Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER

sexta-feira, 29 de maio de 2020

Com que forças conta Bolsonaro? - Míriam Leitão

O Brasil está em situação grave. Os militares do gabinete e o ministro da Defesa acham que o presidente Jair Bolsonaro tem razão e só fazem reparos ao tom. Acreditam que, sim, o Supremo Tribunal Federal (STF) está exorbitando de suas funções. Não está, mas a opinião dos militares dos quais se cercou o reforça, e ele então decide escalar e assim fortalece sua militância. Por outro lado, na reforma da Previdência foi feito um grande agrado às polícias militares, com a extensão aos PMs do benefício dado às Forças Armadas: a manutenção da integralidade e da paridade. Isso aumentou o apoio das PMs ao presidente. Bolsonaro ontem fez ameaças ao Supremo e ao ministro Celso de Mello. Quem vai impor limites? Perguntei isso a uma alta autoridade, e ouvi que as instituições já estão impondo limites.

[os brasileiros, com raras exceções, sempre interpretam as situações destacando a opção mais chamativa, mais danosa.
Que tal interpretar as palavras do presidente - uma citada no parágrafo adiante - como um alerta avisando que não mais tolerará agressões ao Poder Executivo, à Constituição, e, as combaterá via judicial, com recurso à Suprema Corte?
Somem a interpretação proposta com atos concretos do presidente Bolsonaro = combatendo via Supremo à convocação do ministro Weintraub e também o inquérito das fakes news.
Experimentem.] 



Na visão dessa autoridade, o que os ministros Celso de Mello e Alexandre de Moraes estão fazendo é impondo limites. O plenário do STF tem feito isso também. Câmara e Senado, quando mudam propostas ou rejeitam projetos, estão avisando ao presidente quais são as fronteiras entre os poderes. As instituições estão fazendo um risco no chão — disse essa autoridade.

A já tradicional gritaria matinal foi, ontem, mais estridente. Cada palavra foi bem estudada. E a entonação. Quando ele elevou a voz para dizer “Acabou, porra!” estava enviando mensagem à militância. Tudo o que faz ou diz é gravado para ser usado em campanhas ou no seu projeto autoritário. Para esse uso foi gravada a reunião ministerial. O filho 03 foi de novo escalado para ameaçar a democracia. A fala do deputado Eduardo é de que não é uma questão de “se” mas de “quando” acontecerá a “ruptura”. Foi dita na noite da quarta-feira para acalmar a militância de extrema-direita assustada com a operação de busca e apreensão do inquérito das fake news. O projeto de Bolsonaro é este mesmo: a ruptura. Adianta pouco as negativas de que não haverá golpe militar porque as democracias morrem de outra maneira.

O Supremo Tribunal Federal está em duas encrencas. O tribunal aprovou o fim da condução coercitiva do investigado (ADPFs 395 e 444). E se Abraham Weintraub não atender à ordem do ministro Alexandre de Moraes? A segunda encrenca é o início polêmico desse inquérito. Foi aberto de ofício, o ministro Alexandre de Moraes foi nomeado sem sorteio e tropeçou no início com a censura à revista “Crusoé”. Ao longo do tempo, contudo, o processo ganhou relevância política, não porque mirou a direita, mas porque está investigando indícios de crime.

Os próprios militares que estão no governo não defendem o que um deles definiu para outro alto integrante do poder como “milícia digital”. Mas o presidente colocou toda a força da presidência para defender exatamente essa milícia digital, investigada pelo Supremo. “Com dor no coração ouvi aqueles que tiveram a sua casa violada,” disse o presidente. “Essa mídia social me trouxe à presidência.”  Bolsonaro está deliberadamente fazendo uma confusão entre liberdade de expressão e o crime de divulgar fake news, caluniar, difamar, organizar-se para atacar através de robôs, contratar empresas de disparos em período eleitoral, financiar manifestações antidemocráticas. É isso que está sendo investigado. O grande desafio da democracia é criar antídotos contra esses ataques às instituições. O Congresso também prepara uma lei dura para evitar o uso criminoso das mídias sociais. As próprias plataformas estão estabelecendo normas. Não é ameaça à liberdade de expressão. O presidente sabe disso.

Ele está claramente querendo intimidar o Judiciário. Por efeito bumerangue, conseguiu aumentar a união dentro da Corte, como se viu no curto e claro discurso do ministro Luiz Fux, avalizado por Dias Toffoli, em defesa de Celso de Mello. Bolsonaro acredita que neutralizou o Ministério Público com a nomeação de Augusto Aras, a quem ofereceu ontem publicamente o cargo de ministro no STF. Acredita que consegue o apoio das Forças Armadas, pelas vantagens que deu aos oficiais, e que tem o respaldo das PMs, pelo ganho dado aos policiais militares.
Durante a tarde, enquanto Bolsonaro conversava com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, mandou o recado: – É bom dialogar, mas é bom ficar claro que nós vamos continuar reafirmando que a nossa democracia é o valor mais importante do nosso país e as instituições precisam ser respeitadas.
Bolsonaro tentará ignorar recados e passar por cima dos limites.

Míriam Leitão, jornalista - com Alvaro Gribel, São Paulo

Caneta sem tinta - Merval Pereira

O Globo

Ataques à democracia

STF riscou uma linha de onde não admitirá que Bolsonaro passe 

[será que o Supremo Tribunal Federal, órgão colegiado, vai estimular atritos com o presidente Bolsonaro por este ao proferir  "acabou', não mais tolerar, chega" estava alertando que sempre que entender necessário, recorrerá àquela Suprema Corte para combater atos que interfiram na independência do Poder Executivo? ] 
Para além desse sentimento até mesmo de autopreservação, não fosse a ameaça à democracia, os ataques ao decano do STF, ministro Celso de Mello, tornaram-se exemplares da falta de limites desses militantes, que o decano classificou de “bolsonaristas fascistóides”. Celso de Mello, aliás, já previa os problemas que a radicalização política poderia causar à democracia no país. Em 2018, com problemas de saúde que o impediam de se locomover normalmente, pensou em se aposentar. Começou mesmo uma conversa sobre seu substituto, e indicou indiretamente ao presidente Michel Temer que se sentiria feliz se a advogada-geral da União, Grace Mendonça, fosse indicada para sua vaga. [será que a permanência na ativa do decano do STF não se tornou fonte de tensão? com sua aposentadoria as coisas poderão se acomodar.
será que tentar indicar seu substituto não configurou uma interferência?]

No final do ano, com a polarização política acirrada na campanha presidencial, ele avisou a Grace que continuaria até o final de seu período, e entrará na compulsória por fazer 75 anos, em novembro.
A operação de busca e apreensão da Polícia Federal de quarta-feira, que tanto incomodou o presidente Bolsonaro, estava prevista há pelo menos um mês, e só não foi realizada antes devido à pandemia, como noticiei na minha coluna “Golpe frustrado”, de 22 de abril.

Como já havia a perspectiva de que Bolsonaro estava tentando interferir na Polícia Federal na saída do então ministro da Justiça Sérgio Moro, o ministro Alexandre de Moraes determinou que fosse mantida a mesma equipe da PF que trabalhava no caso há um ano. Com isso, evitou que a operação pudesse ser inviabilizada por questões burocráticas ou vazamentos com viés político.  Os membros do Supremo riscaram uma linha de onde não admitirão passar os desmandos do presidente e seus seguidores. Em consequência, as duas novas tentativas do governo de reverter decisões do Supremo têm chances próximas de zero de vingar, tanto o habeas corpus a favor do ministro Abraham Weintraub, quanto o pedido de fim do inquérito sobre fake news feito pelo Procurador-Geral da República, Augusto Aras.

Há uma jurisprudência firmada de que o tribunal não deve receber pedido de habeas corpus contra atos de seus ministros. [a jurisprudência pode ser mudada? sim, nada é permanente - nem a CPMF conseguir ser.] Quanto ao inquérito, mesmo os que, a princípio, consideraram que era uma demasia do presidente Dias Toffoli, hoje entendem que os fatos descobertos nas investigações justificam sua existência, indo muito além da auto defesa que parecia ser o objetivo inicial. Trata de ataques à democracia. Além do mais, iniciado de maneira equivocada, esse inquérito foi colocado nos eixos muito devido às críticas que recebeu. O ministro Alexandre de Moraes comanda as investigações, e não julgará, o PGR Aras tem conhecimento delas e foi atendido na tese de que os deputados não deveriam ser alvos de busca e apreensão em suas residências. A fala do presidente Bolsonaro ontem de manhã foi reveladora de seus intentos, mas ele não tem meios legais para afirmar que “acabou”, se referindo à ação da PF autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes contra as fake News. Não há nada que ele possa fazer contra o STF, que, como disse Rui Barbosa, tem o direito de errar por último.

É preocupante que ele não aceite limites que a democracia impõe,  queixando-se de que sua caneta não tem tinta. Não imagino que tenha algum tipo de apoio fora dessas milícias digitais para tomar qualquer providência fora da lei. Vários militares, inclusive o vice-presidente, Hamilton Mourão, reafirmaram ontem que não há possibilidade de golpes militares. Os comandantes das Três Armas não são tão condescendentes quanto seus colegas da reserva com relação às extravagâncias políticas do presidente Bolsonaro. Enquanto ficar na retórica, e não houver nenhuma medida prática para desautorizar o STF, vamos viver nesse clima de tensão permanente. Para parar o STF, nem mesmo mandando o soldado e o cabo, como disse o filho 03 Eduardo, para fechá-lo.

Merval Pereira, jornalista - O Globo


Os motivos da intervenção constitucional de 1964 e de 2020 (???) - Sérgio Alves de Oliveira


Ainda bem que o povo brasileiro não depende mais da sua “comprometida” grande mídia, e da manipulação das suas “verdades”, para se informar sobre o que de fato está ocorrendo no mundo, especialmente na política brasileira. As redes sociais acabaram com o reino da mentira.


Recentemente escrevi “1964 foi uma intervenção ‘constitucional’ ?”), onde toquei de “leve” no assunto em pauta, destacando  que as Constituições de 1946 (artigos 176,177, e 178), sob o império da qual se deu a intervenção cívico-militar de 1964, e a Constituição  vigente,  de 1988,que repetiu, ”fundindo” os três num só artigo (142), são absolutamente idênticas, no que pertine  às hipóteses das Forças Armadas “intervirem”, para “garantia da Pátria”, dos “poderes constitucionais”,da “lei” e da “ordem”.

Se se analisar com profundidade essas quatro (4) hipóteses de intervenção constitucional,todas previstas, idênticamente, nas Constituições de 1946 e 1988,verificar-se-á que TODAS estavam, e “estão”, presentes,tanto em 31 de março de 1964,quanto hoje (maio/junho de 2020).  As infrações à “ordem”, à “lei” ,”contra a Pátria” e “contra os Poderes Constituconais”,deram presença  em 1964,e se repetem com mais intensidade agora, em 2020

A única grande diferença é  que mudaram os autores dessas quatro infrações constitucionais, previstas nas “cartas” de 1946 e 1988.  Em  31 de março de 1964, o grande responsável pela anarquia institucional que se instalava, infringindo a “ordem”,a “lei”, e atentando contra a “Pátria”,e contra os demais “Poderes Constitucionais (Legislativo e Judiciário)”,foi exatamente o Chefe do  Poder Executivo, o então Presidente João Goulart. Resumidamente, o Poder Executivo atacava os Poderes Legislativo e Judiciário, inclusive prevendo os seus fechamentos,tão logo instaurada a “Revolução Comunista”,prevista para acontecer em  1º de maio de 1964,”Dia do Trabalho”.

Mas hoje a situação se inverteu. Os responsáveis pelas infrações constitucionais que podem resultar numa “intervenção constitucional”,  promovida pelas Forças Armadas, são agora os Poderes Legislativo e Judiciário, antes “vítimas”,e agora “autores” dos “crime” constitucional, ameaçando  a “garantia” que deve ser assegurada ao outro Poder Constitucional, ao Poder Executivo. [apesar da faculdade conferida pela Constituição o presidente Bolsonaro, movido pelo espírito conciliador e ciente que uma ação militar - ainda que amparada na Constituição Federal - é sempre traumática, optou, corretamente, por  se defender das agressões que tem sofrido continuamente recorrendo ao Poder Judiciário.

O seu 'chega', o 'impor limites'  ditos recentemente, avisam que não mais aceitará que inimigos do Brasil - pessoas físicas, partidecos e outros - que,  a qualquer pretexto buscam impedir, via judicial, a governabilidade do Brasil, tenham seus intentos passivamente aceitos.

Deixou claro o presidente que qualquer decisão contrária aos interesses do Brasil, seja judicial ou legislativa, que se apresente como motivadora da quebra da harmonia e independência entre os Poderes, será contestada na Justiça. 
Sempre recorrerá ao Supremo, esperando que aquela Corte, em decisão colegiada revogue o ato combatido, quase sempre fruto de decisão monocrática de ministro integrante do STF.
Se tratando de decisão do Poder Legislativo, configurando arbitrariedade do presidente do Senado ou da Câmara, será combatida no Supremo Tribunal Federal.
Perdem tempo os que interpretaram, de boa ou má fé, as palavras presidenciais como ameaças - recorrer ao Poder Judiciário, especialmente ao Colegiado da Suprema Corte não é, nunca foi, jamais será ameaça ou ato hostil.
E já começou a cumprir o seu alerta, contestando à convocação do ministro Weintraub e o inquérito das fake news.] 

E na prática  o “fiel” da balança”, exercendo até certo ponto  o papel de “Poder Moderador”,que foi em 31 de março de 1964, e poderá/deverá  ser novamente, sem dúvida é o Poder Militar, através das Forças Armadas, que tem total soberania de se posicionar e decidir a respeito, nos termos do artigo 142 da Constituição vigente.


Sérgio Alves de Oliveira - Advogado e Sociólogo

quinta-feira, 28 de maio de 2020

Em 'live' com alvos de ação do STF, Eduardo Bolsonaro cita 'momento de ruptura' e Fachin pede ao plenário do STF que avalie pedido da PGR para suspender inquérito das fake news



Resultado prático da investigação de fake news vai ser três vezes zero - J.R. Guzzo


O Estado de S. Paulo

A questão é o clima tóxico que se estimula no Brasil por força da crescente incerteza sobre o que é legal e o que é ilegal neste País

O Supremo Tribunal Federal, como se sabe, abriu em março do ano passado uma investigação para apurar possíveis delitos – e os culpados por eles – na divulgação de “fake news”, ou notícias falsas, que têm ou teriam ocorrido contra o próprio STF, seus integrantes e membros de suas famílias. É uma dessas coisas que começou no escuro e caminha em direção ao escuro. Sua manifestação mais ruidosa acaba de acontecer com a realização de cerca de 30 buscas e apreensões, executadas por agentes da PF numa inédita missão a serviço do Supremo, na manhã desta quarta-feira, 27. Os alvos foram editores de blogs pró-governo e anti-STF, indivíduos diversos e oito deputados no exercício dos seus mandatos, seis deles federais. Pode isso?

Não foi uma decisão dos 11 ministros que compõem o plenário do tribunal. Quem resolveu assim foi o presidente do STF, Dias Toffoli – e, desde o início o Ministério Público, a quem cabe segundo a lei brasileira a exclusividade pela condução de inquéritos criminais e o eventual oferecimento de denúncias à Justiça, foi contra. O STF, segundo entendia o MP de então, não tinha o direito de abrir e operar uma investigação de crimes supostamente cometidos contra ele mesmo – ou, na verdade, contra ninguém. Muitos dos mais respeitados juristas brasileiros têm exatamente a mesma posição. Mas por uma dessas coisas que tornam o Brasil, com frequência, um país incompreensível, a Procuradoria-Geral da República mudou de opinião e começou a achar que o procedimento era legal, sim, desde que o presidente Jair Bolsonaro nomeou o novo e atual chefe, Augusto Aras. Como assim? A PGR, que era contra, passou a ser a favor de uma operação de legalidade intensamente duvidosa que reprime os grandes amigos do governo Bolsonaro? Pois assim está.

O ministro Luís Roberto Barroso tinha dito, justamente dois dias antes, que o STF é quem garante a manutenção da democracia no Brasil, e que as críticas a ele são livres  – o que não se pode é deixar de cumprir as suas decisões. Onde se encaixa, então, o rapa de hoje?? Se as críticas são realmente livres, por que as apreensões de celulares e outros atos de repressão contra editores de blogs e, mais que isso, seis deputados federais, que fazem parte de um Poder independente? Por que, dentro deste mesmo inquérito, o ministro Alexandre Moraes censurou o site O Antagonista e a sua revista digital  Crusoé.

Independente da opinião do atual PGR, qual a lei brasileira que permite ao STF abrir e conduzir diretamente uma investigação criminal? 
Onde está escrito que delegados e agentes de polícia passem a obedecer a ordens de um ministro e saiam por aí apreendendo celulares, entrando em residências e convocando para depor pessoas que não são acusadas oficialmente de nenhum crime pelo Ministério Público – inclusive parlamentares com imunidades constitucionais perante os dois outros poderes? 
É legal fazer um inquérito que não tem um fato determinado a apurar, nem indiciados? 

O resultado prático de todo esse som e fúria vai ser três vezes zero: ninguém vai para a cadeia, nenhum deputado será cassado e não haverá órgãos de imprensa proibidos de funcionar. A questão é o clima tóxico que se estimula no Brasil por força da crescente incerteza sobre o que é legal e o que é ilegal neste País.

J.R. Guzzo, jornalista - O Estado de S. Paulo


PGR à mercê da política - Merval Pereira

O Globo

Planalto teme TSE

O pedido extemporâneo do Procurador-Geral da República, Augusto Aras, para que seja suspenso o inquérito sobre fake news aberto há um ano no Supremo Tribunal Federal (STF) só tem explicação no clima de tensão que dominou o Palácio do Planalto com a operação de ontem da Polícia Federal contra apoiadores do presidente Bolsonaro. Sendo assim, o Procurador-Geral coloca o Ministério Público à mercê da disputa política que ora se desenvolve no país, prejudicando sua credibilidade. Suas idas e vindas sobre o tema, apontadas pelo partido político Rede, demonstram que ele se deixou levar pelas incertezas da política, sem emitir pareceres técnicos. De olho grande na vaga do STF que abrirá em novembro, dizem seus críticos.

[magistral William Waack quando chamou aquele inquérito - também conhecido por inquérito do fim do mundo - de abominável.]

A cronologia dos fatos é impressionante. Quando assumiu o cargo, Aras discordou de sua antecessora, Raquel Dodge, que, em abril do ano passado, declarou-se contrária à abertura do inquérito sem a presença do Ministério Público, e deferiu a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) impetrada pelo Rede no sentido de suspendê-lo. O novo Procurador-Geral, em outubro, manifestou-se pela validade do inquérito, e classificou de imprestável a ADPF. Ontem, seis meses depois, o mesmo Aras mudou de ideia e pediu a suspensão do inquérito baseado na mesma ação do Rede.

O presidente Bolsonaro já havia dito ao então ministro Sérgio Moro que o inquérito que abrangia parlamentares bolsonaristas era “mais um motivo para a mudança”, referindo-se à Polícia Federal. A operação de busca e apreensão autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes nas casas dos investigados poderá revelar, através dos celulares e computadores, toda intrincada rede de montagem do que pode ser, segundo o STF, uma organização criminosa dedicada a espalhar mentiras, injúrias, difamações contra os adversários políticos e a disseminar noticias falsas com intuitos políticos.

Essa central de mentiras e difamação teria uma base instalada dentro do Palácio do Planalto, que os parlamentares ouvidos na investigação chamaram de “gabinete do ódio”. Assessores do governo comandam desde lá os ataques coordenados aos “inimigos”, e o principal orquestrador seria o vereador Carlos Bolsonaro, o 02 do presidente.
O ministro Alexandre de Moraes foi até mesmo cauteloso, e não aceitou o pedido para fazer busca e apreensão nas casas dos parlamentares investigados, que foram apenas intimados a depor. Esse inquérito do Supremo Tribunal Federal sobre fake news tem ligações indiretas com as ações que correm no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a campanha presidencial da chapa Bolsonaro-Mourão, acusada de ter se beneficiado de esquemas ilegais de distribuição de fake news e impulsionamentos de propagandas políticas de WhatsApp.

O temor do Planalto é que, como já está acontecendo, partidos políticos peçam para que o TSE incorpore as provas coletadas às ações em curso, ganhando dinâmica própria o pedido de impugnação da chapa. O procurador-geral da República, Augusto Aras, declarou-se surpreendido pela operação policial, mas foi informado pelo ministro Alexandre de Moraes, que abriu vista por uma semana para ele se manifestar sobre as diligências. O vice-presidente Hamilton Mourão reagiu à operação com um Twitter onde confunde ação penal com investigações. Afirmou que o STF não está cumprindo a Constituição, que diz que o Ministério Público é o dono da ação penal pública, mas essa questão já fora dirimida lá atrás, quando Raquel Dodge arquivou o processo justamente com esta argumentação.
[clique aqui e conheça razões técnicas que desmontam o inquérito das fake news.]

O ministro Alexandre de Moraes decidiu que “o sistema acusatório de 1988 concedeu ao Ministério Público a privatividade da ação penal pública, porém não a estendeu às investigações penais”. O Supremo, no momento, é que estabelece a maior barreira democrática para coibir os avanços autoritários do governo, atingindo uma coesão poucas vezes vistas. A Polícia Federal continua sob suspeita depois da interferência de Bolsonaro, e mesmo as ações de hoje podem ser atribuídas ao fato de o ministro Alexandre de Moraes não ter deixado que a nova administração trocasse os agentes que trabalham há quase um ano no inquérito. O Legislativo, depois que o Centrão aderiu ao governo, está excessivamente cauteloso, tendo o presidente Rodrigo Maia perdido o controle do plenário. E a atitude cambiante do Procurador-Geral da República coloca em xeque também o Ministério Público.

Merval Pereira, jornalista - O Globo




Ignorância da Lei – Editorial - O Estado de S. Paulo

Críticas de Bolsonaro e de seu entorno ao STF mostram seu nível de desinformação

Quanto mais o presidente Jair Bolsonaro e seu entorno militar reclamam do Supremo Tribunal Federal (STF), alegando que ele está avançando na jurisdição do Executivo e impedindo o chefe da Nação de governar, mais vai ficando claro que as acusações contra a Corte são absurdas e que as decisões tomadas por seus ministros são rigorosamente baseadas nas leis em vigor e na Constituição. [conforme interpretação do Supremo, ainda que do tipo criativa.] 

As mais recentes decisões do STF são prova disso. No caso da pandemia de covid-19, quando Bolsonaro tentou anular as medidas na área da saúde tomadas por prefeitos e governadores para combater o contágio da covid-19, o STF nada mais fez do que reafirmar a estrutura federativa do Estado brasileiro, tal como está prevista em vários artigos da Constituição. O artigo 1.º institui como forma de Estado a “República Federativa”. O artigo 18 afirma que o federalismo pressupõe autonomia administrativa dos entes federativos e deixa claro que não há uma relação de hierarquia entre eles. E o artigo 23 é taxativo quando afirma que é “competência comum da União, dos Estados e dos municípios zelar pela guarda da Constituição” em áreas essenciais, como a saúde pública. [só que a decisão do Supremo alijou a  União Federal, tirando espaço para qualquer atuação do Presidente da República = que representa a União Federal.]  

Foi por isso que, ao julgar uma ação de inconstitucionalidade contra a MP 926, que dispõe sobre “medidas para o enfrentamento da emergência de saúde pública” e confere ao presidente da República “a competência para dispor, mediante decreto, sobre serviços públicos essenciais”, o STF decidiu, por unanimidade, que a MP não podia anular a competência dos Estados e municípios de legislar de forma concorrente em relação à política sanitária de saúde. A não observância da autonomia dos entes federativos constituiria uma “afronta ao princípio do federalismo”, disse o ministro Edson Fachin.

Outra decisão do STF que suscitou reclamações do presidente e de seu entorno militar, mas que também estava fundada no direito positivo, foi adotada pelo ministro Alexandre de Moraes após a demissão de Maurício Valeixo do comando da Polícia Federal (PF). Moraes ordenou que fossem mantidos os delegados federais envolvidos no inquérito de apuração das fake news contra integrantes da Corte. Nada mais fez do que se valer de suas prerrogativas como magistrado. O mesmo ocorreu quando concedeu liminar suspendendo o decreto de nomeação do delegado Alexandre Ramagem para o cargo de diretor-geral da Polícia Federal. Por ser amigo pessoal da família Bolsonaro e por estar a PF investigando um de seus filhos, o ministrou alegou que a nomeação configurava “desvio de finalidade e inobservância dos princípios da impessoalidade, da moralidade e do interesse público”, previstos pelo artigo 37 da Constituição. [conveniente por respeito tanto à Constituição Federal quanto ao Poder agredido, decisões que afrontem diretamente à autoridade do presidente jamais devem ser tomadas de forma monocrática.
A partir do momento em que os ministros do STF abrirem mão de uma onipotência que não possuem - ONIPOTENTE SÓ DEUS - ficará mais fácil o diálogo.
Que necessidade tem de um despacho intimando ministros de Estado, destacar uma velharia que foi aposentado no começo do século 19? condução debaixo de vara.] 

O presidente e seu entorno militar também criticaram a decisão do ministro Celso de Mello de permitir a divulgação do vídeo da patética reunião ministerial de 22 de abril e de pedir ao procurador-geral da República que se manifeste sobre o pedido de apreensão do celular de Bolsonaro e de um de seus filhos. Chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o cidadão Augusto Heleno classificou as medidas como “afronta à autoridade máxima do Poder Executivo”. Esqueceu-se, porém, como afirmou o STF, em nota, que Mello “limitou-se a encaminhar à PGR, que é o órgão da acusação, a notitia criminis, com esse pleito de apreensão formulado por três agremiações partidárias”. Lembrou, também, que o § 3.º do artigo 5.º do Código de Processo Penal “confere legitimidade a qualquer pessoa do povo para efetuar comunicação de crime perseguível mediante ação penal pública”. [vide  o comentado  parágrafo anterior.]


É evidente, assim, que em momento algum o STF agiu por vontade individual [decisão monocrática o que significa?] de seus ministros. É evidente, também, que a Corte não tomou qualquer decisão à margem da lei e que aplicou rigorosamente a Constituição, segundo a qual, num sistema republicano e federativo não existe poder absoluto ou ilimitado. [cabe expressar minha opinião com uma pergunta:
que tipo de poder é o que permite que um ministro do STF possa, de forma monocrática, deferir liminar suspendendo uma lei, parcial ou totalmente?
E tal suspensão valerá até que o plenário do STF aprecie e reforma a decisão.
Sendo que o ministro autor da liminar é quem decide quando a matéria será apreciada pelo colegiado Supremo.
Enquanto o plenário não se manifestar a lei impugnada não vale - apesar de ter sido aprovada por maioria nas duas Casas do Poder Legislativo e sancionada pelo Presidente da República, Chefe do Poder Executivo.] Portanto, a reação do presidente e de seu entorno – principalmente o cidadão Heleno – às decisões do STF não procedem. Tais reações carecem de base legal e mostram o nível de desinformação dos que estão à frente do Executivo, bem como sua ignorância sobre o funcionamento das instituições do País.

Editorial - O Estado de S. Paulo


Imprensa marrom - Carlos Alberto Sardenberg

Antigamente, era mais fácil. Havia muita diversificação entre os veículos de imprensa, mas com uma divisão principal: os independentes e os chapa-branca. Aliás, esta última expressão é ela mesma do tempo antigo. Hoje, as autoridades circulam em carros com placas de bronzeevoluíram, não é mesmo?  – ou com chapas frias. Sabem como é, o povo hoje sabe com quem está falando e muitas vezes não gosta.

[a imprensa livre, independente, investigativa é e sempre será necessária.
Se torna inconveniente, abusiva mesmo, que passa a ser repetitiva, cansativa, na tentativa - sempre vã - de impor o que pensa ser correto, de apresentar sua versão, sua interpretação, como fato.
Se necessário, procede até o fatiamento da noticia, esquartejamento mesmo, para enfiar goela abaixo, trecho por trecho, o que lhe convém.
Só que o povo, especialmente o brasileiro, não aceita - pode não saber votar, votando em coisas como lula e dilma - mas não aceita versões. Vota mal, mas interpreta fatos de versões.]

Mas voltemos ao que interessa, a imprensa. Os veículos chapa-branca eram aqueles que só existiam para fazer propaganda e/ou defender os interesses do governo, de políticos, de igrejas e de negócios setoriais. Viviam de verbas públicas ou de dinheiro colocado pelo patrocinador. A imprensa independente era aquela que vivia da notícia e, no caso da tevê, do entretenimento. Vivia no duplo sentido: tinha que ser reconhecida como tal pelo público (credibilidade) e tinha de ganhar dinheiro com venda em bancas, de assinaturas e de publicidade. A independência deveria ser editorial e econômica ao mesmo tempo. Aqui, essa imprensa independente amadureceu ao longo da vida democrática pós-1985.

Tem várias características, algumas boas, outras ruins, mas há um ponto essencial. A imprensa brasileira não é bem agressiva, é atrevida. Nem sempre foi. Tornou-se atrevida, especialmente a política,  em tempos relativamente recentes. Por exemplo: alguns anos atrás, repórteres políticos não se atreveriam a perguntar ao presidente se ele queria interferir na Polícia Federal ou melar uma investigação sobre atividades de seus filhos. Na verdade, não é que não se atreveriam, nem lhes ocorria perguntar esse tipo de coisa. Parecia normal que autoridades tivessem privilégios, incluindo as famosas mordomias.

Também não era um vício apenas nacional. Na Washington de John Kennedy, todo mundo sabia que o presidente gostava muito de mulheres e que as recebia na piscina da Casa Branca quando Jacqueline não estava por perto. Jornalistas sabiam, alguns até participavam das farras – e não publicavam nada. Ao contrário, publicava-se que se tratava de um feliz casal presidencial. Em Brasília dos anos 80 e 90, os jornalistas também sabiam das mazelas pessoais (amantes, rolos) e, digamos, profissionais dos políticos, tais como negócios paralelos. Não lhes ocorria publicar, mesmo porque muitos jornalistas desfrutavam de vantagens indevidas, como empregos no Congresso, em autarquias e estatais. Além de financiamentos especiais em bancos públicos.

A mudança forte começou a aparecer na passagem dos anos 80 para os 90. Repórteres mais novos começaram a publicar os privilégios, os bastidores, inclusive das casernas – ou seja, as informações não oficiais, não autorizadas, mas obtidas por apuração e investigação independente.
Ao mesmo tempo, desenvolveu-se o jornalismo opinativo – outro que tanto incomoda as autoridades. Para o presidente Bolsonaro e seus seguidores, ou a imprensa é a favor ou é mentirosa, canalha, lixo e tantas outras ofensas. Mas na democracia, quem decide se uma imprensa é boa ou não é o público, com sua audiência, sua leitura, seu respeito.

Essa imprensa está aí. Ainda bem. As redes sociais, claro, são uma novidade. Mas a divisão entre independência e militância de qualquer tipo é a mesma que se via na imprensa tradicional. Então, os principais veículos independentes, aqui e no mundo, estão migrando para as redes sociais. Continuam sendo a representação da imprensa livre e responsável.  Mas as redes também tornaram mais fácil o surgimento dos veículos “fake news”, que bem poderia ser a nova designação para imprensa marrom, aquela sem nenhum escrúpulo. Do mesmo modo que antes não se poderia fechar a imprensa para bloquear o lado marrom, também hoje não se pode bloquear as redes para afastar os provedores de fake news, ofensas e ameaças. Mas, atenção, liberdade de expressão não é um salvo conduto. Não pode haver censura prévia. Mas a publicação e seus autores podem ser processados, na devida forma da lei.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista


Para onde levam os inquéritos - William Waack

O Estado de S.Paulo

Onde hoje mora o perigo para Bolsonaro não é no Congresso, é no STF

Onde hoje mora o perigo para Bolsonaro não é no Congresso, é no STF. E não é no inquérito que resultou das acusações do ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro ao sair do governo. É no inquérito das fake news, também no Supremo, que começou há mais de um ano atirando nos “procuradores de Curitiba” como principais suspeitos de articulações contra o STF e acabou acertando no esquema bolsonarista de pressão e propaganda que, suspeita-se, é articulado em parte desde o Palácio do Planalto.

Não cabe aqui discutir todos os aspectos jurídicos relacionados ao inquérito, que começou impondo censura a órgãos de imprensa (logo derrubada), corre em sigilo e transforma o STF em investigador e juiz ao mesmo tempo. Integrantes da corte acham que o tal inquérito virou uma metralhadora giratória nas mãos do ministro Alexandre de Moraes – o mesmo se ouve na PGR, que foi contra, depois a favor, e agora contra de novo, mas são coisas que ninguém admite em público. [a ex-procuradora Raquel Dodge arquivou em 2019 o tal inquérito.]

Em outras palavras, o mundo correto jurídico acha o inquérito abominável, porém ainda mais abominável o que representam as redes bolsonaristas. Uma vez que essa ação dirigida pelo Supremo tem como alvo quem se organizou para destruir a institucionalidade, o inquérito é amplo o suficiente para, eventualmente, levar a uma acusação política grave, além de criminal contra seus alvos. Difícil de calcular são as consequências do tipo de ambiente que provoca.

Os alvos da vez são personalidades das redes bolsonaristas, empresários amigos do presidente e parlamentares que o apoiam. Na lista figura também um ministro, o da Educação, que deverá ser ouvido pelo que disse na já célebre reunião ministerial do dia 22 de abril não no inquérito relacionado a Moro, mas no inquérito das... fake news contra o Supremo. No Legislativo o mesmo inquérito do Supremo reforça uma CPMI para apurar... fake news nas eleições.


Outra voz que ganhou destaque nos últimos dias, a do empresário Paulo Marinho, ex-adepto convertido em inimigo do presidente, também deve ser incluída no que o TSE tem investigado, via corregedoria (considerada mais contundente pelos especialistas) como abuso de poder econômico e político nas eleições de 2018, incluindo disparos em massa de mensagens em redes sociais e, claro, fake news.

Por um lado, o empenho dos atingidos por operações da PF deflagradas por Alexandre de Moraes em caracterizar os ministros do STF como meros adversários políticos, fora o resto, vai em boa parte ao encontro do que pensam militares graúdos que manifestam (tão somente nos bastidores) descontentamento com os rumos gerais do governo, mas não escondem a fúria com o que consideram ingerência indevida do Judiciário nos negócios do Executivo. A reação ao STF forja um tipo de “união”.

Por outro, o que as redes bolsonaristas em geral e o presidente em particular conseguiram com os sucessivos ataques às pessoas dos ministros foi levar o STF a uma inusitada convergência de posturas entre ministros divididos por querelas pessoais ou pelas sérias dúvidas quanto ao inquérito das fake news. Em outras palavras, em que pesem as divergências internas, a resposta do STF tem sido mais institucional do que “pessoal”.

Os ministros do STF reiteram em uníssono que o Judiciário está sendo atacado pelos que não aceitam fiscalização ou limitação de poderes, não respeitam o pacto federativo, interferem em órgãos do Estado (como Polícia e Receita Federal) por motivos pessoais ou políticos, agem contra a saúde pública ao desrespeitar critérios técnicos e científicos no combate ao coronavírus, desprezam a educação e mobilizam setores do eleitorado contra instituições como Legislativo e Judiciário. Em resumo, Jair Bolsonaro.


Nos bastidores do mundo do direito em Brasília admite-se que não surgiram até aqui evidências contundentes para basear eventual denúncia da Procuradoria que “automaticamente” encurtaria a permanência de Jair no Planalto. Tal desfecho só poderia surgir de um julgamento político no Congresso, reitera-se. É exatamente o que um grupo dentro do STF espera conseguir. [o povo está indo as ruas apenas quando o objetivo é apoiar o presidente Bolsonaro - vejam que a divulgação de um vídeo, com o intuito de prejudicar Bolsonaro, resultou em:
- maior número de apoiadores do presidente presentes ao  encontro dos domingos; e, 
- queda do dólar na segunda passada e a Bolsa de Valores subir.

No mundo político além da falta de apoio popular, combustível para progresso de qualquer pedido de impeachment, há a dificuldade de conseguir o mínimo de 341 votos contra o nosso presidente.
No campo jurídico falta 'substância' nas acusações. O inquérito abominável, na adequada classificação do articulista, não se sustentará quando o plenário do STF for examiná-lo.]

William Waack,  jornalista - O Estado de S. Paulo