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segunda-feira, 22 de agosto de 2022

Hidroxicloroquina provavelmente ajudou na pandemia, conclui reanálise dos melhores dados - Eli Vieira

Gazeta do Povo -  Ideias

Uma nova análise dos dados dos melhores estudos publicados sobre o efeito da hidroxicloroquina (HCQ) na pandemia concluiu que essa droga ajudou a reduzir a Covid-19 sintomática em 5% a 45% dos casos, em comparação a pessoas que não tomaram HCQ, se ela fosse tomada antes da exposição dos pacientes à doença. O resultado central dessa profilaxia pré-exposição, que consiste em tomar HCQ por precaução antes do contágio, é uma redução de 28% no risco de Covid-19.

(...)

Harvard e Espanha

O primeiro autor da análise é Xabier García-Albéniz, afiliado a uma organização não-governamental de saúde em Barcelona, Espanha, e à Universidade de Harvard. 
Ele é acompanhado por quatro coautores afiliados a Harvard, ao Ministério da Saúde da Espanha e à Universidade de Málaga. 
A análise é uma revisão metanalítica, ou seja, um estudo sobre estudos que busca agregar dados e conciliar as diferentes conclusões dos estudos individuais. Foi publicada na revista European Journal of Epidemiology, a oitava mais influente publicação científica na área da epidemiologia (entre 111) segundo o site Scimago, especializado em rankings de revistas científicas.
 
Internados com Covid em Hospital de Campanha Pedro Dell’Antonia, em Santo André, 16 de abril de 2021. Análise de estudos mostra que a hidroxicloroquina poderia ter ajudado de maneira profilática.| Foto: EFE / Sebastiao Moreira
 
O foco dos autores da revisão foi nos estudos que utilizaram a HCQ como um profilático antes e depois da exposição ao vírus, como algo que evitasse a apresentação ou o agravamento dos sintomas, não como um tratamento. 
Estudos que utilizassem a HCQ como tratamento para um quadro estabelecido de Covid-19 foram excluídos da análise. 
Também foram excluídos estudos que não usaram a técnica da randomização, que é a distribuição por sorteio dos pacientes em dois grupos, um que tomou HCQ e outro que não tomou, para comparação — uma estratégia para reduzir possível tendenciosidade nos resultados.
 
O ex-presidente, ex-presidiário e ex-condenado [não inocentado]    Lula tem todos os motivos para não gostar da Lei da Ficha Limpa, que ele próprio sancionou em 2010.

TSE nega pedido para tirar do ar postagens de Bolsonaro que relacionam o PT ao PCC

De 72 estudos, 11 restaram para a reanálise após a seleção: sete deles tratavam da profilaxia pré-exposição e quatro da pós-exposição.


A Falácia da Linha Nítida

Xabier e colegas discutem os resultados em linguagem negativa: não se pode descartar a ideia de que a hidroxicloroquina foi benéfica como um tratamento preventivo para Covid-19, como muitos fizeram — frequentemente com motivações políticas. 
Eles lamentam uma interpretação errônea dos resultados dos estudos que atrapalhou os estudos clínicos que estavam em andamento no começo da pandemia e impediu que fossem geradas estimativas precisas a respeito do manejo da pandemia antes do advento das vacinas.

Internados com Covid em Hospital de Campanha Pedro Dell’Antonia, em Santo André, 16 de abril de 2021. Análise de estudos mostra que a hidroxicloroquina poderia ter ajudado de maneira profilática.| Foto: EFE / Sebastiao Moreira

Essa interpretação errônea é conhecida como a “falácia da linha nítida”. Na pesquisa científica, especialmente nas áreas biológicas e médicas, convencionou-se usar uma ferramenta estatística conhecida como valor p. Simplificadamente, o valor p é a probabilidade de os resultados a favor de eficácia de um medicamento terem sido obtidos por pura sorte, em vez de por causa de um efeito real. Por uma convenção, aceita-se no máximo um valor p de 5% — em menos de cinco a cada cem vezes aqueles resultados serão observados ao acaso, então é suficientemente improvável que eles sejam por sorte e suficientemente provável que representem algo como uma diferença no risco de desenvolver Covid entre quem tomou HCQ e quem não tomou.

(...)


Em suma, o erro de muitos jornalistas e divulgadores de ciência ao comentar os estudos da hidroxicloroquina em que o valor p foi maior que 5% é uma violação de um famoso adágio popularizado pelo astrônomo Carl Sagan: “Ausência de evidência não é evidência de ausência”. Se o valor p algumas vezes passou de um limiar arbitrário máximo, isso não significa que está provada uma ineficácia da droga, mas no máximo que não houve, na amostra e sob as condições específicas de alguns estudos, evidências suficientes a favor de sua eficácia. Pelo contrário, uma observação repetida de valores p baixos, mas acima do limiar, poderia ser contada como evidência a favor de algum efeito que os métodos não foram adequados para capturar.

Os cientistas da revisão lamentam os resultados dessa confusão: “o recrutamento [de participantes] para a maioria dos estudos de profilaxia com HCQ foi impedido de forma severa pelas interpretações incorretas das evidências” dos primeiros estudos. Os achados desses estudos foram retratados “amplamente (e incorretamente) como evidências definitivas da falta de eficácia da HCQ, simplesmente porque não eram ‘estatisticamente significativos’ quando tomados individualmente”, comentam, o que levou muitos a “concluírem prematuramente que a HCQ não tinha efeito profilático, quando a conclusão correta era que a estimativa do efeito era imprecisa demais”. Em suma, “a opinião pública interfere com a geração das próprias evidências”, alertam os autores aconselhando futuros estudos.

Revisando a revisão
A propósito da revisão a reportagem consultou o dr. Daniel Victor Tausk, que vem se manifestando publicamente de forma similar à vista nesta revisão há dois anos. Ele é professor associado do Instituto de Matemática e Estatística da Universidade de São Paulo.

(...)

Ele refez para a Gazeta do Povo parte da análise da nova revisão de Xabier García-Albéniz e colaboradores. Os autores usaram duas abordagens estatísticas, uma mais “clássica” e outra mais “pessimista”. Tausk removeu um estudo usado na revisão pois suspeita que os resultados podem ter sido atrapalhados pela forma como o estudo separou os participantes: por andares de um prédio. 
Há espaços fechados como corredores em que pessoas em um mesmo andar podem pegar Covid. 
Na abordagem clássica, o valor p da profilaxia pré-exposição da hidroxicloroquina dá 2%, ou seja, “significativo”. Na abordagem mais pessimista, o valor p é de 6,5%, acima do limiar convencional de 5%, mas não muito. O matemático calcula que a redução do risco de piora clínica com o uso da droga é de cerca de 20%, um pouco menor que a estimativa da revisão.

 Eli Vieira, colunista - Gazeta do Povo - Ideias


quarta-feira, 27 de julho de 2022

Neymar será julgado, um mês antes da Copa do Catar, por corrupção em assinatura de contrato com o Barcelona [o acusado pode ser condenado a 7 anos de prisão.]

 O Globo — Barcelona

Neymar e outras cinco pessoas serão julgadas por supostas irregularidades na assinatura do contrato do jogador com o Barcelona, em 2013. A partir do dia 17 de outubro, um tribunal da Catalunha iniciará a análise do caso, com a promotoria local pedindo a pena de dois anos de prisão para o atleta. Segundo o jornal El País, ao lado do jogador no banco dos réus, estarão seus pais e dois ex-presidentes do Barcelona (Sandro Rosell e Josep Maria Bartomeu), todos acusados de corrupção entre particulares e fraude, além de um ex-diretor do Santos, clube do qual o jogador foi adquirido pela equipe espanhola.

Na ação, o Ministério Público da Espanha exige o pagamento de 8,4 milhões de euros, cerca de R$ 45,6 milhões. Ainda de acordo com El País, o julgamento é consequência de uma denúncia apresentada há sete anos pela DIS, empresa brasileira especializada no mercado de futebol, que se sentiu prejudicada na negociação entre Neymar e Barcelona. Antes da ida do jogador para a Europa, a empresa detinha 40% dos direitos federativos dele.

A DIS havia adquirido o percentual em 2009, quando o atacante tinha apenas 17 anos, por um preço equivalente a cerca de dois milhões de euros. A empresa considera que foi vítima de um “golpe” arquitetado por Neymar, seus parentes e pelo Barcelona e pede uma indenização superior a 150 milhões de euros — mais de R$ 815 milhões.

A empresa e o Ministério Público consideram que, em 2011, ocasião do acordo entre jogador e empresa, Neymar e o pai assinaram dois contratos simulados com o Barcelona, ignorando que parte dos direitos pertenciam à DIS. Um desses contratos, de 40 milhões de euros, teria servido para “amarrar” a assinatura antes de se tornar público, e teria sido feito sem o conhecimento da DIS.

“O Barcelona e o jogador quebraram as regras da Fifa e alteraram a livre concorrência no mercado de transferências”, disse a empresa em sua defesa em 2016, quando as acusações foram apresentadas.

Ainda segundo El País, embora o Ministério Público peça dois anos de prisão para Neymar e o pagamento de uma multa de 10 milhões de euros, a empresa ainda pede a pena de cinco anos de prisão para Neymar e que ele esteja impedido, pelo mesmo período, de jogar futebol.

A DIS também pede cinco anos de prisão para os pais do jogador. Nesse caso, o MP pede “apenas” dois anos de prisão para o pai e um para a mãe do atleta. [Considerando que na Espanha os acusados que são condenados ficam presos, caso o jogador seja condenado o Brasil será favorecido = um 'perna de pau' a menos, no elenco da seleção brasileira de futebol.]

Esportes - O Globo 

 

domingo, 27 de março de 2022

CORTAR O MAL PELA RAIZ! - Gilberto Simões Pires

ESCREVER UMA BOA CARTA
Se a nossa Constituição, com total razão, desde o momento em que foi promulgada, em 1988, tem sido alvo de inúmeras críticas pelo fato de reunir um imenso conjunto de malefícios ou de coisas que provocam consequências negativas para o sofrido povo brasileiro, mais críticas ainda passou a receber depois que o STF resolveu interpretá-la ao seu modo e/ou interesse (ideológico). Diante desta situação -crítica- a felicidade geral da Nação depende de uma BOA E EFETIVA CARTA, do tipo que faça valer os reais e corretos anseios da população.

SALVAÇÃO DO BRASIL COMEÇA POR UMA NOVA CARTA 
Sobre este importante tema, o qual dediquei vários editoriais, vejo que a cada dia que passa mais cresce o convencimento de que a SALVAÇÃO DO BRASIL COMEÇA POR UMA NOVA CARTA. A propósito, nesta semana a jornalista Madeleine Lacsko, da Gazeta do Povo, relatou o debate que mediou sobre a necessidade de uma nova Constituição com a participação do ministro aposentado do STF, Francisco Rezek, do professor emérito da Universidade Mackenzie, Ives Gandra Martins, do diretor do Centro de Estudos Brasileiros da Universidade de Salamanca, Ignacio Berdugo, do professor de economia da Universidade de Iowa, Luciano Castro e da professora do CEU Law School, Beyla Fellous.
 
PONTO DE PARTIDA 
O encontro foi o PONTO DE PARTIDA para que se inicie um debate acadêmico sobre o tema. Segundo o professor Ives Gandra Martins, a solução para mudanças mais imediatas seria fazer REFORMAS CONSTITUCIONAIS, principalmente a ADMINISTRATIVA. Chamar uma Assembleia Nacional Constituinte seria uma temeridade, dada a qualidade de políticos a quem damos poder hoje em dia. Esse é o temor de muitos, inclusive o meu, afirmou Ives.

Para funcionar, uma Constituição precisa necessariamente refletir os VALORES DO POVO. E a estrutura técnica tem de ser pensada para fazer com que esses princípios sejam realmente colocados em prática, não fiquem apenas no papel. Há países que elegem comissões de notáveis para elaborar regras. Outros simplesmente escolhem especialistas. Todos fazem CONSULTAS POPULARES.

PLEBISCITO
 A Assembleia Nacional Constituinte do Brasil teve 559 parlamentares. É um modelo semelhante ao do Benin, pátria originária do acarajé. Já o Quênia escolheu um comitê de 9 especialistas. Na Espanha, um comitê parlamentar de 7 pessoas escreveu a Constituição. A Tunísia elegeu mais de 200 pessoas para fazer uma Constituição. A grande questão é como unir a sociedade em torno do projeto. Vejam que o máximo que aconteceu no Brasil foi o plebiscito de armas e também para escolher entre monarquia, presidencialismo e parlamentarismo. Na África do Sul, por exemplo, foram feitas mais de 1000 consultas públicas. [o que complica no Brasil é que a Constituição de 88 além de todos os malefícios, pode ser aplicada mediante interpretação de seis ministros do STF, e pode ser emendada, criando um quarto poder pela vontade de um único ministro = que não prosperou por ter sido exposta em solo estrangeiro.]
 
PROPOSTAS CONCRETAS
 Uma proposta, que foi bem observada pelo ministro Francisco Rezek, é a ESTRUTURAL. As pessoas reclamam muito de IMPUNIDADE, INFINITOS RECURSOS PENAIS, CONTROLE DO SISTEMA POLÍTICO por caciques de partido e assuntos assemelhados. Vira e mexe aparece um abençoado com uma ideia de lei nova ou julgamento do STF para resolver o problema. Daí a gente embarca porque ENQUANTO HOUVER OTÁRIO, MALANDRO NÃO MORRE DE FOME. 
Um dos principais problemas que nós temos está no artigo mais conhecido da Constituição, o Art. 5º, que estabelece um longuíssimo rol de DIREITOS FUNDAMENTAIS DO CIDADÃO. 
A crítica que a gente sempre ouve é a de ser MUITO DIREITO E POUCO DEVER.  
E nisso há razão, até a Declaração Universal dos Direitos Humanos tem deveres.
 
ARTIGO NA ÍNTEGRA
Vale pena para que o amadurecimento aconteça com maior rapidez. 
 
Ponto Crítico - Gilberto Simões Pires 



sábado, 12 de março de 2022

É Rússia, não URSS - Carlos Alberto Sardenberg

Muita gente, lá fora e aqui, está cometendo um grande equívoco: pensar a Rússia como se fosse a União Soviética. Não é.

No tempo da URSS, Moscou tinha uma mensagem não apenas para a Europa, mas para o mundo todo. O marxismo soviético era uma construção completa: definia desde a organização da sociedade política, da produção e distribuição de riqueza até a vida cultural.

Mais importante: essa ideologia era partilhada pelo mundo afora. Nos países já no âmbito da URSS, havia partidos, militância e apoios locais ao marxismo soviético.

Não se tratava de uma “simples” dominação externa, mas de identidade ideológica, pelo menos de parte das populações. Mais ainda: nos países que estavam na órbita do Ocidente, em muitos havia partidos comunistas de sólida representação popular. Itália e França, por exemplo.

Em outros países, havia PCs ilegais, mas muito atuantes, especialmente no setor cultural.  Em Moscou, existia uma universidade onde só estudavam alunos de outros países. Uma escola séria, competente no ensino de história, política e cultura, do ponto de vista do marxismo soviético.

A guerra fria, portanto, era uma disputa entre duas articuladas visões de mundo.

Uma dessas visões simplesmente veio abaixo. O socialismo soviético morreu – e por ação de suas populações locais. Reparem: o muro ruiu sem que o Ocidente precisasse dar um tiro.

Não houve invasão do Leste, nenhuma conquista. Apenas as populações locais, quando puderam ver o que acontecia no outro lado do mundo, decidiram mudar de vida e de regime. Para o marxismo soviético, foi uma vergonha como os alemães orientais correram para comprar Coca-Cola em Berlim.

Como os ex-socialistas se arrumaram? Pessoal da Europa Leste entendeu rapidamente que o melhor negócio era entrar para a União Europeia um mar de prosperidade. Bastava olhar como Espanha e Portugal saíram da pobreza com a entrada na UE.

A China, sempre mais competente, já percebera a mudança – e introduzia o capitalismo e a propriedade privada, base de sua ascensão, ainda que com forte controle estatal.

As opções ficaram assim, simplificando: qual capitalismo se vai seguir, com mais ou menos Estado?

Na política, também simplificou: ou a democracia ou a ditadura.

A Rússia de Putin é o quê? Um capitalismo de compadres,”crony capitalism”, e uma ditadura assassina. E um maluco que se acha na “Grande Rússia”.

Para o ex-soviéticos, bastava entrar na União Europeia em busca de prosperidade. Não se interessavam pela OTAN, muito menos hostilizar a Rússia.

Por que, a um determinado momento, resolveram entrar para a OTAN? Por causa das ameaças de Putin, quando ele conseguiu dar uma arrumada na Rússia.

Em resumo – a URSS tinha uma proposta para o mundoum baita equívoco, como se viu depois. Mas brilhou durante muito tempo.

A Rússia de Putin tem o que? Ameaças imperialistas.

Portanto, chega dessa história de avanço da OTAN para o Leste. Foram as populações do Leste que, democraticamente, fizeram sua opção.

Azar da Ucrânia, que se atrasou com aquele ditador pró-russo. Aliás, reparem: só ficam com a Rússia os ditadores, incluindo os nossos aqui da América Latina. A Rússia não foi ameaçada. Ela é a ameaça. E Putin vai cair do mesmo modo que caíram os outros: pela reação de seu próprio povo.

Portanto, chega de comparar a invasão da Ucrânia com os casos de Iraque, Líbia, Síria, Afeganistão – estados incentivadores de terrorismo. EUA e Europa têm seus pecados, mas não se pode compará-los com essa Rússia de Putin.

A Europa abriu-se a negócios com as empresas russas.
Companhias e investidores ocidentais foram para a Rússia. Empresas russas se instalaram na Europa.

Por que Putin simplesmente não deixou essa integração prosseguir? A melhor hipótese: ele temia que a “excessiva” ligação com o Ocidente mostrasse aos russos onde a vida é melhor.
[lembrando: - um dos pilares do Ocidente, os EUA, tem um presidente que iniciou seu mandato, assinando ordens executivas favorecendo o aborto, limitando a autoridade das polícias e por aí vai;
-  o Zelinsky todo dia reúne jornalistas apoiadores e repete aquele monótono lenga-lenga de que o pessoal da Ucrânia é valente, não vai se render, que mais sanções precisam ser aplicadas contra a Rússia,o espaço aéreo da Ucrânia deve ser declarado 'zona de exclusão' = uma forma malandra de tentar envolver outros países na 'sua' guerra, etc, etc.
Encerra o palavrório e no dia seguinte repete tudo, com um detalhe inaceitável: mais ucranianos mortos.
Tal situação impõe a retirada imediata do Zelinsky, um plebiscito supervisionado pela ONU para que o POVO UCRANIANO decida soberanamente qual destino quer
O que não pode continuar é que para satisfazer a vaidade do presidente ucraniano, mais ucranianos continuem morrendo.]

E Putin simplesmente não podia se juntar à União Europeia: seu regime não passa nos critérios de democracia e legislação de direitos humanos. Sobrou o que? Uma tentativa de formar um império de ditadores.

Carlos Alberto Sardenberg,  jornalista 

 Coluna publicada em O Globo - Economia 12 de março de 2022


sexta-feira, 4 de março de 2022

Os negros e o Partido Republicano - Revista Oeste

John James, Candace Owens, Larry Elder, Winsome Sears, Vernon Jones e Herschel Walker | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
John James, Candace Owens, Larry Elder, Winsome Sears, Vernon Jones e Herschel Walker | Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

O mundo assiste hoje, e quase em tempo real, à guerra na Ucrânia. Imagens de soldados russos e ucranianos, assim como de civis fugindo do terror da guerra, são divulgadas pelas redes sociais numa velocidade impressionante. No entanto, mesmo em um mundo globalmente conectado devido aos grandes avanços tecnológicos, checar a veracidade de imagens e informações pode ser uma tarefa difícil. Em meio a tanques e armamento militar pesado, a guerra das narrativas também é um estado atual do conflito na Ucrânia. A propaganda que os lados divulgam, no entanto, não é uma arma recente em situações como essa. Propagandistas na mídia atuam como soldados disciplinados. E nem é preciso um mundo conectado à tecnologia como o atual para que um ataque à verdade seja iniciado, bastam os jornalistas certos para as causas de cada lado.

Na década de 1890, o governo espanhol e os nacionalistas cubanos começaram a lutar pelo desejo de Cuba de ser independente da Espanha. Em 1895, Cuba e Porto Rico eram as últimas propriedades coloniais daquele país no hemisfério ocidental e, para lutar contra as revoltas, o governo espanhol começou a realocar vilas cubanas para suprimir qualquer ajuda que os rebeldes pudessem estar recebendo. Ao mover essas aldeias, milhares de civis começaram a passar fome, adoecer e morrer.

Enquanto alguns líderes cubanos não queriam que os Estados Unidos interferissem, outros procuraram os Estados Unidos em busca de ajuda. Na América, as pessoas simpatizavam com os cubanos que lutavam pela independência de seu país natal, uma vez que sua luta lembrava a batalha das colônias pela independência dos britânicos, em 1776. Os Estados Unidos entrariam na Guerra Hispano-Americana em abril de 1898 para ajudar Cuba a alcançar a independência — e um dos fatores que contribuíram para que os cidadãos norte-americanos exigissem que o país entrasse no conflito foi o chamado “jornalismo amarelo”.

O yellow journalism nada mais era do que o sensacionalismo de histórias na mídia. Durante o final dos anos 1800, os gigantes da mídia americana William Randolf Hearst e Joseph Pulitzer competiam para vender jornais. Para ganhar leitores, Hearst e Pulitzer frequentemente permitiam que seus repórteres exagerassem nos fatos e nos detalhes de suas histórias. O modus operandi da imprensa de hoje não é uma coisa tão nova assim.

A luta cubana pela independência, claro, ganhou a atenção de Pulitzer e Hearst, que enviaram repórteres a Cuba para contar as histórias dos campos de concentração cubanos liderados pelo general espanhol Butcher Weyler. A cobertura sobre os conflitos e o sofrimento que ocorriam em Cuba chamou a atenção do público norte-americano, envolvendo emocionalmente os leitores. Para aumentar a indignação e as tensões entre os países, uma carta roubada de Enrique Depuy de Lome, ministro espanhol, com comentários negativos sobre o presidente norte-americano William McKinley foi publicada — embora esse não tenha sido o estopim para a entrada norte-americana na guerra. Então, em 15 de fevereiro de 1898, o navio americano USS Maine explodiu no Porto de Havana, evento que colocaria os Estados Unidos de vez no conflito. O governo dos EUA havia enviado originalmente o Maine a Cuba para proteger os interesses econômicos norte-americanos e prover informações sobre a batalha, mas Pulitzer e Hearst publicaram rapidamente que a explosão tinha sido um ataque espanhol.

A Marinha dos Estados Unidos começou a investigar a explosão do navio e determinou que ela não havia sido resultado de atos subversivos, mas de um mau funcionamento do navio. Enquanto as descobertas da Marinha dos EUA eram anunciadas, a cobertura jornalística sensacionalista da explosão motivou o público norte-americano a pedir ao governo que declarasse guerra à Espanha. Nunca houve retratação pelas fakes news da época.

O racismo republicano
Mas esse “jornalismo amarelo” não é exclusividade de eventos em guerras apenas. A maneira como esses agentes atuam, seja na imprensa seja com revisionismos factuais, pode ser eficiente e apagar as verdadeiras páginas dos livros de história. Uma atuação eficaz, que rende frutos até hoje na sociedade norte-americana, foi o brilhante twist histórico entoado por centenas de historiadores e jornalistas militantes de que o Partido Republicano nos EUA, o GOP, é um partido racista, que sempre pregou a segregação das minorias, principalmente dos negros.

Fundado em 1854, o Partido Republicano foi criado para promover a igualdade afro-americana e lutar pela liberdade dos negros, um dos pilares da Guerra Civil, o conflito que mais matou norte-americanos na história. Abraham Lincoln e os Republicanos Radicais no Congresso lutaram para acabar com a escravidão e dar aos negros cidadania plena. A própria Guerra Civil desmonta a falácia de que republicanos são racistas desde a sua origem, já que o partido foi criado exatamente para combater os racistas democratas do sul. Regimentos compostos de negros durante a Guerra Civil Americana existiram apenas no norte, onde os republicanos abolicionistas conduziam seus Estados livres. (Recomendo o filme “Tempo de Glória”, de 1989, com Denzel Washington, Morgan Freeman e Matthew Broderick, que conta a história real do 54º Regimento de Infantaria de Massachusetts, o primeiro regimento afro-americano do Exército da União na Guerra Civil Americana.) Intelectuais, jornalistas e professores negros eram todos atrelados ao Partido Republicano, que promovia a congregação de todos os cidadãos.

Logo após a Guerra de Secessão e nas décadas seguintes, os primeiros políticos eleitos — com muito suor e luta contra o preconceito — eram todos do Partido Republicano. Os democratas administravam praticamente todos os Estados do sul e, mesmo após a Guerra Civil, trataram de aprovar legislações segregacionistas, as chamadas Jim Crow Laws — leis que excluíam e separavam os negros da vida cotidiana na sociedade norte-americana.

Por mais que tentem esconder nos porões do atual debate público, o conservadorismo negro e suas raízes antirracistas estão enraizados em várias comunidades de ascendência africana nos EUA. Os conservadores negros enfatizam o tradicionalismo, o patriotismo, a autossuficiência e o forte apelo cultural e social dentro do contexto da igreja cristã. A era da Reconstrução iniciou a maior mudança de afro-americanos conservadores na história moderna da política norte-americana. Durante esse período, os eleitores negros começaram a se alinhar mais com o Partido Republicano e suas ideologias conservadoras, que promoviam a liberdade, não apenas física, mas intelectual.

O preconceito da imprensa
Nas últimas três décadas, um tipo de conservadorismo defendido por um grupo de intelectuais negros tornou-se um marco no cenário político da América, promovendo debates políticos sobre alguns dos assuntos mais urgentes que confrontam a sociedade norte-americana contemporânea. Suas ideias foram negligenciadas por estudiosos da experiência afro-americana, e grande parte da responsabilidade de explicar o significado histórico e contemporâneo do conservadorismo negro recaiu sobre jornalistas altamente alinhados com o Partido Democrata. Normalmente, esses “especialistas” retratam os conservadores negros como estúpidos e incoerentes. Condolezza Rice, Ben Carson, Larry Elder, Candace Owens, o juiz da Suprema Corte Clarence Thomas, os escritores e economistas Shelby Stelle e Walter Williams, Alveda King, sobrinha de Martin Luther King Jr, e até o espetacular e necessário Thomas Sowell são constantemente chamados de Uncle Toms, uma expressão pejorativa, algo como “capitão do mato” no Brasil.

A mídia continua a se voltar preguiçosamente para o Black Lives Matter, como se esse grupo falasse por todos os negros

Thomas Sowell já se acostumou com um certo olhar da mídia progressista, geralmente de entrevistadores brancos. Eles sempre questionam como um conservador negro consegue lidar com críticas dos colegas negros. Em uma entrevista recente, Sowell, agora com 90 anos, desafiou a premissa de que os negros estão mais alinhados com as políticas dos progressistas democratas: “Não sei se podemos dizer que vou contra a corrente dos afro-americanos”, disse. “Não acho que colegas intelectuais negros sejam diferentes dos intelectuais brancos. Todos eles estão desalinhados com o que a comunidade, de fato, pensa. Negros regularmente me param em público e elogiam minhas opiniões. Quando saí do meu hotel nesta manhã, o segurança negro veio e disse: ‘Você é o Sowell?’; eu disse, ‘sim’. Ele andou comigo por todo o corredor e conversamos sobre isso e sobre aquilo… Então, não é Sowell contra negros. São os intelectuais progressistas negros”.

Sowell tem um escopo distinto de trabalho em teoria social e história econômica que é separado de seus estudos sobre raça, cultura e desigualdade. O grande volume dos textos e artigos de Thomas Sowell é superado por poucos contemporâneos, negros ou não. A amplitude e a profundidade de sua erudição tornam o rótulo “conservador negro”, seja qual for a definição do termo, limitada demais. Sua vasta obra será estudada e apreciada por muito tempo depois que ele partir.

Black Lives Matter
E a longa história de confundir os interesses de norte-americanos negros com os de organizações negras, jornalistas negros, acadêmicos negros e outras elites segue firme. 
A mídia continua a se voltar preguiçosamente para esses grupos, como o Black Lives Matter, como se eles falassem por todos os negros. 
Felecia Killings, uma jovem negra e CEO do Movimento Conservador Consciente, viaja o país contando sua história e despertando jovens negros das correntes que muitos têm com os democratas progressistas. Killings conta que seu pai a criou para ser conservadora e explica ainda que os negros norte-americanos são conservadores em seus valores. 
 
Sua organização, Conscious Conservative, tenta preencher a lacuna de educação e treinamento entre os negros norte-americanos e o conservadorismo, defendido pelo Partido Republicano: “Trata-se de entender a história negra, trata-se de entender que essa história está do lado do conservadorismo e, se pudermos adotar essas mensagens de uma maneira mais firme, em oposição a uma maneira degradante e desumanizante, veremos mais negros norte-americanos, millennials negros, especialmente entre os eleitores negros do sexo masculino; e começaremos a ver mais deles se alinhando com a política conservadora. Só o conservadorismo protege nossa liberdade e nossa crescente riqueza que estamos construindo avidamente dia após dia”.

Os comentários da jovem Killings vieram depois que Winsome Sears, vice-governadora eleita da Virgínia, tornou-se a primeira mulher negra a ser eleita em todo o Estado. Sears, candidata do Partido Republicano, atribuiu sua vitória ao fato de os eleitores estarem cansados de ver negros e brancos sendo colocados uns contra os outros: “Eles estão cansados de negros contra brancos e asiáticos contra latinos. Eles estão cansados disso e estão cansados de políticos que não deixam as feridas do passado cicatrizarem”.

Apesar de sua derrota nas eleições de 2020, o ex-presidente Donald Trump pode se gabar de um sucesso que intrigou os pesquisadores — ele era mais popular entre os eleitores de minorias étnicas do que em 2016, e o republicano presidencial com o maior número de votos nesses grupos desde 1969. Alguns podem achar isso surpreendente, já que seus críticos o acusaram durante quatro anos de racismo. Trump negava as acusações e acusava os democratas de subestimar os eleitores afro-americanos. Enquanto na Casa Branca o republicano foi ativo em políticas como independência financeira para as comunidades negras e latinas, com a implementação de programas eficazes de isenção fiscal, entre eles o “Opportunity Zones” para condados com baixo investimento do capital privado. Também cortou fundos federais para a indústria do aborto e suas clínicas espalhadas principalmente nas comunidades negras, o que fez elevar sua aprovação entre negros e latinos cristãos.

Questões como a imigração, sobre a qual o presidente Trump foi notoriamente linha-dura, a comunidade latina se mostrou menos monolítica do que alguns supõem. Uma pesquisa Gallup de 2017, por exemplo, descobriu que 67% dos hispânicos disseram que se preocupavam muito ou bastante com a imigração ilegal — número maior do que a proporção de brancos não hispânicos (59%), que responderam da mesma maneira. O presidente republicano ganhou seis pontos porcentuais entre os homens negros em 2020 e cinco pontos porcentuais entre as mulheres hispânicas. Isso significa que alguns eleitores mudaram de ideia, depois de não votar nele ou votar em outro candidato em 2016.

(...)

Quando em 2022 um lado do espectro político-ideológico ainda prega a segregação silenciosa, baseada na ideia de que a cor de sua pele pode predominar sobre o seu caráter, o que eu posso dizer é que sinto muito por essas pessoas. Por pura cegueira ideológica, alimentada por sementes vis de políticos racistas e inescrupulosos, eles deixam de ler e conhecer homens como Wilson William e Thomas Sowell. Homens que além, muito além da cor da pele engrandecem, expandem e enriquecem o mundo das ideias de todos nós.

Leia também “Tempo de escolha”

Ana Paula Henkel, colunista - Revista Oeste


quarta-feira, 2 de março de 2022

Os pets no agronegócio - Evaristo de Miranda

Revista Oeste

A introdução dos cães, sobretudo pelas mãos dos jesuítas, inaugurou um novo tempo de sono e vida mais tranquila para os índios

Diferentes tipos de raças - Foto: Shutterstock


Bom pra cachorro!
Expressão popular brasileira

Durante séculos, o sono dos indígenas foi leve e conturbado. Animais selvagens, predadores, grupos inimigos e ameaças de todo o tipo os impediam de dormir profundamente. Era preciso estar vigilante. Suas noites só começaram a ser tranquilas com a chegada de uma nova tecnologia: os cachorros europeus. Sua capacidade excepcional de detectar intrusos e ameaças pelo ruído e pelo olfato, de latir e dar sinais nas proximidades das aldeias e de até atacar invasores transformou o sono e as noites nas redes e nas tabas.

Talvez não tenham sido facões, machados ou anzóis, as tecnologias portuguesas mais amplamente desejadas e adotadas pelos indígenas brasileiros. Foram os cães, mais úteis do que o impenetrável e irreprodutível metal dos europeus. Cães primitivos existiam na América do Norte. Eles acompanharam as migrações das diversas levas de humanas pelo Estreito de Bering, como atestam registros arqueológicos. Sua chegada à América do Sul foi mais tardia (entre 5000 e 2500 a.C.). E ficaram restritos a áreas agrícolas dos Andes, com alguma rara presença na Pampa.

As raças pré-colombianas desapareceram rapidamente com a chegada dos cães europeus. Até hoje não há uma explicação científica satisfatória sobre seu desaparecimento brusco e sua substituição por cães europeus. Uma coisa é certa: os cães europeus também conquistaram a América.

No Brasil, era diferente. Os índios não possuíam cachorros e não há vestígio de cães domésticos até a chegada dos portugueses. No século 16, a expansão territorial dos tupis ainda não estava consolidada, após a extinção de sambaquieiros e de outros povos no rastro de seu avanço. As guerras entre tribos eram marcadas pela antropofagia. Mulheres e crianças eram vítimas: fáceis de capturar, imobilizar e transportar, mais indefesas do que os guerreiros. Buscar água ou brincar longe das aldeias era um risco enorme. A vida real das mulheres e das crianças indígenas era talvez distante da mítica visão paradisíaca apresentada por alguns.

A introdução dos cães, sobretudo pelas mãos dos jesuítas, inaugurou um novo tempo de sono e vida mais tranquila para os índios. Em caso de aproximação de guerreiros inimigos, de dia ou de noite, os cachorros davam sinal e até atacavam potenciais agressores. O cão foi integrado nas tribos como o primeiro mamífero doméstico. E o mais extraordinário deles: capaz de seguir os passos do dono, obedecer a ordens e cumprir tarefas. Nessa intimidade é comum, ainda hoje, as índias amamentarem cães em seus seios ou prepará-los assados como alimento.

Os índios descobriram sua eficiência cinegética, caçando sozinho ou em matilha. O cão mudou as técnicas de caça, e até ritos de captura da onça, antes atraída para armadilhas no solo, como indicam relatos jesuíticos. Sua capacidade de farejar, perseguir e acuar as onças no alto das árvores era uma novidade. Nunca mais o índio se sentiu num mato sem cachorro.

O número de pets cresce em média 2% ao ano, acima da taxa de crescimento da população

O cão (Canis familiaris) é um mamífero carnívoro da família dos canídeos. Para a ciência, o cachorro descende de populações do lobo eurasiático (Canis lupus). Todo cão, independente da raça, é descendente longínquo de lobos selvagens e primo dos coiotes. Mesmo o mais miniaturizado, como os carregados por senhoras em suas bolsas, é descendente de um lobo. E, pela etimologia, o Canis infiltrou-se em canícula, canalha, cinismo…

Os cães são naturalmente prolíficos. Cada ninhada tem em média de seis a oito filhotes. Cios são frequentes. Fêmeas aceitam muitos machos. Às vezes, a ninhada tem filhos de vários pais. O intervalo entre partos é pequeno e permite duas crias por ano. O sucesso reprodutivo dos cães garantiu sua expansão entre as tribos. Chegaram às aldeias remotas, cujo contato com brancos só ocorreria séculos mais tarde. E prossegue a seleção canina. A Confederação Brasileira de Cinofilia lidera é a cinofilia nacional, com mais de 150 mil animais registrados

No Brasil, entre os principais animais de companhia estão os cães. São 56 milhões, a segunda maior população canina do mundo. Em segundo lugar, estão 41 milhões de aves canoras e ornamentais. Gatos somam 24 milhões e têm o maior crescimento: mais de 3% ao ano. A população de peixes ornamentais é da ordem de 19 milhões, e os pequenos mamíferos, répteis e outros animais totalizam 2,5%.

Se em sua casa tem cachorro, gato, peixinho no aquário ou passarinho numa gaiola, você integra o segmento do agronegócio dos animais de companhia. O chamado setor pet do agronegócio está relacionado ao desenvolvimento das atividades de criação, produção, comercialização e cuidados para mais de 145 milhões de animais de estimação existentes no Brasil.

Os animais de estimação são criados para o convívio com humanos por razões principalmente afetivas. Eles têm como destinações principais: companhia, lazer, terapia, auxílio a portadores de necessidades especiais, esportes, segurança, torneios, exposições, conservação, socorrismo e trabalhos especiais. O número de pets cresce em média 2% ao ano, acima da taxa de crescimento da população.

Graças às bases industriais do agronegócio brasileiro, à organicidade crescente de suas diferentes atividades produtivas e à reciclagem de seus produtos e resíduos, a maioria dos animais pode receber o que há de melhor em nutrição, medicina veterinária, alojamento, canis, transporte, identificação, treinamento e bem-estar animal. Por obra do agronegócio, sobretudo para os cães, a vida anda boa pra cachorro.

O agronegócio pet registrou um bom crescimento em 2021. O lockdown e o isolamento social impostos recentemente levaram os tutores de animais a uma maior proximidade com seus pets e a demandar mais alimentos completos e balanceados, cujo consumo cresceu 8% em 2021. Até alimentos vegetarianos para cães são produzidos para respeitar convicções de seus donos. Segundo o Instituto Pet Brasil (IPB), em 2020, o conjunto do mercado pet registrou crescimento de 13,5%, com faturamento de R$ 40 bilhões. Em 2021, o crescimento foi de 22% e o faturamento ultrapassou R$ 50 bilhões.

Simplificadamente, três áreas compõem esse mercado: alimentação animal (pet food) representa 73% do faturamento; produtos veterinários (pet vet) alcançam 19%; cuidados e bem-estar animal (pet care) somam 8%. Pequenos e médios pet shops são o principal canal de acesso aos produtos e representam quase metade das vendas do setor (48%); seguidos por clínicas e hospitais veterinários (17,9%); lojas agropecuárias (10,2%); varejo alimentar (8,9%); pet shops de grande porte (7,4%); e-commerce (5,4%); e outros, como clubes de serviço, lojas de conveniência e hotelaria (2,2%). Em 2020, as empresas do setor pet ultrapassaram 272 mil estabelecimentos, segundo a Abinpet. Todo o setor se aproxima a 0,4% do PIB brasileiro.

Os cães deixam cada vez mais o quintal para viver dentro das casas. Até em razão da verticalização nas cidades e da vida em apartamentos. Animais de estimação são considerados parte da família. Muitos casais sem filhos ou pessoas idosas, cuja expectativa de vida aumenta, buscam a companhia de um pet. Ao reduzir a solidão, os pets assumem outras dimensões na vida das pessoas. Cães participam de tratamentos terapêuticos, acompanham o humano em sua existência e, em muitas culturas, guiam na morte, como psicopompos (Anúbis, Cérbero, Xoloti…). Presentes na vida de santos, os cães inspiram a vida espiritual.

Por milênios, em sua interdependência crescente, cães e humanos compartilharam comidas, doenças, ócio, trabalho, inimigos e ameaças. Filhotes foram trazidos para dentro das cabanas e das cavernas. E o simétrico foi sonhado: lobos amamentando humanos, desde a fundação de Roma até Mogli, o menino-lobo. Sem falar em lobisomem, Lassie ou Rin Tin Tin. E a fecunda parceria prossegue no campo e na cidade. No agronegócio brasileiro, a caravana passa e os cães vão junto. Felizes e bem tratados.

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Evaristo de Miranda,  colunista - Revista Oeste


segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

O mundo se despede da pandemia - Revista Oeste

Artur Piva - Paula Leal

Na Europa, países derrubam restrições e tratam a covid como uma doença comum. No Brasil, casos em queda e máscaras em alta 
Foto: Montagem/Shutterstock
Foto: Montagem/Shutterstock
 
 A Inglaterra se tornou o país mais livre da Europa. Há algumas semanas, os ingleses experimentam a vida livres de máscaras, passaportes sanitários ou restrições de circulação. Até os contaminados pelo coronavírus foram dispensados de fazer isolamento social. O governo do primeiro-ministro, Boris Johnson, pôs em prática o plano “Viver com covid”, antecipando o desfecho dado como certo pela comunidade científica: a covid-19 se tornará uma endemia, ou seja, uma doença comum, como é a gripe. 
A decisão da Inglaterra é acompanhada por outros países que já entenderam, nessa altura do campeonato, que a apresentação de passaportes de vacina e lockdowns rigorosos são incapazes de conter o curso da doença. Com o mundo adentrando no terceiro ano da pandemia, algumas “verdades incontestáveis” simplesmente perderam a “validade científica”. Não dá para seguir em um embate permanente contra a doença, tratando a liberdade como sinônimo de morte e as restrições infinitas como corretas e saudáveis. Parte do planeta já despertou para a realidade.   

Ao menos 20 países já anunciaram a flexibilização de regras no combate à pandemia. A Espanha, no mês passado, propôs classificar a covid-19 como uma doença endêmica. Coube ao primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez, fazer o anúncio: “A ciência nos deu a resposta para que consigamos nos proteger”, afirmou Sánchez, em entrevista à rádio Cadena Ser. “Nós temos de começar a avaliar a evolução da covid-19 de uma pandemia para uma doença endêmica.” Desde 29 de janeiro, a Espanha voltou a permitir que as pessoas frequentem bares e restaurantes sem restrições. Nem a comprovação de vacinação é necessária.

A Suíça suspendeu a maioria das medidas restritivas contra a covid-19. O uso de máscaras e a apresentação do certificado de vacinação não serão mais exigidos para entrar em lojas, restaurantes, cinemas e teatros. Não há mais restrições para reuniões privadas nem a necessidade de obter licença para grandes eventos. A Dinamarca liberou geral e derrubou todas as proibições. “Estamos prontos para sair da sombra do coronavírus, nos despedimos das restrições e saudamos a vida que tínhamos antes”, disse a primeira-ministra, Mette Frederiksen

A Polônia vai remover a maioria das restrições à covid-19 a partir de 1º de março. Na Itália, o uso de máscaras ao ar livre tornou-se facultativo. E Israel derrubou a exigência do passaporte sanitário. O primeiro-ministro, Naftali Bennett, justificou a medida afirmando que a onda de contágio da Ômicron está diminuindo rapidamente. O país, que já está na quarta dose de vacina, quer combater o coronavírus por meio da vacinação, sem “bloquear” a economia.

Combinação ideal para acelerar o fim da pandemia
Depois da chegada da Ômicron
, a mais transmissível das variantes do coronavírus, a pandemia perdeu fôlego. No último dia 15, a Organização Mundial da Saúde (OMS) anunciou pela segunda vez neste ano queda no número de novos casos de covid-19 no mundo. As mortes pela doença estão reduzindo. É verdade que já vivemos outros períodos de trégua do vírus, seguidos de surtos ainda piores. Até agora, a doença já matou cerca de 6 milhões de pessoas no mundo e contaminou aproximadamente 430 milhões. Mas em nenhum momento, desde que a OMS decretou a pandemia, em março de 2020, o planeta reuniu três condições capazes de acelerar o fim de tragédias sanitárias causadas por vírus como agora: a vacinação em massa, um vírus menos letal em comparação com outras variantes e a grande quantidade de pessoas que se imunizaram naturalmente, [a famosa e desejada 'imunidade de rebanho' que o presidente Bolsonaro tanto defendeu e, por isso, foi tão execrado. Mais uma vez os especialistas mostraram as razões de estarem desempregados ou desatualizados - esses pelo longo período de aposentadoria.] por terem contraído a doença.

Assim como outros vírus respiratórios, o coronavírus provavelmente buscará o equilíbrio entre letalidade e sobrevivência. “O vírus só consegue se multiplicar se ele estiver dentro de um organismo vivo”, explica a infectologista Patrícia Rady Muller. “Não é a intenção do vírus sair matando todo mundo, senão ele não vai ter como se multiplicar e sobreviver.” Logo, variantes com alto poder de infecção se tornam dominantes, mas com baixa capacidade de provocar doenças graves e mortes.A alta transmissibilidade faz com que a Ômicron circule com muita rapidez entre suscetíveis, infectando num curto período grande parte da população”, explica José Eduardo Levi, virologista e coordenador de pesquisa da Dasa, uma das maiores redes de saúde integrada do Brasil. “O que também leva à queda rápida pelo esgotamento de suscetíveis e torna a maior parte da população imune.” O médico Christopher Murray, especialista em métricas da saúde da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, escreveu em artigo, publicado no mês passado, na revista científica The Lancet: “O nível de infecções sem precedentes sugere que mais da metade da população mundial terá sido contaminada pela Ômicron entre novembro de 2021 e março de 2022”. 

Somado a isso, já foram aplicados mais de 10 bilhões de injeções anticovid no mundo. Apesar de as vacinas não serem 100% eficazes para evitar contaminações pelo coronavírus, estudos mostram que pessoas vacinadas, quando infectadas, têm menos chances de evoluir para casos graves e mortes. “Embora a Ômicron seja mais competente, tanto em escapar da resposta vacinal quanto da imunidade pós-infecção, já que a taxa de reinfecção por essa variante em quem já teve covid é alta, as vacinas têm evitado quadros mais graves também pela Ômicron”, disse Levi. 

A pandemia no Brasil
No final do ano passado, o surgimento da Ômicron causou uma nova onda de pessimismo global. No Brasil, não foi diferente. As festas de réveillon foram canceladas, governantes recuaram em aliviar medidas como uso de máscaras, o trabalho remoto foi reativado e alguns gestores, como o governador de São de Paulo, João Doria, se apressaram em anunciar doses extras de vacinas para a população. Um novo déjà vu pandêmico se instalou no país. As manchetes voltaram a repercutir recordes de contaminações, alta nas internações hospitalares, a curva de mortes aumentou. De fato, a nova variante impactou o ritmo da crise sanitária no Brasil. Mas os números mostram que o solavanco provocado pela Ômicron, como antecipou reportagem da Revista Oeste, foi bem menos intenso quando comparado com outros períodos da pandemia, e está em desaceleração. 
 
Cenário atual de casos e mortes por covid-19
No Brasil, assim como em outros países em que a Ômicron aterrissou
, o número de casos de covid-19 explodiu. Em 3 de fevereiro, o país registrou recorde de infecções: quase 300 mil em um único dia. No entanto, a média móvel de casos, que elimina distorções entre dias úteis e fim de semana, ficou em pouco mais de 90 mil na última quinta-feira, 24, abaixo de 100 mil pela terceira vez desde 19 de janeiro. A redução da taxa ocorre desde 6 de fevereiro, o que também já começa a refletir na diminuição das mortes. O número total de contaminados pelo coronavírus é de pouco mais de 28,5 milhões de brasileiros até agora.

Enquanto boa parte do mundo se despede das restrições impostas por autoridades em razão do coronavírus, o Brasil resiste

Contudo, diferente do que se viu no início de 2021, o índice de mortes não aumentou na mesma proporção que os casos dispararam. A média móvel de mortes registrou queda pelo quarto dia consecutivo, chegando a quase 800, menor número desde 7 de fevereiro. No entanto, levando em consideração o pico da pandemia, em abril do ano passado, quando mais de 3,1 mil pessoas morreram em um único dia, houve redução de cerca de 75% das mortes, considerando a média móvel para sete dias.

A Maquiagem das estatísticas
No período mais trágico da pandemia no Brasil, a ocupação de leitos de UTI destinados ao tratamento da covid-19 no Estado de São Paulo chegou perto de 90%, segundo dados da Seade, fundação vinculada à Secretaria de Governo do Estado. Em 7 de abril de 2021, havia cerca de 13 mil pacientes internados para pouco mais de 14 mil vagas.

Ainda no ano passado, quando a pandemia perdeu força, os hospitais reduziram a quantidade de leitos destinados exclusivamente para pacientes com covid-19. Por exemplo, no Estado de São Paulo, a disponibilidade de leitos de UTI covid caiu de 14 mil para menos de 5 mil (redução de quase três vezes). Nesta semana, em 24 de fevereiro, quase 2,5 mil pacientes ocupavam leitos de UTI covid. No entanto, o governo do Estado registrava lotação acima de 50%. Se a quantidade de UTIs destinadas à covid-19 fosse a mesma de 7 de abril de 2021, a ocupação atual não chegaria a 20%. 

Considerando as mais de 14 mil vagas de UTI reservadas em abril do ano passado para pacientes com covid-19, mesmo em 3 de fevereiro — momento de maior pressão no sistema de saúde depois do surgimento da Ômicron até agora —, a lotação teria ficado abaixo de 30%.

 

Na vanguarda do atraso

Enquanto boa parte do mundo se despede das restrições impostas por autoridades em razão do coronavírus, o Brasil resiste. Por aqui, os gestores não dispensaram o acessório mais simbólico desta pandemia: as máscaras. Elas continuam por toda parte. São usadas ao ar livre, em alguns casos até dentro de piscinas. Máscaras (às vezes duas) cobrem o rosto em academias, parques, na chegada de restaurantes e festas (sentado pode tirar). O uso do equipamento, mais do que evitar a contaminação pelo coronavírus, virou gesto político e ato de resistência. Nesta semana, o Fórum Nacional de Governadores se reuniu para avaliar a flexibilização do uso de máscaras no país a partir de março. O grupo pediu uma análise ao comitê científico para formular um cronograma de transição de medidas restritivas relacionadas à covid.

Outro ponto em que o Brasil patina em relação às nações desenvolvidas é o debate transparente sobre a vacinação infantil. Embora o Ministério da Saúde tenha deixado claro que a vacinação de crianças não é obrigatória, os Estados têm obrigado indiretamente a imunização de menores de 12 anos, sob ameaça de denunciar os pais que optarem por não imunizar seus filhos ao Conselho Tutelar. Para completar o combo do atraso, ainda discutimos a imposição do passaporte sanitário, quando países da Europa já entenderam que a vacinação não impede a transmissão e quem opta por não se vacinar não representa um risco para a humanidade. O retorno à vida como era antes está mais perto do que nunca. O Brasil não pode ficar para trás. 

Leia também “As inúmeras contradições da pandemia”

Artur Piva - Paula Leal, jornalista - Revista Oeste


sábado, 29 de janeiro de 2022

O LUGAR VAGO A QUE PUTIN SE CANDIDATA - Fernão Lara Mesquita

Não é de hoje a decepção dos fugidos do totalitarismo com a constatação da negação, pelo Ocidente que seus reformadores admiravam, dos fundamentos da sua própria cultura humanística.

Desde a Queda do Muro, já lá vão 33 anos, eles vêm constatando, com a reiterada surpresa de quem viveu acordado o pesadelo com que os outros estão apenas sonhando, que as trajetórias desses dois lados do mundo andam invertidas, com cada lado caminhando para o lugar que o outro ocupava.

Agora o movimento de “roque”, como no xadrez, está completo. Na visão do ex-chefe da polícia política soviética e presidente eterno da Russia, Vladimir Putin, “neste momento em que o mundo atravessa uma fase de disrrupção estrutural, a importância de um conservadorismo baseado na razão é cada vez mais urgentemente necessário, precisamente porque os riscos e perigos vêm se multiplicando tanto quanto a fragilidade de tudo à nossa volta”(…) 

“Todo poder, se quiser ser grande, tem de apoiar-se num conjunto de ideias que apontem para o futuro. E quando essa ideia se perde, o poder deixa de ser grande ou simplesmente se desintegra. Isso aconteceu com Roma e com a Espanha do século 17. Aconteceu também com a União Soviética quando a idéia do comunismo que a sustentava se perdeu. Ela era falsa, mas estava lá. Isso aconteceu com as potências europeias que ficaram cansadas e abandonaram suas ideias em favor de um pan-europeísmo que ainda os empurrou para frente por um tempo mas também se está esfarelando”.

Vladimir Putin candidata-se ao lugar vago.

Ele acredita que se for capaz de delinear uma ideologia conservadora consistente a Russia pode transformar-se num modelo e num polo de atração não só para os países da antiga União Soviética que têm eleito governos conservadores, como a Hungria e a Polônia, mas até para as forças conservadoras da Europa e dos próprios Estados Unidos.

“O liberalismo progressista (que é como a esquerda americana chama a si mesmo) apoia proibições na sua estrutura ideológica. Não está aberto às instituições e políticas que não se alinhem com os seus instintos. Cada vez mais restringe o espaço de manobra dessas correntes, estejam onde estiverem, dos direitos dos pais ao conceito de soberania. É abertamente hostil até mesmo a princípios fundamentais do liberalismo tais como a liberdade de expressão. Tem se voltado até mesmo contra a vontade expressa dos eleitores em eleições e referendos”.

Ironicamente o mundo está prestes a entrar, portanto, numa nova Guerra Fria com papéis invertidos com o Ocidente carregando a bandeira do liberal-progressismo-comunista e a Russia a do conservadorismo.

Clube de Discussões Valdai é um thinktank criado pelo próprio Putin em 2004, que patrocina anualmente o Forum Econômico Internacional de S. Petersburgo em Vladivostok. 

Seguem, abaixo, extratos do seu discurso na edição de outubro de 2021:

“(…) a crise que estamos enfrentando é conceitual e até, mais que isso, civilizatória. Uma crise dos princípios que regem a própria existência humana na Terra (…) vivemos num estado de permanente inconstância, de imprevisibilidade, uma infindável transição (…) enfrentamos mudanças sistemáticas vindas de todas as direções – da cada vez mais complicada condição geofísica do planeta até às mais paradoxais interpretações do que é ser humano e quais as razões de nossa existência”…

“As mudanças climáticas e a degradação ambiental são tão obvias que mesmo as pessoas mais desatentas não podem mais ignorá-las. Alguma coisa tem de ser feita (…) e qualquer desavença geopolítica, científica ou técnica perde o sentido num quadro em que os vencedores não terão água para beber ou ar para respirar (…) nós temos de rever as prioridades de todos os estados”.

“(…) o modelo atual de capitalismo não oferece solução para o crescimento da desigualdade (…) em toda a parte, mesmo nos países mais ricos a distribuição desigual da renda está exacerbando as diferenças (…) os países mais atrasados sentem essa diferença agudamente e estão perdendo a esperança de se aproximar dos mais adiantados. E a desesperança engendra as agressões e empurra as pessoas para os extremos” (…) 

“O fato de sociedades inteiras e gente jovem em diversos países ter reagido agressivamente às medidas de combate ao coronavirus mostrou que a pandemia foi só um pretexto: as causas dessa irritabilidade toda são muito mais profundas, e por isso a pandemia transformou-se em mais um fator de divisão em vez de levar à união”.

“Mas a pandemia também mostrou claramente que a ordem internacional ainda gira em torno dos estados nacionais (…) as super plataformas digitais não conseguiram usurpar a politica e as funções do Estado (…) pesadas multas começam a ser-lhes impostas e as medidas anti-monopólio estão no forno (…) somente estados soberanos podem responder efetivamente aos desafios do tempo e às demandas dos cidadãos (…) quando as crises verdadeiras se desencadeiam só um valor universal fica de pé, a vida humana. E cada Estado decide, com base em suas habilidades, suas condições, sua cultura e suas tradições, qual a melhor maneira de protege-la”.

“O Estado e a sociedade nunca deve responder com radicalismo ou com a destruição de sistemas tradicionais às mudanças de qualidade na tecnologia ou no meio ambiente. É muito mais fácil destruir do que criar. Nós, aqui na Russia, sabemos amargamente disso. Os exemplos da nossa historia nos autorizam a afirmar que as revoluções não são um meio para resolver crises; elas só as agravam. Nenhuma revolução vale o dano que produz nas capacidades humanas”.

“Os advogados do auto-proclamado ‘progresso social’ acreditam que estão empurrando a humanidade para um nível de conscientização novo e melhor. Não ha nada de novo nisso. A Russia já esteve lá. Depois da revolução de 1917 os bolchevistas também diziam que iam mudar todos os comportamentos e costumes, a própria noção de moralidade e os fundamentos de uma sociedade saudável. A destruição de valores solidamente estabelecidos e das relações entre as pessoas até o limite da completa destruição da família, o encorajamento para que as pessoas denunciassem seus entes queridos, tudo isso foi saudado como progresso e amplamente festejado mundo afora” (…) 

“Olhando o que está acontecendo no Ocidente fico embasbacado de ver de volta as práticas que eu espero que nós tenhamos abandonado para sempre num passado distante. A luta pela igualdade e contra a discriminação transformou-se numa forma agressiva de dogmatismo que beira o absurdo (…) Manifestar-se contra o racismo é uma causa nobre e necessária mas essa nova ‘cultura de cancelamento’ transformou-se numa discriminação reversa que não é mais que racismo pelo avesso. A ênfase obsessiva na raça está dividindo cada vez mais as pessoas (…) o contrário do sonho de Martin Luther King”. 

“O debate em torno dos direitos do homem e da mulher, então, transformou-se numa perfeita fantasmagoria (…) e crianças pequenas, sendo ensinadas à revelia de seus pais, que meninos podem se transformar em meninas e vice-versa sem problema nenhum (…) Com o mundo de disrrupção em disrrupção a importância de um conservadorismo racional é fundamental (…) confiar em tradições testadas pelo tempo, um alinhamento preciso das prioridades, relacionar as necessidades com as possibilidades, estabelecer metas prudentes e, principalmente, rejeitar o extremismo como método (…) Para nós, russos, estes não são postulados especulativos mas lições da nossa trágica história. O custo de experiências sociais doentiamente concebidas é impossível de ser pago. Essas ações não destroem apenas bens materiais mas principalmente os fundamentos espirituais da existência humana, deixando atras de si um naufrágio moral onde nada pode ser reconstruído por muito, muito tempo”.

“É claro que ninguém tem receitas prontas. Mas eu me arrisco a dizer que nosso país tem uma vantagem (…) nossa sociedade desenvolveu uma imunidade de rebanho ao extremismo que pavimenta o caminho para a reconstrução depois do cataclismo socioeconômico (…) O nosso é um conservadorismo otimista, que é o que mais importa. Nós acreditamos que o desenvolvimento estável e continuado é possível. Tudo depende estritamente dos nossos próprios esforços”.

“Obrigado por sua paciência”.

 O Vespeiro - Fernão Lara Mesquita