Globo - Folha de S. Paulo
Mão invisível do atraso freia a economia e houve época em que era mais fácil comprar cocaína que importar computador
Capitão
Bolsonaro é um mestre do ilusionismo. A cada semana agita o país com tolices,
impropriedades ou mesmo irrelevâncias
Em julho de
2017 o procurador Deltan Dallagnol foi convidado para fazer uma palestra
no Ceará, pediu cachê de uns R$ 30 mil, mais passagens para ele, a
mulher, os filhos e estadia no Beach Park (“as crianças adoraram”). Em
junho passado o ministro de Economia baixou a Portaria 309, que reduzia
os impostos de importação de bens de capital, informática e tecnologia.
Dezoito dias depois, suspendeu-a. Nada ver uma coisa com a outra? Elas
mostram como a mão invisível do atraso leva o leão a miar.
Quem
pagou a villeggiatura do doutor Dallagnol foi a Federação das Indústrias
do Ceará, uma das estrelas do Sistema S, aquele em cuja caixa de R$ 20
bilhões arrecadados compulsoriamente nas veias das empresas o doutor
Paulo Guedes prometeu “meter uma faca”. Passaram-se seis meses
sem que Guedes voltasse a falar no Sistema S, mas quando ele assinou a
portaria 309 cumpriu uma das maiores promessas de campanha do capitão
Bolsonaro. Baixando os impostos de importação de bens de capital e de
equipamentos de informática, baratearia os preços de computadores,
celulares e produtos eletrônicos. A alegria durou pouco pois recolheu-a
prometendo revê-la.
[o Sistema S não goza de bom conceito - muito dinheiro para bancar muita mordomia e produzir pouco; dinheiro público, arrecadado compulsoriamente sendo responsável pela arrecadação o próprio governo - e o ministro Paulo Guedes já deveria ter metido a faca, o problema é que o lobby no Congresso, pró Sistema S é enorme e poderoso;
Dallagnol fez as palestras, recebeu o que lhe era devido - o CNMP e o CNJ permitem; pior é aquele ex-guerrilheiro aloprado, Fernando Pimentel ex-governador de Minas - que usou uma Federal de Minas Gerais para esquentar dinheiro de corrupção - diz ter realizado as palestras, embolsou o dinheiro, só que ninguém viu nem ouviu as tais palestras - as federações também integram o sistema S.
O Sistema S é formado por Sesc, Sesi, Senai, Senar, CNC, CNI, CNA, IEL e outros mais. Os citados e os outros mais ainda oferecem alguns serviços aos trabalhadores nas empresas das áreas que atendem;
já as federações, que estão subordinadas as poderosas Confederações, estas existem apenas para o lobby político - com estruturas milionárias, tanto em termos de edificios quanto de funcionários.
A CNC e a CNI possuem sedes milionárias em Brasília, edificios imensos e de alto luxo, praticamente vazios.
Os Sesc', Sesi's, Senai'e e seus pares prestam algum tipo de serviço e estão vinculados às Conselhos e Administração Regionais e estas são 'administradas' pelos Conselhos e Administrações Nacionais, que custam mais caro que os 'regionais' que são os que prestam serviços.]
A mão invisível de uma parte do patronato da
indústria ganhou a parada mostrando ao governo que poderia bloquear seus
projetos no Congresso. Ela já conseguira o arquivamento do projeto de
abertura comercial deixado por Michel Temer. Esse jogo tem quase um
século. Houve época em que era mais fácil comprar cocaína do que
importar computador. Quando a economia nacional começou a se
abrir, o agronegócio foi à luta, modernizou-se e hoje é
internacionalmente competitivo. A indústria blindou-se atrás de
federações (alimentadas pelo Sistema S), aliada a “piratas privados e
criaturas do pântano político” (palavras de Guedes). Poderosa,
preserva-se com leis protecionistas. Resultado: os piratas prosperaram, a
indústria definhou e seus produtos custam caro. Já as federações nadam
em dinheiro, custeando palestras que poucos empresários sérios custeiam.
O
capitão Bolsonaro é um mestre do ilusionismo. A cada semana agita o
país com tolices (“ golden shower ”), impropriedades (o conforto de um
trabalho infantil que não conheceu) ou mesmo irrelevâncias (a nomeação
do filho para a embaixada em Washington; ganha um almoço de lagosta no
Supremo Tribunal quem souber os nomes dos três últimos embaixadores nos
Estados Unidos). [gosto de ler - além de livros, sempre li e leio jornais, revistas, os antigos almanaques, as Seleções do Reader's Digest, etc - nos tempos do governo Médici, já era assinante de Veja, leitor diário do Globo, JB, etc, portanto aprecio e defendo o trabalho da imprensa.
Mas, quem está maximizando a opção feita pelo presidente da República de nomear seu filho embaixador - competência que a Constituição lhe confere e seu filho atende aos requisitos objetivos, cabendo ao Senado verificar os demais aspectos - é a imprensa que dá corda ao Bolsonaro e ele pega.
Se Bolsonaro estiver errado e seu filho não tiver a competência exigida, caberá ao Senado bloquear a nomeação - ou será que o Senado Federal, presidido pelo competente Alcolumbre não merece confiança?]
Quando um assunto relevante como a abertura da
economia vai para o pano verde, o leão revoga a Portaria 309 no
escurinho de Brasília, prometendo revisá-la em agosto. A ver, pois essa
orquestra tem muitos tambores e poucos violinos.
A trava de Toffoli
A
trava do ministro José Antonio Toffoli que congelou as investigações
relacionadas com as contas do senador Flávio Bolsonaro mostra que a
Justiça é cega e lenta para o andar de baixo. Para o de cima, a história
é outra. A ideia segundo a qual movimentações financeiras
estranhas só podem ser compartilhadas depois de uma decisão judicial
transforma o Coaf e a Receita Federal em sucursais do Arquivo Nacional.
(Cadê o Queiroz?) Olhada de outro jeito, essas informações não deveriam
ser usadas, sem ordem de um juiz, por procuradores voluntariosos,
capazes de destruir reputações na busca de 15 minutos de fama.
Os
advogados de Flávio Bolsonaro foram brilhantes ao engatar seu argumento
a um litígio que nasceu em 2003 num posto de gasolina do interior de
São Paulo. Os sócios do posto foram autuados pela Receita Federal,
tiveram a conta bancária da empresa bloqueada pela Receita e passaram
mover o dinheiro como pessoas físicas. A Receita voltou a autuá-los, e o
Ministério Público enfiou-lhes uma ação penal. O advogado do posto de
gasolina contestou a legalidade do compartilhamento de informações da
Receita com o MP, perdeu na primeira instância e ganhou na segunda. O MP
recorreu ao Supremo Tribunal, onde o processo entrou e ficou sonolento. [indiscutivelmente não pode haver essa troca de informações entre a Receita e o MP, bem como, é criminoso que o Coaf faça seus registros e o caso vaze para a imprensa - caso do Queiroz.
Importante destacar que o Coaf luta com movimentações atípicas - que na maior parte das vezes não são ilegais - assim, tem que haver limites para evitar que atipicidades sejam tratadas como ilegalidades - tanto é que a segunda instância deu ganho de causa ao posto.]
O
caso foi para o gabinete do ministro Toffoli. Em abril do ano passado o
STF entendeu que esse litígio deveria ter repercussão geral, [entendimento ocorrido bem antes do Fabricio virar manchete por prática de movimentações atípicas, que TALVEZ sejam ilegais.] ou seja,
valeria para qualquer caso semelhante. O julgamento foi marcado para 21
de março deste ano e depois foi transferido para o próximo dia 21 de
novembro.
Estavam assim as coisas, quando os advogados de Flávio
Bolsonaro tinham um habeas corpus para ser apreciado no Rio de Janeiro e
decidiram engatar seu caso ao do posto de gasolina de Americana,
pedindo uma liminar. Como o Supremo está em férias e seu presidente
torna-se plantonista, coube a Toffoli tomar a decisão, com repercussão
geral, congelando a essência da investigação das contas de Flávio
Bolsonaro. A briga do posto de gasolina de Americana com a
Receita começou em 2003 e estava no STF há mais de um ano. A Justiça é
lenta, mas às vezes não tarda.
(...)
O tesouro da UFRJ
O
projeto “Viva UFRJ” sugere que a universidade pode arrecadar milhões
vendendo seus terrenos na Praia Vermelha e na Ilha do Fundão. A
área da Praia Vermelha pode valer bastante. No caso das terras do
Fundão, a “vocação imobiliária” deixou de ser o sonho de um campus e foi
noutra direção. Os interessados nos terrenos gostariam de construir
galpões para apoiar a logística do aeroporto do Galeão.
(...)
Dificuldade
O
pessoal do palácio do Planalto sabe que a reforma da Previdência chegou
ao Congresso azeitada pela iniciativa tomada no governo de Temer e com
relativo apoio na opinião pública. Um projeto de reforma tributária não
terá uma coisa nem a outra.