Editorial - Valor Econômico
Guedes precisa recorrer a quem apoia vários de seus projetos, como o presidente da Câmara, Rodrigo Maia
Desde que o presidente Jair Bolsonaro resolveu apoiar-se no centrão para
evitar ser desalojado do Palácio do Planalto, mais integrantes da
equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, deixaram o governo. Não é
coincidência. A agenda econômica bateu em um muro de oposição no centro
do poder, escorado pela falta de convicções liberais do próprio
presidente da República.
[Três pontos:
- o deputado Maia não apoia projeto de ninguém. Só apoia projetos que lhe interessam e, ao apoiá-los, deles de apropria;
- Presidente Bolsonaro, já passa da hora de dispensar o ministro Guedes. Suas poucas condições de utilidade já se exauriram. Ao contrário, se tornou um palanqueiro, estilo Mandetta', chegando ao ponto de dizer, nas entrelinhas de um pronunciamento, que ou o senhor faz o que ele quer ou será impedido;
As reformas delineadas pela equipe econômica pararam, mas isso não foi
tudo. Ministros militares, sem a desaprovação pública de Bolsonaro,
inventaram um plano de obras que só pode prosperar por meio de
gambiarras que põem abaixo o teto de gastos - único empecilho à volta do
descontrole fiscal. As manobras, das quais também participa o ministro
do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, contam com ampla torcida
organizada, reunindo o centrão fisiológico e os partidos de esquerda.
Paulo Guedes dá sinais de que caminha para o isolamento no governo. Seus
apelos diretos por declarações de apoio a Bolsonaro indicam isso.
A saída de Mansueto Almeida foi a de maior peso, e premonitória - como
secretário do Tesouro, era o guardião de um cofre que em breve poderá
ser arrombado. Ele teve disputas desgastantes com outros membros da
equipe econômica e desilusões com o abandono de seu plano de
reequilíbrio fiscal dos Estados, batizado com seu prenome, que abria um
leque de 9 alternativas para a escolha dos governadores iniciarem a
arrumação de suas contas. Enviado ao Congresso, está lá até hoje e de lá
provavelmente não sairá.
Frustrações embalaram a demissão de Paulo Uebel, secretário especial da
Desburocratização. Com apoio em estudos do Banco Mundial, de
consultorias, de economistas locais e de sua própria experiência,
elaborou uma reforma administrativa para dar racionalidade funcional,
produtiva e salarial à máquina do Estado. Embora não fosse seu objetivo,
a reforma traria economias aos cofres públicos, ao disciplinar
promoções, carreiras (há mais de 300 hoje), benefícios e exigir o mínimo
que hoje inexiste em todos os escalões da República - a avaliação de
desempenho.
O presidente Jair Bolsonaro, que não quer se aborrecer com o que não
entende, e não quer problemas com o funcionalismo, desdenhou da reforma
administrativa. Ela não foi enviada e ficou à espera da oportunidade,
que não veio. Bolsonaro disse que a reforma ficará para o ano que vem.
Uebel pegou o paletó e foi embora.
O secretário especial de Desestatização, Salim Mattar, dono da Localiza,
saiu depois do total encalhe do programa de venda das estatais.
Desfazer-se de patrimônio público é, e tem de ser, mais difícil do que
vender ativos em uma empresa privada, mas o programa não andou mesmo foi
por falta de interesse do governo. Bolsonaro não é privatista, as
“jóias” da coroa - Petrobras, Banco do Brasil - não entraram na lista de
privatizações e mesmo vender empresas penduradas no Tesouro não é fácil
dadas as centenas de apadrinhados pendurados nesses cabides de emprego. [Privatizar a Petrobras e o Banco do Brasil é excelente, inevitável e urgente.
Caixa Econômica Federal, desmembrada - sem restar nada autarquizado - um banco = a ser privatizado e o restante formará um complexo para administrar o sistema imobiliário hoje em mãos da Caixa, incluindo financiamento, mantendo a administração do FGTS, nos moldes do extinto BNH, com as adequações necessárias.]
O recuo das promessas eleitorais por Bolsonaro já ocorria antes da
pandemia e a covid-19 acrescentou dissabores a quem já estava amuado.
Guedes chegou tarde, e com parcimônia, na discussão dos auxílios
emergenciais que o vírus tornou necessários. Mas os programas de apoio
funcionaram a ponto de levantar a popularidade e o faro eleitoral do
presidente. Diante da abertura necessária dos cofres, os ministros militares vieram
com um “Plano Marshall” mambembe e descosturado que, ademais, dinamita o
teto de gastos. Foi um ataque frontal ao ministro da Economia, que
parecia ter fracassado em meio ao festival de baixarias da reunião de 22
de abril. Os ministros militares e Marinho voltaram à carga. [teto de gastos é incompatível com a necessidade, urgente e inadiável, de execução de medidas para recuperação da economia - abalada pela pandemia.
Gastos para recuperar a economia, empregos, volta do crescimento, não podem estar limitados por normas válidas, e necessárias, antes da pandemia.
Tudo com ATENÇÃO REDOBRADA à volta de inflação e ocorrência de corrupção em obras, contratações e compras.]
Como o Estado está quebrado, é preciso voltar à racional sobriedade após
o fim do estado de calamidade pública, que deu respostas sociais à
pandemia. Furado o teto, as demandas não terão fim, em especial com uma
base governista alicerçada no centrão. Sem a premência do aperto fiscal,
as reformas serão deixadas de lado. Em seu lugar virão o risco de uma
explosão do déficit público e seu financiamento por via inflacionária.
Bolsonaro disse ontem que “nosso norte continua sendo a responsabilidade
fiscal e o teto de gastos”, mas não é bom se fiar em suas palavras.
Guedes precisa recorrer a quem apoia vários de seus projetos, como o
presidente da Câmara, Rodrigo Maia, refazer pontes e reeditar uma
parceria que conseguiu realizar a reforma da Previdência.
Editorial - Valor Econômico
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