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domingo, 21 de junho de 2020

Weintraub entrou nos EUA como um contrabando - Blog do Josias

UOL - Josias de Souza

Os detalhes do envio de Abraham Weintraub para um refúgio dourado no exterior provocam no brasileiro que é obrigado a permanecer no país uma sensação insuportável de exílio, uma nostalgia colossal do Brasil. É como se o capitão e seus sequazes arcaicos quisessem impor aos brasileiros um país do qual nem os cegos conseguem se orgulhar.
Weintraub não viajou para os Estados Unidos. Ele foi contrabandeado. 
Três dias depois do anúncio de sua demissão, apresentou-se aos agentes alfandegários americanos como ministro da Educação do Brasil. Com isso, livrou-se da quarentena que a administração amiga de Donald Trump impõe aos brasileiros por causa da pandemia. Só depois da consumação do logro Bolsonaro mandou publicar a demissão de Weintraub numa edição extraordinária do Diário Oficial. Se o viajante fosse uma mercadoria, estaria transitando por Miami como muamba. Tratando-se de uma pessoa, percorre a cidade americana na forma de uma caricatura.

O grotesco foi promovido de um contracheque de ministro (R$ 30,9 mil mensais) para um holerite de diretor do Banco Mundial (R$ 115 mil). Extinguiu o direito do brasileiro ao riso. Poucas vezes o sórdido teve uma aparência tão marcadamente sórdida. Weintraub voou de sua Pasárgada para o estrangeiro com a pressa de um fugitivo. Ele responde a dois inquéritos no Supremo Tribunal Federal. Num, é processado por ofender os ministros do Supremo: “Eu, por mim, botava esses vagabundos todos na cadeia, começando no STF.”

Noutro, é investigado pelo crime de racismo. Publicou numa rede social mensagem ironizando o modo como os chineses falam português, trocando a letra R pelo L. Para virar diretor do Banco Mundial, o vexame brasileiro precisa ser referendado por outros oito países. Um abaixo-assinado subscrito por 15 organizações da sociedade e 250 pessoas, entre economistas, ex-ministros, escritores e artistas, pede que a muamba seja devolvida ao Brasil. [Estamos entre os que entendem que Weintraub causava muitos problemas - ao Brasil e ao governo Bolsonaro - e não apresentava soluções.
Mas, discordamos dos pretensiosos, destacados em itálico,  que fingem esquecer que nomear diretores, representando o Brasil,  para organismos internacionais está entre as atribuições do Poder Executivo da União, cujo Chefe é o Presidente da República - no caso eleito por quase 60.000.000 de votos.
Portanto, eles não possuem competência para indicar ou vetar nomes indicados pelo presidente Bolsonaro - ainda que chegassem a 300, sua representatividade é ínfima.]

Blog do Josias - Josias de Souza, jornalista/UOL

quinta-feira, 18 de junho de 2020

Parece que foi ontem - Nas entrelinhas

A centralização do poder, cuja recidiva quase sempre foi protagonizada por intervenções militares, parecia uma página virada, mas ainda nos assombra

O brasileiro é uma invenção política, civil. Foi uma grande sacada dos mineiros, na luta pela Independência, cujo mito de origem é a Inconfidência, tendo o alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, como grande herói nacional. Mas, até a Independência, além dos mineiros, o que havia mesmo eram paulistas, fluminenses, baianos, pernambucanos e gaúchos, que se digladiavam. O Partido Brasileiro surgiu após a Revolução do Porto, que ordenou a volta de João VI a Portugal e convocou eleições para a Assembleia Constituinte que elaboraria a primeira Constituição portuguesa.

Reunia a pequena burguesia urbana, comerciantes e proprietários rurais que defendiam ideais liberais e não acatavam as ordens vindas das Cortes portuguesas. Cipriano Barata, Muniz Tavares, Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, padre Diogo Antônio Feijó e Nicolau Campos Vergueiro, eleitos deputados, lideraram o nosso primeiro partido político, que veio a ter um papel decisivo para a permanência de D. Pedro I no Brasil e, em 7 de setembro de 1822, na Independência, pontificou o santista José Bonifácio de Andrade e Silva, irmão de Antônio Carlos.
Houve uma guerra para consolidar a Independência, o Exército da época era português. Controlava províncias que se mantiveram leais a Portugal: Cisplatina (atual Uruguai), Bahia, Piauí, Pará e Maranhão. No Império recém-criado, de dimensões continentais, era grande a ameaça de fragmentação política. A saída foi D. Pedro I contratar oficiais estrangeiros, entre os quais o lorde inglês Thomas Cochrane e o marechal francês Pierre Labatut, para organizar a Marinha e o Exército, tarefa que coube a Bonifácio, um bacharel, matemático e geólogo civil.

Na Bahia, a Guerra da Independência durou de 7 de setembro de 1822 a 2 de julho de 1823. Comandava por Manoel Pedro, as tropas leais ao Brasil haviam sido batidas pelos portugueses, recuando para o Recôncavo Baiano. Dom Pedro enviou o general francês Pedro Labatut para reforçar as tropas brasileiras, que derrotaram Madeira na batalha de Pirajá (8 de novembro de 1822). Além de cercada por terra, com a chegada da armada comandada por Crochrane, Salvador foi completamente bloqueada, forçando a rendição dos portugueses.  Madeira negociou a volta das tropas remanescentes para Portugal.

Brutal foi repressão no Grão-Pará, que resultou em 1.300 mortos, sendo 240 por asfixia nos porões do brigue São José Diligente (depois, “Palhaço”), por ordem do almirante inglês John Pascoe Grenell. 

(.....)


Liderado por Antônio Carlos, o Partido Liberal patrocinou ali a centralização do poder, cuja recidiva na nossa história quase sempre foi protagonizada por intervenções militares, uma história que parecia uma página virada com a Constituição de 1988, mas ainda nos assombra, porque continua vivíssima. Em 1º de julho de 1980, ideólogo do regime militar, o general Golbery do Couto e Silva resumiu a ópera numa conferência na Escola Superior de Guerra (ESG), na qual abordou a centralização e a descentralização da administração, fazendo uma analogia com os movimentos de sístole e diástole do coração. Na ocasião, sugeriu aos militares evitar pronunciamentos que indiquem sintomas de enfraquecimento do governo; procurar nos conflitos soluções negociadas que evitem confronto; desconfiar de movimentos que aliem professores e alunos; e reprimir por meios legais manifestações consideradas impróprias contra o governo, tanto no meio parlamentar quanto por parte dos órgãos de comunicação. Uma parte do conflito de Bolsonaro com o Legislativo e Judiciário é fruto de sua personalidade; a outra, mais preocupante, decorre de uma concepção de Estado centralizado e vertical ainda arraigada, apesar de ultrapassada, compartilhada por alguns generais que o cercam.

Leia a íntegra: Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense 

terça-feira, 28 de abril de 2020

É incrível: querem criticar o presidente por nomear gente próxima. Gente de casa! - Alexandre Garcia

Gazeta do Povo

Tem cabimento?

Vocês já devem estar cansados de saber o que disse Sergio Moro e o que respondeu o presidente Bolsonaro. Agora praticamente já temos um novo ministro da Justiça e um novo diretor-geral da Polícia Federal. [atualizando: o novo ministro da Justiça é André Gonçalves;
Alexandre Ramagem, o novo diretor-geral da PF.
Ambos foram escolha do presidente Bolsonaro - não se concretizou a nomeação de Jorge Oliveira, primeira escolha do presidente Bolsonaro, por resistência do próprio escolhido e que terminou sendo acatada pelo presidente.
A resistência se tornou mais plausível devido o  currículo de menor amplitude do atual Secretário-Geral da Presidência.] 

Alexandre Ramagem, o novo diretor-geral da PF, é um delegado da Polícia Federal, que chefiava a agência nacional de inteligência e já trabalhou na segurança do presidente Bolsonaro.
Já o ministro da Justiça é Jorge Oliveira, que também trabalhava com o presidente na sua assessoria mais próxima e depois foi feito ministro Secretário-Geral da Presidência. Ele é formado em Direito e é major da Polícia Militar.

Uma observação interessante
Como a oposição é muito fraca, quem cumpre esse papel hoje é boa parte da mídia. Só que a mídia é meio ingênua, não sei se é porque é muito jovem. Os jornais estão criticando o presidente – imaginem – por ter nomear gente muito próxima a ele.Gente da confiança dele. Gente de casa. Essa é a crítica. É incrível!  De certo, queriam que o presidente nomeasse alguém distante e que ele não conhece e, portanto, não tenha confiança. É muito óbvio que Bolsonaro ia nomear alguém de confiança, ainda mais depois do que aconteceu entre ele e o Ministro da Justiça, Sergio Moro. O presidente foi surpreendido quando o ex-ministro convocou a imprensa para fazer acusações.

Depois Moro ainda revelou conversas privadas entre ele e Bolsonaro. Para mim, essa foi a única situação que ficou mal para o ex-ministro. Eu admiro o caráter, o patriotismo, a coragem e o trabalho contra corrupção de MoroEu fui ao casamento da deputada Carla Zambelli, em que Moro era padrinho. Depois ele pega a conversa entre ele e a sua afilhada de casamento e expõe publicamente uma conversa, inclusive, que não é comprometedora.

Leia também: "Durante uma crise, lembre-se: isso também vai passar"

Na conversa, a deputada pede que o então ministro aceite trocar o chefe da Polícia Federal e promete que vai ajudá-lo a se tornar ministro do Supremo Tribunal Federal. Isso foi divulgado. Ficou assim uma coisa meio adolescente. A mesma coisa divulgar conversas com seu chefe, que reclamou que a PF estava na cola de 12 deputados aliados. Se tratava de uma investigação pedida pelo STF para descobrir quem estaria instigando manifestações de rua para fechar o Supremo e o Congresso. Você certamente quer saber: pode haver impeachment de Bolsonaro?

Alguns pedidos de impeachment existem. Tem ministro do STF pedindo que Rodrigo Maia despache esses pedidos, tem Celso de Mello recebendo um pedido de abertura de inquérito do Procurador-Geral da República, Augusto Aras.  Aliás, Aras não esperou a resposta do presidente Bolsonaro. Interessante um jurista não esperar o contraditório. Foi Moro acusar e Aras fez um pedido de forma apressada, já que têm erros de português.

Esse inquérito pode enquadrar ou Bolsonaro ou Moro. A acusação contra o presidente é de falsidade ideológica, coação no curso de processo, advocacia administrativa, obstrução de justiça, prevaricação, corrupção passiva privilegiada.  Já o ex-ministro pode ser enquadrado por denunciação caluniosa. Eu não sei se isso é um truque para pegar Moro já que os ministros Lewandowski, Gilmar Mendes e Toffoli não gostam dele.  Assim como Rodrigo Maia e o centrão não gostam. O centrão, por exemplo, deturpou completamente o pacote anticrime. Para esse grupo de parlamentares é um alívio a saída de Sergio Moro.

Mas temos que considerar o seguinte
Nunca houve afastamento de presidente sem que houvesse povo fazendo manifestação. Quando derrubaram João Goulart foram as pessoas que saíram para rua primeiro. Quando Jânio Quadros renunciou, o povo não saiu em defesa. Quando Collor pediu para a população sair para rua a seu favor, eles saíram para rua para se manifestar contra o ex-presidente. E ele caiu. O povo saiu para rua e derrubou a Dilma.

Já com os ex-presidente Lula e Fernando Henrique Cardoso a população quase não foi para rua querendo derrubar eles. Embora, no governo FHC, petistas fossem para rua pedindo “Fora FHC” e quando estourou o mensalão pediram “Fora Lula”. 
No domingo (26) à tarde, o povo a maior parte de carro – encheu a frente da Esplanada dos Ministérios para mostrar para o Congresso e para o Supremo que o povo está na rua a favor do presidente.

Alexandre Garcia, jornalista - Vozes - Gazeta do Povo


segunda-feira, 23 de março de 2020

"BIOGRAFIA" DE UM FRACASSO - Percival Puggina

 O sujeito viu o muro de Berlim ser construído e tinha certeza de que o lado de lá era tudo de bom. Torcia pela URSS nas copas do mundo.

Carregava sempre um caderninho com frases de Mao Tse-Tung. 
Admirava os Viet Congs e os Khmer Vermelho. Comemorou o sequestro de Aldo Moro pelas Brigate Rosse. 
Vestiu, lavou, secou e vestiu de novo sua camiseta do Che. Colou uma foto do Danny le Rouge no guarda-roupa. Sacudiu bandeirinha de Cuba. Passou uma temporada lá, em 1969, colhendo cana para atender ao apelo do camarada FidelTeve arrepios cívicos quando a cadelinha Laika subiu para a turnê da tecnologia soviética no seu canil espacial. 

Vociferou contra a Primavera Húngara de 1956 e a de Praga em 1968. Aplaudiu as ações dos tanques chineses na Praça da Paz Celestial. Todo ano, no dia 11 de setembro, faz feriado e bebe espumante. Varou o inverno acampado na frente da PF de Curitiba. Cumpriu a agenda direitinho.

Nunca esteve só. Muitos, como ele, dedicam a vida a argumentar em favor do comunismo e do caráter científico e inevitável do socialismo. Como professores, políticos, jornalistas, religiosos, intelectuais ou simples militantes partidários, gastaram seu latim e seu português em apontar e condenar as “insuperáveis contradições” do capitalismo e da economia de mercado. Capturaram corações e mentes. Fizeram (e perderam) todas as apostas possíveis na superioridade ética e técnica das teses esquerdistas.

Dá para ter noção, leitor, do pesadelo em que se transformou a vida dessas pessoas nos últimos anos? Seus porta-vozes e líderes têm sido tipos como Lula e Dilma, o casal Kirchner, Hugo Chávez e Nicolás Maduro, Daniel Ortega, Evo Morales, Rafael Correa. Você procura uma democracia construída sobre suas idéias e não encontra. Um livro que junte os cacos e reorganize consistentemente sua visão de mundo sobre as bases daquela crença? Nada. Um estadista de boa estirpe para seguir? Ninguém aparece. Para arrematar, os eleitores norte-americanos elegeram Trump e o Brasil deu vitória a Bolsonaro.

É dureza! Na contramão, as idéias que combateu retiram inúmeras nações da fome e do atraso. As economias abertas alcançam níveis consistentes de desenvolvimento social. Todos os modernos e bem sucedidos estados nacionais aderem à democracia representativa, ao pluralismo e viabilizam amplas liberdades públicas. Até a China, do comunismo amarelo e vermelho, adotou o capitalismo e pôs em curso um dos mais espetaculares saltos econômicos e sociais que a humanidade já observou. Do comunismo ficou o pauzinho do picolé: a ditadura. E, com ela, a mal explicada história do Covid-19.


* Percival Puggina (75) membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.



domingo, 15 de março de 2020

SOBRE ÉTICA LULA LEU ARISTÓTELES EM GREGO, DE CABEÇA PARA BAIXO - Percival Puggina

É chocante para a população de um país que convive com tantas dificuldades postas interna e externamente à ascensão social e econômica de seus cidadãos, ver tantos gastos com prerrogativas e privilégios concedidos a uma parcela de sua elite política. Raros serão os usufrutuários que tenham, de algum modo, contribuído para agregar à renda nacional o valor necessário para sustentá-los em jatinhos, helicópteros, voos em primeira classe e luxuosas hospedagens. Em outras palavras: só podem dispor disso se por nossa conta.

Em 22 de julho de 2005, discursando a petroleiros (1), o ex-presidente Lula disse: "Neste país de 180 milhões de brasileiros, pode ter igual, mas não tem nem mulher nem homem que tenha coragem de me dar lição de ética, de moral e de honestidade". Esse depoimento do ex-presidente me voltou à cabeça quando fiquei sabendo de sua nova agenda europeia na qual receberia homenagem em Paris e iria à Suíça para reunião com o Conselho Mundial de Igrejas e dali a Berlim para um ato em favor da democracia. Sempre à nossa custa, claro, falando bem de si mesmo e mentindo sobre o Brasil e sobre sua situação perante a justiça brasileira. Acompanhado de quatro assessores, também pagos por nós.

Não sei se existe algum brasileiro disposto a topar o desafio e discutir ética com Lula. Afinal, o ex-presidente, a despeito de todos os processos que contra ele rolam no judiciário nacional, já deixou bem claro em ocasiões anteriores a frouxidão de seus conceitos sobre ética. Divagando sobre eles, Lula se imagina cravando picaretas, cunhas e cordas nas escarpas da vida até o cume da moralidade nacional... É possível que o leitor destas linhas não conheça, ou não lembre mais dos conceitos do ex-presidente sobre si mesmo a esse respeito. Parece que o líder petista leu Ética a Nicômaco, de Aristóteles, em grego e de cabeça para baixo:
“Sou filho de pai e mãe analfabetos, minha mãe não era capaz de fazer o "o" com um copo. E o único legado que deixaram, não apenas para mim, mas para a família, era que andar de cabeça erguida é a coisa mais importante que pode acontecer com um homem e uma mulher. Conquistei o direito de andar de cabeça erguida nesse país e não vai ser a elite brasileira que vai ‘fazer eu’ baixar minha cabeça".

Pronto! Eis aí, entre erros gramaticais, o certificado de garantia da própria idoneidade que nos fornece o esclarecido ex-chefe de Estado. A mãe não sabia fazer o "o" com um copo e, junto com o marido, o ensinou a andar de cabeça erguida.
É altamente improvável que os leitores destas linhas tenham recebido tais lições de seus pais. Analfabetos ou não, em português correto ou não, possivelmente lhes terão passado preceitos assim: 
a) deves buscar o bem e evitar o mal; 
b) não faz aos outros o que não gostarias que te fosse feito; 
c) exerce tua liberdade com responsabilidade; 
d) não justifica teus erros com os erros alheios; 
 e) diz sempre a verdade; f) evita as más companhias. Correto?
Se você, leitor, checar essa lista, enquadrará o ex-presidente como infrator de todos esses princípios. Mas isso não o impede de jactar-se mundo afora. Realmente não dá para discutir ética com esse homem imaculado, que já se proclamou sem pecados, santificado por um fio de prumo. Talvez seja por essa empinação toda, de tanto olhar para cima, que seu governo, levando o país junto, se tenha estatelado no chão da moralidade.

* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


terça-feira, 21 de janeiro de 2020

BALBÚRDIA NA EDUCAÇÃO -Lambança no Enem expõe arrogância e despreparo de Weintraub - O Globo


A última do Seu Creysson

É “imprecionante”. Na sexta-feira, o ministro Abraham Weintraub disse ter comandado o “melhor Enem de todos os tempos”. Horas depois, foi desmentido por quem fez o exame. Pelas redes sociais, estudantes denunciaram erros na correção e no lançamento das notas.  “O aluno respondeu a prova cinza e veio o gabarito da prova amarela”, resumiu o presidente do Inep. Alexandre Lopes é o quarto burocrata a ocupar o cargo em apenas um ano. A alta rotatividade expõe a falta de rumos do MEC no governo Bolsonaro.
 

[atualização sobre competência institucional:

a confusão do Enem, resultante de falhas no processo de impressão e/ou correção das provas, não é um ato que possa ser atribuído ao titular da Pasta da Educação.

Por duas razões: 

- corrigir provas não é atribuição de um Ministro de Estado - ainda que da Educação. A correção de provas é um ato realizados por equipamentos de informática adequados para o trabalho, sento tal ajuste de competência de técnicos especializados e todo o processo acompanhado profissionais do mesmo quilate. 

Jamais pode ser um ato orientado/comandado por uma única pessoa, ainda que seja o titular do Ministério da Educação;

- a função de Ministro de Estado consiste da gestão e mesmo da instituição de políticas para a pasta - o que exclui, mesmo no Ministério da Educação, a tarefa de corrigir provas ou fiscalizar a impressão.

Assim, o que ocorre no MEC, buscando atingir o Weintraub, é um processo de sabotagem e que deve ser investigado, identificado seus autores e punidos - seja na parte de impressão e revisão, ou na parte de correção.

É necessário parar com a vinculação da 'cultura' que ainda está fora da Educação com o ministro Weintraub.

Quando o presidente Bolsonaro decidir juntar a Secretaria de Cultura ao organograma do MEC, aí sim, tudo ficará sobre o controle do atual ministro ou de outro que o suceda.]                                                                                                                                                    


A lambança no Enem é a cara de Weintraub. Ao atacar as universidades públicas, o ministro ofendeu professores e mostrou desprezo pelo ensino superior. Ao escrever coisas como “imprecionante”, “paralização” e “suspenção”, agrediu o idioma e virou piada entre alunos do ensino fundamental. Weintraub se tornou uma espécie de Seu Creysson do bolsonarismo. O personagem do Casseta & Planeta também combinava o ar pretensioso com os erros de português. A diferença entre os dois é que o ministro não tem a menor graça. A cada aparição circense, com ou sem guarda-chuva, só deixa claro que não tem condições para exercer o cargo. O economista não foi escolhido por sua capacidade de gestão. Chegou lá porque jurou lealdade à cartilha olavista. Até a semana passada, ele competia em sectarismo e agressividade com Roberto Alvim. Só não cometeu o erro de plagiar o ideólogo da turma.

Há 34 anos, Celso Furtado assumia o Ministério da Cultura no embalo da redemocratização. “A primeira condição para que exista uma política cultural é que a cidadania desfrute de um clima de liberdade”, afirmou, em discurso contra o dirigismo e a censura.  Ontem a viúva do economista disse ter sentido “dor e tristeza” ao ouvir as palavras de Regina Duarte. Prestes a herdar o que restou da pasta, a atriz se  Bolsonaro. “Parece que ela aceitou o convite para fazer o que o mestre mandar. Estou arrasada”, desabafou Rosa Freire d’Aguiar, jornalista e tradutora premiada.

Bernardo M. Franco, colunista - O Globo






segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

No país da pós-verdade - O Globo

Luciano Trigo


Gerações de brasileiros estão sendo levadas a acreditar que a todo desejo equivale um direito — e nenhum dever

Historiadores relatam que, em busca das riquezas fabulosas do Eldorado, conquistadores europeus interrogavam insistentemente os nativos, até que recebessem — ou julgassem receber — a resposta que desejavam. Pero Vaz de Caminha escreve em sua famosa carta que, convidados a subir a bordo de uma caravela, alguns nativos examinaram atentamente um par de objetos e, em seguida, voltaram seu olhar para a terra. Os navegantes portugueses concluíram daí que eles estavam propondo trocar aqueles objetos por ouro e outras riquezas — interpretação que, evidentemente, mais se devia ao desejo que à realidade. “Isso tomávamos nós nesse sentido, por assim o desejarmos”, escreve Caminha.

Talvez tenhamos herdado do colonizador português nossa vocação para acreditar naquilo que queremos, mais do que naquilo que enxergamos. Não surpreende, portanto, que o recente fenômeno da pós-verdade tenha encontrado no Brasil terreno mais do que fértil: a pós-verdade conferiu, por assim dizer, legitimidade intelectual à persistente atitude do brasileiro de ignorar fatos e números que contrariem suas convicções. Sempre aplicamos à realidade o filtro do nosso desejo: se a realidade não corresponde ao que quero, pior para a realidade. 

Outro traço distintivo do caráter nacional no século 21 é a obstinada recusa em reconhecer um erro. Parece que Mark Twain estava pensando nos brasileiros do futuro quando afirmou que é mais fácil enganar as pessoas do que convencê-las de que elas foram enganadas. Assim somos: preferimos nos agarrar a um engano até o túmulo a admitir que fomos feitos de bobos. Por fim, um terceiro traço que nos caracteriza, complementar aos outros dois, é a tendência a confundir fatos e opiniões, vontades e direitos, o que geralmente conduz à vitimização: quando desejos se transformam em direitos, se eu não tenho algo que quero será sempre por culpa do outro, não por incompetência minha.

Somados, esses três traços impedem qualquer conciliação entre os campos em disputa na sociedade fraturada em que vivemos hoje. Como esses campos parecem viver em realidades incompatíveis, sem qualquer interseção que permita um esboço de consenso, é inútil apelar à razão. No país das verdades alternativas, cada um escolhe a narrativa que mais lhe apetece, sem qualquer cerimônia. Todos têm razão e ninguém admite ser contrariado.

Como chegamos a esse ponto? Educação. Antigamente se aprendia desde criança que a gente não pode ter tudo que quer. Mesmo aqueles que não aprendiam isso em casa acabavam entendendo, porque a vida ensinava, e a realidade se impunha. A vida ensinava também que as pessoas são diferentes, têm graus variáveis de beleza e inteligência, talentos, aptidões e características individuais, mas isso não era motivo para inveja nem ressentimento. A beleza alheia não ofendia, a inteligência alheia não oprimia, os talentos alheios eram objeto de admiração, não de ódio porque se aprendia também que o esforço, o sacrifício e a perseverança podiam levar qualquer pessoa à realização e à felicidade.

[a propósito do parágrafo abaixo, tem uma situação, prestes a tomar tempo do Supremo, que vem  a calhar para ser citada como comentário desta matéria.
Antes, destacamos que todos nós adoecemos, não escolhemos ficar doentes e vitimados por qual moléstia e sim somos 'escolhidos';

apenas determinados estilo de vida nos tornam mais propensos a sermos atingidos por determinadas doenças, mas, essa regra não é definitiva;
um exemplo óbvio e recorrente: é aceitável o argumento que um fumante corre maior risco de ser vítima de diversas doenças, entre elas o câncer de pulmão e/ou em outros órgão do aparelho respiratório; 
recentemente, uma senhora faleceu vítima do câncer do pulmão, que fez metástase para o cérebro - sendo que ela nunca fumou nem foi fumante passiva.

Agora o Supremo Tribunal Federal vai atropelar dezenas de processos para julgar se uma norma da Anvisa - agência especializada em normatizar procedimentos relativos à segurança da saúde - que considera "inapto a doar sangue o homem que fez sexo com outro nos 12 meses anteriores à ida ao hemocentro. O PSB considera que está configurado preconceito contra os homossexuais,..."
"... o ministro Edson Fachin afirmou, ao apresentar o voto favorável à ação, que o estabelecimento de um grupo de risco com base na orientação sexual não é justificável. Para ele, trata-se de uma restrição desmedida com o pretexto de garantir a segurança dos bancos de sangue." (não foi perguntado ao ministro se ele aceita receber sangue de um doador homossexual, homem, que fez sexo com outro seis meses antes da doação)
Citamos este exemplo apenas corroborando o entendimento do ilustre articulista de que gerações de brasileiros estão sendo levadas a acreditar que a todo desejo equivale um direito — e nenhum dever.
CLIQUE AQUI para SABER MAIS, ou AQUI.]

Hoje não é mais assim: em vez de entender que não podem ter tudo que querem, gerações de brasileiros estão sendo levadas a acreditar que a todo desejo equivale um direito — e nenhum dever. 
Uma pessoa desprovida de beleza tem o direito de ser top model; 
uma pessoa desprovida de inteligência ou disposição para estudar tem o direito de tirar nota 10 nas provas; 
uma pessoa desprovida de dinheiro tem o direito de ter um iPhone 11; 
uma pessoa que nasceu homem tem o direito de participar nas equipes femininas em competições esportivas tudopor assim o desejarmos”, como escreveu Caminha. É difícil acreditar que isso possa dar certo: pode existir pós-verdade, mas ainda não inventaram a pós-realidade. Indiferente ao que desejamos e ao sentido que damos às coisas, a realidade sempre se impõe, nem sempre de forma agradável.

Luciano Trigo, jornalista e escritor - artigo em O Globo


sábado, 23 de novembro de 2019

Professor de juridiquês - Merval Pereira





A estupefação que causou o voto de quatro horas do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, na abertura do julgamento sobre o compartilhamento de dados entre os órgãos de persecução penal (Ministério Público e Polícia) e os de investigação (Unidade de Inteligência Financeira- UIF, antigo Coaf -, e Receita Federal) foi provocada pela tentativa de sinuosamente voltar atrás sem deixar clara a mudança.

Tão obscuro o voto que teve que ser explicado mais tarde por uma nota oficial. Há pesquisas, como a do economista Felipe de Mendonça Lopes, da Fundação Getulio Vargas, que mostram que, com o televisionamento ao vivo dos julgamentos, os votos ficaram maiores em média 26 páginas, o que aumenta o tempo de leitura em cerca de 50 minutos.O ministro Luis Roberto Barroso definiu bem o momento: “Seria preciso chamar um professor de javanês”. Referia-se ao conto “O Homem que Sabia Javanês”, de Lima Barreto, sobre um vigarista que, sem saber nada do idioma, se apresentou como professor  de javanês a  um barão que colocara um anúncio em busca de alguém que lhe ensinasse a língua. [apesar da maioria se considerar 'supremo', situação que os alça à condição de divindade, os ministros permanecem humanos e apesar de não lhes faltar holofotes, o excesso de exposição os seduz.

Votos longos, findam por despertar a atenção, ainda que lavrados em javanês, e ser o centro delas, mais cristaliza de forma até exagerada uma aura de supremo.]

A utilização de métodos econométricos deu a ele a certeza de que a mudança de composição do plenário do Supremo não tem nada a ver com o aumento do tamanho dos votos, mas sim a transmissão ao vivo. Já houve quem propusesse o seu fim, mas parece uma decisão impossível de ser revista, devido à cobrança sempre maior da transparência das decisões, não necessariamente clareza.

 Quanto à obscuridade da linguagem, lembrei-me de um ciclo de palestras que coordenei este ano na Academia Brasileira de Letras sobre a influência do barroco em nossa cultura. Um dos aspectos abordados pelo ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Nelson Jobim foi justamente o juridiquês, esse idioma parecido com o português, salteado com termos em latim, que nos acostumamos a ouvir durante a transmissão dos julgamentos pela televisão.

Jobim criticou as transmissões, avaliando que com elas os votos ficaram mais longos. Mas ressaltou a vantagem da transparência do processo decisório do Supremo, não obstante o Brasil continue sendo o único país do mundo que televisiona os julgamentos de seu Supremo ao vivo, em tempo real. A Corte Suprema dos Estados Unidos realiza suas reuniões a portas fechadas, e somente o acórdão é divulgado, sem a especificação das eventuais divergências entre seus membros. E nenhum deles vai à imprensa criticar a decisão da maioria ou dar seu voto divergente.

 Mas, voltemos ao juridiquês. Para Jobim, o uso radical da linguagem mais culta e o excesso de erudição têm o objetivo de “transmitir potência no discurso”. Nelson Jobim acredita que o formalismo da linguagem jurídica já virou piada, mas “ainda assim, insistimos em usar o juridiquês no Brasil”.  Para ele “a ornamentação lingüística” sinalizaria um jurista mais preparado, “pois quem se afasta se torna grande e incompreensível”. Jobim definiu assim o falar empolado: “Comunicação sem clareza é uma forma eficaz de esconder ignorância no assunto sobre o qual se fala”.  Leu, ao encerrar a palestra, um trecho do conto “Teoria do medalhão”, do patrono da ABL Machado de Assis, destacando a seguinte frase: “Falar difícil é fácil. O difícil é falar fácil”.

O tema favorece debates intermináveis, e na quarta-feira tomou conta das redes devido ao longo e obscuro voto do presidente Dias Toffoli. Em um grupo de que participo na internet vieram diversas citações muito úteis para se ter uma idéia de como se deve falar.  Diz Ludwig Wittgenstein, respeitado filósofo da linguagem: "tudo o que pode ser dito, pode ser dito claramente; e o que não pode ser dito claramente, deve relegar-se ao silêncio".

No Dicionário de Filosofia de Nicola Abbagnano, outra definição de Wittgenstein da linguagem: “Devemos atribuir um significado às palavras que usamos se desejamos falar com algum significado e não por simples tagarelice, e o significado que atribuímos às palavras deve ser algo do qual todos já tenham conhecimento.”. Outro, Hans-Georg Gadamer, filósofo alemão, das maiores autoridades em hermenêutica, o estudo das palavras, afirma que "aquele que fala uma linguagem que mais ninguém fala, rigorosamente não fala". O sociólogo alemão Niklas Luhmann, considerava a argumentação jurídica um "acréscimo de redundância".


Merval Pereira, colunista - O Globo

sábado, 16 de novembro de 2019

A diplomacia do improviso - Míriam Leitão

O Globo

É preciso deixar o improviso na diplomacia

Os presidentes dos países dos Brics
O presidente Jair Bolsonaro disse, diante dos outros quatro líderes dos Brics, que está tocando a agenda de reformas “que estava há décadas por uma solução”. O ministro da Economia, Paulo Guedes, misturando inglês e português anunciou que Brasil e China estão negociando uma área de livre comércio. Nem uma coisa nem outra. Os governos Collor, Itamar, Fernando Henrique, Lula e Temer fizeram reformas econômicas importantes. E um acordo desses com a China exigiria muitas etapas prévias para o início das negociações. Um erra ao relatar o passado, o outro ao descrever o presente.

Ao falar sobre os eventos recentes, Bolsonaro tem o mesmo defeito do ex-presidente Lula, o de ignorar o que foi feito antes dele. O “nunca antes” do ex-presidente foi retomado pelo atual, que costuma fazer pausas dramáticas após afirmar: “o Brasil mudou”. A verdade é que na economia, o país vem mudando um pouco a cada mandato. O menos reformista foi o da ex-presidente Dilma Rousseff.  A última grande abertura comercial foi feita por Fernando Collor. O ex-presidente Fernando Henrique conduziu inúmeras reformas, como a mudança do capítulo econômico da Constituição que acabou com o monopólio da Petrobras, Eletrobras, Telebrás. Privatizou, mudou a previdência e aprovou a Lei de Responsabilidade Fiscal. O ex-presidente Lula aprovou uma importante reforma da previdência dos servidores. Itamar Franco em dois anos fez, sob o comando de Fernando Henrique, a mais importante reforma monetária do país, que acabou com a hiperinflação. Michel Temer aprovou o teto de gastos e a reforma trabalhista. Por que é preciso lembrar isso? Porque a amnésia ataca certos governantes do Brasil. Eles se apresentam como inaugurais e seus atos como inéditos. [o Brasil (nos desgovernos anteriores, deste século - exceção o de Temer, que só não foi mais exitoso para o Brasil, devido o Janot engaANOT ter impedido) já perdeu muito tempo. 
Nos parece que relatar fatos passados será pura perda de tempo, por improdutivo.]

O atual governo fala muito em abertura, mas pouco se viu de concreto, além do acordo Mercosul-União Europeia que vai demorar a sair do papel. Uma área de livre comércio do Brasil com a China, ou, no dizer de Guedes aos jornalistas brasileiros, “free trade area” porque “we’re seeking of higher grounds of integration” demandaria muito mais do que essa mudança de oito a oitenta que atingiu o governo Bolsonaro da noite para o dia.

Quando o presidente falava mal da China, chamando o país de o “predador” que queria “comprar o Brasil”, foi alertado por economistas, exportadores, diplomatas, jornalistas que a China é o nosso principal parceiro comercial, com US$ 98,6 bilhões de comércio e quase US$ 30 bilhões de superavit. Agora ele entendeu essa parte. Foi à China, recebeu Xi Jinping e comunicou solene: “A China é nosso principal parceiro comercial”. Sim. [prova que apesar de uma evidente (e maximizada) teimosia o nosso presidente tem capacidade de reconhecer erros, corrigindo-os.]
 
Daí a dizer que pode ser feito um acordo de livre comércio com o país vai uma grande distância. Se for sem o Mercosul, desmonta-se o acordo com a União Europeia. Se for com o bloco, é preciso que haja clima entre os dois maiores países do Mercosul. O governo brasileiro está de amuos porque não gostou do resultado eleitoral. Para mostrar seu desgosto pensa em mandar o ministro da Cidadania, Osmar Terra, representar o Brasil na posse de Alberto Fernández. Alguém precisa avisar Bolsonaro que a Argentina, apesar da crise, é o maior comprador de produtos manufaturados brasileiros, e é parceiro próximo, goste-se ou não de quem ocupará a Casa Rosada. [por enquanto, o Brasil não pode priorizar o confronto político devido diferenças ideológica - a economia tem que ter prioridade, assim o mais sensato é aguardar que os hermanos que fizeram a bobagem nas últimas eleições, consertem a lambança.] 
 
Mesmo soando claramente como uma precipitação do ministro da Economia, a tal área de livre comércio assustou os empresários. A sabedoria está em evitar o protecionismo comum em parte dos industriais brasileiros, mas não pecar por ingenuidade diante de um país que tem uma máquina poderosa de produção, e cuja economia não joga exatamente o livre jogo do mercado. Os subsídios no produto chinês são tão numerosos quanto invisíveis.

O Brasil precisa mesmo de níveis mais altos de integração com a economia mundial, mas é preciso sair da teoria para a prática. O atual governo tem o hábito de anunciar projetos que ainda não formulou. [hábito grave e que pode trazer prejuízos - falar pouco sempre é mais produtivo.
No caso do presidente Bolsonaro, que tem inimigos em pontos estratégicos do governo brasileiro, se torna mais grave, já que facilita ação de sabotadores.]  É preciso abandonar também o improviso e o amadorismo na política externa. O “namoro” com os Estados Unidos, para usar uma imagem cara ao presidente, ignorou a realidade de que a economia americana é nossa competidora na exportação de alimentos. Os Estados Unidos e a China são ambos parceiros fundamentais do Brasil. Isso parece que finalmente a diplomacia de Bolsonaro entendeu.

Coluna da Míriam Leitão, jornalista - O Globo - com Marcelo Loureiro

sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Atraso secular - Merval Pereira

Sobre 2ª instância, atraso secular


A discussão que começou ontem no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre prisão em segunda instância repete o que ocorreu em 1827, quando Bernardo Pereira de Vasconcelos, jornalista e deputado do Império, subiu à tribuna para criticar o que considerava um excesso de recursos no sistema judicial brasileiro. Passaram-se 192 anos, e ainda não chegamos a uma conclusão.

A mudança da jurisprudência em pouco tempo é outro obstáculo para uma decisão sensata. A prisão em segunda instância foi proibida apenas em 2009, quando passou a vigorar o entendimento de que somente depois do trânsito em julgado poderia ser decretada a prisão de um condenado.  Em 2016, formou-se uma nova maioria a favor da volta da jurisprudência que permitia a prisão em segunda instância, que prevalecera muitos anos antes da mudança.

Agora, querem mudar novamente, pois o ministro Gilmar Mendes fez a maioria de um voto pender para o trânsito em julgado. Tudo indica que no próximo ano, quando o ministro Celso de Mello, favorável ao trânsito em julgado, se aposentar, a maioria poderá mudar novamente, dependendo de quem o presidente Bolsonaro indicar para o STF. E pode mudar novamente no ano seguinte, quando o ministro Marco Aurélio Mello, também favorável ao trânsito em julgado, for substituído.

 Essa profusão de instâncias recursais é herança de nossa colonização portuguesa, quando chegou a haver quatro ou cinco instâncias: a primeira, uma segunda, que era o Tribunal da Relação, uma terceira, a Casa da Suplicação, uma quarta, o Supremo Tribunal de Justiça, que originou o STF, e a graça Real, o último recurso ao Rei.

Bernardo de Vasconcelos, autor do projeto legislativo do Código Criminal do Império, em vigor em janeiro de 1831, defendia que os recursos não deveriam suspender a condenação, exceto em pena de morte: “o contrário é estabelecer o reinado da chicana”.

A constituição de 1824 e o sistema recursal do Império só admitiam duas instâncias, a do juiz monocrático e a do tribunal da relação como corte de apelação. Reagia-se contra o excesso de recursos do Antigo Regime visto como garantidor de privilégios e impunidade.

Hoje, temos quatro recursos, o último sendo ao STF, o nosso Rei. A grande data do Judiciário brasileiro é o 10 de maio de 1808, quando foi criada a Casa de Suplicação do Rio de Janeiro com competência para julgar todos os recursos, inclusive da Casa de Relação da Bahia. Foi quando passamos a ter um judiciário totalmente independente de Portugal, embora baseado no sistema português.
O historiador e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) Arno Wheling foi quem encontrou esse atualíssimo discurso de Bernardo de Vasconcelos, justamente em pesquisa para um livro que está escrevendo sobre a Casa da Suplicação.

O código de Bernardo de Vasconcelos, segundo os estudiosos, representou a primeira codificação criminal autenticamente nacional, definindo princípios hoje consagrados em toda legislação criminal do ocidente: princípio da legalidade, anterioridade, proporcionalidade e cumulação das penas, assim como a imprescritibilidade.  Vários juristas estrangeiros aprenderam português para ler no original o código, que inovou em vários aspectos, até mesmo no tratamento da maioridade penal, que não era abordada por nenhum código ocidental.

Aqui no Brasil, continuamos a discussão sobre quatro instâncias recursais, e quem apóia o trânsito em julgado, defendido ontem pelo relator, ministro Marco Aurélio Mello, alega a injustiça potencial de que um inocente possa cumprir pena. Valeria retardar o processo, pois, para só levar à cadeia quem fosse indiscutivelmente culpado.   O jurista José Paulo Cavalcanti argumenta que, ao mesmo tempo, esses mesmos Ministros do Supremo admitem a prisão provisória. “Na condenação em três instâncias, o processo passou por um juiz, três desembargadores de tribunais estaduais ou federais, e ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Nove julgadores, portanto”.

Ainda assim, pela presunção de inocência, deveriam, segundo eles, ficar soltos. Só que, na prisão provisória, vale a decisão de apenas um juiz. Com muitíssimo mais razão não deveriam admitir que alguém possa ficar preso, durante anos até, a partir de um único juiz. “A lógica sugere que com muito mais razão, esse réu jamais deveria ficar preso”, analisa José Paulo Cavalcanti. 


Merval Pereira, jornalista - Coluna em O Globo


sexta-feira, 11 de outubro de 2019

Flamengo de Jesus recupera o prazer de desfrutar o futebol no Brasil - UOL

Rodrigo Mattos

Ao se assistir ao Flamengo no estádio, é perceptível que não há nada de aleatório no time. Os movimentos e posicionamentos fazem sentido, as jogadas são executadas como se ensaiadas fossem, os jogadores sabem todos o que têm de fazer e são hoje melhores do que eram há dois, três meses. O futebol é intenso, empolgante, vertiginoso. É o efeito do técnico Jorge Jesus.  Essa é a explicação pragmática que se atém ao que faz uma equipe de futebol funcionar (ou não). Há outra análise pertinente a partir daí que é: o que esta equipe representa na história recente do futebol brasileiro e se deixará um legado.

Conversei sobre isso com o colega PVC
, uma das nossas melhores cabeças para o assunto, em um Maracanã em êxtase. Ele me lembrou o Santos de Neymar como um time tão móvel no ataque quanto esse do Flamengo. Eu lembrei do Cruzeiro de 2013/2014 como um time tão dominante no Brasileiro, e também uma máquina ofensiva.  Bem, esse Flamengo é melhor do que aquele Cruzeiro, por ter jogadores mais dotados tecnicamente e por jogar com ousadia quase o tempo inteiro. E aquele Santos tinha um craque que o Flamengo não tem em Neymar, mas não tinha o nível igual em todas as outras posições, nem a exuberância na movimentação ofensiva.
 
[falando em Neymar, fica dificil não prolongar o assunto sobre os méritos do preferido do ainda treinador Tite.
Quais méritos?
- 100 partidas pela Seleção - fácil de alcançar quando é sempre escalado pelo técnico, mesmo quando está totalmente sem condições técnicas de jogo; 
- nunca foi Campeão do Mundo, Copa do Mundo FIFA;
- nunca foi eleito melhor jogador do mundo - títulos que sobram em Messi e Cristiano Ronaldo;
- tem fama de cai-cai e é ousado - se considera merecedor dos privilégios que recebe no timinho brasileiro.]

Difícil colocar marcas de tempo, anos, década. Mas a verdade é que não víamos um time que nos desse prazer como esse Flamengo há um longo período. E por que? Não nos faltam, nem faltavam, talentos. Mas estamos estagnados, incapazes de repetir o futebol belo de um passado distante porque já não cabia em um esporte que se modernizou e igualmente incapazes de reproduzir a nova beleza que se criou lá fora. Estamos como artistas decadentes olhando um concerto de um novo talento da calçada.

E então um português veio nos mostrar - e antes um argentino no Santos com um elenco inferior, diga-se – que podemos voltar a sentir prazer no futebol. Que futebol não é saber sofrer é saber desfrutar.  Veja o jogo diante do Galo. Havia ali uma linha de cinco defensores atrás, outra de mais quatro à frente e um atacante. Em dado momento, o Atlético-MG meteu 11 na área. Justo se assim lhe apetece.O Flamengo trabalhava a bola, nenhum chuveirinho daqueles de qualquer jeito. O passe da ponta era para o canto da área, a triangulação pela lateral, até achar o espaço preciso, como quem desenha ângulos com jogadores nos lugares de esquadros e compassos.

Esse mecanismo era em favor desse talento individual que tanto produzimos e vendemos para fora. Vitinho acha um drible e um chute, um garoto de 17 anos mata o jogo, e Arão ganha todas as bolas com a facilidade de quem joga com crianças porque está sempre no lugar certo.  Ao final, Jesus observou que seu trabalho só criará raízes no futebol brasileiro se for vencedor. É fato, aqui só se acredita na vitória. Mas já não se pode negar que o português nos trouxe de volta algo que havíamos perdido, esse prazer de ver uma graça no futebol, algo que nos enche os olhos para além do pragmatismo de vencer.
 
Rodrigo Mattos - Blog no UOL

domingo, 25 de agosto de 2019

Outros enganos sobre a Amazônia - Veja

Blog do Augusto Nunes

A historinha ensina a passar qualquer notícia recebida por três peneiras: a da verdade, a da bondade e a da utilidade




O Amazonas, o rio, e a Amazônia, a região, têm sido assim chamados pela presença de mulheres guerreiras vistas a cavalo, que queimavam ou cortavam o seio direito com o fim de melhor manejar o arco e a flecha. Esta versão lendária, vinda do Grego, passou pelo Latim e chegou a várias línguas, incluindo o Português, mas sua penúltima escala foi o Espanhol. O militar e explorador Francisco de Orellana, o descobridor do maior rio do mundo, disse ter enfrentado na expedição tribos guerreiras femininas semelhantes às lendárias mulheres da Capadócia, na atual Turquia.
Foi uma das primeiras fake news da América, pois que baseada em outra, ainda mais antiga, o que lhe aumenta a aura de suposta verdade, vindo a tornar-se, pois, histórica. As inexistentes mulheres guerreiras sem o seio direito tiveram origem na semelhança entre  a palavra iraniana ha-mazan, cavaleiros, e a palavra grega amázon, sem o seio, modificação de mázos, seio, antecedido do “a”, indicando negação.

Talvez tenha contribuído para o engano de Orellana – ele não fez a confusão de propósito – ter enfrentado guerreiros índios nus e de cabelos longos, e confundido seus mamilos escuros com seios queimados das mulheres lendárias das quais ouvira falar nas cortes ou nas viagens. Ele teve cargos importantes, foi vice-governador de Guayaquil, no Equador, devia pegar de ouvido muitas histórias e lendas e não teve tempo de ruminá-las direito, pois morreu aos 35 anos. 

Em resumo, se não existia pecado do lado de baixo do Equador, por que mentir seria um deles? Orellana não mentiu, assim como não mente quem repete esta e outras lendas sobre a Amazônia, dando-lhes foros de verdade, agora não mais histórica, mas estatística. Para mentir e enganar bobos, a ferramenta mais usada até então eram números e porcentagens. Agora são fotos falsas.  O contexto das novas lendas sobre a Amazônia tem, porém,  um outro viés. A maioria dos brasileiros lia e escrevia pouco, mas ouvia e falava muito. Esta situação mudou com a chegada das redes sociais. De repente, o brasileiro passou a escrever o que antes falava, usando para expressar-se um misto de fala e de escrita, que na verdade é uma terceira língua: não é a língua comum falada nestas terras, mas também não é a norma culta da modalidade escrita até então lida em jornais e revistas, utilizada por quem escrevia nestes veículos e a aprendera nos bancos escolares lendo sobretudo os clássicos do idioma.  

Esses poucos ainda escrevem, mas já são minoria nas redações, inesperadamente tomada por profissionais quase ágrafos, entretanto portadores de diploma de curso superior. O que predomina, então, nas postagens parece ter vindo dos meios de comunicação social, sobretudo da televisão. e a modalidade da língua interessasse apenas pela forma, os problemas seriam diminutos. Um erro de ortografia ali, outro acolá, uma regência indevida mais adiante, nada disso impediria o entendimento, mas o que ocorre é outra coisa. Não se diz mais coisa com coisa, deu a louca no português do Brasil. O caos é rapidamente instalado pelo desconhecimento dos assuntos e dos modos corretos de sobre eles dissertar por escrito.

Mas o que mudou na fala e na escrita do brasileiro com acesso às redes sociais? Até recentemente o assunto predominante era o futebol. De repente a política tornou-se um grande tema nas redes sociais, talvez o principal, e definiu as últimas eleições presidenciais em favor de quem soube usá-las melhor.  Diante da verborragia, mais impressionante ainda nos incautos, sobretudo quando ilustrada por conceitos e números malucos, não é de bom tom mandar calar a boca, como o rei da Espanha fez com Hugo Chávez há cerca de doze anos, tornando instantaneamente famosa mundo afora a frase  Por que no te callas?”.
Por ter sido proferida originalmente em espanhol, língua mais franca do que o português,  virou bordão no mundo lusófono e alistou ao lado de Chávez uma legião brasileira para apoiá-lo. Afinal, quem o rei pensava que era para ofender assim outro estadista?

Mas, se não se deve mandar ninguém calar a boca, não se deve também acreditar em tudo o que os outros dizem. É preciso usar as três peneiras, um conselho atribuído ora ao chinês Confúcio, que viveu entre os Séculos VI e V a.C., ora ao grego Sócrates, no Século IV a.C. A historinha ensina a passar qualquer notícia recebida por três peneiras: a da verdade, a da bondade e a da utilidade. E só divulgá-la depois disso. É verdade o que informaram? A divulgação foi feita por com boas intenções? É útil divulgar o que se soube?

Também os antigos romanos se preocuparam com o que era tornado público e resumiram suas inquietações em dois provérbios invocados com frequência no mundo jurídico: cui prodest? (a quem interessa?) e cui bono? (para quem é bom?).

Não apenas as redes sociais estão sem editor. Também o Brasil e o mundo. Ora, se ler é escolher, publicar é a primeira escolha sobre o que os outros vão ler. Como disseram nossos avós, ouvido não é penico. Os olhos também não devem ser.

Transcrito do Blog do Augusto Nunes - Veja  
 
Deonísio da Silva
Diretor do Instituto da Palavra & Professor
Titular Visitante da Universidade Estácio de Sá