O
programa do PT, que vai ao ar à noite — panelas à mão! — é um lixo
político, moral e estético. Que seja José de Abreu a apresenta-lo até
faz sentido. Ocorre que ele estava muito convincente como Nino, o rei do
lixão em “Avenida Brasil”, e se mostra um canastrão constrangedor nessa
peça que se desenvolve entre o delírio e a ameaça de caráter
terrorista. Sim, o programa do PT decidiu ameaçar os brasileiros, muito
especialmente os 66% que querem o impeachment de Dilma, segundo o
Datafolha, e os 71% que avaliam que seu governo é ruim ou péssimo.
Vídeo: PT na TV: Programa partidário - 06 de agosto de 2015
João
Santana é talentoso, mas escorregou feio. Admita-se: não dá para fazer
milagre. O produto que ele tem de vender é ruim, está bichado, ninguém
quer comprar. Começo pelo mais grave.
O programa
tem uma tese central: a crise política é pior do que a crise econômica,
e fica evidente que ela virá, segundo os companheiros, caso se insista
no afastamento de Dilma. E aí o partido radicaliza: ameaça o país com um
“final trágico”. É mesmo? Convenham: petistas na cadeia em razão da
indústria de assalto ao estado que eles promoveram é um final ruim para
os bandidos, mas feliz para o país.
Em três momentos, os petistas ameaçam explicitamente a população:
– entre 20s e 23s – José de Abreu mira o abismo e fala “no final trágico para todos”;
– entre 5min21s e 5min45s – um rapaz pergunta: “será que tumultuar a política traz solução para a economia?” Nesse trecho, o PT chega a falar em golpe militar (ainda que esteja fazendo uma comparação com 1964);
-entre 6min12s e 6min20s – o partido volta a afirmar que é preciso evitar que a crise política ameace a democracia, “pois, sem democracia, tudo iria ao chão”.
– entre 20s e 23s – José de Abreu mira o abismo e fala “no final trágico para todos”;
– entre 5min21s e 5min45s – um rapaz pergunta: “será que tumultuar a política traz solução para a economia?” Nesse trecho, o PT chega a falar em golpe militar (ainda que esteja fazendo uma comparação com 1964);
-entre 6min12s e 6min20s – o partido volta a afirmar que é preciso evitar que a crise política ameace a democracia, “pois, sem democracia, tudo iria ao chão”.
Pergunta-se: quem ameaça a democracia no Brasil?
Respondo: os ladrões!
Pergunta-se: quem ameaça a democracia no Brasil?
Respondo: os que pretendem chamar o cumprimento da lei de “golpe”.
Pergunta-se: quem ameaça a democracia no Brasil?
Respondo: quem entende o Brasil como a luta permanente “nós” e “eles”.
Eu
sintetizo: hoje, a única força que molesta a democracia, porque não
chega a ameaçá-la — e não chega porque não deixamos —, é o PT.
É
estupefaciente que o partido que faz um programa que deveria, então,
apelar à concórdia e à união nacional recorra, duas vezes, ente 1min02s e
1min06s e 5min46s e 5min51s, a imagens de líderes da oposição, com o
carimbo: “Não se deixe enganar pelos que só pensam em si mesmos”. São
contemplados, entre as personagens demonizadas, os senadores Aécio Neves
(PSDB-MG), Ronaldo Caiado (DEM-GO), Agripino Maia (DEM-RN), o deputado
Carlos Sampaio (SP), líder do PSDB, e Paulinho da Força (SD-SP).
Atenção! Três deles são presidentes de partidos de oposição: Aécio,
Agripino e Paulinho.
Nesta
quarta, num apelo candente, tanto Aloizio Mercadante, ministro da Casa
Civil, como Michel Temer, vice-presidente da República e coordenador
político do governo, falaram que alguém precisa “unir e reunir” os
brasileiros. Como? Ora, acusando os líderes oposicionistas de egoístas e
enganadores.
O PT é uma piada grotesca.
Aos
6min23s, eis que aparece Lula: “Nosso pior momento ainda é melhor que o
melhor momento dos governos passados; nosso maior ajuste ainda é menor
do que o ajuste que ELES fizeram”.
Seria
muito fácil demonstrar a mentira de tal afirmação, mas me dispenso
disso. Pergunto apenas se essa é a retórica de quem investe na paz ou na
guerra. Lula, que nasceu destituído do senso de ridículo, não tem
autocrítica. Julgando-se ainda uma referência acima de qualquer
questionamento, diz: “Eu mesmo fiz um ajuste na economia e depois o
Brasil ficou muito melhor”. De fato, ele se considera a única referência
positiva que pode ter um governante na face da Terra. O PT ainda não
percebeu que esse tempo passou.
Aos
7min55s, aparece Dilma, de branco. Afirma: “Sei suportar pressões e até
injustiças”. Ela disse rigorosamente isso na entrevista concedida a Jô
Soares. Era João Santana lá, é João Santana cá. Não temos uma
presidente, mas uma personagem protagonizando um roteiro ruim.
O resto,
meus caros, é campanha eleitoral, com a ligeira diferença, desta feita,
de que Dilma foi eleita há menos de 10 meses. No oitavo mês do segundo
governo, os brasileiros já conhecem todas as mentiras contadas pela
candidata Dilma — e isso explica, em boa parte, os 71% de rejeição e os
66% que querem o impeachment, segundo o Datafolha.
Quem achou
que era uma boa ideia ridicularizar os panelaços, submetendo-os a uma
ironia ufanista e autorreferente? O programa certamente vai ajudar a pôr
alguns milhares nas ruas no dia 16. Finalmente,
e não me estenderei a respeito, José de Abreu, um ator mediano, tem um
desempenho patético. Fala escandindo as sílabas, mal escondendo a
leitura de um texto no teleprompter. Havia, para ficar com referências
da arte dramática, algo de distanciamento brechtiano no seu desempenho:
ele não nos deixava esquecer, em nenhum momento, que aquilo era uma
farsa, uma representação, um discurso sobre a realidade, remetendo-nos, o
tempo todo, para a vida real, que hoje rejeita o PT.
Lula e seu
partido, na década de 80, eram Stanislavski. Os atores realmente
pareciam possuídos pelo papel que encarnavam, diziam coisas críveis, que
soavam naturais. Conduziam muitos à emoção. Agora não! É evidente que
nem eles acreditam naquela porcaria. Para
encerrar: a ruindade é tamanha que se estampa em letras garrafais, na
tela, uma frase que flerta com o incompreensível. Deve ter sido redigida
pessoalmente por Dilma. Está lá: “Não é melhor a gente não acertar em
cheio tentando fazer o bem do que errar feio fazendo o mal?”.
Do ponto de vista da comunicação, é uma aberração porque:
– a interrogação é longa demais;
– os “nãos” estão muito próximos e tornam a mensagem obscura;
– há uma óbvia desconexão de sentido
entre “errar feio” e “fazendo o mal” como relação de causa e
consequência: afinal, quem faz o mal não acha que erra; faz uma opção;
– torna as pessoas reféns da melancolia. Não há boa saída: ou se erra tentando fazer o bem ou se erra tentando fazer o mal.
A boa
notícia é que o programa é mais uma evidência de que o PT morreu. E
ninguém aparece para acender uma vela e encomendar o corpo. Ele fica aí,
recendendo a cadaverina, em praça pública.
Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo