Durante os três primeiros anos do governo Bolsonaro, a Agência
Brasileira de Inteligência (ABIN) operou um sistema secreto de
monitoramento da localização de cidadãos em todo o território nacional,
segundo documentos obtidos pelo GLOBO e relatos de servidores.
A
ferramenta permitia, sem qualquer protocolo oficial, monitorar os passos
de até 10 mil proprietários de celulares a cada 12 meses.
Para isso,
bastava digitar o número de um contato telefônico no programa e
acompanhar num mapa a última localização conhecida do dono do aparelho.
Nota DefesaNet
Diferente do que a reportagem erroneamente informou, a Cognyte (ex-Verint)
está presente no Brasil desde muito antes do governo Bolsonaro. A
empresa é uma das líderes mundiais no fornecimento de soluções
tecnológicas destinadas a apoiar as atividades de inteligência, sendo
uma das principais parceiras das Forças Armadas, de Segurança e de Inteligência do Brasil e de diversos países.
O
investimento em soluções e softwares destinados as atividades de
inteligência aumenta a rapidez e a efetividade das operações. A mídia
tradicional, por desconhecer a importância da atividade de inteligência,
publica regularmente informações sem fundamento e acaba expondo
capacidades e sistemas táticos que não deveriam ser públicos em prejuízo
da segurança das operações.
DefesaNet defende o aumento e a
continuidade do investimento em sistemas e tecnologias capazes de
suportar e aumentar a eficácia das atividades de inteligência, em prol
da segurança do Estado Brasileiro e das Operações Militares.
O Editor
A prática suscitou questionamentos entre os próprios integrantes do
órgão, pois a agência não possui autorização legal para acessar dados
privados. O caso motivou a abertura de investigação interna e, para
especialistas, a vigilância pode ainda violar o direito à privacidade.
Procurada, a ABIN disse que o sigilo contratual a impede de comentar.
A ferramenta, chamada “FirstMile”, ofereceu à agência de inteligência
a possibilidade de identificar a “localização da área aproximada de
aparelhos que utilizam as redes 2G, 3G e 4G”. Desenvolvido pela empresa
israelense Cognyte (ex-Verint), o programa permitia rastrear o paradeiro
de uma pessoa a partir de dados transferidos do celular para torres de
telecomunicações instaladas em diferentes regiões. Com base no fluxo
dessas informações, o sistema oferecia a possibilidade de acessar o
histórico de deslocamentos e até criar “alertas em tempo real” de
movimentações de um alvo em diferentes endereços.
A agência comprou o software por R$ 5,7 milhões, com dispensa de
licitação, no fim de 2018, ainda na gestão de Michel Temer. A ferramenta
foi utilizada ao longo do governo Bolsonaro até meados de 2021.
Integrantes da ABIN relatam que o mecanismo era usado sem a
necessidade de registros sobre quais pesquisas eram realizadas. Na
prática, qualquer celular poderia ser monitorado pelo programa sem uma
justificativa oficial. A utilização da ferramenta gerou questionamentos
internos no órgão, inclusive com relatos de sua utilização contra os
próprios agentes. A polêmica resultou em um procedimento interno para
apurar os critérios de utilização e a regularidade da contratação dessa
tecnologia de espionagem.
Nota DefesaNet
Delgado Ramagen postou em sua conta Twitter
Um integrante do alto escalão da ABIN afirmou ao GLOBO, sob a
condição de anonimato, que o sistema era operado sob a justificativa de
haver um “limbo legal”. Ou seja, como o acesso a metadados do celular
não está expressamente proibido na lei brasileira, a agência operava a
ferramenta alegando serem casos de “segurança de Estado” — e, portanto,
não estava quebrando o sigilo telefônico. O problema, segundo esse
oficial de inteligência, era que o programa podia ser manejado “sem
controle” e não era possível saber se foram feitos acessos indevidos.
O uso da ferramenta chegou a ser citado em uma decisão da Justiça
fruto de uma operação da Polícia Federal que investigava suspeitas de
vazamentos de informações por dois representantes comerciais do programa
no Brasil. Uma mensagem de voz enviada pelo WhatsApp por um desses
funcionários, cujo conteúdo foi citado no despacho, revelou que ele
tinha acesso à localização de celulares.
Questionamento legal
Especialistas e integrantes da Comissão Mista de Controle das Atividades de Inteligência (CCAI)
do Congresso ouvidos pelo GLOBO questionam a utilização desse tipo de
serviço pela ABIN. A lei que regula a agência, de 1999, não prevê entre
suas atividades o monitoramento de celulares nem a vigilância da
geolocalização de determinados alvos.
— Nesse caso, há três direitos frontalmente violados: o direito à
vida privada, à intimidade e à liberdade de locomoção. E não só. A vida
do cidadão está em risco quando a geolocalização é feita de maneira
indiscriminada — diz Denilson Feitoza Pacheco, presidente da Associação
Internacional para Estudos de Segurança e Inteligência (Inasis).
Para o advogado Christian Perrone, diretor de Direito e GovTech do
Instituto de Tecnologia e Sociedade, a falta de parâmetro legal para a
ABIN comprar e utilizar o programa dá margem a questionamentos sobre a
violação do direito à privacidade e intimidade: — A própria contratação sem ter um instrumento normativo sobre os
padrões de utilização já entraria na linha tênue de ser ilegal, mas a
sua utilização gera ainda mais preocupação: na lógica constitucional, se
temos direito à privacidade e intimidade, ela só pode ser impactada por
uma justificativa de interesse público que seja robusta.
‘Geolocalização remota’
Do ponto de vista legal, a fiscalização sobre as atividades da ABIN
cabe ao Poder Legislativo por meio da CCAI. Segundo o senador Esperidião
Amin (PP-SC), ex-presidente da comissão, o tema revela a necessidade de
atualização do sistema de inteligência.
— Precisamos nos preocupar com a defesa do cidadão. Esse é o aspecto
que pode surgir com esses programas a pretexto de defender segurança e
infraestrutura — afirmou.
Procurado, o ex-chefe da ABIN Alexandre Ramagem, eleito deputado
federal com o apoio de Bolsonaro, não quis dar detalhes da utilização do
serviço sob a sua gestão:
Cármen Lúcia: ‘Arapongagem é crime’, diz ministra do STF em decisão
que impõe limites a decreto de Bolsonaro sobre poderes da ABIN ( Nota
DefesaNet – A Ministra que criou a Constituição adaptável às
necessidades da Corte, fecha os olhos, para as arbitrariedades que o seu
colega faz aliado com PF contra a privacidade dos cidadãos) — Isso é com a ABIN. Tem contrato, tem tudo. A contratação está toda
regular. Se tiver algum questionamento, tem que fazer à ABIN.
A ABIN, porém, não forneceu as informações sobre o caso. Procurada, a
empresa responsável pelo programa afirmou que não poderia comentar por
questão de sigilo contratual. Em um registro na Associação Brasileira
das Indústrias de Materiais de Defesa e Segurança (ABIMDE), a companhia
diz que presta uma série de serviços de inteligência como, por exemplo, o
de “geolocalização celular remota” e de “inteligência na dark web”.
A fabricante da ferramenta foi representada no Brasil por Caio Cruz,
filho do general Santos Cruz, ex-ministro de Bolsonaro. Caio Cruz não
deu detalhes da contratação, alegando sigilo.
ESTRUTURA PARALELA
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Nota DefesaNet
Notas de um Fiel Observador, publicado em Edição 16 Julho 2021
Inteligência
Uma
das prioridades atuais é a modernização dos sistemas de inteligência
das Forças Armadas. Nosso entorno estratégico está tomado de agentes e
forças extrarregionais. A luta incessante contra o narcotráfico e o
crime organizado requerem uma inteligência militar modernizada com
sistemas avançados de COMINT (Communications Intelligence) e ELINT (Eletronicss Intelligence, sensores eletro-ótpticos e ferramentas cibernéticas.
Como
se diz, o investimento em inteligência é um dos menores e mais
efetivos. As ordens de grandeza na Inteligência são muito pequenas,
ínfimas frações em comparação com os custos das Forças convencionais,
mas os resultados são bastante significativos. A inteligência pode
vencer a guerra mesmo antes dela começar.
A instabilidade
política no Brasil e nos países vizinhos, agravadas pela pandemia e
pelas mudanças de governo, com a movimentação de diferentes atores
requer mais atenção e capacidades ampliadas dos serviços de inteligência
da Marinha, Exército e Aeronáutica, e a necessidade urgente da criação
de uma agência de inteligência para o Ministério da Defesa.
DefesaNet