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segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Como Portugal se tornou destino popular de aposentados brasileiros

BBC News

Portugal: Como país se tornou destino popular de aposentados brasileiros

Até meados de 2015, nunca havia passado pela cabeça de Patrícia Martins deixar o Brasil. Divorciada e com dois filhos adolescentes, ela levava uma vida estável em São Paulo, onde trabalhava em uma das maiores empresas de tecnologia do país. Até que veio a grave crise política e econômica que culminaria, naquele momento, no impeachment da então presidente Dilma Rousseff.

"Percebi que estava tudo indo ladeira abaixo. Foi quando comecei a me interessar pela possibilidade de migrar para o exterior depois que me aposentasse", conta.

             A carioca Telma Facina está prestes a obter a cidadania portuguesa

 

Assim que o desejo se tornou um plano concreto, Portugal também se transformou em uma alternativa coerente: cabia na sua renda, não exigia o domínio de outro idioma e, principalmente, era conhecido por ser um lugar seguro.

Um ano depois, já aposentada, ela estava dentro do avião com passagem só de ida para Lisboa. "Quem me viu em São Paulo, andando de carro de luxo, não me reconhece quando chega aqui. É uma vida muito mais digna", explica. "Eu não volto mais para o Brasil."

É um ponto de partida semelhante ao da carioca Telma Facina, de 71 anos. Aposentada da antiga Companhia de Eletricidade do Estado do Rio de Janeiro (Cerj) desde o fim dos anos 1990, ela não pensava em morar fora do Brasil até 2016, quando precisou mudar às pressas para a Europa por um caso de doença na família. 

Como Portugal era o único que oferecia um visto especial para aposentados, o país era, à época, mais uma solução do que um projeto — relação que foi se transformando com o passar dos anos."Eu tinha ido a uma reunião com o cônsul português no Rio de Janeiro e ele tinha feito uma propaganda maravilhosa sobre viver a aposentadoria aqui", conta ela de sua casa, em Almada, do outro lado do Rio Tejo, cartão-postal de Lisboa.

"Quando eu precisei, vi que era, de fato, o visto mais fácil", completa.

Passado o momento familiar difícil, ela encontrou uma maneira de reunir a família novamente: levou a filha e o neto para morarem com ela em solo lusitano. Prestes a receber a cidadania do país, ela não quer voltar. 

         Claudney e a esposa, Karla, em uma praia em Cascais, a cerca de 30 km de Lisboa

Facina e Martins expressam um fenômeno migratório recente em Portugal. Outrora destino de estudantes e de jovens profissionais brasileiros atraídos por uma experiência europeia e melhor qualidade de vida, o país agora convive com uma onda de pessoas que deixam definitivamente o Brasil para gozar seus anos de aposentadoria em território português — ou que chegam ali faltando poucos anos para se aposentar. "É um fenômeno de perfil diferente: são pessoas mais velhas, geralmente. com bons rendimentos, e que nem sempre têm planos de regressar", explica a pesquisadora Nilcelene Biasutti, que acabou de defender uma dissertação de mestrado sobre o tema na Universidade de Lisboa.

Dados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), do governo português, ilustram bem esse panorama: até 2014, a proporção de pessoas que desembarcavam em Portugal solicitando o visto D7 destinado principalmente aos aposentados — era de cerca de 2% entre todas as chegadas de brasileiros. Quatro anos depois, essa taxa já era de 10,9%.

A pandemia de covid-19, que fez com que os voos entre os continentes fossem restringidos por meses, derrubou essa demanda até o começo de 2021, quando voltou com força. "Hoje, o perfil majoritário dos nossos clientes é novamente de quem quer passar a aposentadoria aqui", conta o advogado André Pacheco, que despacha de uma das filiais portuguesas do escritório Hofstaetter Tramujas e Castelo Branco, especialista em processos migratórios.

Ele conta que há ainda casos de brasileiros que, na contramão, do perfil comum, precisam complementar a renda para ter a residência aceita. Pelas regras locais, quem pede o visto D7 deve movimentar cerca de R$ 52 mil — o equivalente a um ano do salário mínimo de Portugal (665 euros) — em alguma conta bancária no país, valor que sobe para R$ 78 mil caso a mudança seja feita com um cônjuge. Se os filhos também estiverem no requerimento, cada um deles representa um acréscimo de 30% na exigência.

Durante sua pesquisa, Biasutti também se deparou com outras situações, como a de pessoas indocumentadas que voltaram ao Brasil para se aposentarem e, então, pediram o visto português; ou de quem perdeu renda e precisou voltar à ativa já em Portugal para complementá-la. "Isso aconteceu com muita gente que alugou um imóvel e migrou. Quando o real desvalorizou, eles tiveram que trabalhar de novo, porque os custos de vida ficaram muito maiores."

Tanto Telma Facina como Patrícia Martins têm sentido os efeitos do câmbio. No caso da primeira, principalmente, por contar apenas com a renda da aposentadoria."Eu tive que parar totalmente com as viagens que fazia pela Europa", conta Facina.

É por isso também que, de acordo com Pacheco, apesar da procura, mesmo pessoas de maior poder aquisitivo têm desistido do projeto de se aposentar em Portugal neste ano. De janeiro de 2020 para cá, o euro teve uma escalada de 44%. Em meados de novembro, a moeda era cotada a R$ 6,51. "Isso fez com que essa possibilidade ficasse mais restrita a quem já tem uma renda elevada no Brasil e quer deixar o país mesmo assim", observa o especialista em processos migratórios.

O carioca Claudney Neves, de 49 anos, é um deles. Reformado do Exército há um mês, ele tem tudo pronto para se mudar para Portugal com a mulher desde 2017, quando a sua aposentadoria estava perto de se concretizar. "Naquela época, nossas contas mostravam que minha renda nos permitiria viver confortavelmente lá", afirma.

Animado, o casal viajou para o país europeu há dois anos para dar entrada nos documentos e abrir uma conta bancária — para depositar o valor necessário para o visto D7. Eles chegaram a decidir até onde viveriam: Espinho, uma cidadezinha de 31 mil habitantes perto de Porto.

Vieram, então, a pandemia e, em seguida, a escalada da moeda europeia, que adiaram os planos de forma indefinida. "Hoje, fazendo a mesma conta, não dá para viver como a gente queria. Nós teríamos que complementar a renda chegando lá."

Trabalhar para se aposentar
Se muitos brasileiros chegam já aposentados, há outro contingente que desembarca em território lusitano justamente com o plano de se aposentar por lá.

Para isso, eles se amparam em um acordo previdenciário assinado entre Brasil e Portugal em 1995 que, entre outras coisas, permite que o tempo de trabalho tanto lá quanto cá seja contabilizado de forma conjunta na hora de se aposentar. Pelas regras, o candidato precisa ter contribuído por, no mínimo, 15 anos da sua vida ativa. Nesse caso, ele receberá o valor proporcional a esse período pago pelo governo português.

Luís Eduardo Afonso, professor da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA-USP), observa, porém, que o tempo de contribuição, por si só, não deve balizar a decisão de se aposentar em Portugal."É preciso se atentar às regras do sistema previdenciário deles, que são diferentes das nossas. É o caso da idade para se aposentar e do período contributivo, por exemplo."

Pela lei portuguesa, uma pessoa deve ter, no mínimo, 66 anos e 6 meses para ter direito à aposentadoria. No Brasil, há várias regras, embora a base mais comum seja de 62 anos para os homens e 57 para as mulheres. Segundo a advogada Miranda Ferreira, que também ajuda migrantes que buscam se estabelecer em Portugal, as diferenças na lei são geralmente favoráveis à previdência brasileira, que paga valores melhores e tem um sistema mais flexível.

Pelo acordo bilateral, quando chega a hora de se aposentar, a regra que vale é a do país em que a pessoa está. Ou seja: um brasileiro que completou os requisitos de contribuição por lá também é aposentado dentro do sistema previdenciário português recebendo, inclusive, na moeda local e tendo os mesmos direitos de um cidadão do país. Afonso alerta ainda para a impossibilidade de se aposentar apenas pelo tempo de contribuição, como era possível no Brasil até a mais recente reforma previdenciária.

Em 2019, uma mudança na legislação (Emenda Constitucional 103/2019) definiu que a aposentadoria brasileira também depende do período contributivo e de um requisito de idade mínima — assim como em Portugal. "O ponto fundamental é que há o direito. Ele é reconhecido para a pessoa que migrou. Os detalhes dele, porém, dependem muito de cada acordo previdenciário", explica.

Por outro lado, há como se aposentar em solo português apenas pelo critério da idade — isto é, sem o tempo de contribuição mínimo de 15 anos. Esta é, aliás, a modalidade com mais beneficiados no sistema do país. Chamada lá de pensão social de velhice, ela exige que a pessoa possua residência reconhecida no país e tenha pelo menos 66 anos e 6 meses. O piso do benefício é de 275 euros (cerca de R$ 1.780).

Por que se aposentar em Portugal?
Quando começou a pesquisar o fenômeno de aposentados em Portugal, Nilcelene Biasutti percebeu que, na imprensa portuguesa, a questão era sempre tratada sob a ótica da insegurança pública no Brasil. "Tinha esse estereótipo de que as pessoas não podiam usar suas joias no Rio de Janeiro e, por isso, mudavam." Assim que foi a campo, porém, descobriu motivações diferentes.

De fato, há anos que a presença brasileira atrai a atenção dos portugueses. Não é para menos: no último relatório do SEF, de 2020, por exemplo, o Brasil domina praticamente todas as estatísticas representa a maior comunidade do exterior em solo português (184 mil pessoas), a que mais recebeu cidadanias (20,8 mil) e, na contramão, a que mais registrou expulsões ao longo do ano (160).

Pelos dados, 28% da população estrangeira em Portugal hoje é oriunda do Brasil. Segundo Biasutti, boa parte dos casos diz respeito a famílias separadas que decidem voltar a viver próximas, como o caso de Telma Facina. São filhos que estudam ou trabalham na Europa e atraem seus pais já aposentados para o continente, por exemplo. Como não falam outro idioma, decidem se fincar em território português.No relatório do SEF de 2020, 47% dos brasileiros que chegaram se enquadram nessa categoria — chamada de reagrupamento familiar.

Há ainda muita gente para quem o país lusitano não era a primeira opção. "Ouvi muitos brasileiros que queriam se aposentar e ir para Miami, nos EUA, ou então para o Canadá. Porém, como a renda que esses países exigem é mais alta, Portugal era para onde dava para ir", revela.

Já o advogado André Pacheco aponta que, mesmo com os benefícios fiscais alguns tipos de vistos oferecem isenção de tributos e com a lei da igualdade entre os cidadãos, o fator segurança pesa muito na decisão de migrar. "São pessoas que querem envelhecer em um lugar menos perigoso do que as cidades brasileiras. Portugal é, de fato, um país muito seguro", explica.

Foi o que pesou na decisão de Claudney Neves, antes mesmo de sua aposentadoria. "O Rio de Janeiro é uma guerra. Eu já fui assaltado, meus amigos já foram, já morreu gente na rua de casa. Não dá mais", desabafa.

Enquanto o câmbio não alivia, ele permanece em compasso de espera, fazendo planos para sua velhice em Portugal.

"De repente, a gente tenta de novo em 2022".

BBC News Brasil - Vinicius Mendes 

Matéria publicada na BBC News 14 novembro 2021


segunda-feira, 28 de junho de 2021

O último surto - Na hora do adeus, ministro deixa como herança o 'Estado de Coisas Inconstitucional' - O Estado de S.Paulo

J. R. Guzzo

O ministro Marco Aurélio, que se prepara para se aposentar do STF e entregar ao Brasil, com a sua saída, a melhor realização dos 31 anos que passou no cargo, parece ter guardado para essas últimas horas o pior que poderia fazer para fechar a sua carreira. Pensava-se que a chave de ouro tinha sido a sua ordem para tirar de uma cadeia de segurança máxima, tempos atrás, um dos mais notáveis criminosos que constam nas anotações da polícia, o traficante André do Rap – que sumiu do mapa e está solto até hoje. Que nada. Antes de ir para casa, o quase ex-ministro conseguiu se superar e criar uma alucinação jurídica que não existe em nenhum lugar do mundo – o “Estado de Coisas Inconstitucional”.

Essa aberração impõe uma espécie de toque de recolher, ou estado de sítio, para todo e qualquer setor da administração pública que, segundo algum dos onze ministros, esteja com problemas. 
Não é preciso que alguém, ali, desrespeite qualquer dos 250 artigos da Constituição; basta que o PSOL, o PT ou coisa parecida sempre eles – queiram bloquear o que está sendo feito na área e exigir uma intervenção do STF. Uma vez decidido pelos ministros que há um “Estado de Coisas Inconstitucional” em algum pedaço da máquina do Estado, é o tribunal que passa a mandar ali, diretamente ou através de interventores nomeados por ele. Não há nenhuma sílaba na Constituição que permita uma coisa dessas.

Algumas semanas atrás, Marco Aurélio baixou o “Estado de Coisas Inconstitucional” nas penitenciárias brasileiras todas, sem exceção, das que investem fortunas nos presídios e cumprem todos os requisitos legais em sua manutenção, como as de São Paulo, até os mais sinistros chiqueiros onde se enfiam presos por esse interiorzão afora. 

O ministro disse que é tudo igual; deu três meses para o governo apresentar um “plano” que “resolva completamente”, nos próximos “três anos”, um problema de séculos. O interventor encarregado de mandar na área é o Conselho Nacional de Justiça uma aglomeração de burocratinhas que jamais colocaram o pé num xadrez em toda a sua vida.

Agora, com a aposentadoria roncando no calendário, Marco Aurélio inventou o “Estado de Coisas Inconstitucional” para a covid e o seu tratamento. Se o plenário do STF aceitar esse novo surto, os “entes federados”, sob “a coordenação do Executivo” ficam obrigados, entre outros disparates, a fazer “análise diária dos impactos na redução dos casos, fornecer “máscaras de pano multicamadas” para 210 milhões de pessoas, adotar “medidas de bloqueio”, orientar a população a ficar em casa e outros despropósitos que circulam entre a ignorância, a burrice e a preguiça mental. Marco Aurélio não ouviu, ao baixar essa sua bula, o Conselho Federal de Medicina ou qualquer outra entidade da área médica ou científica; apenas executou o pedido de “18 entidades de trabalhadores”.

Mergulhado na sopa ideológica que o STF cozinhou em torno da covid, o ministro acabou se metendo numa sinuca de bico. Denuncia a “inação” do governo federal mas nada diz sobre o fiasco das autoridades locais a quem o próprio STF deu autonomia plena para gerir a covid. Não foram elas que criaram o “Estado de Coisas Inconstitucional”? E agora: quem vai mandar na área? Os mesmos que fracassaram?  
Marco Aurélio não sabe. Também não sabe quem vai fazer, na prática, “a política concertada” que, segundo ele, é indispensável para lidar com a epidemia. O ministro diz apenas que o STF vai atuar “incentivando a formulação e a implementação de políticas públicas”. Fica reservado ao “Legislativo e ao Executivo” o “campo democrático das escolhas”. Deu para entender alguma coisa de útil? [com todas as vênias: os surtos do ministro Marco Aurélio e os do seu antecessor, outro ex-decano, leva os brasileiros à conclusão inarredável que prorrogar a idade da expulsória para 75 anos não foi uma boa.]
 
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo 
 

terça-feira, 18 de maio de 2021

O limite dos generais - O Estado de S. Paulo

Pedro Fernando Nery 

Portaria distorce decisão do STF em benefício de militares, em especial, os generais

Militares não se aposentam. Foi assim que sempre argumentaram as Forças Armadas para se livrar da equiparação das regras previdenciárias com civis. Militares se aposentam: e os ministros militares do governo são aposentados. É o que buscou a Defesa para se livrar do limite remuneratório (conhecido como teto). Argumenta-se que esses generais devem poder receber acima do limite/teto acumulando “aposentadoria” e o salário de ministro

Estariam, assim, incluídos nas decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU) que permitem excepcionalmente nesses casos que o teto remuneratório seja dobrado, aplicado separadamente a cada um dos pagamentos, e não à soma deles (aposentadoria+salário). [o que o POVO - que é quem paga a conta - quer saber não é se general, soldado, arrumador do caimento da toga e puxador de cadeiras (este, segundo o ministro Barroso, de extrema importância (clique aqui e vide 11º 12º parágrafo) - não é se eles estão acumulado aposentadoria x salário e, sim estranham que o Congresso Nacional edite uma LEI (CRIANDO O TETO REMUNERATÓRIO) e o STF e o TCU, editem decisões modificando o alcance da lei - tentação para os modificadores.

Deixa de valer, assim, o limite de R$ 39,2 mil, o salário de ministros do Supremo que é a remuneração máxima no serviço público. Com a dobra do limite feita, o chamado “teto duplex” iria para quase R$ 80 mil. É 70 vezes o soldo dos recrutas. A mudança decorre de uma portaria do Ministério da Economia (que, aliás, não diz como vai pagar, violando a Lei de Responsabilidade Fiscal). 

Militares da reserva com cargos no governo serão beneficiados, porque até então o acúmulo de salário e aposentadoria esbarrava no teto. Agora, o limite será o teto dobrado. Haverá aumentos para o presidente, mas principalmente para os generais. Segundo jornais, o vice Mourão receberia mais de R$ 63 mil mensais a partir de agora, os ministros Braga Netto, da Defesa, R$ 62 mil; Heleno, da Segurança Institucional, R$ 63 mil; e Ramos, da Casa Civil, R$ 66 mil. 

A alegação para a portaria seria o cumprimento de uma decisão do STF, que permitiu que o limite remuneratório de R$ 39,2 mil seja observado separadamente para aposentadoria e para salário. Seria, assim, um limite para cada vínculo. Mas militar na reserva perde o vínculo?

A Constituição prevê que a aposentadoria afasta o vínculo com o empregador, seja na iniciativa privada ou no governo. Só que militares sempre justificaram que não se aposentam, que há apenas uma “transferência para a reserva remunerada”, que seguem à disposição do Estado e que podem ser convocados.  O TCU também havia decidido em anos recentes que, “na hipótese de acumulação de aposentadoria com a remuneração decorrente de cargo em comissão, considera-se, para fins de incidência do teto constitucional, cada rendimento isoladamente”. A expressão usada é aposentadoria, o que não se aplicaria aos generais.

Mesmo no STF, a discussão no julgamento da questão não parece ter levado em conta os militares. Por exemplo, o ministro Lewandowski, para quem o teto de R$ 39,2 mil sobre aposentadoria+salário violaria a dignidade da pessoa humana, [e como fica a dignidade da pessoa, com trabalhadores que ganham  mil e poucos reais, salário mínimo, quando encontram  trabalho??? ou só os ministros são pessoas humanas?observou que a aposentadoria é contraprestação por décadas de contribuição.

Mas militares não contribuem para a transferência para a reserva (ou “aposentadoria”), porque esta não seria um benefício (já que ainda estão à disposição etc.). Não é exagero do colunista: caro colunista: antes de se auto-absolver no 'pecado' exagerar, sugerimos que faça um quadro comparativo entre as peculiaridades da carreira militar e as da civil. 30 anos de serviço de um militar, vale em termos de dedicação, desgaste físico, stress, por uns 50 de um trabalhador civil.

Dois exemplos: um militar ao cumprir serviço de 24 horas, cumpre expediente normal no dia seguinte = civil seria 12h trabalho  x 36 h de folga; em situação de prontidão, permanece por tempo indeterminado e muitas vezes sem oportunidade de descalçar do coturno.]  nenhum dos generais na reserva contribuiu sequer com um centavo em qualquer mês da carreira militar para o que agora querem considerar uma aposentadoria.  O argumento de que militar não se aposenta foi usado historicamente para evitar a imposição de idades mínimas para aposentadoria (90% sai da ativa com menos de 55 anos, 50% antes de 49), de contribuições de aposentados (como no serviço público civil) e de cálculo de aposentadoria com base na média salarial (como no INSS). Militares ainda têm a integralidade: vão para a reserva com 100% do maior salário. “Os militares nunca tiveram e não têm um regime previdenciário” escreveu Mourão em 2017 no texto “Por que os militares não devem estar na reforma da Previdência?”. O vice prometeu doar o dinheiro.

Agora, para pegar carona nas decisões do TCU e do STF autorizando o limite duplo para aposentados que recebem salário, o governo editou portaria estendendo o limite duplo para “militares na reserva”. As decisões não trataram desses casos, que exigiriam uma emenda à Constituição – já que é controverso o status dos militares da reserva. Qual o limite dos generais?

Pedro Fernando Nery - Doutor em economia - O Estado de S. Paulo


terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

TFBR - Com origem de esquerda e lava-jatista, Fachin assume lugar de Celso em críticas a Bolsonaro e militares - DefesaNet

Com a aposentadoria de Celso de Mello, o ministro Edson Fachin assumiu o posto no STF (Supremo Tribunal Federal) de principal crítico do presidente Jair Bolsonaro e da atuação política de militares.   Assim como fez o ex-decano da corte no início do atual governo, o magistrado tem alertado para eventuais riscos à democracia que a militância bolsonarista pode representar.

O último episódio de acirramento na relação entre o Supremo e o Palácio do Planalto surgiu justamente de uma nota em que Fachin responde ao ex-comandante do Exército Eduardo Villas Bôas e afirma ser “intolerável e inaceitável qualquer tipo de pressão injurídica sobre o Poder Judiciário”.   O ministro se referia às revelações do general da reserva de que a publicação de um tuíte em 2018 para pressionar a corte um dia antes do julgamento que levou à prisão do ex-presidente Lula (PT) foi elaborada por ele junto com “integrantes do Alto-Comando” das Forças Armadas.

Com as críticas aos militares e ao chefe do Executivo, Fachin manda sinais para a esquerda, responsável pela sua indicação ao STF e por quem é considerado inimigo político desde que assumiu a relatoria da Lava Jato na corte.  Não foi apenas no embate com Villas Bôas que Fachin criticou a movimentação política de militares. Em recente entrevista à Folha, o ministro citou a “remilitarização do governo civil” como um dos sete sintomas que revelam a existência da “corrupção da democracia” no Brasil.

E classificou como "preocupante" a presença do general Eduardo Pazuello no Ministério da Saúde. Relator da Lava Jato no STF, o magistrado será presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) entre fevereiro e agosto de 2022, ano de eleição presidencial, e tem apontado o comportamento de Bolsonaro como um risco ao sistema eleitoral brasileiro. Sem mencionar o presidente, ele listou à Folha a “recusa antecipada de resultado eleitoral adverso” e a “depreciação do valor do voto” como sintomas da corrupção democrática do país.

A afirmação ocorreu pouco mais de um mês depois de o chefe do Executivo ter declarado que o Brasil pode ter um “problema pior que nos Estados Unidos” caso não tenha voto impresso no pleito de 2022.   Bolsonaro fez referência à invasão do Congresso americano por uma multidão que não aceitava a vitória de Joe Biden contra Donald Trump, aliado do presidente brasileiro. Fachin, no entanto, teme que o risco no Brasil seja maior, uma vez que nos Estados Unidos não houve “adesão de lideranças políticas à tentativa de golpe nem ocorreu a atuação ilegítima das forças de segurança e das Forças Armadas”.

Em outra oportunidade, o ministro aproveitou o golpe militar em Mianmar do início deste mês para mandar recados ao Palácio do Planalto.  “O colapso da democracia, nesse norte, é semeado na pré-temporada do discurso. Na sombra das palavras jaz a sub-repção. Cumpre vigiar”, disse, por meio de nota, em 2 de fevereiro.
Naquele país, os militares alegaram fraude nas eleições, prenderam a cúpula do governo civil e assumiram o poder. Fachin foi o integrante do STF a comentar o tema de maneira mais enfática e disse que “ataques à credibilidade dos pleitos avultam como estratégias coordenadas" para "formar um caldo de cultura" que justifique a não aceitação do resultado das eleições.“Ao redor do planeta a perversa desmoralização das eleições invade a espacialidade discursiva como parte de projetos que visam ao colapso das democracias”, afirmou.

O ministro tem sido visto no tribunal como o sucessor de Celso de Mello, que se aposentou em outubro do ano passado, no enfrentamento com Bolsonaro e com a participação política de militares no governo. Em maio do ano passado, no auge da crise entre os Poderes, quando Bolsonaro participou de manifestação que pedia fechamento do Congresso e do Supremo em frente ao Quartel General do Exército, o então decano deu a declaração mais dura de um ministro da corte contra o presidente.   "Guardadas as devidas proporções, o 'ovo da serpente', à semelhança do que ocorreu na República de Weimar (1919-1933) parece estar prestes a eclodir no Brasil", afirmou em mensagem enviada a outros ministros do Supremo.

Agora, apesar de ainda não ter feito uma comparação tão pesada, Fachin tem adotado a mesma linha de alertar para o risco dos ataques da militância bolsonarista às instituições.  Esta também é uma forma de o ministro tentar se reconciliar com a esquerda, que garantiu sua ascensão ao Supremo e passou a criticá-lo pela defesa que faz da Lava Jato.  A posição favorável à operação e crítica do atual governo, porém, faz com que seja criticado por ambos os campos políticos.

Após comentar as revelações de Villas Bôas sobre os bastidores da publicação de um tuíte às vésperas do julgamento de Lula, o ministro foi ironizado pelo próprio general da reserva pelo fato de a reação ter ocorrido três anos depois e também foi contestado pelo petista.   Na última quinta-feira (18), em entrevista ao UOL, o petista questionou o momento escolhido por Fachin para comentar o caso. "Por que o Fachin veio falar agora, três anos depois? Por que se acovardou na hora?", disse.

Em 2015, porém, a maior parte do PT apoiou e comemorou a escolha de Fachin. Na época, a então presidente Dilma Rousseff (PT) já estava com a popularidade em baixa e enfrentava críticas inclusive da esquerda por ter adotado uma linha econômica mais liberal ao nomear Joaquim Levy no Ministério da Fazenda. A presidente, então, decidiu nomear Fachin como um aceno a partidos considerados progressistas e aos movimentos sociais.

Advogado de carreira, ele contava com extenso currículo acadêmico, mas os questionamentos surgiram devido à vinculação com o partido da então presidente. Em 2010, Fachin chegou a participar de um evento em apoio a Dilma e a ler um manifesto, em nome de inúmeros juristas, a favor da eleição da petista. O ministro chegou ao Supremo de maneira discreta. O magistrado não costuma dar entrevistas e usa uma linguagem mais técnica ao proferir seus votos.

No início de 2017, porém, Teori Zavascki, que era o relator da Lava Jato, morreu em um acidente de avião, e Fachin agiu para assumir seu lugar à frente da operação que gozava de amplo prestígio popular. Desde então, tornou-se um dos principais defensores da operação que levou à debacle do PT. Como consequência, passou a ser criticado pelo partido que era próximo e o indicou ao Supremo.

Filhos

O vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) escreveu em 2019, em uma rede social, que por vias democráticas as mudanças rápidas desejadas no país não aconteceriam. A postagem do filho do presidente foi alvo de críticas de políticos e da OAB, que viram nela uma ofensa ao sistema democrático brasileiro.

Já o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) afirmou, em entrevista à jornalista Leda Nagle, que "se a esquerda brasileira radicalizar, uma resposta pode ser via um novo AI-5". "Se a esquerda radicalizar a esse ponto, a gente vai precisar ter uma resposta. E uma resposta pode ser via um novo AI-5, pode ser via uma legislação aprovada através de um plebiscito como ocorreu na Itália. Alguma resposta vai ter que ser dada"

Ministros
Após a fala polêmica de Eduardo sobre o AI-5, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Augusto Heleno, disse em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que editar um "novo AI-5", como sugeriu o deputado, exigiria estudos. "Não ouvi ele falar isso", afirmou.
"Se falou, tem de estudar como vai fazer, como vai conduzir. Se houver uma coisa no padrão Chile [referência a protestos que se espalharam pelo país em 2019 e 2020], é lógico que tem de fazer alguma coisa para conter."

O ministro da Economia, Paulo Guedes, também minimizou a declaração de Eduardo? 

DefesaNet -  Transcrito em 23 fevereiro 2021


terça-feira, 27 de outubro de 2020

Comando do Exército entra em alerta com possível nomeação de Ramos

Radar - Robson Bonin

Interlocutores da cúpula da instituição afirmam que há movimento no Planalto para aparelhar politicamente a tropa 

A fritura de Luiz Eduardo Ramos na semana passada fez surgir no comando do Exército uma dessas histórias de arrepiar a ala da caserna avessa à politicagem do generalato de pijama. Pela conversa, Jair Bolsonaro colocaria o ministro da Secretaria de Governo no comando do Exército e colocaria no Planalto o atual comandante da tropa, Edson Pujol. Augusto Heleno levaria outro cargo desses que mais parecem complemento de aposentadoria. 

O problema da suposta articulação no Planalto está na resistência da caserna ao nome de Ramos. “Não é só que os integrantes do alto comando não gostam de Ramos, eles não toleram a mistura da instituição com politicagem”, diz ao Radar um interlocutor da cúpula do Exército. 

Radar - Veja Online

[pensando alto: soa estranho, porém, possível, o ministro Ramos assumir comando da tropa após passar para a reserva - nada impede;
caso a notícia acima, que também parece um balão de ensaio, se concretize, teremos um político voltando a comandar tropas e um militar de tropa exercendo cargo político.
Porém, 'missão dada, missão cumprida'.]
 


quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Colegas de toga impõem constrangimento público a Marco Aurélio

Alexandre Garcia

STF e o caso André do Rap

Decisão do ministro Marco Aurélio Mello que soltou André do Rap foi bastante contestada por colegas do STF.

Plenário desaprova ato de Marco Aurélio
Nesta quarta também foi o dia em que o plenário da Corte constitucional do Brasil se deu ao trabalho de julgar o caso de habeas corpus de um traficante de drogas. Como eu já disse, estão dando muita importância para esse André do Rap. O processo dele deveria ter sido decidido em primeira instância. [não resistimos a lembrar: o STF já se ocupou em julgar se banheiros públicos podem ser unissex ou não. Assim, ...]
A decisão do STF de manter a ordem de prisão do traficante foi uma espécie de reprovação ao ministro Marco Aurélio Mello, que irá se aposentar no ano que vem. Mas, depois dessa situação triste, ele deveria até pedir uma antecipação dessa aposentadoria, faria bem a ele. Mais triste ainda foi o recado que o caso André do Rap passa às nossas crianças. Elas provavelmente não terão a oportunidade de serem ricas e famosas e veem o exemplo de um traficante que tem tudo isso.

O André do Rap já está mais famoso que o Fernandinho Beira Mar. Ele passou cinco anos se escondendo com sucesso da polícia. As crianças pensam: “poxa, como ele é capaz?”; “como o tráfico de cocaína dá dinheiro”.  Ele pode ter virado um símbolo para meninos e meninas que não tem muita chance na vida de terem todo esse dinheiro e essa fama. O sujeito teve o nome completo repetido em todos os jornais. É uma pena a gente ver isso.

O presidente da República, Jair Bolsonaro, ironizou a notícia de que ele estaria acabando com a Lava Jato. Ele falou que, “se tiver corrupção no meu governo, boto para fora com uma voadora no pescoço”. A declaração foi bem ao estilo dele.
Disse ainda que a Polícia Federal estava em Roraima deflagrando uma operação contra o superfaturamento de emendas parlamentares para combate à Covid-19. O desvio teria chegado a R$ 20 milhões. A operação, entre outros, investiga o senador Chico Rodrigues (DEM-RR).

Processo contra Lula está travado pelo STF
Esta quarta-feira (14) foi um dia triste para a Justiça. Primeiro um dos processos contra o ex-presidente Lula está travado em Curitiba por causa de uma decisão do Supremo Tribunal Federal. O problema é que parte desses crimes prescrevem em dezembro e o ex-presidente pode sair impune.

O processo estava concluído, pronto para sair a sentença, mas o STF mandou voltar à fase das alegações finais e depois quis dar acesso à defesa de Lula ao acordo de leniência firmado com a Odebrecht. O Ministério Público Federal pediu que o caso seja retomado o mais rápido possível.

Excelente notícia aos motoristas profissionais
Ainda faltam seis meses para entrar em vigor as mudanças no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) sancionadas pelo presidente Bolsonaro, embora a decisão tenha sido publicada nesta quarta, no Diário Oficial da União.

O prazo de validade da carteira de motorista para quem ainda não tem 50 anos passa a ser de 10 anos. Dos 50 aos 70 anos terá que fazer a renovação de cinco em cinco anos e quem tem mais de 70 anos terá que renovar a habilitação a cada três anos. Para perder a carteira de motorista será necessário 40 pontos, o dobro do que antes era permitido, salvo se houver alguma infração gravíssima. Vai ser preciso muita infração média e leve para perder a habilitação.

Caso haja uma infração gravíssima, esse número cai para 30 pontos; e se houver duas continua sendo necessários 20 pontos. Para os motoristas profissionais, que dirigem todos os dias a trabalho, essa é uma excelente notícias direitos reservados.

Alexandre Garcia, jornalista - Gazeta do Povo - Vozes


https://www.gazetadopovo.com.br/vozes/alexandre-garcia/

quinta-feira, 20 de agosto de 2020

Os fura-teto - Carlos Alberto Sardenberg

Coluna publicada em O Globo - Economia 20 de agosto de 2020

Estão tentando fazer com o teto de gastos do governo federal a mesma coisa que fizeram com o teto salarial do funcionalismo público. Pela lei, nenhum funcionário poderia ganhar mais que R$ 39,2 mil brutos, o salário de ministro do Supremo Tribunal Federal, aliás reajustado recentemente, em 2019. Mas muitos servidores ganham mais, muito mais. Gambiarras diversas, inscritas na lei, em regulamentos ou interpretações do judiciário, fizeram com que várias “verbas” fossem classificadas como extratexto. Há anos que se faz assim.

Antes, o salário-teto era o do presidente da República, hoje de R$ 30,9 mil. Isso valia também para os ministros do STF, mas estes deram um jeito de ultrapassar o do presidente e, assim, o teto subiu. E todas as demais carreiras foram em busca do novo patamar.
Mas o golpe mais eficiente, para eles, claro, e não para o contribuinte que paga os impostos, é a invenção do extratexto. Isso permite acumular salário com o que chamam de “vantagens pessoais”, como determinados auxílios (educação, saúde, etc.) e aposentadorias.

Pelo espírito da regra – ou seja, se a gente entender o óbvio, que teto é teto – tudo o que passasse dos R$ 39,2 mil simplesmente deveria ser abatido. Mas não é. O próprio Bolsonaro tem direito ao salário de presidente, mais duas aposentadorias, uma da Câmara dos Deputados, outra do Exército, como capitão reformado. [se  o funcionário  fez jus as duas aposentadorias por tempo de serviço, tempo de contribuição e na forma da lei - vigente na época da aposentadoria - e, posteriormente, passou a exercer uma função de forma legal que lhe vale novo salário, nada mais justo que o teto não seja aplicado sobre a soma total dos rendimentos.
Mas sendo a aposentadoria ou aposentadorias decorrentes de invalidez ou qualquer outro motivo que impedisse o beneficiário de trabalhar, nada mais justo que voltando a trabalhar (em outro emprego, cessando a invalidez) as aposentadorias recebidas fossem suspensas.
A situação do presidente Bolsonaro ocorre dentro da estrita legalidade, afirmamos sem receio de erro, pela simples razão de houvesse a mais remota possibilidade de ilegalidade, os inimigos do presidente Bolsonaro = inimigos do Brasil, da democracia e da liberdade = já teriam recorrido à Justiça para cancelar.
Uma das vantagens que torno o capitão o herói de todos os brasileiros é exatamente ser público e notório que qualquer ilegalidade que envolva o presidente Bolsonaro, será de pronto combatida.
Não combatem,  prova incontestável que nada existe de ilegal.]

É quase um padrão por todo o serviço público, a acumulação de um salário da ativa com alguma ou algumas pensões. Isso, em si, já está errado. Ou o sujeito está trabalhando ou parado. Se a pessoa volta ao serviço ativo, deveria perder a aposentadoria, como acontece em muitos países.  De tempos em tempos, o Congresso aprova alguma lei dizendo que teto é teto, sem penduricalhos ou puxadinhos, como classificou uma vez a ministra Cármen Lúcia, do STF. É só aprovar a lei que começam as ações judiciais para recuperar o extratexto.

Agora mesmo, está na gaveta do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, um projeto de lei dizendo de novo que o teto é R$ 39,2 mil – e acabou. Está lá. Mas aparentemente Maia ainda não encontrou um momento, digamos, oportuno, para colocá-lo em votação. Talvez tenha medo da repercussão negativa que haveria caso o projeto fosse esmagadoramente derrotado. E, assim, não apenas o pessoal consegue avacalhar o teto salarial, como tenta agora avacalhar a lei de 2016, pela qual a despesa do governo federal de um ano deve ser igual à do ano anterior mais a inflação.  Dizem que isso vai contrair gastos com saúde e educação, mas na verdade a preocupação é com a possibilidade de não se permitir aumentos salariais para o funcionalismo. [os funcionários públicos, - servidores públicos que não são MEMBROS de Poder ou do MP - não recebem aumento faz algum tempo, bem antes da pandemia.]

O economista Alexandre Schwartsman publicou artigo no site Infomoney e no seu próprio blog (“O teto e a raça: o que dizem os números) mostrando que os gastos sociais, generalizando, aumentaram, sim, depois da lei do teto. Por exemplo: despesas com a função Saúde saltaram de R$ 143,3 bilhões em 2016 para R$ 153,3 bilhões em 2019, em valores constantes. Mais interessante ainda: a função “Proteção Social” (previdência e assistência social) foi de R$ 871,4 bilhões para R$ 938,2 bilhões, no mesmo período.
Schwartsman mostra ainda que o gasto com “remuneração de empregados” saltou de R$ 280,5 bilhões em 2016 para R$ 305,8 bilhões no ano passado, também em valores constantes.

Finalmente, os dados da PNAD (IBGE) mostram que o rendimento médio do trabalhador brasileiro no setor privado é de R$ 2 mil/mês; dos estatutários, R$ 4,3 mil.
[um dos problemas que puxa o Brasil para trás é a mania de distribuição de renda, reduzindo salários = distribuição de pobreza.
Em passado não muito distante a regra era: 'esperar o bolo da riqueza crescer, para distribuir' = ainda hoje é esperado.
Agora se o setor público ganha mais que o privado, sempre tentam reduzir o salário do servidor público para o patamar do empregado privado. Se ambos ganham mal - a suposta vantagem do servidor público é quando seu rendimento é comparado com o do empregado privado, cujo salário é pior  - reduzir do que ganha um pouco mais é distribuir miséria e não igualdade.]
Esse dado permite duas observações. Uma, óbvia, que o servidor ganha mais de duas vezes do que as demais categorias. Segunda, e talvez mais importante, registra a imensa desigualdade dentro do funcionalismo. Se o teto é teto R$ 39,2 mil mais os extras e a média é de R$ 4,3 mil, é sinal de que muitos funcionários ganham mal. E são em geral os trabalhadores mais próximos do público e mais longe de Brasília.
Mas toda vez que surge o debate, sindicatos do funcionalismo argumentam com os salários mais baixos. Seria importante que esses funcionários mal remunerados percebessem que poderiam ganhar mais se os de cima ganhassem menos. [percebem, mas os de cima são os de cima que quando interpretam algum questionamento contra alguém que ganha muito, tem presente que a decisão de agora pode ser estendida a ele em futuro não muito distante.]

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 




quinta-feira, 16 de julho de 2020

José Dirceu receberá quase R$ 10 mil de aposentadoria pela Câmara [O crime compensa? [Zé Dirceu diz que sim]

José Dirceu receberá quase R$ 10 mil de aposentadoria pela Câmara 

[O crime compensa?  Zé Dirceu diz que sim. Condenado a dezenas de anos e em liberdade, passa a receber mais um penduricalho,  debochando dos milhões de brasileiros que se contaminam usando  coletivos superlotados em busca de uma aposentadoria ínfima. 

E, ao que nos consta, o criminoso petista não devolveu nem um centésimo do que roubou.]

O Tribunal de Contas da União concedeu aposentadoria a José Dirceu. Condenado a 30 anos, 9 meses e dez dias de reclusão na Operação Lava-Jato, por corrupção e lavagem de dinheiro, o ex-ministro e ex-deputado federal receberá um benefício mensal de R$ 9.646,57.

A análise feita pela Corte considerou o tempo de 10 anos e 10 meses que Dirceu teve de mandatos eletivos na Câmara dos Deputados para conceder a aposentadoria. O ex-parlamentar ingressou na Casa em 1991 e deixou o Legislativo federal em 2007.
Além de Dirceu, foram contemplados com a aposentadoria o ex-ministro da Saúde José Saraiva Felipe e os ex-deputados federais José Mentor Guilherme de Mello Netto e José Linhares Ponte, também investigados pela Lava-Jato.

coluna Brasília-DF

terça-feira, 26 de maio de 2020

O investigado e o investigador - O Globo

José Casado


Visita do presidente Bolsonaro à PGR expõe Augusto Aras

Bolsonaro e Aras ainda ruminam a derrota no Supremo

Jair Bolsonaro fez uma visita surpresa a Augusto Aras, procurador-geral da República. Foi à procuradoria apenas para “apertar a mão do nosso novo colegiado maravilhoso da PGR”. Recebeu “a alegria de sempre”, segundo Aras. Teria sido mais um encontro imprevisto, fechado e rápido, se Bolsonaro não fosse um investigado e Aras o seu investigador em inquérito sobre crimes de responsabilidade na Presidência. Esse detalhe deu relevo à cena de ontem, em Brasília.

Ambos ainda ruminam a derrota no Supremo, na divulgação dos registros da reunião ministerial de abril. Aras pediu ao juiz Celso de Mello uma censura muito mais abrangente do que a solicitada pela defesa do presidente. Argumentou que a transparência ao público, reivindicada por outro investigado, o ex-ministro Sergio Moro, daria à oposição chance de “uso político, pré-eleitoral (2022)”, criando “instabilidade” e “querelas”.

O juiz respondeu-lhe em 55 páginas. Lembrou a Aras que, no regime democrático, o Ministério Público não pode sequer manifestar a “pretensão” de restringir o direito de investigado ou réu em ver produzidas ou ter acesso a provas que possam favorecê-lo. A Constituição impõe publicidade aos atos de agentes públicos, observou. E, no caso, nem o governo se preocupara em tratar a reunião com sigilo.

Aras perdeu a batalha, mas tem o poder final de denunciar — ou não — o presidente. Pode decidir antes da aposentadoria do juiz Celso de Mello, em novembro. [o procurador-geral deixará para apresentar a denúncia quando (se) houver provas - ocasião adequada para se apresentar qualquer tipo de denúncia.] Ou deixar para a época de sucessão na Procuradoria-Geral e de escolha do substituto de outro que se aposentará no STF, Marco Aurélio Mello. De toda forma, Bolsonaro o deixou exposto na visita de ontem.

O presidente abstraiu a pandemia e segue em campanha pela reeleição. No roteiro incluiu o domínio de agências de espionagem, órgãos de controle externo e o Ministério Público. Ano passado, apresentou critérios peculiares para escolha do procurador-geral. Na essência, desejava a virtual conversão da PGR em anexo do Planalto. Bolsonaro, agora, só depende de Aras.

José Casado, colunista - O Globo


terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Imposto do desemprego - Nas entrelinhas

O governo deixará de arrecadar cerca de R$ 10 bilhões em cinco anos, mas a compensação viria na mudança das regras do seguro-desemprego


Na mensagem enviada ao Congresso Nacional, ontem, o presidente Jair Bolsonaro anunciou suas prioridades para 2020, focadas na agenda econômica: reforma tributária, MP do Contribuinte Legal, independência do Banco Central, privatização da Eletrobras, promoção do equilíbrio fiscal e novo marco regulatório do saneamento. As propostas foram bem recebidas no Congresso, que começou o ano politicamente esvaziado. O ministro da Casa Civil, Ônyx Lorenzoni, cuja pasta foi esvaziada, fez uma entrega protocolar da mensagem. Bolsonaro estava em São Paulo, com o ministro da Educação, Abraham Weintraub, outro que anda em baixa no governo, para inaugurar um colégio militar.

A única proposta de caráter social entre as prioridades do governo é o Programa Verde Amarelo, cujo objetivo é combater o desemprego. O grande jabuti é o desconto de 7,5% de contribuição no seguro-desemprego. Lançada em novembro passado, a proposta já está sendo ironizada no Congresso, onde é chamada de imposto do desemprego, e deve ser rechaçada pela Câmara, ainda mais num ano eleitoral, como aconteceu com outras propostas do ministro da Economia, Paulo Guedes, como a recriação da contribuição sobre operações financeiras e o chamado “imposto do pecado”, a supertaxação do cigarro e da bebida, rechaçada pelo próprio presidente Bolsonaro.

O governo deixará de arrecadar cerca de R$ 10 bilhões em cinco anos, mas a compensação viria na mudança das regras do seguro-desemprego, que possibilitaria uma arrecadação de R$ 12 bilhões em cinco anos. Em compensação, o período de recebimento do seguro-desemprego passaria a contar para a aposentadoria. O Programa Verde Amarelo mira o desemprego, com regras que flexibilizam a legislação em relação ao trabalho aos domingos e feriados, às férias e ao 13% salário. É destinado a trabalhadores que recebam até 1,5 salário-mínimo, em contratos de 2 anos. Estima-se que 500 mil pessoas poderão ser contratadas com a mudança.

Outra proposta do programa é a concessão de R$ 40 bilhões para até 10 milhões em microcrédito, destinados a pequenos empreendedores. De acordo com o governo, os recursos serão direcionados à população de baixa renda, aos “desbancarizados” e aos pequenos empreendedores formais e informais. Outra meta é reinserir no mercado de trabalho 1 milhão de pessoas afastadas por incapacidade, pela via da reabilitação física e habilitação profissional. Também está prevista a contratação de 380 mil pessoas com necessidades especiais.,

Coronavírus
O governo está levando a sério a ameça de epidemia de coronavírus chegar ao Brasil, que já tem 14 pessoas infectadas. Ontem, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, anunciou que o Brasil, mesmo sem casos confirmados de infectados com coronavírus, vai reconhecer estado de emergência em saúde pública. A medida pode viabilizar a retirada dos brasileiros que estão na província de Wuhan, na China, o epicentro da epidemia, que está isolada. De acordo com o Ministério da Saúde, a escolha do local onde será a quarentena dos brasileiros trazidos da China ficará a critério do Ministério da Defesa. Provavelmente, uma base militar, em Florianópolis, em Santa Catarina, ou em Anápolis, em Goiás.

O ministro cita três razões para a quarentena: primeiro, a cidade de Wuhan escolheu fazer um isolamento. Quando se entra em um local de quarentena, se mantém em estado de quarentena. Segundo, lá estão concentrados 67% de todos os casos. Terceiro, quando se traz pessoas de várias regiões do país, elas seriam espalhadas para vários estados do Brasil, daí a necessidade de manter todos eles juntos. O ministro não falou, mas existe uma quarta razão: o sistema hospitalar no Brasil não está em condições de enfrentar uma situação na qual o vírus seja transferido de pessoa a pessoa, seria uma tragédia sem igual, desde a gripe espanhola. A saída é aumentar a vigilância epidemiológica nos aeroportos e portos e isolar os casos suspeitos imediatamente.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - Correio Braziliense

 

sábado, 25 de janeiro de 2020

Militarização do serviço público - O Estado de S.Paulo

Adriana Fernandes

Entrou no radar o risco do avanço do aparelhamento militar no funcionalismo

A judicialização da lei que permite a contratação temporária de militares da reserva para trabalhar em atividades de servidores públicos civis é dada como certa em Brasília. Lideranças políticas avaliam como equivocada a decisão do Congresso de ter aprovado a inclusão do artigo 18 na Lei 13.954, que trata das mudanças nas carreiras e aposentadoria das Forças Armadas. O artigo permite que o militar da reserva (inativo) seja contratado para o desempenho de atividades de natureza civil com o pagamento de um adicional igual a 30% da remuneração que estiver recebendo na inatividade.
 
[a judicialização já é esperada, por diversas razões. Algumas:
 
- interessa a turma dos que são contra o Brasil, a turma do 'quanto pior, melhor', para eles pouco importam que a fila de requerimentos de benefícios do INSS já ultrapasse o milhão  de pedidos e aposentados, idosos, deficientes, até morram antes de receber alguma coisa;
 
- o Brasil, pós 'constituição cidadã', judicializa tudo - até uso de banheiro público é assunto que aguarda ser pautado no STF.

Todos fingem não saber que contratar, via concurso público, pessoas para prestarem serviços temporários ao Governo é um processo extremamente burocrático, demorado e complicado.
Realizar um concurso público para alguns milhares de pessoas serem contratadas para o Serviço Público - INSS, por um período entre seis a doze meses, vai custar milhões de reais que poderiam ser utilizados para custear parte do valor da contratação dos temporários.

Contratar sem concurso público é ilegal e até criminoso.

Optando pela contratação de militares da FF AA, já na reserva, está sendo atendido o quesito concurso público - os militares prestaram concurso público e estão capacitados a executar os serviços que a eles serão destinados - cuidarão do atendimento direito ao público, sendo que a análise dos processos continuará com o pessoal técnico do INSS, já capacitado.
 
Receberão 30% do que recebem na reserva,  a título de gratificação extraordinária. Na maior parte dos casos, o valor será inferior ao que terá que ser despendido com a contratação de servidores civis, concursados.
Lembrando, que a contratação será entre um semestre a um ano.
O IBGE, faz algum tempo, está realizando concurso para pessoal temporário - censo 2020 -   e o processo está lento, com risco de atraso no inicio do censo.]

Com a lei, o risco do avanço do aparelhamento militar do serviço público no governo Jair Bolsonaro entrou no radar. Esse já era um tema recorrente no período de transição de governo, antes mesmo de o presidente ter tomado posse no cargo.  O movimento só ficou mais claro depois que o governo anunciou que iria contratar uma força-tarefa de 7 mil militares que já estão na reserva para acabar com a fila de mais de 1,3 milhão de pedidos de benefícios do INSS.

Ele acontece no momento em que o Ministério da Economia anunciou que não haverá concursos públicos tão cedo por causa da necessidade de reduzir os gastos da folha de pessoal, um dos itens de despesas obrigatórias que mais pesam no Orçamento da União. Só concursos muito pontuais e estratégicos, como o da Polícia Federal, vão ocorrer até o final da administração Bolsonaro. Com uma mão, o governo aperta os concursos e com a outra chama os militares da reserva pagando a gratificação. Situação que poderá se repetir em outras áreas do serviço público federal, sobretudo, nas chamadas atividades-meio. Atribuições de carreiras de Estado, como auditores fiscais da Receita, não poderão ser alcançadas porque têm regras mais rígidas incluídas em lei.

De certo é que a nova lei dos militares, que apertou as regras de aposentadoria, mudou a estrutura das carreiras militares e reajustou os salários, acabou abrindo o caminho para uma maior militarização do serviço público.

A ficha caiu só agora.
A lei foi aprovada no fim do ano passado, no rastro da aprovação da reforma da Previdência, e em meio à negociação final do Orçamento deste ano. Agora, há uma articulação para a apresentação de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) depois do fim do recesso do Legislativo. As negociações do governo com o Tribunal de Contas da União (TCU) para fechar um acordo para a contratação temporária para acabar com a fila podem dar um parâmetro, um limite, para o movimento da militarização.

O ministro Bruno Dantas do TCU analisa pedido de liminar do Ministério Público junto ao tribunal para suspender a contratação. O TCU tem a competência de barrar contratos considerados ilegais e exigiu do governo que ampliasse a contratação para civis para trabalhar no INSS temporariamente. O Ministério da Economia propôs como solução a contratação de servidores aposentados do INSS. O acordo vai sair na próxima semana. Em jogo, os planos do presidente Bolsonaro. Por isso, a importância da decisão.

Antes disso, o Palácio do Planalto, que não gostou da resistência do TCU, correu para publicar em edição extra do Diário Oficial da União decreto que regulamenta a contratação de militar. O decreto foi assinado pelo presidente em exercício, Hamilton Mourão, e não se restringe ao caso do INSS. A contratação dos militares poderá ser feita por outros órgãos. Mourão foi um dos integrantes do alto escalão do governo que botou lenha na fogueira na polêmica com o TCU. Sem estar muito a par das negociações com o tribunal, entrou em campo para avisar que, em vez de contratar, o governo convocaria os militares para trabalhar na fila do INSS. O presidente em exercício recuo logo em seguida. Mas a fala dele teve eco na Esplanada. A conferir cenas dos próximos capítulos.

Adriana Fernandes, jornalista - Coluna em O Estado de S.Paulo