Editorial
O presidente Jair
Bolsonaro não gosta do que lê nos jornais nem das críticas que sofre.
Resolveu revidar ontem, editando Medida Provisória que altera lei
aprovada pelo Congresso e sancionada por ele há quatro meses (a 13.818,
de 24 de abril) e desobriga as empresas de capital aberto de publicarem
demonstrações financeiras em jornais. A lei que foi modificada
estabelecia que até 31 de dezembro de 2021 valeria a regra da Lei das
Sociedades Anônimas, que determina publicação de balanços no Diário
Oficial do Estado em que estiver situada a companhia e em um jornal de
grande circulação nacional. Bolsonaro mencionou o Valor e, entre risos
irônicos, disse esperar que o jornal "sobreviva à MP de ontem".
O
presidente costuma inventar argumentos para atacar adversários ou
interpretar o conteúdo do que lê de maneira singular. Ele disse ontem,
após mencionar a MP 892 que assinara no dia anterior, que concedeu duas
entrevistas ao Valor durante a campanha eleitoral e em uma delas a
manchete era a de que sua proposta de política econômica era igual à da
presidente Dilma Rousseff. Detalhe: o presidente não concedeu
entrevistas ao jornal durante a campanha, apesar de procurado. Os únicos
registros de entrevistas ao Valor datam de 2017 e não trazem tal
referência. Articulistas em colunas de Opinião fizeram paralelos entre
os dois em alguns episódios específicos, como o de quando o presidente
interferiu diretamente na política de preços da Petrobras.O
atropelo à verdade pelo presidente tem sido recorrente, assim como sua
campanha contra a imprensa. Bolsonaro reconheceu ontem em Itapira (SP)
seu objetivo ao editar a MP: "No dia de ontem eu retribuí parte daquilo
que grande parte da mídia me atacou".
Mas, mais do que buscar
atingir a imprensa, o presidente mais uma vez passou por cima da Câmara
dos Deputados e do Senado, que deliberaram sobre o assunto e aprovaram,
após quatro anos de debates, um esquema de transição que eliminaria a
obrigatoriedade de publicação de balanços integrais em jornais impressos
e fixou prazo razoável de adaptação para que isso fosse feito. O
presidente da Câmara, Rodrigo Maia, disse ontem que "retirar receitas
dos jornais do dia para a noite" não lhe parece a melhor decisão. Ele
destacou que não acha que Bolsonaro esteja sendo "atacado" pelos
jornais, que "estão divulgando notícia" e que considera que o jornal
impresso "ainda é instrumento muito importante da divulgação de
informação, da garantia da liberdade de imprensa, da liberdade de
expressão e da nossa democracia". [deputado Maia, algumas sugestões: - senhor cuida de exercer seu mandato de deputado federal, não decepcionando seus eleitores, que não são muitos e presidindo a Câmara - evitando criticas aos chefes dos outros Poderes;
o senhor também não critica decisões do Poder Judiciários - dois juízes no exercício de suas atribuições estão decidindo em qualquer cadeia comum colocarão o condenado e o senhor já fica declarando em entrevistas que a decisão foi extemporânea.
Criticam Bolsonaro por fazer determinados comentários esquecendo que não é o cidadão Bolsonaro e sim o Presidente da República e o mesmo entendimento vale para o senhor que quando fala é visto não como um cidadão comum e sim como o presidente da Câmara dos Deputados.]
Na semana passada, o presidente
foi criticado pelo decano do Supremo Tribunal Federal, Celso de Mello,
por também ter atropelado o entendimento do Congresso, ao lançar uma MP
alguns dias depois de outra ter sido rejeitada, com a mesma finalidade
de retirar a demarcação de terras indígenas da Funai e transferi-la para
o Ministério da Agricultura. Mello viu na atitude de Bolsonaro o sinal
de haver, "na intimidade do poder, um resíduo de indisfarçável
autoritarismo". A edição da nova MP confirma a percepção do ministro do
STF.
Não há a mínima questão de urgência ou relevância que
justifique o uso de medida provisória para tratar do assunto. O
presidente utilizou seus poderes legais para tentar constranger
financeiramente jornais pelo fato de eles publicarem críticas ou
avaliações negativas de seu governo, um fato corriqueiro em regimes
democráticos. A MP 892 não vai mudar em nada a atitude dos jornais
independentes, que não se pautam por objetivos políticos, como o
presidente acredita.
Os impulsos autoritários do presidente
causam problemas para o próprio governo. No início da discussão da
reforma da Previdência, Bolsonaro disse que por ele a reforma jamais
seria feita, maneira estranha de defender a primeira e mais relevante
batalha de seu governo. Agora, quando a reforma tributária adentra o
Congresso, com enormes obstáculos à frente, Bolsonaro ataca os
governadores do Nordeste em seu conjunto - e os governadores tiveram
papel decisivo para enterrar todas as tentativas que passaram pelo
Congresso. [os governadores foram deixados de lado nas negociações e o melhor exemplo disso é que dependesse deles a reforma da Previdência alcançaria os estados.]
A equipe econômica valoriza e pretende incentivar o
mercado de capitais, enquanto o presidente, com a MP, vai, como diz nota
da Associação Nacional de Jornais, "na contramão da transparência de
informações exigida pela sociedade". Ele se orgulha de retirar custos de
publicação das empresas, mas se esquece dos atuais e futuros
acionistas, que buscam cada vez mais informações facilmente disponíveis
diante da arrancada da bolsa de valores. A palavra está novamente com o
Congresso, que tem a oportunidade de reafirmar o entendimento anterior
como a melhor solução para a questão.
Editorial - Valor Econômico
A lufada de ar fresco na política é benéfica. Resta saber como irão se portar deputados e senadores quando tiverem de decidir entre o desejo de seus eleitores e o que for melhor para o País
Começou, enfim, o teste da
chamada “nova política”. Os congressistas que tomaram posse ontem
compõem uma legislatura marcada por histórica renovação. Na Câmara dos
Deputados, 243 das 513 cadeiras agora são ocupadas por parlamentares que
jamais exerceram o cargo de deputado federal, uma taxa de renovação de
47,4%, a maior desde 1998. No Senado a mudança é ainda mais expressiva.
Das 54 vagas disputadas no ano passado, 46 foram conquistadas por novos
nomes. Tamanha renovação - 85%, o que dá aos novatos a maioria na Casa,
composta por 81 senadores - é a maior desde a redemocratização.
A lufada de ar fresco no Congresso é benéfica na medida em que reflete o estado de espírito da Nação. Nada mais democrático do que um Parlamento que reproduz as vontades e disposições da sociedade que o elegeu. Nos últimos cinco anos, em especial na esteira das manifestações de junho de 2013, cresceu no seio de parcela expressiva da população o sentimento de fastio, não raro combinado com repugnância, em relação a tudo e a todos que representavam o que se passou a chamar de “velha política”. Nesta expressão cabem desde práticas de compadrio, patrimonialismo e corrupção - alijando o interesse nacional das discussões políticas - até oligarcas que vinham perpetuando um modo de fazer política que mantém o País no atraso. Desejou-se algo “novo” na política e assim se deu.
A novidade, no entanto, não é uma qualidade em si mesma. Um Congresso renovado não será, necessariamente, um Congresso melhor se, ao fim e ao cabo, novos rostos reproduzirem velhas mentalidades. A sociedade há de ser vigilante sobre os recém-empossados - novos ou não - se quiser, de fato, ver materializada a “nova política” que tanto desejou. A esmagadora maioria dos novos parlamentares foi eleita sob o signo da antipolítica, por paradoxal que isso pareça. Uma nuvem cinzenta pairou sobre o debate eleitoral havido no último ano, confundindo um legítimo anseio por mudanças na política com a sua própria negação. Essa perigosíssima confusão, em boa medida, foi provocada pelo jacobinismo de setores do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário, que por interesses nunca bem explicados disseminaram a ideia de que todos os políticos são iguais e todos são corruptos.
Assim foi pavimentada a estrada que nos trouxe até aqui. Fato é que tanto os calouros como os veteranos da política terão de fazer parte de legítimos esforços para sanear os hábitos perniciosos que contaminaram a atividade parlamentar e aprovar projetos de lei e emendas à Constituição sem os quais não serão debeladas as crises política, econômica, social e moral que solapam o desenvolvimento nacional.
Por “nova política”, assim como foi clamada pela sociedade, deve-se entender, antes de tudo, o exercício da representação parlamentar tendo o interesse nacional acima de tudo. Aqueles que são novos no Congresso e pretendem escrever história devem ter isso em mente, pois não serão raros os momentos em que os parlamentares desta legislatura estarão diante de um conflito entre os interesses imediatos de seus eleitores e aquilo que é melhor e essencial para o País. E esse conflito de interesses deve-se resolver, sempre, em favor do bem-estar da Nação e nunca em favor do conforto dos grupos que se organizam para obter benesses e “adquirir” direitos.
Como é sabido, as redes sociais, entre outros fatores, revolucionaram o modo de fazer campanha eleitoral. A atual composição do Congresso é um retrato bem acabado deste fenômeno. Será comum ver parlamentares transitando pelos corredores de Brasília falando “sozinhos” olhando para seus telefones celulares, praticamente exercendo seus mandatos ao vivo para os eleitores que a tudo acompanham na internet. A comunicação instantânea funcionará muito bem enquanto for bem servido o interesse nacional. Resta saber como irão se portar deputados e senadores quando tiverem de decidir entre duas coisas que nem sempre andam juntas: o desejo de seus eleitores e o que for melhor para o Brasil. Esta será a hora da verdade para antigos e novos políticos.
N. da R. - Pelos acontecimentos de ontem no Senado, conclui-se que, pelo menos naquela Casa, não haverá nada de novo.
A lufada de ar fresco no Congresso é benéfica na medida em que reflete o estado de espírito da Nação. Nada mais democrático do que um Parlamento que reproduz as vontades e disposições da sociedade que o elegeu. Nos últimos cinco anos, em especial na esteira das manifestações de junho de 2013, cresceu no seio de parcela expressiva da população o sentimento de fastio, não raro combinado com repugnância, em relação a tudo e a todos que representavam o que se passou a chamar de “velha política”. Nesta expressão cabem desde práticas de compadrio, patrimonialismo e corrupção - alijando o interesse nacional das discussões políticas - até oligarcas que vinham perpetuando um modo de fazer política que mantém o País no atraso. Desejou-se algo “novo” na política e assim se deu.
A novidade, no entanto, não é uma qualidade em si mesma. Um Congresso renovado não será, necessariamente, um Congresso melhor se, ao fim e ao cabo, novos rostos reproduzirem velhas mentalidades. A sociedade há de ser vigilante sobre os recém-empossados - novos ou não - se quiser, de fato, ver materializada a “nova política” que tanto desejou. A esmagadora maioria dos novos parlamentares foi eleita sob o signo da antipolítica, por paradoxal que isso pareça. Uma nuvem cinzenta pairou sobre o debate eleitoral havido no último ano, confundindo um legítimo anseio por mudanças na política com a sua própria negação. Essa perigosíssima confusão, em boa medida, foi provocada pelo jacobinismo de setores do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário, que por interesses nunca bem explicados disseminaram a ideia de que todos os políticos são iguais e todos são corruptos.
Assim foi pavimentada a estrada que nos trouxe até aqui. Fato é que tanto os calouros como os veteranos da política terão de fazer parte de legítimos esforços para sanear os hábitos perniciosos que contaminaram a atividade parlamentar e aprovar projetos de lei e emendas à Constituição sem os quais não serão debeladas as crises política, econômica, social e moral que solapam o desenvolvimento nacional.
Por “nova política”, assim como foi clamada pela sociedade, deve-se entender, antes de tudo, o exercício da representação parlamentar tendo o interesse nacional acima de tudo. Aqueles que são novos no Congresso e pretendem escrever história devem ter isso em mente, pois não serão raros os momentos em que os parlamentares desta legislatura estarão diante de um conflito entre os interesses imediatos de seus eleitores e aquilo que é melhor e essencial para o País. E esse conflito de interesses deve-se resolver, sempre, em favor do bem-estar da Nação e nunca em favor do conforto dos grupos que se organizam para obter benesses e “adquirir” direitos.
Como é sabido, as redes sociais, entre outros fatores, revolucionaram o modo de fazer campanha eleitoral. A atual composição do Congresso é um retrato bem acabado deste fenômeno. Será comum ver parlamentares transitando pelos corredores de Brasília falando “sozinhos” olhando para seus telefones celulares, praticamente exercendo seus mandatos ao vivo para os eleitores que a tudo acompanham na internet. A comunicação instantânea funcionará muito bem enquanto for bem servido o interesse nacional. Resta saber como irão se portar deputados e senadores quando tiverem de decidir entre duas coisas que nem sempre andam juntas: o desejo de seus eleitores e o que for melhor para o Brasil. Esta será a hora da verdade para antigos e novos políticos.
N. da R. - Pelos acontecimentos de ontem no Senado, conclui-se que, pelo menos naquela Casa, não haverá nada de novo.