O Supremo Tribunal Federal(STF), por 9 a 1, confirmou a decisão do
presidente da Corte, ministro Luiz Fux, que cassou a liminar que soltou o
traficante André de Oliveira Macedo, o André do Rap, da lavra do
ministro Marco Aurélio Mello. Um dos chefões do Primeiro Comando da
Capital (PCC), o traficante fugiu para o exterior. A decisão era pedra
cantada, assim como o bate-boca no final do julgamento entre os dois
ministros. Novo decano, Marco Aurélio sustentou sua posição, embora
tenha negado um habeas corpus de um comparsa do fugitivo, cujo advogado
alegou as mesmas razões acolhidas no caso de André do Rap, para pedir
sua libertação.
Apesar do resultado dilatado, a sessão de ontem foi tensa. Todos
ressaltaram a necessidade de o presidente da Corte respeitar as
liminares dos ministros, e trataram o caso de André do Rap como
excepcionalidade. O ministro Ricardo Lewandowski chegou a criticar Fux
por ter sustado uma de suas liminares, durante um plantão, quando era
vice-presidente do Supremo. Houve críticas dos ministros à proposta de
mudanças no sistema de distribuição de processos por ato administrativo
feita por Fux.
O ministro Gilmar Mendes destacou as falhas no caso de André do Rap,
uma vez que a liminar concedida por Marco Aurélio foi dada após o
advogado do traficante ter peticionado pela segunda vez; antes, havia
retirado outro pedido de habeas corpus, que fora distribuído para a
ministra Rosa Weber. [???] Também criticou a omissão do juiz de primeira
instância, que deveria ter se pronunciado no prazo de 90 dias, e o
Ministério Público Federal (MPF), que somente recorreu da decisão no
sábado passado, o que também facilitou a fuga do traficante, que não foi
devidamente monitorado pela polícia.
O julgamento do habeas corpus de André do Rap foi o assunto político
da semana, mas acabou ofuscado pela operação de busca e apreensão da
Polícia Federal que flagrou o senador Chico Rodrigues (DEM-RR),
vice-líder do governo no Senado, tentando esconder R$ 37 mil dentro da
cueca. O delegado que comandava a operação desconfiou do volume do
calção do pijama que o senador usava em sua casa e resolveu fazer uma
revista íntima no parlamentar. O vexame foi notícia no mundo inteiro e
virou meme nas redes sociais. O ministro Luís Roberto Barroso, que
determinou a operação, depois do flagrante, decidiu afastar Chico
Rodrigues do mandato por 90 dias, mas não concedeu o pedido de prisão
feito pela Polícia Federal. Os vídeos que registram o momento do
flagrante não foram divulgados e estão trancados num cofre da PF.
Dinheiro da Saúde
Com lugar agora garantido no folclore político da pior maneira
possível, Chico Rodrigues criou grande constrangimento para o presidente
Jair Bolsonaro, de quem era amigo desde os tempos em que ambos foram
deputados na Câmara. Por recomendação do Palácio do Planalto, o líder do
governo no Senado, Fernando Bezerra, aconselhou o parlamentar a
renunciar ao cargo de vice-líder do governo, o que foi feito ontem
mesmo. O senador está sendo pressionado pela cúpula do DEM, inclusive o
presidente do Senado, Davi Alcolumbre (AP), a renunciar ao mandato, mas
resiste. Não quer perder a imunidade parlamentar, com medo de ser preso
imediatamente.
Chico Rodrigues, segundo as investigações, articulou a remessa de
recursos federais destinados ao combate à covid-19 em Roraima, sob
condição de que fosse contratada a empresa Quantum Empreendimento em
Saúde, controlada por Jean Frank Padilha Lobato, apontado como seu
operador. Segundo relatórios da CGU, a empresa assinou um contrato de R$
3,2 milhões com o governo de Roraima, para fornecimento de kits de
testes de covid-19, com superfaturamentos da ordem de R$ 956,8 mil. O
senador chegou a solicitar um avião da FAB para transportar materiais da
Quantum, o que está sendo investigado, pois o ônus do transporte
deveria caber à empresa e não ao Ministério da Defesa.
Com acesso direto ao presidente Jair Bolsonaro, Chico Rodrigues era
muito influente, com vários apadrinhados indicados para órgãos federais
em Roraima. Integraria um esquema que desviou mais de R$ 20 milhões em
emendas parlamentares, que seriam destinadas ao combate da covid-19 no
estado. Roraima já recebeu, em 2020, cerca de R$ 171 milhões repassados
pelo Fundo Nacional de Saúde (FNS). Desse valor, R$ 55 milhões eram
especificamente para combate à covid-19.
Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense