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sábado, 11 de novembro de 2023

Risco de descontrole das contas públicas ameaça crescimento econômico

Governo Lula explicita que restringir gastos não é a sua prioridade - uma escolha com consequências nefastas para o equilíbrio fiscal

 BOQUIABERTO - Haddad surpreso com Lula: o presidente mandou às favas o compromisso do país com a responsabilidade fiscal (Fátima Meira/Futura Press)

O economista e ex-ministro Roberto Campos, avô do atual presidente do Banco Central, é o autor de uma frase que, sob diversos aspectos, sintetiza uma triste sina brasileira: “O Brasil nunca perde a oportunidade de perder oportunidades”. 
A velha máxima mais uma vez provou a sua validade. 
Poucas vezes o país deparou com condições tão favoráveis para crescer. Na nova era ambiental, o Brasil destaca-se por ter, entre as maiores economias do mundo, a matriz energética mais sustentável, o que o colocaria em posição de vantagem para liderar as transformações que estão em curso. 
Somos também o maior exportador de alimentos do planeta, com um agronegócio vigoroso e inovador que responde por quase 25% do produto interno bruto. 
Na geopolítica, o cenário é igualmente favorável. Enquanto a China coloca o pé no freio e a Rússia está em guerra, o Brasil é, entre os grandes emergentes, o menos exposto às turbulências internacionais. 
Tudo isso poderia ser aproveitado para o país deslanchar de vez. Contudo, estamos — de novo — condenados à nossa vocação de perder oportunidades.

arte economia

Desta vez, boa parte da culpa deve ser atribuída à cartilha econômica que os governos petistas costumam adotar: a que dá prioridade aos gastos

Na quarta-feira 8, o Banco Central revelou que as contas públicas fecharam o mês de setembro com déficit primário de 18 bilhões de reais, sendo que no mesmo mês de 2022 houve superávit de 10,9 bilhões de reais. No acumulado de doze meses, o setor público consolidado — formado por União, estados, municípios e empresas estatais — registrou déficit de 102 bilhões de reais, o equivalente a 0,97% do PIB. É certo, portanto, que as contas públicas fecharão 2023 no vermelho, após breve respiro alcançado no ano passado. A conclusão óbvia: os números estão ruins porque o governo Lula desde o início vem gastando mais do que arrecada — e promete gastar mais ainda.

arte economia

(...)

Sem disciplina fiscal, as perspectivas são alarmantes. O economista Alexandre Schwartsman, colunista de VEJA, diz que houve um aumento de 3% do déficit primário (incluindo União, estados, municípios e empresas estatais) de janeiro a setembro de 2023 versus igual período de 2022. Ressalte-se mais uma vez que, no ano passado, o governo registrou um superávit de 1,2% do PIB, que provavelmente se tornará um déficit de 1,8% neste ano, agora com o país sob a regência de Lula.

(...)
Está no DNA do Partido dos Trabalhadores gerir as contas públicas pelo caminho do aumento de receitas, e não do corte de despesas.  
Os dogmas petistas também pressupõem ingerência do governo nas empresas estatais. 
Em outubro, o conselho de administração da Petrobras, com maioria de indicados pelo governo federal, propôs a revisão de seu estatuto para que sejam permitidas indicações políticas em postos-chave da companhia. Combinadas, iniciativas como essa afetam a credibilidade do país e minam a confiança dos investidores. “O governo está se afastando de políticas que antes contribuíam para fortalecer a saúde econômica do Brasil no futuro”, diz Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Rating.

(...)

 

O corte de gastos seria essencial, especialmente em um país sufocado por uma das cargas tributárias mais altas do mundo, sem margem para aumento de impostos. 
 Tal premissa, contudo, está longe do horizonte petista. 
Nos últimos meses, o ministro Haddad tem procurado obsessivamente meios de elevar a arrecadação. 
Entre as propostas na mesa estão a tributação de importados de pequeno valor, apostas esportivas e empresas offshore. 
Segundo cálculos da Receita Federal, essas medidas gerariam 165 bilhões de reais em receitas extras. O problema é que elas não têm se materializado. Mais que isso: foram superestimadas, dado o otimismo exagerado com os rumos da economia. 

(...)

Os governos que gastam demais costumam gerar danos severos à economia. 
Em um primeiro momento, o avanço dos investimentos públicos pode até provocar algum crescimento do PIB, mas ele será seguido no longo prazo por crises gigantescas. 
Foi assim, lembre-se, nos anos Dilma Rousseff, quando o Brasil enfrentou a pior recessão da sua história. 
 Pelo visto, o governo Lula parece disposto a seguir o mesmo caminho. O Brasil deverá encerrar 2023 com um endividamento público que equivale a 76% do PIB e projeções indicam que, a continuar na toada gastadora, a proporção chegará a 84% em 2026. No final do ano passado, o índice foi de 73% do PIB.

arte economia

(...)

No rol das oportunidades perdidas, a reforma tributária deverá também ocupar lugar de destaque. 
Embora as novas regras aprovadas no plenário do Senado Federal sejam melhores do que as antigas, fato é que as mudanças estão longe do ideal. O texto admitiu tantas exceções, resultantes de pressões políticas e setoriais, que sua premissa original de reduzir a carga de impostos não será cumprida
O Brasil deverá ter uma das maiores taxas de IVA (imposto sobre valor agregado) do mundo, algo injusto para uma sociedade que recebe serviços precários dos entes públicos. 
“Há o risco de criarmos um monstrengo tributário”, diz Felipe Salto, economista-chefe da gestora Warren Investimentos. 
Roberto Campos tinha razão. A lista de oportunidades desperdiçadas pelo Brasil não para de crescer.

Publicado em VEJA,  edição nº 2867, de 10 de novembro de 2023

CLIQUE AQUI, para ler a íntegra da matéria = Revista VEJA


sábado, 19 de novembro de 2022

A PEC da Argentina [ou PEC do PRECIPÍCIO] do governo Lula: um desastre econômico - Revista Oeste

Alan Ghani

O governo Lula nem começou, mas a transição já dá sinais muito ruins, seja pelas medidas propostas, seja pela composição da equipe de transição 

 Quando Lula venceu a eleição, os brasileiros minimamente informados sobre o que foi a passagem do PT pelo governo federal sabiam que o horizonte seria nebuloso.  
O que poucos previram é que ficaria claro em tão pouco tempo que o terceiro mandato de Lula tem tudo para ser [e será começando o desastre antes mesmo da posse.] pior que os 13 anos da era petista.

Lula cumprimenta Pacheco, ao lado de outros petistas | Foto: Divulgação/Redes Sociais 

Lula cumprimenta Pacheco, ao lado de outros petistas  -  Foto: Divulgação/Redes Sociais [se alguém gritasse PEGA LADRÃO a DEBANDADA SERIA GERAL - no máximo ficariam dois ou três homens e uma mulher - na Odebrecht a chamavam de 'amante'.] 

Nesta quinta-feira, repetiu-se o que vem ocorrendo nos últimos dias: o Ibovespa, principal índice da Bolsa de Valores brasileira, operava com forte queda e o dólar subia pouco depois da abertura do mercado. O motivo da vez era a fala de Lula na Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, a COP27, no Egito. Em um dos trechos do discurso, ele voltou a dizer: “Não adianta ficar pensando só em responsabilidade fiscal”. O petista ainda afirmou que, quando se fala em teto de gastos, se tira dinheiro “da saúde, da educação e da cultura”.[o eleito, que sempre falou muita bobagem -  substituímos para não usar a mais adequada - após a temporada em Curitiba aumentou exponencialmente quantidade de bobagens que expele quando fala.]

Se, em seu primeiro mandato, Lula escreveu uma Carta ao Povo Brasileiro comprometendo-se com alguns preceitos indispensáveis à saúde da economia; neste ano ele não se deu ao trabalho nem de revelar quem será o ministro da Economia de seu governo. [megalomaníaco como sempre foi, o descondenado ao se ver livre, do nada, de uma temporada de mais de uma dezena de anos na cadeia, passou a se considerar um deus - no caso com os pés de lama pútrida.] anda, É o desastre anunciado. Dias depois do resultado das urnas, Henrique Meirelles abandonou barco. Armínio Fraga, Edmar Bacha e Pedro Malan, que também apoiaram a candidatura de Lula, escreveram uma carta pública nesta quinta-feira mostrando preocupação com as declarações do petista sobre as regras fiscais. Mas o que poderiam esperar de diferente?

O PT foi minimamente liberal somente de 2003 a 2005, para ter algum grau governabilidade. Mas, a partir de 2005, com a entrada de Guido Mantega no Ministério da Fazenda (atual Ministério da Economia), o abandono do tripé macroeconômico (câmbio flutuante, comprometimento com as metas inflacionárias e austeridade fiscal) começou a ser gestado, principalmente na parte fiscal.

A catástrofe petista
Até hoje pagamos um preço muito alto pela falta de recursos do governo para investimentos, porque, no passado, principalmente de 2010 a 2015, o Estado não agiu com responsabilidade fiscal, endividando-se muito com a sociedade civil, por meio da emissão de títulos públicos. Em parte, há menos recursos para investimentos em infraestrutura, porque temos de pagar os juros elevados da dívida pública contraída em governos anteriores.

Evidentemente, existem situações nas quais há uma licença para gastar além desse limite — ou, como falam, “fora do teto”. Na pandemia, houve despesas que não entraram na regra do teto, devido ao caráter excepcional do período. Para ocorrer essa exceção, é necessário aprovação do Congresso Nacional.

Aquilo que foi uma exceção durante a pandemia poderá se tornar regra a partir de 2023 com a PEC da transição (valor aproximado de R$ 200 bilhões). [mais conhecida como PEC do PRECIPÍCIO que, nada resolve, e trará prejuízos imensos ao Brasil, atingindo de forma mais gravosa aos menos afortunados. Tanto que, sendo DEUS brasileiro, confiamos que não permitirá que tal desastre seja aprovado.] A cifra bilionária proposta seria para o pagamento de despesas não previstas no Orçamento de 2023, como aumento real do salário mínimo e do Auxílio Brasil para R$ 600. Para viabilizar a proposta, é necessário “furar o teto”, não computando essas despesas na regra fiscal.

Para ter uma ideia do rombo fiscal, seriam gastos aproximadamente R$ 800 bilhões em quatro anos. Essa quantia equivale a toda economia gerada pela reforma da previdência

Há três problemas com a PEC. O primeiro é a própria elevação do gasto público em 2023. O segundo é a quebra de regra institucional, o “jeitinho brasileiro” na regra fiscal, minando a confiança dos empresários e investidores no governo. E o terceiro problema — e o mais grave — é que talvez o aumento do gasto não valha apenas para 2023, mas para os próximos quatro anos, ou se torne permanente.

No entanto, para garantir a sustentabilidade de um gasto permanente é necessário que a arrecadação não caia, pelo contrário, cresça pelo menos na mesma proporção da despesa. 
O problema é que o aumento da arrecadação do governo depende do crescimento do país. 
E o governo não consegue decretar o aumento do PIB para os próximos anos. Ao contrário, esse tipo de medida populista gera incertezas fiscais, afasta os investimentos do setor privado, o que exerce influência negativa sobre o crescimento econômico do país.

Para ter uma ideia do rombo fiscal, seriam gastos aproximadamente R$ 800 bilhões em quatro anos. Essa quantia equivale a toda economia gerada pela reforma da previdência. Em outras palavras, estaríamos “jogando a reforma da previdência no lixo”.

Não à toa, a cogitação da PEC junto com as falas desastrosas de Lula e a demora para a definição da equipe econômica já foram suficientes para causar um estrago no mercado: o dólar subiu, os juros futuros dispararam e o valor das empresas despencou.

A reação negativa do mercado não é um elitismo de investidores endinheirados. Pelo contrário, o mercado é formado por um conjunto de investidores, grandes e pequenos, que colocam seu capital em risco em diversos tipos de investimentos, fazendo alocações baseadas no cenário econômico futuro.

O gráfico 1, abaixo, mostra que as taxas de juros dos títulos públicos subiram, porque os investidores entenderam que ficou mais arriscado emprestar dinheiro para o governo. Portanto, eles exigem uma taxa maior de juros nos empréstimos para o governo, a fim de compensar o risco fiscal (calote).

Fonte: Tesouro Nacional

 

Já a elevação do dólar (gráfico 2) mostra que aumentou a demanda para investimentos fora do Brasil e a procura por uma moeda forte (proteção contra o risco país), enquanto a queda da bolsa mostra perda de valor das empresas, reflexo de um cenário econômico muito mais desafiador.

Fonte: Bacen
Fonte: B3

É espantoso que alguns renomados economistas, gestores de fundos e empresários tenham se surpreendido pela possibilidade de o governo Lula ir nessa linha mais desenvolvimentista e populista (ele “Dilmou”). Ora, os sinais na campanha eram evidentes. Não havia um plano econômico bem definido. Lula falava em revogação do teto de gastos. Guilherme Boulos, em entrevista ao Roda Vida, disse queem nenhum momento as ideais liberais de Alckmin seriam incorporadas ao programa de governo da chapa (aqui)”. José Dirceu também sinalizou na mesma direção (aqui). Enfim, os sinais eram evidentes, mas aparentemente o mercado vivia numa espécie de dissonância cognitiva.

O segundo mandato de Lula foi um prenúncio do governo Dilma. Só não apareciam as consequências negativas da elevação do gasto público, porque a conjuntura internacional foi favorável até 2008, e Lula ainda contava com os frutos da casa arrumada herdada pelo governo FHC. Já no governo Dilma, uma espécie de segundo mandato de Lula turbinado, a deterioração fiscal e seus efeitos se tornaram evidentes.

O gráfico abaixo mostra a correlação entre queda do PIB e deterioração fiscal. É claro que correlação não é causalidade. Pode ser que o superávit primário tenha caído porque o PIB caiu, ou a queda do superávit primário levou a um menor crescimento econômico. Mas não me parece coincidência que após 2014 (resultado primário passa de +1,4%/PIB para -0,4%/PIB), e o PIB se retraia 3,6% e 3,3% nos anos seguintes, de 2015 e 2016.

Fonte: IBGE

E por que esse efeito? Porque a deterioração fiscal, além da política de preços na Petrobras e as mudanças de regras no setor elétrico, levou os empresários a um clima de medo. Eles se tornaram avessos ao risco, segurando investimento e retendo caixa. Nesse cenário, as empresas produziram menos, tiveram de demitir funcionários para sobreviver (desemprego se elevou), e a crise se concretizou com duas quedas consecutivas de PIB, praticamente na mesma magnitude da crise sanitária mundial de covid, sem haver uma pandemia.[não podemos considerar o pt = petismo = perda total uma pandemia, devido,  felizmente,  sua amplitude não ser mundial.]

Os fantasmas do passado
O governo Lula nem começou, mas a transição já dá sinais muito ruins, seja pelas medidas propostas, seja pela composição da equipe de transição. Fantasmas dos governos anteriores petistas voltam à cena, causando grande desconforto e desconfiança no mercado.

A questão principal é que hoje Lula não conta com a mesma sorte do primeiro mandato. Hoje, embora a casa esteja bem mais arrumada do que no fim do governo Dilma, a situação fiscal é bem diferente de 2003. Além disso, em 2003, a conjuntura econômica era altamente favorável. A China crescia a dois dígitos, e os EUA, a Europa e a América Latina apresentavam evolução significativa do PIB. Era um ciclo excepcional, marcado pelo crescimento da economia mundial, puxado pela liquidez internacional e pelo choque positivo de commodities.

Infelizmente, o mundo é outro. Pandemia, guerra entre Rússia e Ucrânia, elevação dos juros nos EUA e a desaceleração do crescimento chinês geraram uma perspectiva de estagflação em importantes economias do mundo (Zona do Euro e EUA)

Além dos problemas externos, Lula conta ainda com um Congresso mais à direita e uma forte oposição na sociedade civil. Seu governo nem começou, e há inúmeros protestos contra ele. [Claro; a maioria dos brasileiros não aceita simplesmente ser governada por um ladrão. DESdescondenem o ladrão e a situação vai melhorar e tudo dentro da DEMOCRACIA, da JUSTIÇA e das LEIS. ] Praticamente 49% dos eleitores se opõem ao petismo. Seu governo ainda carrega a mancha do Mensalão e do Petrolão, tornando sua popularidade bem menor.

Também por essas razões, o cenário será muito mais hostil. Nesse contexto, é bom lembrar que a farra fiscal poderá levar rapidamente ao desastre econômico e, consequentemente, político. Se elevar o gasto público fosse a solução dos problemas, a Argentina e a Venezuela seriam os países mais ricos do mundo. A PEC de transição (PEC da Argentina,[ também,  segundo a economista Elena Landau,  a PEC do PRECIPÍCIO] ) mostra que a rota para o desastre está contratada.

Leia também “Retomando o caminho para a miséria”

Alan Ghani, colunista - Revista Oeste

 

quinta-feira, 25 de agosto de 2022

O Big Brother mudou-se para a cobertura. Na caradura. - Percival Puggina

Quando tudo parece muito ruim;

quando ministros do STF proferem decisões como quem dispara o gatilho e

quando leem a Constituição como magos em torno de obediente bola de cristal;

quando quem tem o dever constitucional de reagir não o faz;

quando quem tem o dever moral de denunciar, aplaude ou silencia;

quando a violência judicial é incitada pela orquestração midiática;

quando um ladrão pode concorrer à presidência da República e tantos não se importam com isso;

quando o Big Brother sem votos mudou-se para a cobertura e vai deixando vítimas,

devemos começar a pensar sobre o que vem depois.

Sim, porque haverá um depois. Hoje, o Brasil está assim, mesmo com nossa intimidade e nossos direitos de opinião e expressão respaldados pela claudicante Constituição Federal e legitimados pelo resultado eleitoral de 2018.

Mas, e se o pior acontecer? Se a nação for levada ao desvario pela manipulação midiática, da qual as cenas teatrais da última segunda-feira, representam um pequeno espasmo dos contorcionismos cotidianos no carretel dos noticiários? Se o poder que tudo pode se sentir legitimado, a ditadura consolidar-se na cobertura e os ratos ocuparem o prédio?

Na reta final da eleição mais decisiva de nossa história, somos levados a entender que os passos já foram dados, os postos tomados, as portas aferrolhadas. A grama do vizinho pisoteada; sua porta arrombada; já levaram seu computador, seu celular, seus papéis; já vieram buscá-lo. Mas aquilo não era com você, certo?

Há mais de um século é contada a sequência dessa história. Os que hoje trovejam o horizonte nacional, são fraternais amigos de ditadores vizinhos e distantes que estão fazendo exatamente isso. Outubro é logo ali. Faça a sua parte. 

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

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sábado, 4 de dezembro de 2021

DIA DE LEMBRAR O HOLODOMOR E “A SOMBRA DE STALIN” - Percival Puggina

Dia 27 de novembro, foi o dia de lembrar uma tragédia da humanidade, sofrida pelo povo da Ucrânia por determinação de Stalin. Totalitarismos fazem coisas assim e o Holodomor foi uma delas. A contagem das vítimas é imprecisa, mas os  impressionantes números variam, segundo fontes, entre um mínimo de 2 milhões e um máximo de 10 milhões.  

 

[Comunismo = o regime que assassinou  o maior número de pessoas usando a FOME = mais de 100.000.000 de pessoas considerando as mortes em todo o mundo.

É este o regime que a maldita esquerda quer implantar no Brasil.
Ao  tempo que um ministro do STF declara: "num encontro “latino-americano” de esquerda sobre “liberdade de expressão”, imaginem só — foi uma obscura construção através da qual se chega à conclusão de que “a direita” deveria ser proibida de participar das eleições brasileiras" ...  "Disse apenas que a direita — “uma nova direita” — está pretendendo conquistar o poder através das eleições, com o objetivo de “corroer as instituições democráticas”.   CONFIRA AQUI. ou "O ministro sem fronteiras",J.R. Guzzo - Oeste.]

Sob o domínio soviético, a Ucrânia era grande fornecedora de alimentos para a URSS. Nos anos 1932 e 1933 Stalin, que já extinguira a propriedade privada, determinou o confisco de toda a produção de grãos, deixando a população desprovida de alimentos. Milhões morreram de fome, proibidos de abandonar a região e de se deslocar para onde eram levados os alimentos que produziam. Os comunistas ocultaram essa realidade, que só ganhou holofotes meio século depois com a extinção da URSS.

Recomendo enfaticamente o filme “A sombra de Stalin”, em exibição no Brasil pela Netflix. O filme conta a história real de um jornalista galês, Gareth Jones, que se empenhava em chamar a atenção das autoridades britânicas para uma incoerência: o ditador soviético armava-se até os dentes na mesma época em que havia fome na região (de onde era originária sua família). Conseguiu autorização para viajar, burlou a vigilância que o acompanhava e entrou na Ucrânia, onde andou a pé. Fotografou a tragédia que viu. No entanto, levada a Londres, sua história não foi valorizada porque outro jornalista, o norte-americano Walter Duranty, vencedor do Prêmio Pulitzer, porém a serviço da propaganda de Stalin, residente em Moscou, informava contrariamente. A versão se impôs aos fatos. Como em tantos outros casos, como bem sabia Goebbels, como bem sabe a militância esquerdista – Os fatos? Ora os fatos!

Assista ao filme e reze sempre pela humanidade, principalmente quando um novo totalitarismo [que certamente não é bolsonarista] parece sombrear o horizonte.

Percival Puggina - Fique Sabendo 

 

segunda-feira, 22 de março de 2021

STF na contramão do Direito, da ética e do País - Carlos Alberto Di Franco

O Estado de  S. Paulo - Opinião

Agora só falta prender o responsável pela maior operação anticorrupção da História do Brasil

Não me canso de reafirmar meu respeito ao Supremo Tribunal Federal (STF) enquanto instituição essencial da República. No entanto, as instituições não são abstrações. Encarnam-se nas pessoas que a compõem. 
A credibilidade da Corte depende, e muito, das atitudes dos seus integrantes. É a base da legitimidade. Perdida a credibilidade, queiramos ou não, abre-se o perigoso atalho para o questionamento da legitimidade.  O STF, infelizmente, não tem contribuído para fortalecer a sua credibilidade. É hoje, lamentavelmente, uma das instituições com maior rejeição. E isso é um grave risco para a democracia. 
 
Meu artigo é um alerta angustiado. Já passou da hora de os ministros descerem do Olimpo dos deuses e fazerem uma séria e honesta autocrítica. A sociedade está farta de inúmeras decisões do STF. E a instituição, goste ou não, está mergulhando numa gravíssima crise de imagem. 
 
A decisão monocrática do ministro Edson Fachin que anulou as condenações de Lula da Silva decididas na 13.ª Vara de Curitiba pelo então juiz Sergio Moro, no âmbito da Operação Lava Jato, e tornou o ex-presidente elegível não poderia deixar de causar um terremoto político e um tsunami de indignação moral.  
Como disse, oportunamente, a professora Catarina Rochamonte, colunista do jornal Folha de S.Paulo, trata-se daquele que é tido como chefe do chamado petrolão, que o ministro Gilmar Mendes, antes da sua conversão garantista, considerou “o maior escândalo de corrupção de que se tem notícia”. Também “não se tem notícia de uma transmutação de valores como a de Gilmar Mendes, que, de entusiasta da Lava Jato, passou a fazer da destruição da mesma sua prioridade e obsessão”, frisou a colunista. 
 
Fachin, misteriosa e surpreendentemente, resolveu ressuscitar argumentos já analisados (e rebatidos) à exaustão sobre a competência da 13.ª Vara para julgar as ações contra Lula. Para sustentar sua decisão inexplicável afirmou que as ações contra Lula não tratavam especificamente da Petrobrás, foco central da Operação Lava Jato de Curitiba. No entanto, o próprio ministro incluiu em sua decisão trechos da denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal no caso do triplex, em que está claríssima a ligação entre os favores recebidos pela empreiteira OAS e nomeações e contratos da Petrobrás. Essa relação foi reconhecida em todas as instâncias nas quais Lula foi condenado – na primeira instância, pelo juiz Sergio Moro e no Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4), como voto do relator João Pedro Gebran Neto sendo seguido pelos demais membros da Oitava Turma. Por fim, o Superior Tribunal de Justiça, que manteve a condenação de Lula, também analisou os questionamentos sobre a competência para julgar o caso e concluiu que não houve irregularidade alguma ao se realizar o julgamento na 13.ª Vara e pela Oitava Turma do TFR-4. 
 
Em nota, Fachin disse que a questão já havia sido debatida diversas vezes no Supremo, mas só agora reuniu condições de ser julgada corretamente. Ele assumiu o caso em 2017, depois da morte do ministro Teori Zavascki. Foram necessários quatro anos para decidir “corretamente” sobre um assunto que ele havia decidido outras tantas vezes de modo diverso? Nenhum problema. Faz tempo que a Corte deixou de lado os fatos e o Direito e se embrenhou no campo de um ativismo de ocasião. O STF é hoje a principal fonte de insegurança jurídica no País. 
 
Mas a coisa não parou por aí. Fachin errou feio ao anular os processos contra Lula, mas tão evidente quanto o fato de as denúncias e sentenças desses processos desmentirem sua argumentação é o fato de que, concorde-se ou não com essa decisão, uma vez anulados os processos, qualquer recurso impetrado dentro deles também se torna nulo. 
 
Mas aí, caro leitor, aparece no horizonte o ministro Gilmar Mendes. Após segurar o caso por quase dois anos e meio, graças a um pedido de vista, o ministro sentiu forte comichão e decidiu pautar o tema Moro na famosa Segunda Turma do STF. Em voto longo e carregado de parcialidade (afinal, é desafeto público de Moro), Mendes dedicou-se à demolição da reputação do ex-juiz, no que chamou de “maior escândalo judicial da nossa História”, e, apesar de dizer que nem seria necessário usar as supostas mensagens atribuídas ao ex-juiz e aos procuradores da Lava Jato, mencionou seu conteúdo com grande generosidade. 
 
O fecho de ouro foi dado pelo ministro Nunes Marques, escolhido pelo presidente Jair Bolsonaro para o STF. Pediu vista. Um artifício para adiar a provável degola do ex-juiz Sergio Moro e dar mais um empurrãozinho na Lava Jato rumo ao abismo diligentemente preparado num enorme acordão. Não faz muito, terminei um de meus artigos com um comentário premonitório: Lula absolvido e Moro condenado. A narrativa começa a ser construída. Agora só falta prender o responsável pela maior operação de combate à corrupção da nossa História. Caminhamos céleres rumo à ditadura do Judiciário. Acho difícil, muito difícil, que a imensa maioria da sociedade brasileira, honrada, trabalhadora e sacrificada, aceite engolir um sapo de tamanhas proporções. 
 
Carlos Alberto Di Franco, jornalista - e-mail: difranco@ise.org.br - O Estado de S. Paulo

sábado, 13 de fevereiro de 2021

Vacina, auxílio, reforma e privatização - Carlos Alberto Sardenberg

 Coluna publicada em O Globo - Economia 13 de fevereiro de 2021

Outra coisa que aproxima esquerda e direita no Brasil:  a bronca com o mercado. E a ignorância a respeito dessa obscura entidade, motivo de contradições dos dois lados. O vice-presidente Hamilton Mourão, ao justificar a concessão de um novo auxílio emergencial, comentou: “Não podemos ficar escravos do mercado”.

Ora, não é difícil encontrar entre economistas e investidoresmembros do tal mercadoquem defenda fortemente o auxílio. Inclusive por razões econômicas. O auxílio coloca renda na mão das famílias, o que vai movimentar comércio e serviços, como se verificou no ano passado.  A ressalva do chamado mercado está na demanda por uma política pública organizada e permanente – e não um quebra-galho populista.

É grande a diferença. Uma política bem pensada define com clareza os beneficiários do programa, mede sua eficácia e, sobretudo, define as fontes de financiamento, respeitando o controle das contas públicas. O quebra-galho, esse exigido pelo Centrão e pelo presidente Bolsonaro, é um arranjo de momento para fins eleitoreiros.[ou uma forma de impedir a ação dos adeptos do quanto pior, melhor = inimigos do Brasil = inimigos do presidente Bolsonaro, que buscam apenas impedir que o presidente governe. Para eles o povo é apenas um detalhe incômodo.] Simplesmente aumenta o gasto, sem cortar nada em troca. E não dá horizonte aos mais pobres, por ser provisório.

Mais interessante ainda é que o Centrão pede o auxilio dizendo que já atendeu o mercado com a lei da autonomia do Banco Central. Sim, economistas e investidores gostam da independência do BC. Quer dizer que nisso o governo é escravo do mercado? Sim, é a resposta, mas não do Mourão, e sim de Fernando Haddad. Para ele e toda a esquerda, a autonomia significa entregar o BC ao mercado e, pior, aos banqueiros.

Trata-se de equívoco e contradição, pelo outro lado. Ao passado: quando FHC nomeou Armínio Fraga, então gestor dos fundos de George Soros, para a presidência do BC, o PT disse que era a raposa tomando conta do galinheiro. Aí, Lula se elege presidente e quem coloca no BC? Henrique Meirelles, ex-presidente mundial do Bank of Boston. Ou seja, um chefe das raposas.

Meirelles, que havia recebido promessa de independência de Lula, cumprida, ficou no BC durante os oito anos do governo petista e fez um bom trabalho. A pobreza do debate político-econômico é causa dos nossos atrasos. No mundo, todos os BCs independentes são mais eficientes, ou seja, entregam estabilidade e condições de crescimento.

Políticas públicas de apoio aos mais pobres estão incorporadas às mais variadas doutrinas econômicas há muito tempo. Bolsa Família, por exemplo, é uma ideia surgida nos quadros do Banco Mundial. Ali se chegou à conclusão de que distribuir comida e bens aos mais pobres era simplesmente ineficiente.

Órgãos governamentais gastavam a maior parte do dinheiro em burocracia e no processo de distribuição, sem contar a corrupção. Ora, por que não entregar o dinheiro direto na mão das famílias? Com uma condição: que colocassem os filhos na escola e mantivessem em dia a carteirinha do posto de saúde. Teoria: com o dinheiro, as famílias não precisavam colocar as crianças para trabalhar; estudando, as crianças tinham a chance de escapar da pobreza.

Foi introduzido no Brasil pelo prefeito tucano Magalhães Teixeira, de Campinas, em 1994. Depois, em Brasília pelo então governador Cristóvão Buarque. E virou Bolsa Escola no governo FHC. É simplesmente um bom programa social, que não pode ser chamado de esquerda ou direita. Assim, como não há BC de direita ou de esquerda. Há os que controlam e os que não controlam a inflação. Tudo considerado, o Brasil precisa de vacina/programas sociais, por óbvio, de reformas, porque o setor público não cabe no nosso PIB, e privatizações, porque os governos não têm dinheiro para investir.

Sim, o mercado gosta disso. Nós também.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista


sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Como resolver os obstáculos que dificultam o crescimento da economia

Os sinais para o país decolar surgem no horizonte, mas, para que isso aconteça, o governo e o Congresso precisam se livrar de entraves pelo caminho

Certos momentos podem definir o futuro de uma nação. Nas próximas semanas, uma leva de dados oficiais colocará em números a dimensão da recuperação econômica do Brasil, uma vez passada a fase mais dramática da pandemia de Covid-19, concentrada no segundo trimestre de 2020. Os sinais de que o pior ficou para trás despontam em diversos indicadores de setores como construção, vendas no varejo e produção industrial, além da confiança empresarial, mais robusta. 

 

As incertezas globais também foram atenuadas. A eleição [ainda não confirmada] do democrata Joe Biden nos Estados Unidos, depois de uma tensa corrida eleitoral, retirou um ponto de pressão de mercados de todo o mundo. E os testes acima de 90% de eficácia em diversas vacinas trazem mais esperanças de um mundo imunizado contra o coronavírus e mais próximo do “velho” normal. Por aqui, o Brasil tem se beneficiado da melhora de preços de diversas commodities — da recuperação no preços do petróleo, passando por produtos agrícolas que estão próximo da máxima histórica, como a soja, e o minério de ferro, que se valorizou por volta de 30% no ano. Em razão disso, a bolsa de valores retomou o seu maior patamar desde fevereiro, com o investidor estrangeiro de volta ao país. Até o último dia 20, o saldo de entradas internacionais no mercado de capitais brasileiro já superava 26 bilhões de reais, o que já fez de novembro o melhor mês da história. Tais variáveis combinadas apontam para um ciclo promissor pela frente.

 

 A grande questão que agora se impõe, portanto, não é mais ressuscitar uma economia abalroada pela crise sanitária, mas sim garantir que o reaquecimento da atividade seja consistente em 2021, aproveitando uma janela de oportunidade que o mundo deve proporcionar nos próximos meses. Com um fluxo de capitais menos intimidado pela pandemia, o Brasil terá novamente a chance e engrenar um crescimento duradouro e iniciar um momento positivo para o bem-estar da população. O momento é perfeito. As eleições municipais terminam neste fim de semana e a atividade parlamentar será retomada. Está na hora de um esforço conjunto entre o governo e o Congresso para a realização de reformas estruturantes que melhorem o ambiente de negócios, tragam prosperidade e mitiguem as desigualdades sociais. Não são medidas fáceis, exigem amplo entendimento e ação, mas tornam-se factíveis à medida que haja uma convergência entre os poderes. O risco é o país deixar de aproveitar esse cenário, optando por medidas motivadas por interesses eleitoreiros, que podem nos levar à beira de um colapso. “Nos últimos quarenta anos, alternamos momentos muito bons e muito ruins, mas o resultado final foi modesto, quase medíocre”, diz o ex-presidente do Banco Central (BC) Armínio Fraga. “O que deveria ser uma locomotiva de crescimento ficou parado em diversas barreiras. E o país ainda está repleto de entraves”.

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“Respeitar o teto é importante porque nos permite atrair investimentos e criar empregos.”

Michel Temer

 

Os entraves para o crescimento do Brasil são conhecidos e desafiadores. De uma certa forma, eles se encaixam com precisão em um conceito criado pela pesquisadora americana Michele Wucker, especialista em análises econômicas da América Latina. Em 2016, ela se valeu da imagem dos rinocerontes cinza, paquidermes africanos bastante comuns nos safáris fotográficos, para representar um padrão falho na gestão pública da região. Sempre presentes no cenário, eles costumam ser negligenciados até que, por motivos banais, se tornam agressivos e partem para o ataque. “São como problemas imensos, que as pessoas acham que sempre vão estar por ali, inofensivos, mas que, quando saem de controle, se transformam em ameaças devastadoras”, diz ela. A questão central, na teoria de Wucker, é se antecipar e resolver o problema antes que seja tarde demais. O plano de voo para a economia decolar, deixar esses rinocerontes para trás e atingir velocidade de cruzeiro já existe. Cabe ao governo e ao Congresso se empenhar para colocá-lo em prática. E logo.
 
Publicado em VEJA,  edição nº 2715, de 2 de dezembro de 2020
 
Em Economia - VEJA -  MATÉRIA COMPLETA

sexta-feira, 24 de julho de 2020

Os caminhos na tempestade - Fernando Gabeira

Em Blog

O foco de nossas discussões hoje no Brasil tem sido o governo: atacar ou defender o que está aí, arranjos para derrubar ou manter Bolsonaro de pé. No entanto, há uma crise de grandes proporções no horizonte. Não importa quem estiver em Brasília, enfrentará um enorme desafio para simultaneamente amparar os mais vulneráveis e fazer o País andar.

sábado, 11 de julho de 2020

É possível que São Paulo esteja próxima da faixa onde ocorre a imunidade de rebanho







A imunidade no horizonte

Nas grandes cidades europeias, o número de novos casos de covid-19 subiu, atingiu o pico e diminuiu. Nessas cidades, a queda abrupta de novos casos foi resultado de medidas drásticas de isolamento social e lockdown. Em Manaus, o número de casos subiu rapidamente, não foram adotadas medidas drásticas de isolamento social, os mortos foram enterrados em valas comuns no pico, e logo em seguida o número de casos diminuiu. 

Qual a causa dessa rápida queda do número de infectados em Manaus? Teria a cidade atingido a imunidade de rebanho? Um modelo matemático demonstra que isso pode ter ocorrido, e talvez esteja ocorrendo em cidades como São Paulo. Se for verdade, é uma ótima notícia.
LEIA TAMBÉM: 5,2% de infectados é um número grande ou pequeno?




A imunidade de rebanho acontece quando o número de pessoas resistentes ao vírus atinge uma fração da população suficientemente alta para que o vírus não encontre pessoas suscetíveis à infecção. 
Imagine que eu esteja doente, mas que só tenha contato com pessoas que já tiveram a vírus. Acabo não o transmitindo para ninguém.
Quando isso ocorre, o número de novos casos começa a cair e a epidemia perde força. No caso do SARS-CoV-2, a imunidade de rebanho é atingida quando 60% da população já foi infectada. 
Mas será que 60% da população de Manaus teria sido infectada? Não sabemos, mas o fato é que em nenhuma cidade do mundo as taxas de infecção chegaram perto desse número (nas áreas mais pobres de São Paulo, a taxa de infecção algumas semanas atrás era de 16%).


O problema dessas contas é que a taxa de infecção necessária para atingir a imunidade de rebanho é calculada usando modelos que assumem que toda a população é idêntica e cada pessoa pode potencialmente interagir e infectar qualquer outra com a mesma probabilidade. Mas isso não corresponde à realidade. Na população há pessoas mais ou menos suscetíveis ao vírus e grupos com maior ou menor número de contatos com outras pessoas. Nesse novo estudo, essas duas variáveis foram introduzidas num modelo clássico chamado SEIR (Suscetível >Exposto >Infectado >Recuperado). Num modelo desse tipo, a cada momento da epidemia, cada indivíduo da população está em um desses quatro grupos. 
No momento zero todos são S e não existem pessoas nos outros grupos. Ao longo do tempo os Es e Is aumentam de frequência e no fim do surto abaixam. 
No final, quando o surto acaba, só existem pessoas no grupo R e no grupo S. Nesse ponto é que é atingida a imunidade de rebanho. No caso de uma população homogênea, a porcentagem das pessoas no grupo R seria de 60% e no grupo S, seria 40%. Nesse modelo você pode medir o número do pessoas no grupo R usando os testes sorológicos e os no grupo I usando testes de RT-PCT. Essas curvas são bem conhecidas quando todas as pessoas da população são idênticas.

O que foi feito agora é simular uma população com dois tipos de heterogeneidade. A primeira consiste em dividir a população em seis faixas etárias e assumir taxas diferentes de interação entre esses grupos (por exemplo, pessoas da mesma faixa interagem mais entre si). A segunda heterogeneidade é dividir a população em três grupos de acordo com a intensidade de sua interação social. Assim, em um grupo temos pessoas que interagem com muitas outras por dia (seriam os festeiros), no segundo grupo pessoas que refletem a média das interações por dia da população e, num terceiro grupo, as pessoas que têm poucas interações (seriam os solitários). Criada essa população estratificada por idade e interação social, os cientistas simulam o que aconteceria em cada caso (sem estratificação, com estratificação por idade, com estratificação por idade e nível de interação e assim por diante) e observam qual a quantidade de pessoas no grupo R no fim do processo.

O resultado é surpreendente. Com a população homogênea, a imunidade de rebanho é atingida com 60% de pessoas resistentes – e esse número cai à medida que se aumenta a heterogeneidade, chegando a 43% quando os dois tipos de heterogeneidade são introduzidos. Agora se o número básico de reprodução do vírus (chamado R zero) 2 for 2,0 em vez de 2,5 (como se considera hoje), a imunidade de rebanho é atingida com 34% das pessoas infectadas.
Isso significa que quanto maior a heterogeneidade introduzida no modelo, menor o número de infectados necessários para atingirmos a imunidade de rebanho. Imagine que esse modelo esteja correto. Na cidade de São Paulo, nas regiões mais pobres, a fração das pessoas no grupo R (os positivos para o anticorpo) já era de 16% em meados de junho e talvez seja bem maior quando fizermos a próxima medida em 20 de julho. Basta dobrar a taxa, de 16% para 32%, para a cidade de São Paulo atingir a imunidade de rebanho. Ou seja, existe a possibilidade de partes da cidade de São Paulo estarem com um número de contaminados próximo da faixa onde começamos a observar os efeitos da imunidade de rebanho. Manaus talvez tenha atingido essa faixa no pico da epidemia (lá não foram feitos estudos detalhados de soroprevalência). Isso explicaria a queda dos casos em Manaus e a pequena queda que já estamos observando em São Paulo. Sem dúvida é uma boa notícia.
MAIS INFORMAÇÕES: A MATHEMATICAL MODEL REVEALS THE INFLUENCE OF POPULATION HETEROGENEITY ON HERD IMMUNITY TO SARS-COV-2. SCIENCE 10.1126/science.abc6810 (2020)

 O Estado de S.Paulo

Fernando Reinach - Biólogo - Saúde



terça-feira, 24 de março de 2020

A Escolha de Sofia - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

O Brasil hoje: se correr, o bicho covid-19 pega; se ficar, o bicho da recessão come

O mundo todo e o Brasil, particularmente, vivem um dilema típico de “A Escolha de Sofia”. Aprofundar o isolamento e a paralisação de estados, cidades, empresas, empregos e pessoas, em nome da saúde e da vida? Ou mitigar o combate radical ao coronavírus para tentar preservar empresas e empregos, em nome da economia?
Na prática, uma guerra da área sanitária com parte de governantes, empresários e economistas. De um lado, governadores que trabalham diretamente com o Ministério da Saúde e os especialistas no setor; de outro, o presidente Jair Bolsonaro, o Ministério da Economia e aliados.

Em tese, todos têm razão. A prioridade absoluta neste momento é trabalhadores, funcionários, autônomos e diaristas em casa para interromper a transmissão do vírus maldito. A prioridade de hoje, porém, não pode desconsiderar a de amanhã: a pandemia acaba e as vítimas não serão só os mortos e contaminados, mas todos que produzem, vendem, trabalham. O horizonte é de terra arrasada, com recessão, quebradeira de empresas e lojas, 40 milhões de desempregados, na previsão de um grupo de empresários.

Como sempre, em todas as crises, dificuldades e momentos, as maiores vítimas todos nós sabemos quem são e serão: velhos, homens, mulheres e crianças da tal da “base da pirâmide”. Passado o momento em que os infectados e mortos eram recém-chegados da Ásia e da Europa, ou por eles foram contaminados, a expectativa, que dá um tremor no corpo e um frio na coluna, é que o vírus chegue às favelas, cortiços, às imensas áreas sem água, sabão, muito menos álcool gel.

São milhões com imunidade baixa, higiene precária, compreensão da situação equivalente ao (mínimo) grau de educação. Logo, serão os alvos fáceis de um vírus oportunista e letal. São os moradores de rua, os que vendem água, milho ou qualquer coisa por aí, os diaristas que só recebem (e comem) quando trabalham e, entre eles, os informais, que crescem freneticamente e sem amparo legal. Eles vão morrer mais com o vírus e vão sofrer mais no pós-vírus. Se correrem, o bicho covid-19 pega; se ficarem, o bicho da recessão come.

O novo coronavírus chegou para valer em todas as unidades da Federação, decretando calamidade pública, prenunciando colapso da saúde e crescendo na velocidade do exemplo mais dramático, a Itália. E tudo isso na pior hora. Um dos líderes mundiais em desigualdade social, o Brasil convive com falta de estado e bolsões de miséria absoluta em todas as suas regiões. E vem de dois anos de recessão, de mais dois “crescendo” 1,3% e desperdiçou 2019 com PIB de 1,1%. Mais: a questão fiscal é o maior obstáculo da economia.

De onde tirar a montanha de dinheiro que o País precisa para salvar vidas, tratar doentes, preservar setores mais atingidos, empregos, milhões de famílias sem renda? O governo tem anunciado medidas, como flexibilização das regras trabalhistas e de pagamento de dívidas e vales de R$ 200,00 para informais e os mais miseráveis entre os miseráveis. Mas, num País populoso como o nosso, significa que a conta é altíssima para os cofres públicos, mas o valor que chega à mesa das famílias é irrisório. Tudo deprimente, apavorante.

A luz no fim do túnel só virá, primeiro, com o máximo rigor contra a transmissão do vírus e, depois, com união, patriotismo, solidariedade, as disputas políticas de lado, o presidente acordando para a realidade e uma certa elite esquecendo, por ora, a eterna ganância e a velha arrogância. Aliás, uma pergunta: como os bancos vão entrar nessa onda? Governos de esquerda, centro e direita vêm e vão e esse é o setor que mais lucra. É hora de retribuir, porque se trata de questão de vida e morte. Das pessoas e da economia. [os bancos são os que mais e sempre ganham;
Até quando todos perdem,  eles encontram uma forma de ganhar.
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Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo