2021

A história da mãe de criança de 5 anos presa há 100 dias por furto de água - BBC News

Após duas negativas de instâncias inferiores, um pedido de habeas corpus chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada

Uma diarista de 34 anos está há pouco mais de 100 dias presa em uma penitenciária de Minhas Gerais, sob acusação de ter furtado água. Após duas negativas de instâncias inferiores, um pedido de habeas corpus chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada.

Maria (nome fictício*) foi presa na frente do filho de 5 anos, em julho, em uma casa de uma cidade no interior de Minas. Segundo a polícia, ela e o marido violaram o lacre da instalação de água do local onde a família vivia de favor.

A defensora Alessa Veiga soube do caso em outubro ao visitar a ala feminina de um presídio de Minas. "Ela me entregou um bilhete, dizendo que estava presa há três meses por furto de água e que seu filho tinha ficado com a irmã mais nova, que é adolescente e vive em outra cidade. A Justiça prendeu o pai e a mãe e não se preocupou com que aconteceria com o filho", conta.

Para a defensora pública, que entrou com um pedido de habeas corpus no STF, o caso de Maria se enquadra no princípio de insignificância (quando o valor do objeto furtado é tão irrisório que não causa prejuízos à vítima, como no furto de comida, água, sucata e produtos de higiene pessoal). "É um absurdo uma mãe ficar cem dias presa por furto de água, um crime não violento. Ela me disse que queria pagar a conta, mas não tinha dinheiro. É uma família muito pobre, usava a água para cozinhar para o filho, para beber, tomar banho... eles viviam de favor, em uma casa minúscula. Será que a prisão era a melhor solução para esse caso?", diz a defensora.

Já o Tribunal de Justiça de Minas Gerais e o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, consideraram que Maria deve ser mantida presa por ser reincidente, por supostamente ter desacatado o policial no momento da prisão pelo furto de água, "cuspindo em seu rosto", e porque não conseguiu provar ser a mãe da criança que carregava durante o episódio (leia mais abaixo). "Os fatos já apurados e as circunstâncias dos crimes demonstram tanto a inaplicabilidade das medidas cautelares diversas da prisão, quanto o risco concreto à ordem pública, caso a autuada seja de pronto colocada em liberdade", escreveu o desembargador Olindo Menezes, do TRF-1. [devemos ter presente que o furto de água, da forma que é narrado,  pode ser enquadrado no principio da insignificância,  porém, o crime de desacato deve ser punido na forma da lei. É inaceitável que se use um delito menor para obter impunidade para um crime maior.]

'Reação à prisão'
Segundo o Boletim de Ocorrência, por um mês a família usou a água disponibilizada pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) sem pagar pelo consumo. Questionada pela BBC News Brasil, a Copasa não informou o total do prejuízo sofrido pela empresa nem qual seria o valor da conta que a família teria de pagar pelo mês que utilizou o serviço. O Boletim de Ocorrência também não informa esses dados. Fotos da residência e da "gambiarra", incluídas no processo, mostram que a água era retirada de um cano e redistribuída pela casa. Segundo o IBGE, em média, cada membro de uma família brasileira consome 116 litros de água por dia.

Em junho, dois agentes da Copasa visitaram a casa e constataram que a família tinha violado o hidrômetro da residência. Os funcionários lacraram a instalação novamente, interrompendo o fornecimento de água. Um mês depois, os fiscais retornaram e, segundo eles, o lacre havia sido rompido de novo. Eles contam que chamaram a Polícia Militar depois de terem sido xingados por João (nome fictício), servente de pedreiro e companheiro de Maria.

Em depoimento, Maria disse que voltava com o filho para casa quando encontrou uma viatura no local. Ela tentou fugir com a criança no colo quando soube que seria levada à delegacia por furto de água. No BO, o funcionário da Copasa relatou a reação da diarista: "Exaltou-se, esboçou agressividade, proferiu palavras de baixo calão: 'seus policiais de merda, seus vagabundos, vão procurar bandido'". Ela teria tentado agredir e cuspir em um policial - acabou algemada e "colocada no xadrez" (compartimento traseiro da viatura). O filho assistiu à cena, ao lado.

Depois, na delegacia, Maria negou ter cuspido no policial ou tentado agredi-lo. Também afirmou que foi seu companheiro, João, quem rompeu o lacre no cano de água, porque a família não tinha como pagar a conta no momento. "Usava a água para cozinhar para meu filho", disse.

"Foi uma reação espontânea e justificável de uma mãe muito pobre, que ficou desesperada ao ser presa por furto de água. Presa na frente do filho", diz a defensora Alessa Veiga.

A diarista contou ter parado de estudar na quarta série do ensino fundamental. Ela diz ganhar entre R$ 50 e R$ 70 quando faz uma faxina.  O BO relata a versão dela: "Esclarece que só agiu assim, pois o proprietário da casa, que tinha (anteriormente) deixado eles ficarem no imóvel, mandou cortar a água com eles no local. Além disso, esclarece que não poderiam ficar sem água, visto que têm uma criança de cinco anos".

O servente de pedreiro João também foi preso em flagrante. Em nota, a Copasa afirmou que a prisão do casal "não ocorreu por furto de água, mas sim devido ao comportamento agressivo dos moradores contra os empregados da companhia." "A companhia repudia qualquer ato de violência e orienta seus empregados que acionem a PM se ocorrer algum tipo de agressão, verbal ou física, durante realização de seus serviços", diz a Copasa.

Princípio da insignificância
O Ministério Público de Minas Gerais pediu o relaxamento da prisão de João, alegando que o crime não era violento. Ele foi solto logo depois.
Já para a diarista o MP solicitou "prisão preventiva", citando como agravantes o suposto desacato aos policiais, a "resistência à prisão" e reincidência.

Leandro Machado - Da BBC News Brasil em São Paulo - MATÉRIA COMPLETA

 


quarta-feira, 18 de agosto de 2021

Ex-condenado, vence em pesquisa com 1000 pessoas - Jorge Serrão

Em um ambiente político e institucional perigosamente instável e polarizado, “pesquisas” ou enquetes acerca da “avaliação presidencial” ou sobre “eleições 2022” precisam ser analisadas e encaradas com toda cautela. A divulgação dessas informações têm o efeito imediato de induzir comportamentos, manifestações e opções da opinião pública. Verdadeiras ou falsas, com critérios científicos (estatísticos) rigorosos ou não, geralmente ouvindo, pessoalmente, por telefone ou via internet, tais “levantamentos de dados”, quando veiculados midiaticamente, influenciam o eleitorado e geram polêmicas intermináveis. Quem é favorecido (pessoa ou instituição) aprova e replica a informação. Os contrariados reclamam, questionam, desqualificam e rejeitam os resultados. Nada de anormal.



Alguns problemas fundamentais das enquetes (ops, pesquisas) de opinião: seu alto custo, quem financia a operação, com qual interesse político (tático ou estratégico) e se é racional e sensato confiar no, em geral, reduzido universo de pessoas ouvidas, em qual espaço e em quais circunstâncias conjunturais, sociais e culturais. Todos esses aspectos (sobretudo o a pergunta objetiva: a quem interesse a divulgação dos dados, favoráveis ou desfavoráveis a alguém ou determinada instituição?) deveriam ser levados em consideração por quem vai analisar os resultados. O fato concreto e objetivo é que “pesquisas” (ou enquetes de intenção de voto ou de avaliação dos governantes e instituições públicas) têm a capacidade de influir na decisão pelo voto, e não apenas “medir” a tendência de vontade do eleitorado.



No Brasil, assistimos ao fenômeno, contraditório, de um Presidente que demonstra popularidade em gigantescas manifestações de rua, porém tem seu governo criticado midiaticamente e com avaliações negativas (crescentes) nas “pesquisas” (ou enquetes). Tamanha contradição é o ponto intrigante que afeta previsões e prognósticos para a eleição 2022. Que fator valerá mais na hora da decisão final do eleitor: a popularidade (aparentemente) positiva do candidato ou a avaliação (aparentemente) negativa do governo. 


Quem determina o que é verdadeiro ou falso nessa situação divergente? Eis o dilema fundamental para se acreditar (ou não) nas “pesquisas” ou enquetes. Sobram polêmicas. A XP Política, braço do grande grupo de investimentos, divulgou uma “pesquisa”, feita em parceria com o Instituto Ipespe, que realizou 1.000 entrevistas, de abrangência nacional, de 11 a 14 de agosto, com margem de erro é de 3,2 pontos percentuais. Destaca a “continuidade na tendência de crescimento das avaliações negativas do governo Jair Bolsonaro. No levantamento atual são 54% os que dizem considerar o governo ruim ou péssimo contra 52% no mês passado. O crescimento na rejeição é constante desde outubro de 2020, quando 31% diziam considerar a gestão ruim ou péssima. Na outra ponta, os que veem o governo como bom ou ótimo somam 23%, 2 pontos a menos que na pesquisa de julho. Os dois números são os piores para o governo desde o início da série”.

Outro ponto que torna polêmico o resultado da “pesquisa” XP/Ipespe, que ouviu mil pessoas em um País de 213 milhões de habitantes, é a continuidade na tendência de crescimento das intenções de voto no ex-presidente Lula: “No levantamento de agosto, ele aparece com 40%, 2 pontos percentuais a mais que na pesquisa anterior, enquanto Bolsonaro tem 24%, 2 pontos a menos que na última sondagem. Esta é a quinta pesquisa em que o ex-presidente repete a tendência de alta – ele tinha 25% em março, quando seu nome voltou a ser testado. Atrás dele e de Bolsonaro aparecem Ciro Gomes (10%), Sérgio Moro (9%), Mandetta e Eduardo Leite (4%)”.

Segundo a XP/Ipespe, “o petista também lidera cenário alternativo, em que João Doria (5%) é testado no lugar de Leite e em que são incluídos Datena (5%) e Rodrigo Pacheco (1%) e é excluído Sérgio Moro”. A análise da XP pontua: “Nesse cenário, Lula tem 37% e Bolsonaro, 28%. Lula também continua registrando crescimento no levantamento espontâneo, quando o nome dos candidatos não é apresentado ao entrevistado: ele passou de 25% para 28%, enquanto Bolsonaro segue estável com 22%. No principal cenário de segundo turno, Lula ampliou vantagem sobre Bolsonaro. O petista oscilou 2 pontos para mais, e Bolsonaro, 3 para menos. Agora o ex-presidente venceria com 51% contra 32% do atual presidente”.

A “pesquisa” que ouviu apenas mil pessoas é festejada pelos petistas e pelos inimigos de Bolsonaro. Evidentemente, desagrada e é desacreditada pelos bolsonaristas. A contradição a ser explicada é que Bolsonaro consegue dar demonstrações públicas de apoio popular. Ao contrário do “favorito nas pesquisas” Luiz Inácio Lula da Silva - um político que tem colada em sua imagem a praga da corrupção nos governos petistas (aliás, muito bem avaliados em diversas “pesquisas”, ao contrário do governo Bolsonaro).

Fatos objetivos: Personagem que desmoralizou a honradez política, Lula é o candidato reabilitado pelo golpe que o Poder Supremo deu em três instâncias do Judiciário para lhe devolver direitos políticos, recolocando-o no “xadrez” (eleitoral). Lula também é, insistentemente, o candidato favorito em várias “pesquisas”. Curioso é que diversas enquetes, nas redes sociais, que não são encaradas com a mesma “credibilidade” dos levantamentos dos institutos tradicionais, apontam o contrário: Bolsonaro é quem venceria de goleada a reeleição. De novo, a pergunta básica: Quem aponta a “verdade”? 
 A massa nas ruas ou as pesquisas que ouvem de mil a duas mil pessoas?

Blog Alerta Total - Jorge Serrão, editor-chefe


segunda-feira, 28 de junho de 2021

O último surto - Na hora do adeus, ministro deixa como herança o 'Estado de Coisas Inconstitucional' - O Estado de S.Paulo

J. R. Guzzo

O ministro Marco Aurélio, que se prepara para se aposentar do STF e entregar ao Brasil, com a sua saída, a melhor realização dos 31 anos que passou no cargo, parece ter guardado para essas últimas horas o pior que poderia fazer para fechar a sua carreira. Pensava-se que a chave de ouro tinha sido a sua ordem para tirar de uma cadeia de segurança máxima, tempos atrás, um dos mais notáveis criminosos que constam nas anotações da polícia, o traficante André do Rap – que sumiu do mapa e está solto até hoje. Que nada. Antes de ir para casa, o quase ex-ministro conseguiu se superar e criar uma alucinação jurídica que não existe em nenhum lugar do mundo – o “Estado de Coisas Inconstitucional”.

Essa aberração impõe uma espécie de toque de recolher, ou estado de sítio, para todo e qualquer setor da administração pública que, segundo algum dos onze ministros, esteja com problemas. 
Não é preciso que alguém, ali, desrespeite qualquer dos 250 artigos da Constituição; basta que o PSOL, o PT ou coisa parecida sempre eles – queiram bloquear o que está sendo feito na área e exigir uma intervenção do STF. Uma vez decidido pelos ministros que há um “Estado de Coisas Inconstitucional” em algum pedaço da máquina do Estado, é o tribunal que passa a mandar ali, diretamente ou através de interventores nomeados por ele. Não há nenhuma sílaba na Constituição que permita uma coisa dessas.

Algumas semanas atrás, Marco Aurélio baixou o “Estado de Coisas Inconstitucional” nas penitenciárias brasileiras todas, sem exceção, das que investem fortunas nos presídios e cumprem todos os requisitos legais em sua manutenção, como as de São Paulo, até os mais sinistros chiqueiros onde se enfiam presos por esse interiorzão afora. 

O ministro disse que é tudo igual; deu três meses para o governo apresentar um “plano” que “resolva completamente”, nos próximos “três anos”, um problema de séculos. O interventor encarregado de mandar na área é o Conselho Nacional de Justiça uma aglomeração de burocratinhas que jamais colocaram o pé num xadrez em toda a sua vida.

Agora, com a aposentadoria roncando no calendário, Marco Aurélio inventou o “Estado de Coisas Inconstitucional” para a covid e o seu tratamento. Se o plenário do STF aceitar esse novo surto, os “entes federados”, sob “a coordenação do Executivo” ficam obrigados, entre outros disparates, a fazer “análise diária dos impactos na redução dos casos, fornecer “máscaras de pano multicamadas” para 210 milhões de pessoas, adotar “medidas de bloqueio”, orientar a população a ficar em casa e outros despropósitos que circulam entre a ignorância, a burrice e a preguiça mental. Marco Aurélio não ouviu, ao baixar essa sua bula, o Conselho Federal de Medicina ou qualquer outra entidade da área médica ou científica; apenas executou o pedido de “18 entidades de trabalhadores”.

Mergulhado na sopa ideológica que o STF cozinhou em torno da covid, o ministro acabou se metendo numa sinuca de bico. Denuncia a “inação” do governo federal mas nada diz sobre o fiasco das autoridades locais a quem o próprio STF deu autonomia plena para gerir a covid. Não foram elas que criaram o “Estado de Coisas Inconstitucional”? E agora: quem vai mandar na área? Os mesmos que fracassaram?  
Marco Aurélio não sabe. Também não sabe quem vai fazer, na prática, “a política concertada” que, segundo ele, é indispensável para lidar com a epidemia. O ministro diz apenas que o STF vai atuar “incentivando a formulação e a implementação de políticas públicas”. Fica reservado ao “Legislativo e ao Executivo” o “campo democrático das escolhas”. Deu para entender alguma coisa de útil? [com todas as vênias: os surtos do ministro Marco Aurélio e os do seu antecessor, outro ex-decano, leva os brasileiros à conclusão inarredável que prorrogar a idade da expulsória para 75 anos não foi uma boa.]
 
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo 
 

sábado, 5 de dezembro de 2020

Poderia ser pior? - Nas Entrelinhas

Não temos um plano efetivo de vacinação em massa por parte do Ministério da Saúde, cujo titular é um general de divisão da ativa, especialista em logística

Não gosto de análises catastróficas nem do quanto pior, melhor. Prefiro a teoria das duas hipóteses do humorista Aparíccio Apporelly, o Barão de Itararé, descrita por Graciliano Ramos em Memórias do Cárcere. O escritor alagoano deliciava-se com as anedotas e os comentários espirituosos do jornalista gaúcho, encarcerado durante a ditadura de Getúlio Vargas. Com sua voz pastosa e hesitante, dono de um “otimismo panglossiano”, o Barão sustentava que tudo ia bem e poderia melhorar, fundado numa demonstração de que diante de cada situação haveria sempre uma pior: “Excluía-se uma, desdobrava-se a segunda em outras duas; uma se eliminava, a outra se bipartia, e assim por diante, numa cadeia comprida”, explicava Graciliano. Com a palavra, o próprio Apporelly quando estava preso:

“Que nos poderia acontecer? Seríamos postos em liberdade ou continuaríamos presos. Se nos soltassem, bem: era o que desejávamos. Se ficássemos na prisão, deixar-nos-iam sem processo ou com processo. Se não nos processassem, bem: à falta de provas, cedo ou tarde nos mandariam embora. Se nos processassem, seríamos julgados, absolvidos ou condenados. Se nos absolvessem, bem: nada melhor, esperávamos. Se nos condenassem, dar-nos-iam pena leve ou pena grande. Se se contentassem com a pena leve, muito bem: descansaríamos algum tempo sustentados pelo governo, depois iríamos para a rua. Se nos arrumassem pena dura, seríamos anistiados, ou não seríamos. Se fôssemos anistiados, excelente: era como se não houvesse condenação. Se não nos anistiassem, cumpriríamos a sentença ou morreríamos. Se cumpríssemos a sentença, magnífico: voltaríamos para casa. Se morrêssemos, iríamos para o céu ou para o inferno. Se fôssemos para o céu, ótimo: era a suprema aspiração de cada um. E se fôssemos para o inferno? A cadeia findava aí. Realmente. Realmente ignorávamos o que nos sucederia se fôssemos para o inferno. Mas, ainda assim, não convinha alarmar-nos, pois essa desgraça poderia chegar a qualquer pessoa, na Casa de Detenção ou fora dela”.

O raciocínio irônico do Barão de Itararé é altamente filosófico e serve para qualquer situação. Por exemplo, para a turma enrolada na Lava-Jato, que agora assiste, de tornozeleira eletrônica ou no xadrez, o ex-juiz Sergio Moro ser contratado como especialista em combate à corrupção por um grande escritório de consultoria que presta serviços à Odebrecht. Como se sabe, Emilio Odebrecht, para salvar a empresa e aliviar a cana de seu filho, Marcelo Odebrecht, negociou uma delação premiada com o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que quase implodiu o sistema político brasileiro. Alguns imaginam que o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff pavimentou o caminho para a eleição de Jair Bolsonaro; não, essa estrada foi asfaltada pelo escândalo da Petrobras e o uso generalizado de caixa dois nas campanhas eleitorais.

Pandemia
Mas, voltemos à teoria das duas hipóteses. O ano da pandemia do novo coronavírus está acabando, porém a covid-19 recrudesceu. Há uma corrida mundial para conter a segunda onda na Europa e nos Estados Unidos, que é repetição do que ocorreu com a gripe espanhola, 100 anos atrás. Agora, além do isolamento social, estarão sendo utilizadas vacinas em caráter emergencial. No Brasil, em razão do negacionismo do presidente Jair Bolsonaro e da mentalidade castrense do ministro da Saúde, general Eduardo Pazuello, estamos numa guerra entre o governo federal, que comprou a vacina de Oxford, inglesa, que será produzida pela Fundação Oswaldo Cruz, e o governo de São Paulo, que adquiriu a vacina chinesa CoronaVac, cuja fabricação será iniciada pelo Instituto Butantan. Há, também, uma vacina russa, a Sputnick V, adquirida pelo governo do Paraná. [detalhe bobo, irrelevante: Oxford e Coronavac, indicam vacinas cuja produção SERÁ INICIADA (sendo acaciano: futuro) a Sputnick V já está sendo aplicada na Rússia, não se sabe em qual fase sua aprovação está na Anvisa. De tudo se conclui que a notícia de uma guerra tendo como abertura o Barão de Itararé é mais uma tirada genial do articulista Luiz Carlos Azedo.]

Entretanto, não temos um plano efetivo de vacinação em massa por parte do Ministério da Saúde, cujo titular é um general de divisão da ativa, especialista em logística, que será o grande responsável [sic] pelo atraso da campanha de vacinação. No momento, sua grande preocupação é negar a existência de uma segunda onda da pandemia, sabotar as medidas de isolamento social e atrasar a liberação da vacina chinesa. Vidas não importam, afinal, não existe guerra sem defuntos. E onde aplica-se a teoria das duas hipóteses? Ao comparar o número de mortos com os que sobreviveram à covid-19, graças aos esforços heroicos dos profissionais da saúde.

Nas últimas 24 horas, houve 776 mortes, somando 175.307 óbitos desde o começo da pandemia. A média móvel de mortes no Brasil, nos últimos sete dias, foi de 544. Desde o começo da pandemia, 6.487.516 brasileiros já tiveram ou têm o novo coronavírus, com 50.883 desses casos confirmados nas últimas 24 horas. Em média, nos últimos sete dias, houve 40.421 novos diagnósticos por dia, a maior desde agosto, que registrou 40.526 mortes. O aumento no número de casos foi de 37%. A pandemia recrudesceu nos seguintes estados: PR, RS, SC, ES, MS, AC, AP, RO, CE, PB, PE, RN e SE. [o recrudescimento é o reflexo dos contágios ocorridos no feriadão do inicio de novembro; das eleições realizadas em 15 de novembro aditivado pelo segundo turno do dia 30p.p.

Lembrando que as aglomerações ao longo do mês de novembro, sem o uso de  máscaras, tiveram continuidade  pela realização de comícios. E, para facilitar a vida dos arautos do pessimismo a pane ocorrida no sistema de informática do Ministério da Saúde, represou o número de casos de contágio e mortes, forçando uma divulgação com atraso e 'aumentando' o número de casos - o que causou intensa alegria nos que conseguiram a graduação como  contadores de cadáveres na primeira onda e esperam a segunda para a pós.

Após o dia 10 de dezembro será comprovada a inexistência da segunda onde.]

Luiz Carlos Azedo, jornalista - Nas Entrelinhas - Correio Braziliense

 


terça-feira, 1 de dezembro de 2020

O golpe de Alcolumbre - Carlos Andreazza

O Globo

Não tem vírgula para controvérsia de reeleição de presidentes da Câmara e do Senado. Não pode

Está marcado para a próxima sexta, dia 4 de dezembro, o início do julgamento — no plenário virtual do Supremo — de uma ação por meio da qual o PTB questiona a constitucionalidade da reeleição (qualquer uma, mesmo aquela prevista na Constituição) de presidentes da Câmara e do Senado.

Não é banal que a coisa se dê no plenário virtual, em que os ministros somente depositam os votos. Sem enfrentamento de mérito. Sem debate. É o paraíso a arena dos sonhos para que se consolide o golpe, golpe contra a Constituição Federal, urdido, sem muita cerimônia, por Davi Alcolumbre.

Golpe que o sujeito costura desde meados de 2019, agora finalmente à custa de um Parlamento paralisado; que — sequestrado por disputas de poder antecipadas para muito além de qualquer padrão de irresponsabilidade da política brasileira — nem sequer consegue cuidar do Orçamento de 2021.

Para que fique claro: o Brasil não está parado, com uma pandemia a corroê-lo, em decorrência das eleições municipais. Isso é desculpa. E é mentira. O país está travado porque tem um governo incompetente, [em defesa do Governo se registre que além da pandemia, da crise econômica herdada, do desespero para eleger prefeitos (um adiamento por dois seria além de necessário, legal, natural e propiciaria economia = esse calendário de eleições a cada dois anos deixa a impressão que cada presidência do TSE tem que apresentar um feito: realizou eleições = ou as gerais ou as municipais (estas, ganham status de gerais por ser as que elegem  ocupantes para apenas dois cargos)tem que se sujeitar a pedir liberação ao STF para nomear o Chefe da Polícia Federal = subordinado imediato do ministro da Justiça que é subordinado imediato do Presidente da República.] incapaz de propor agendas e formular políticas públicas; e porque o Congresso, até anteontem a engrenagem que fazia algo andar, foi contaminado pela endemia sucessória, agravada pelo vírus da incerteza. Terá ou não sucesso o golpe de Alcolumbre, de resto a mexer num xadrez de expectativas de poder ainda a ecoar longamente no Parlamento?

Obra do golpe de Alcolumbre. Golpe pelo direito de se reeleger à presidência do Senado numa mesma legislatura; contra o quê, sem margem para interpretação rebolativa, é expressa a Carta que se tenta violar. Está lá, no parágrafo 4º do artigo 57. Não pode. Não tem vírgula para controvérsia. Golpe.

Daí por que seja tão importante para o êxito golpista escapar da discussão de mérito. Porque isso equivaleria a escapar do que versa a Constituição. Porque bastaria que um ministro a abrisse, passando-lhe os olhos, para que tivéssemos um destaque e o caso, deixando a imobilidade muda do plenário virtual, fosse para a deliberação do colegiado. Ou seja: para que a tara de Alcolumbre fosse contida.

Mas não. O STF integra o jogo político; e isso significa atalhar a Lei Maior. Nesse caso, para fugir da apreciação do mérito. Não poderia ser diferente num tribunal cheio de agentes políticos. Que fazem cálculos típicos de um operador político. Logo, se os togados avaliam que o arranjo com Alcolumbre e Maia (que surfaria a onda para ser também beneficiado) serve bem ao equilíbrio da República, ambos se concertando segundo consideram os supremos — para frear os ímpetos autocráticos de Jair Bolsonaro, por que não encontrar uma solução casuística, por que não erguer um puxadinho oportunista e fulanizado, que lhes permita continuar à frente das casas legislativas? [um pensamento que teima em ser expresso: estão na gaveta do presidente do Senado vários pedidos de 'impeachment' contra supremos ministros = que para serem apreciados, julgados e produzirem sentença, basta apenas o Alcolumbre querer e decidir dar andamento aos pedidos. 

O que faz surgir a lembrança de que decidindo o STF considerar um golpe a pretensão do Alcolumbre e impedindo sua reeleição e, por tabela, a do Maia,o Alcolumbre ainda será o presidente do Senado até as eleições de fevereiro/2021.]

Contra o temor de um hipotético grande golpe bolsonarista, um golpe de verdade, um golpinho virtuoso, impingido via Senado e chancelado pela corte constitucional. Que tal? E como não projetar que o STF, deixando-se penetrar pelo que supõe jeitinho pontual e por boa causa, estará forjando as condições para o arrombamento de reeleições infinitas no Parlamento? A estratégia golpista é engenhosa; e terá como fundamentotudo assim indica — o Supremo liberando ao Congresso, como se matéria interna corporis, o condão de decidir sobre as eleições de suas mesas diretoras.

O STF lava as mãos, pautado pelos interesses da política. Adotará ministros já vazaram a tática a postura cínica, covarde, de alegar que a ação do PTB consistiria numa espécie de consulta prévia; a respeito, pois, de algo ainda não ocorrido, um caso hipotético, sendo impossível, por falta de concretude, tratar do mérito. Balela! Mas também puro adiamento; sendo questão de tempo até que se tenha de deparar com uma chuva de reclamações, quando o golpe já estiver aplicado, e o tribunal for obrigado a se lembrar da Constituição.

O STF lavará as mãos. Se entender — já entendeu, todos entendidos — que o assunto é de alçada do Parlamento, dirá que o desejo de Alcolumbre poderá prosperar driblando a única maneira republicana de postular o direito à reeleição numa mesma legislatura: uma emenda constitucional — para a qual seriam necessários três quintos do Congresso. Se decidir, portanto, que Alcolumbre pode chegar lá sem uma PEC, por meio de um golpe mesmo, dirá que lhe bastaria providenciar uma revisão do regimento interno do Senado; para o que precisaria de maioria simples entre os pares.

Ah, os pares... Alcolumbre os trata como bocós. Os senadores, contudo, não protestam. Talvez até gostem do balé desse golpe sui generis; dado que endossam a agenda personalista de um presidente do Senado que, para conseguir a prerrogativa de se reeleger, sumiu do Congresso, tirando o pé de qualquer bola dividida e abandonando a Casa ao apagão
Um presidente do Senado que, para não desagradar ao Supremo de que tanto depende, escondeu-se de ser presidente do Senado. Um presidente do Senado que abandonou a presidência que formalmente exerce para lutar, ao custo do Parlamento de hoje, por uma presidência futura.
 
Carlos Andreazza, jornalista - O Globo
 
 

domingo, 1 de novembro de 2020

De “Maria Fofoca” a “Nhonho”: o que está por trás das novas brigas no governo Bolsonaro? InfoMoney

InfoMoney

Episódios marcam acirramento nas disputas entre distintas alas da coalizão governista às vésperas do que se especula vir a ser uma reforma ministerial.  Conflitos internos e externos têm marcado a rotina de membros do governo federal mesmo após tentativas de moderação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e mudanças na conduta política da atual administração.

Nos últimos dias, o protagonista das brigas públicas foi o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente), desta vez com o general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), a quem batizou de “Maria Fofoca”, e com o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), referido por sua conta no Twitter como “Nhonho” (horas depois o ministro alegou que seu perfil havia sido invadido).

O episódio marca um acirramento nas disputas entre distintas alas da coalizão governista por espaços na administração às vésperas do que se especula vir a ser uma reforma ministerial. Recentemente, os militares ampliaram participação no governo, passando a ocupar todas as pastas sediadas no Palácio do Planalto, enquanto o grupo ideológico perdeu posições especialmente com a saída de Abraham Weintraub do Ministério da Educação.

Já os partidos do chamado “centrão”, antes atacados pelo presidente, começaram a integrar o segundo escalão, viram o Ministério das Comunicações ser refeito e entregue ao deputado federal Fábio Faria (PSD-RN) e agora cobiçam novas pastas. “O movimento de Bolsonaro de aproximação com o ‘centrão’ foi se intensificando cada vez mais e é natural que os integrantes deste grupo queiram espaços de maior destaque no governo. Por outro lado, desagradou aquela base mais ideológica, com perfil mais conservador”, diz a analista política Júnia Gama, da XP Investimentos. “Estamos vendo essas três alas que integram o governo entrando em conflito, por conta desta mudança de rumos que o presidente vem fazendo nos últimos meses. Isso vai desemborcar em uma minirreforma ministerial que deve acontecer no começo do próximo ano”, complementa.

Muitos movimentos são especulados para a possível dança das cadeiras. Um deles envolveria a saída de Salles, após sucessivos desgastes provocados por sua postura na crise provocada pelos incêndios na Amazônia e no Pantanal, além da declaração em reunião ministerial de que o governo deveria aproveitar a pandemia do novo coronavírus para “passar a boiada” em para alterar normas no setor. O ministro, porém, conta com respaldo da ala ideológica, sobretudo após a queda de Weintraub.

Investidas também são observadas sobre o Ministério da Economia. Os novos aliados políticos de Bolsonaro têm defendido a ideia de um desmembramento da pasta, o que permitiria a recriação do Ministério do Trabalho e Previdência, do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e até do Ministério do Planejamento. Os novos postos poderiam acomodar integrantes do “centrão” que passaram a dar suporte ao governo no parlamento. A possibilidade de recriação das pastas foi negada por Bolsonaro em live no início do mês, mas segue agitando conversas nos bastidores. “Vai ser muito difícil, são muitos apetites para o presidente saciar. Ele vai ter que fazer um xadrez muito delicado”, observa Júnia Gama. “Paulo Guedes, apesar de tudo que sofreu nos últimos meses, continua sendo um bastião do governo, um pilar da diretriz econômica liberal, mas tem muita gente de olho naquele ministério”.

Antes de movimentar peças no xadrez da Esplanada, Bolsonaro deve acompanhar atentamente o desfecho das eleições municipais, sobretudo nas disputas nacionalizadas (casos de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo), e da disputa pela presidência nas duas casas legislativas. A redistribuição dos postos, caso efetivada, terá de respeitar a nova correlação de forças que se desenhará no plano político.

InfoMoney


sexta-feira, 24 de abril de 2020

Companheiro de viagem - Nas entrelinhas

“Não é de ontem que Bolsonaro quer nomear o diretor-geral da Polícia Federal, exonerando o delegado Maurício Valeixo, homem de confiança do ministro Moro”

Sou fã incondicional do escritor belgo-francês Georges Simenon, ao qual fui apresentado pelo meu falecido amigo Carlos Jurandir Monteiro Lopes, jornalista, escritor, músico, guru literário e musical, parceiro nas noites boêmias do Lamas e da Estudantina, no Rio de Janeiro. Seus pequenos romances compõem um grande mosaico na literatura francesa, admirado entre outros por André Gide (O imoralista, A volta do filho pródigo), prêmio Nobel da Literatura de 1947, e nossa universal Clarice Lispector (Perto do coração selvagem, A hora da estrela), a judia ucraniana que escolheu o Brasil como sua pátria e, entre os sete idiomas que 
dominava, a língua portuguesa para tecer sua obra literária.

Além das histórias policiais, nas quais o famoso inspetor Maigret poderia pontificar ou não, Simenon escreveu grandes romances psicológicos, como O Burgomestre de Furnes, que trata do embrutecimento, do ódio e da avareza; O gato, o inferno doméstico de um casal de idosos, que se digladiam por meio de pequenos bilhetes provocadores; e a história do quarentão Kees Popinga, um respeitável cidadão holandês, dedicado ao trabalho e à família, ao xadrez e aos charutos, cuja maior curiosidade era apenas conhecer os passageiros do trem noturno que diariamente via passar de sua janela.

A vida de Popinga vira de pernas para o ar quando seu patrão vai à falência e resolve forjar a própria morte. O pacato cidadão, num surto inexplicável, embarca numa viagem sem volta num trem noturno para Paris, no qual comete o que seria um “crime perfeito”. Entretanto, seu comportamento paranoico e fora do padrão desperta suspeitas e, por isso, acaba preso. O livro é um mergulho psicológico no personagem: quem é Kees Popinga? Um maluco? Ou tão normal quanto qualquer cidadão? Sua vida cheia de regras era normal? A história tem um desfecho dostoieviskiano, impossível não lembrar do jóvem Raskólnikov, o personagem central de Crime e Castigo.

Simenon produzia de seis a sete romances por ano, de um só fôlego, trancado no escritório por duas ou três semanas. Entre um livro e outro, observa a alma das ruas e seus atores, para construir personagens e boas histórias. Sua atualidade não está no estilo, mas na trama sem julgamento moral, nua e crua, que desnuda dramas psicológicos e comportamentos sociais. Jurandir dizia que todo repórter de política deveria ler Simenon, não apenas para melhorar o próprio texto, mas para aprender a levar em conta a psicologia de suas fontes e personagens. Impossível não lembrar de suas lições na hora de escrever sobre a mais nova crise do governo Bolsonaro, desta fez, a fritura do ministro da Justiça, Sérgio Moro, que pode ser a próxima baixa na Esplanada dos Ministérios.

Federais
Não é de ontem que Bolsonaro quer nomear o diretor-geral da Polícia Federal, exonerando o delegado Maurício Valeixo, homem de confiança do ministro Moro. A tensão entre o presidente da República e seu ministro é antiga, decorre da investigação sobre o caso das “rachadinhas” da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), na qual o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) é investigado, por causa do ex-assessor Fabrício Queiroz, e suas conexões com as milícias do Rio de Janeiro, responsáveis pelo assassinato da vereadora carioca do PSol, Marielle Franco, e seu motorista, Anderson Gomes.


Em ambos os casos, porém, as investigações estão na esfera do Rio de Janeiro. Entretanto, Flávio Bolsonaro, por ter direito a foro especial, recorreu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF). As investigações chegaram a ser congeladas pelo presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, em liminar que desautorizou as quebras de sigilo fiscal pela Polícia Federal sem autorização da Justiça, mas o plenário da Corte decidiu por ampla maioria autorizar seu prosseguimento. O fornecimento dessas informações pelo antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), então subordinado ao Ministério da Justiça, provocou o primeiro grande estresse entre Moro e Bolsonaro. O desfecho foi a transferência do órgão para o Banco Central (BC) e o agastamento entre ambos.

Mesmo enfraquecido, Moro permaneceu no governo, mantendo o controle sobre a Polícia Federal (PF). Agora, a corda esticou novamente, por duas razões. Primeiro, a investigação aberta pelo Supremo para investigar as fake news, sob comando do ministro Alexandre de Moraes, que está muito próxima de sua conclusão e, aparentemente, envolve deputados federais. Segundo, a pedido de Ministério Público Federal (MPF), o Supremo também vai investigar os organizadores das manifestações de domingo passado, que foram consideradas pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, um atentado à democracia, ou seja, crime contra a Lei de Segurança Nacional. [estranho é que o Supremo acumula mais uma função: 
A de Polícia, quando INVESTIGA;
Se encontrar crime e culpados, também efetua a denúncia? a quem?
e também julga.]

Não há nenhuma informação oficial de que o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) esteja envolvido no caso das fake news, tudo corre em segredo de Justiça. Na bolsa de apostas de Brasília, porém, seu nome está cotadíssimo. O do irmão Carlos, vereador no Rio de Janeiro, também. O mais preocupante, porém, é a segunda investigação. Bolsonaro foi ao ato de domingo, se estiver envolvido na sua realização, isso será considerado um fato grave. [fica subentendido que possível envolvimento do presidente DEVERÁ SER PROVADO - não valendo que seja apenas inferido.] Nesse caso, segundo a Constituição, poderá ser investigado, pois se trata de ato cometido no decorrer do seu mandato, que pode ser considerado crime de responsabilidade.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


quarta-feira, 27 de maio de 2015

O juiz Sérgio Moro joga xadrez

No 17º lance, Bobby Fischer entregou a rainha e, como tinha 13 anos, pensaram até que ele não sabia jogar

Há alguns meses o juiz Sérgio Moro perdeu uma parada feia. O caso das propinas pagas na Petrobras pelos holandeses da SBM saiu de sua jurisdição e, pelo que se teme, foi dormir. A SBM é a maior operadora de unidades flutuantes de petróleo do mundo. No ano passado, pagou uma multa de US$ 240 milhões de dólares por propinas que distribuiu mundo afora. No Brasil, despejou US$ 139 milhões de “comissões legítimas”. Moro e a força-tarefa do Ministério Público não disseram uma palavra. Pareciam Bobby Fischer entregando a rainha na partida de xadrez que mais tarde veio a ser chamada de “o jogo do século”.

Nas petrorroubalheiras das sondas e unidades flutuantes estão imersos contratos de US$ 25,5 bilhões. Desde que começou a Lava-Jato, esse braço das operações vem sendo protegido por um manto de empulhações. Em Curitiba, o jogo foi outro. Entre os empreiteiros presos em novembro estava Gerson Almada, vice-presidente da Engevix, dona de um lote de contratos para a construção de sondas. Na sexta-feira, Moro prendeu preventivamente Milton Pascowitch, o Cupido das boas relações do PT com a Engevix. Almada reconhecera que pagava comissões a Pascowitch. Entre 2004 e 2014, foram R$ 80 milhões. Segundo Pedro Barusco, Pascowitch era um dos 11 operadores que molhavam suas mãos e as de Renato Duque, ex-diretor de engenharia e serviços da Petrobras. Se há uma grande conexão entre as petrorroubalheiras e o PT, ela passa também por aí. Um dos clientes da empresa de consultoria do comissário José Dirceu era o doutor Pascowitch.

Quando Bobby Fischer entregou a rainha, sabia o que estava fazendo. Ao fim do jogo, a rainha do adversário ficou sem ter o que fazer e o garoto ganhou a partida. Moro sabe que dois bancos japoneses já jogaram a toalha em relação a seus créditos com estaleiros nacionais. Um terceiro ameaça vir com a faca nos dentes, querendo saber se o seu dinheiro foi usado para pagar propinas. Almada já contou alguma coisa. Duque e Pascowitch estão em copas, mas há razões para se supor que Moro esteja mais um lance à frente, com um novo canário interessado em cantar para o Ministério Público. Em fevereiro o juiz Moro negara um pedido de preventiva contra Pascowitch, agora deferiu-o. Mais: o Ministério Publico está puxando o fio da meada das relações financeiras de empreiteiros com alguns escritórios de advocacia. 

Até agora a iluminação da Lava-Jato favoreceu casos como os das refinarias onde rolavam licitações fraudadas, aditivos e superfaturamentos. A mãe de um empreiteiro sempre poderá sustentar que o trabalho de seu filho resultou em obras visíveis, reais. No caso de algumas unidades flutuantes, o buraco é mais em cima, pois há equipamentos alugados, prontos. O dinheiro vai de uma caixa para outra sem empregar viv’alma.

Os investigadores de Curitiba começaram a mostrar o que sabem a respeito dos contratos do pré-sal. Logo depois de sua posse na presidência da Petrobras, o comissário Aldemir Bendine lembrou que num novo plano de investimentos “talvez você pegue a SBM, que é uma importante fornecedora”. Tão importante que foi proibida de fazer negócios com a empresa e, mesmo negociando um acordo de leniência, ainda não chegou a um acordo com a Controladoria-Geral da União.


Fonte: O Globo - Elio Gaspari, jornalista