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domingo, 15 de janeiro de 2023

Quem sabe prender precisa saber soltar - Elio Gaspari

Desde domingo passado foram presas pelo menos 1.800 pessoas em Brasília. Delas, umas 1.300 estavam no acampamento golpista diante do Quartel-General do Exército. 
Cerca de 500 foram detidas na cena das invasões do Palácio do Planalto, do Supremo Tribunal Federal e do Congresso. 
Muitos dos que foram presos no acampamento haviam participado dos atos e retornaram à noite.

Apesar da superposição, os dois grupos são distintos. Quem estava no acampamento pedindo um golpe de Estado não pode ser suspeito de ter praticado ato de vandalismo nas sedes dos três Poderes da República. São dois comportamentos reprováveis, porém distintos.

O arrastão de Brasília foi o maior da história nacional. Superou dois outros: o do Congresso Clandestino da União Nacional dos Estudantes, em Ibiúna (1968); e o da PUC de São Paulo (1977), onde jovens comemoravam a refundação da UNE.

Quem prende deve pensar em soltar aqueles que não constituem uma ameaça imediata à sociedade. Os arrastões de 1968 e 1977 deram-se durante a ditadura. Em Ibiúna, foram presos cerca de 1.240 jovens. Na PUC, cerca de mil.

Seis dias depois do arrastão de Ibiúna, quase todos os detidos haviam sido identificados e soltos. Continuaram presos menos de 20 jovens, contra os quais havia mandados de prisão preventiva. 
Na PUC de São Paulo, depois de três dias todos os presos estavam soltos, depois de terem sido identificados. Dezenas responderam a processos. 
 
Em 1968, antes do arrastão, grupos terroristas de direita haviam praticado seis sequestros e mais de 30 atentados com bombas, sem vítimas. Nesse mesmo período, o surto terrorista de esquerda contabilizava uma dezena de assaltos e seis mortos, entre os quais um major do exército alemão confundido com um capitão boliviano
Em 1977, não existia mais terrorismo de esquerda. 
 
No arrastão de 2023, aconteceram episódios inquietantes. Num regime democrático ameaçado por golpistas, manifestantes de Brasília, irresponsavelmente, levaram crianças para o acampamento. Segundo o Conselho Tutelar do Distrito Federal, às 15h de segunda-feira, foram atendidas 20 famílias detidas com 23 crianças ou adolescentes menores de idade. 
Isso significa que eles ficaram detidos por cerca de 24 horas. Precisava?  
Quem sabe prender precisa saber soltar. Os menores poderiam ter sido entregues a familiares em questão de horas. 
 
Na tarde de sexta-feira, centenas de pessoas continuavam detidas em Brasília
Não se sabe quantas foram apanhadas no acampamento e quantas estavam nas depredações na Praça dos Três Poderes. 
Nos arrastões de 1968 e de 1977, seis noites depois, continuavam presas menos de dez.

Aqueles que invadiram prédios cometeram um crime específico e sofrem a pena da lentidão burocrática. Os do acampamento, a maioria entre os detidos, poderiam ter sido libertados há dias, logo depois da devida identificação e tomada de depoimento.

A burocracia das prisões explica a demora pelo cumprimento dos trâmites que incluem a tomada de depoimentos e a realização de audiências de custódia. Tudo bem. Mas em outubro de 1968 (antes do AI-5) e em 1977 (às vésperas da demissão do ministro do Exército Sílvio Frota), a ditadura soltava os presos de seus arrastões com maior celeridade.

Se quem prendeu não dispunha dos meios para soltar, o problema é de quem prendeu. 

(...)


Luana e Goretti
Em maio de 2021, Jair Bolsonaro mandou demitir a infectologista Luana Araújo do cargo de secretária-executiva de enfrentamento à Covid-19.

Motivo: nas redes sociais a doutora condenava a propaganda da cloroquina como remédio eficaz na pandemia.

Em janeiro de 2023, a pediatra Ana Goretti Kalume Maranhão teve sua nomeação barrada pela Casa Civil da Presidência para a chefia do novo Departamento de Imunizações do Ministério da Saúde.

Motivo: “Restrição partidária.”

Ganha um fim de semana em Pyongyang quem souber o que isso significa.

Ela é acusada de ter escrito mensagens louvando a Operação Lava-Jato.

Tempestade perfeita
Com todas as encrencas que estão no tabuleiro, pareceu despicienda a descoberta de uma inconsistência” de R$ 20 bilhões no balanço das Lojas Americanas, grande e tradicional rede de comércio varejista de Pindorama. Coisa de mais de US$ 4 bilhões. Ervanário para ninguém botar defeito. As inconsistências parecem vir de longe.

A revelação deveu-se ao CEO da empresa, Sérgio Rial. Ele tinha nove dias no cargo e explicou: “Tive uma escolha de Sofia, eu falo ou não?”

Falou, e fez muito bem.

Folha de S. Paulo  e Jornal O Globo - Elio Gaspari - MATÉRIA C0MPLETA

 

quinta-feira, 13 de outubro de 2022

Os despachantes do PT no TSE e a paixão de Lula pela ditadura da Nicarágua - VOZES

J. R. Guzzo - Gazeta do Povo

O ex-presidente Lula, candidato a voltar ao cargo neste segundo turno das eleições, quer censurar de novo a Gazeta do Povo; exige que os seus sócios no TSE proíbam o jornal de publicar informações sobre fatos que quer manter escondidos do eleitorado brasileiro e que, para piorar tudo, são absolutamente verdadeiros. 
Comete mais um crime em flagrante contra a democracia, pois censura é crime, e faz uma bela exibição prévia de como o seu governo vai tratar a liberdade de imprensa se ele ocupar outra vez a presidência da República. Se hoje já se comporta desse jeito, ainda sem o “controle social sobre os veículos de comunicação” que quer impor ao país, o que vai fazer quando estiver mandando na polícia e no resto do aparelho de repressão do Estado?
 
A segunda agressão à Gazeta do Povo é tão perversa, grosseira e ilegal quanto foi a primeira.  
Qual é a lei em vigor neste país que autorize o TSE, ou qualquer outra autoridade pública, a censurar um órgão de imprensa? Não há nenhuma -absolutamente nenhuma. O que existe, ao contrário, é a expressa proibição da censura, segundo está escrito na Constituição Federal. 
Fica colocada, aí, a questão chave que a democracia brasileira tem no momento. Lula e os seus despachantes no TSE e no resto do alto Judiciário vão suspender a vigência da Constituição só no período eleitoral, como estão fazendo agora - ou vão continuar mandando a lei para a lata de lixo se ele for declarado vencedor das eleições de 30 de outubro?

Veja Também:
A diferença entre dois Brasis ficou evidente na contagem dos votos 

Lula e o STF salvarão a democracia? O embuste mais agressivo da história

O que está sendo feito contra a Gazeta do Povo é especialmente abjeto quando se considera a gritaria histérica que os ministros do STF, a esquerda em peso e a elite inimiga das liberdades tem levantado, nesse tempo todo, contra as amaldiçoadas fake news – segundo todos eles, a pior ameaça à democracia jamais aparecida no mundo desde o governo do imperador Nero, ou algo assim. 
Por conta disso, diziam, a liberdade de expressão teria de ser reprimida, para impedir a divulgação de notícias falsas. 
E em relação às notícias verdadeiras – o que os marechais-de-campo do “estado democrático de direito” sugerem que seja feito?  
O que se constata agora é que elas devem ser rigorosamente censuradas quando Lula, a esquerda e o “campo progressista” não quiserem que sejam publicadas. É o caso da censura contra a Gazeta - que lhe proíbe a publicação, em seu espaço editorial, de informações sobre o apoio que Lula sempre deu ao ditador Daniel Ortega, da Nicarágua. Não há nada mais distante de uma notícia falsa do que isso: a paixão Lula-Ortega está documentada em fotos, vídeos, áudios, declarações púbicas de ambos e até em notas oficiais do PT. 
O que mais seria preciso? Mas o ministro do TSE que faz a censura pró-PT diz que o apoio de Lula a Ortega é um fato “inverídico”. 
Como assim, “inverídico”?  É um deboche.

O fato é que Lula quer esconder da população coisas que tem feito há anos, em público, para representar o seu papel de “homem de esquerda” e, mais ainda, de “líder da esquerda mundial”. Fez isso em seu interesse, e para tirar vantagem própria. Disse que Ortega tinha o direito de ser presidente da Nicarágua pelo tempo que quisesse. Se pode “na Alemanha”, perguntou ele, porque não poderia na Nicarágua – como se uma democracia como a Alemanha pudesse ser comparada a uma ditadura primitiva da América Central. 

Ficou irado contra os presos políticos de Cuba que faziam greve de fome para cobrar um tratamento menos desumano em suas celas; fez questão de apoiar em público os carcereiros. Disse que o problema da Venezuela era o “excesso de democracia”. 
Agora, não tem coragem de sustentar o que sempre apresentou como “convicções”; ficou com medo de perder voto e quer apagar o que fez aplicando a censura. É este o salvador da democracia brasileira.
 
J. R. Guzzo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES
 

quinta-feira, 30 de dezembro de 2021

A economia fica para ‘depois’. Pois o ‘depois’ chegou - O Estado de S. Paulo

J. R. Guzzo

Após dois anos de covid e de repressão, a pobreza aumentou no Brasil, mas os responsáveis pelo desastre põem a culpa no governo

Descobriu-se de repente, neste final de ano, um acontecimento realmente prodigioso: a pobreza aumentou no Brasil, após dois anos de covid e de repressão, inclusive policial, contra a atividade econômica. Quem poderia imaginar uma coisa dessas, não é mesmo? Fazem lockdown. Fecham o comércio e a indústria. Suspendem os serviços. Proíbem as pessoas de trabalhar – até camelô foi perseguido pela polícia.

Transformam o Brasil num país de fiscais. Agridem, como nunca antes, a liberdade de produzir – a de produzir e mais um caminhão de outras. Daí, quando se vê que há 13 milhões de desempregados e milhares de negócios reduzidos à ruína, se escandalizam: o Brasil ficou mais pobre. 

Eliane Cantanhêde: Totalmente irracional

Como a vida política neste país se reduz cada vez mais à fraude, à mentira e à eliminação da lógica, nada mais natural que o partido dos iluminados-progressistas-etc., que se dá o direito de pensar por todos, tenha chegado à uma conclusão falsa sobre o desastre. A culpa, dizem os viajantes desse bonde, é do “governo”.  
A calamidade na economia atingiu todos os países do mundo, sem nenhuma exceção – ricos ou pobres, bem ou mal governados, democracias ou ditaduras. Há inflação mundial. Há desemprego mundial. Há aumento na pobreza mundial. Mas só o governo do Brasil é culpado. No resto do mundo a culpa é da covid.

Essa falsificação é especialmente grosseira, malandra e mal intencionada quando se considera que no Brasil, por decisão do Supremo Tribunal Federal e com o pleno acordo da elite pensante, as “autoridades locais” ganharam a exclusividade no trato da epidemia. Dizem que não foi assim, mas foi exatamente assim, na prática – já que nenhuma das suas decisões, segundo ordenou o STF, podia ser contrariada pelo governo federal ou por quem quer que fosse. Governadores e prefeitos, na verdade, foram colocados acima da lei.

Todo mundo está cansado de saber o que fizeram: reagindo como uma manada em pânico, as “autoridades locais” se jogaram de corpo e alma no “fecha tudo”, no “fique em casa” e no “cale a boca” e adoraram isso, porque nunca mandaram tanto. A prioridade, repetida até enjoar, era “salvar vidas”. O “ser humano” vale mais que “os negócios”, diziam, e a economia deveria ficar “para depois”. É melhor cancelar um CNPJ do que um CPF – quem não se lembra deste lema, considerado então a quinta essência da sabedoria humana? 
Para os ricos, tudo bem: puseram máscara, fizeram “home office” e continuaram circulando nos seus SUVs. Para os pobres, foi uma tragédia. Não passou pela cabeça das “autoridades locais”, do STF e da elite que a imensa maioria da população brasileira precisa trabalhar todos os dias para sobreviver. Não pode ficar “em casa”. Não é opcional.

A economia fica para “depois”? Pois então: o “depois” chegou. Agora, como o batedor de carteira que tenta se safar gritando “pega ladrão”, os responsáveis pelo desastre lamentam a miséria que causaram e põem a culpa no governo. Nada mais normal, nesse Brasil doente que está aí.

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo


domingo, 14 de fevereiro de 2021

Fogo na camisa amarela - Nas entrelinhas

Como brincar carnaval diante de um cenário tão macabro?  Ir às ruas para uma festa cujo clima depende de aglomeração seria uma espécie de suicídio coletivo

[Felizmente,  um ano sem carnaval; que falta faz? NENHUMA. O número de mortes será menor, o consumo de drogas cairá ainda que pouco, a imoralidade, a corrupção moral (não toleramos a corrupção pública = a que envolve dinheiro - mas aceitamos a corrupção moral que é a mãe de todas as corrupções);  cenas ofensivas à moral e aos bons costumes a depravação, os atos obscenos, as crianças presenciando imoralidades, o exibicionismo repugnante (lembram do golden shower?)o desrespeito aos valores religiosos,o vilipêndio dos símbolos cristãos. 
Vejam a imagem abaixo. Pensem. O recado é claro]
 

 

[ A mudança que ilustra esse recado não foi realizada pelos que se julgam Supremos e pretendem autorizar até quem deve ter o direito de nascer.

Um alerta: desnecessário, mas para perfeito entendimento dos que quando desenhamos não conseguem compreender, que o 'coisa ruim', o de vermelho, está muito triste pela não realização do carnaval 2021.

A mudança mostrada foi realizada por DEUS, o SER SUPREMO, que realmente pode tudo.]

O carnaval sempre foi um momento de inversão de papéis, de questionamento das normas, de fuga do padrão da vida cotidiana e da libertação da repressão. Neste ano, não. Ainda vamos levar algum tempo para ter a verdadeira dimensão do que está ocorrendo, mas, talvez, o carnaval deste ano seja um momento de choque da dura realidade, que é a crise sanitária pela qual o mundo está passando, agravada pela incompetência e pelo negacionismo do governo. Oxalá, no próximo carnaval, a maioria da população esteja imunizada contra a covid-19.

No começo da pandemia, imaginava-se que o carnaval de 2021 seria um dos maiores de todos os tempos, com a população indo às ruas se divertir, superada a peste. Estaríamos vivendo momentos felizes, de muita contestação aos tabus da nudez e da sensualidade, de ironias e críticas escrachadas aos governantes e, como não poderia deixar de ser, ao presidente Jair Bolsonaro. Feminismo, racismo, diversidade, exclusão, ["Quanto maior a ênfase, por exemplo, nas teorias de gênero, maior a homofobia; quanto mais igualdade de gêneros, mais cresce o feminicídio; quanto mais se combate a discriminação racial, mais ela se intensifica; quanto maior o ambientalismo, mais se agride o meio ambiente; e quanto mais forte o indigenismo, pior se tornam as condições de vidas de nossos índios", relatou na entrevista.] os temas característicos do debate contemporâneo, numa sociedade pluralista e democrática, estariam sendo tratados com bom humor e muita sagacidade pelo povo nas ruas, cantando marchinhas e sambas.

Por incrível que possa parecer, o carnaval — essa festa tão desvairada — também é um momento de conscientização da população. É quase impossível na vida de um brasileiro não ter visto um desfile de escola de samba, não ter saído num bloco ou participado de um baile de carnaval no qual não houvesse ruptura ou transformação de costumes. É uma festa muito ambígua, na qual a fuga da realidade funciona como um espelho da sociedade, quando a velha senhora que passa roupa para fora se veste de luxuosa baiana, a madame vira figurante numa ala de escola de samba, o jovem desempregado brilha na bateria, a socialite leva uma bronca do bombeiro hidráulico por atrasar o desfile e o galã da novela arrisca um desengonçado samba no pé, sendo ele mesmo, e não o seu personagem.

O carnaval substituiu o entrudo, que era uma festa embrutecida, na qual o povo tomava as ruas para jogar farinha, baldes d’água, limões de cheiro e até lama e areia uns nos outros. Ou seja, um avanço civilizatório. Roberto DaMatta, o antropólogo estudioso dos foliões e dos malandros, sempre destacou que o carnaval não é apenas um momento de alienação da realidade, é um espaço de transformação dos padrões da sociedade. O Rio de Janeiro, quanta ironia, teve um prefeito que não gosta de carnaval e não conseguiu se reeleger. Temos um presidente da República que também não gosta e que, talvez, se regozije pelo fato de o povo não ter tomado as ruas para fazer troça das autoridades e de si próprio.

Folião de raça
Um dos maiores carnavais de todos os tempos, segundo os historiadores, foi o de 1919, no Rio de Janeiro, ano de estreia do Cordão do Bola Preta, que havia sido fundado em dezembro do ano anterior e, hoje, é o maior bloco do país, arrastando milhões pelo centro do Rio de Janeiro no sábado de carnaval, o que deveria ter acontecido ontem. Aquele foi um carnaval no qual a população comemorou o fim da gripe espanhola, a epidemia que matou 15 mil pessoas somente no Rio de Janeiro. Neste carnaval, a média de óbitos na cidade está em 158 mortes por dia, sendo 234 óbitos e 5,5 mil casos de contaminação nas últimas 24 horas. Já são 551 mil casos no estado. [naquela época se levava semanas para ir do Rio ao Recife; meses para  realizar o percurso Europa x Brasil; imagine se uma pandemia daquele porte, com seu elevado índice de letalidade e contágio, ocorresse nos dias de hoje = em que o contaminado  hoje pela manhã,  pode estar amanhã no outro lado do mundo contaminando.]

Não é privilégio de cariocas e fluminenses. No Distrito Federal, a covid-19 matou 4.198 pessoas, de um total de 247 mil infectados; oito vezes mais do que acidentes e homicídios. Em Belo Horizonte, foram 16,5 mil mortes, de um total de 798 mil infectados. Em São Paulo, 55 mil mortes, com 1,9 milhão de infectados. Na Bahia, 10,6 mil mortos para 623 mil infectados. Em Pernambuco, 10,6 mil mortos para 277 mil infectados; no Amazonas, são 9,7 mil mortos para 292 mil infectados. Estamos vivendo a rebordosa das campanhas eleitorais e das festas de fim de ano. [por conveniência muitos atribuem o acréscimo de agora a uma segunda onda = bem mais conveniente que atribuir às eleições de novembro .p., e os festejos de fim de ano.]

Como brincar carnaval diante de um cenário tão macabro? Agora, com a segunda onda da pandemia, ir às ruas para uma festa cujo clima depende de aglomeração e contato físico seria uma espécie de suicídio coletivo. Por isso, mesmo que a festa seja em casa e nas redes sociais, neste ano, o carnaval não valeu. Melhor ficar em casa, cantar A Jardineira e pôr fogo na camisa amarela, como aquele folião de raça de Ary e Elizeth, na quarta-feira de cinzas.

PS: até quinta-feira! Luiz Carlos Azedo - Nas Entrelinhas - Correio Braziliense

 

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Com voto do relator em defesa da repressão dos militares durante a Guerrilha do Araguaia, comissão rejeita 307 pedidos de anistia - O Globo

Leandro Prazeres

Processos rejeitados se referiam a camponeses que viviam na região

Com um voto do relator em defesa da repressão dos militares durante o episódio conhecido como Guerrilha do Araguaia, a Comissão da Anistia rejeitou 307 pedidos de anistia feitos por camponeses que alegavam ter sido alvo de perseguição política durante o período em que o Exército combateu militantes do PCdoB no interior do Pará. Os casos foram julgados em bloco nesta terça-feira. Em seu voto, o relator do caso, Henrique Araújo, defendeu a ação dos militares que resultou na morte de pelo menos 67 guerrilheiros e 31 camponeses.  - A guerrilha do Araguaia não foi movimento legal e nem legítimo de oposição ao regime de 64, mas sim uma luta armada cuja repressão não configura perseguição política, mas defesa do Estado e da sociedade - disse Araújo.
[o PCdo B, sob inspiração e patrocínio de Cuba e China decidiraminstalar na região do Araguaia um foco de guerrilha, que pretendia se espalhar por toda a região criando um enclave comunista na área e que futuramente desenvolveria ações mais intensas em sincronismo com os terroristas instalados na demais regiões do Brasil.
O governo reagiu com a energia necessário e o Exército Brasileiro, cumprindo seu dever, aniquilou o movimento.
Criaram então uma comissão para cuidas de indenizações e pensões para os terroristas. Nos governo FHC de Lula e Dilma foi uma festa - que agora acabou.]

Suspeitos. Moradores do Araguaia são abordados por uma blitz do Exército durante a guerrilha Foto: Guilherme Xavier Neto / Divulgação
Suspeitos. Moradores do Araguaia são abordados por uma blitz do Exército durante a guerrilha Foto: Guilherme Xavier Neto / Divulgação

De acordo com a Comissão Nacional da Verdade (CNV), a Guerrilha do Araguaia foi um movimento de resistência à Ditadura Militar entre os anos de 1967 e 1974. Inspirados na Revolução Cubana e na experiência chinesa, militantes do PCdoB decidiram instalar um foco de guerrilha na selva amazônica. Após alguns anos resistindo a ações do Exército, o grupo foi dizimado pelos militares em 1974.

Os processos rejeitados pela Comissão da Anistia, no entanto, se referiam a camponeses que viviam na região do Araguaia durante o episódio. Segundo os processos, eles foram alvo de perseguição, maus-tratos e tortura durante o período. Muitos alegam que foram presos ilegalmente e utilizados como guias pelos militares na caça aos guerrilheiros.  Além de defender a atuação dos militares durante o episódio e negar que a repressão à guerrilha deva ser encarada como perseguição política, Henrique Araújo alegou falta de provas para  concessão da indenização do Estado. - Desconsiderar qualquer elemento de prova para atestar a condição de anistiado seria o mesmo que reconhecer que toda e qualquer que vivia na região naquela época faria jus à condição de anistiado - argumentou.

Especialistas que atuam na defesa dos direitos humanos argumentam, no entanto, que a produção de provas sobre o episódio é muito difícil porque muitas das prisões foram feitas ilegalmente e porque os militares não teriam deixado registros sobre as torturas praticadas contra os camponeses. [argumento esdrúxulo e até criminoso o dessa turma dos DIREITOS DOS MANOS - por fazer apologia a condenação sem provas = ao argumentar ser a produção de provas muito difícil e não haver registros = na dúvida, se condena os cofres públicos, os cidadãos contribuintes e premia-se os bandidos - por terem ajudado a guerrilha ou por tentativa de objter indenização usando meios fraudulentos.]

Durante a votação, o general Luis Eduardo Rocha Paiva, que é membro da comissão, chegou a negar a existência da Guerrilha do Araguaia e disse que o governo acertou ao reprimir o que classificou como "foco" de guerrilha. Segundo ele, "foco de guerrilha tem que ser eliminado na raiz". - Não houve guerrilha. O que houve foi um foco de guerrilha. Uma guerrilha teria de ser reconhecida pelo governo, o que não foi, como ocorreu na Colômbia e no Vietnã. O governo não iria reconhecer essa guerrilha como uma contestação do governo brasileiro. E um foco de guerrilha tem que ser eliminado na raiz.  - disse o general.

Para a advogada de um grupo de camponeses que pleiteava indenização, Irene Gomes, a decisão da comissão cria um "caos histórico".  Essa cisão cria um caos histórico. Há centenas de pessoas que foram afetadas pelas ações dos militares na região e que não tiveram e não terão seus direitos reconhecidos. Os camponeses são tão simples que, muitos, não entendem o impacto disso para a história. Mas é uma situação triste - afirmou a advogada. [calma advogada, além de maior rigor na análise dos processos, vai haver uma revisão em todos os processo analisados pela Comissão de Anistia, desde sua criação. Processos com fraudes e inconsistências serão anulados e os beneficiários responderão a processo criminal por fraude processo, estelionato e, dependendo,  formação de quadrilha e terão que devolver tudo o que receberam.]

A decisão da comissão de rejeitar os pedidos de anistia dos camponeses do Araguaia acontece dez meses após a ministra da Mulher, Família e Direitos Humanos, Damares Alves, mudar a configuração da comissão, órgão que ficou sob a responsabilidade do seu ministério.  Desde que assumiu o ministério, Damares promoveu uma mudança no regimento da comissão, aumentando de 20 para 27 o número de conselheiros. Na nova configuração, veio o general Luiz Eduardo Rocha, um dos principais opositores aos trabalhos da CNV e que, frequentemente, leva às sessões um exemplar do livro A verdade sufocada, do coronel do Exército Carlos Alberto Brilhante Ustra, apontado como um dos principais torturadores do regime militar.
Além dele estão dois ex-assessores do vice-presidente Hamilton Mourão e um policial militar.  Damares tem prometido um "pente fino" nos pedidos e disse que iria abrir o que classificou como "caixa preta" da Comissão de Anistia, insinuando que a existência de irregularidades no funcionamento do órgão.

segunda-feira, 1 de abril de 2019

1964 E A LIBERDADE DE OPINIÃO

Você pode pensar o que quiser sobre a Proclamação da República e sobre a Revolução de 30. 

Quase ninguém sabe o que aconteceu no dia 10 de novembro de 1937 (golpe de Estado com que Getúlio Vargas instituiu o Estado Novo e implantou uma ditadura de Congresso fechado, censura, tortura e repressão que durou até 1945). 

Você tem total liberdade de opinião sobre a Revolução Francesa, pode reverenciar a Revolução Bolchevique, chorar nos túmulos de Lênin, Fidel e Chávez.  

Mas não se atreva a divergir da narrativa dominante sobre o que aconteceu no Brasil no dia 31 de março de 1964. Não se atreva!

Em consonância com essa vedação, a OAB encaminhou à ONU um documento que denuncia “a tentativa do Presidente e de outros membros do governo de modificar a narrativa histórica (!) do golpe que instaurou [no Brasil] uma ditadura militar”. A citação entre aspas foi buscada no site do instituto Vladimir Herzog, cossignatário da denúncia. Com mínimas variações, consta de todas as matérias sobre o assunto publicadas nas últimas horas. Nelas está afirmado haver uma “narrativa histórica” que, a juízo dos denunciantes, não pode ser modificada. Trata-se de algo nada científico, principalmente numa ciência social, mas perfeitamente descritivo de uma prática que se vai tornando corriqueira. É como se a História fosse um campo de liberdade criativa semelhante à do vovô que conta aos netinhos estórias de quando “era uma vez”. [comentário 1: a OAB e o Instituto Valdimir, não andam muito bem de raciocínio, parece que lhes falta noção;

o tal 'instituto', cúmplice da escorregada da OAB no trato do direito até que merece uma certa 'comiseração', haja vista não ser o DIREITO a sua seara;
quanto a OAB é absurdo que cometa erro tão elementar: quanto tentava impedir que milhões de brasileiros exercessem seu direito soberano de comemorar o evento que sepultou, mais uma vez, os planos de maus brasileiros em transformar nossa Pátria Amada em satélite da URSS, aquela associação de advogados cometeu um erro elementar:
- se valeu do 'mandando de segurança' para combater o exercício de um direito do presidente da República - promulgar atos administrativos -, falha esta que levou o ministro Gilmar Mendes a sequer conhecer do pleito da OAB.]
 
O que de fato pode ocorrer, e frequentemente ocorre quando um mesmo fato histórico envolve posições antagônicas, são interpretações diferentes. Na minha experiência, interpretações históricas implicam honestidade intelectual e são muito mais precisas, ainda que divergentes, do que as “narrativas” dominantes em tantas salas de aula no Brasil. Exemplo recentíssimo: a grande campeã do Carnaval carioca de 2019 – tendo aderido a uma narrativa desonesta, pondo-se a serviço de um projeto político e ideológico espezinhou na avenida vultos admiráveis da nossa história, como o Duque de Caxias e a Princesa Isabel. Por quê? Porque isso convém à ideologia do conflito. Mas foi pura mistificação.

Assim, é extremamente arrogante e dogmática a intenção de estabelecer, sobre determinado acontecimento, uma “narrativa” cláusula pétrea, imexível, inequívoca e unívoca, mesmo quando muitos dos que vivenciaram aqueles dias, testemunhas do ambiente, das circunstâncias e dos eventos, atendo-se aos fatos, têm interpretações divergentes.
Felizmente não há, no Brasil, uma Reitoria Brasileira de Pontos de Vista, ou uma Corregedoria Geral de Perspectivas, ou uma Agência Nacional Reguladora de Opiniões. 
Isso é orwelliano demais para meu apreço pela liberdade.
 
Pericial Puggina (74), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. 

Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.



sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Mais uma vez Ministério Público desperdiça tempo e dinheiro acusando coronel Ustra por crimes que, caso tenham ocorrido, já foram anistiados



MPF denuncia coronel Ustra e outros dois por morte de dirigente do PCdoB
O Ministério Público Federal ofereceu mais uma denúncia contra o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra por crimes cometidos durante a ditadura militar. Ustra é um dos envolvidos na morte do militante comunista Carlos Nicolau Danielli, sequestrado e barbaramente torturado nas dependências do Destacamento de Operações e Informações do II Exército (DOI) em São Paulo, em dezembro de 1972. Esta é a sexta ação penal protocolada pelo MPF contra o ex-comandante da unidade. Também foram denunciados o delegado da Polícia Civil de São Paulo Dirceu Gravina e o servidor público estadual aposentado Aparecido Laertes Calandra, ambos subordinados a Ustra na época do assassinato. 

O operário Carlos Nicolau Danielli integrava a cúpula do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), legenda que ajudara a fundar a partir de uma dissidência do Partido Comunista Brasileiro (PCB). Em 28 de dezembro de 1972, ele foi detido e levado para o DOI, onde sofreu espancamentos e foi submetido a tortura durante três dias. Segundo relatos de outros presos, Danielli estava, já no segundo dia, próximo da morte, com o abdômen inchado, olhar estático, sangrando pelos ouvidos e pela boca, sem condições de se manter de pé. O óbito foi registrado no dia seguinte, 30. Apesar de não ter suportado a intensidade das agressões, o militante não forneceu as informações que os torturadores queriam sobre outros integrantes do PCdoB.

Testemunhas identificaram Ustra, Gravina e Calandra como responsáveis diretos pela morte de Danielli. O dirigente comunista foi uma das 37 pessoas assassinadas no DOI durante o período em que Ustra esteve à frente do destacamento, de 1970 a 1974. Sob o comando do então major, Gravina e Calandra conduziram várias ações de sequestro e sessões de tortura contra opositores do regime militar. A conduta fazia parte do ataque sistemático e generalizado à população civil por agentes do Estado organizados em um sistema semiclandestino de repressão. 

LAUDO
Os envolvidos comumente mascaravam os episódios de óbito, para que as consequências dos brutais maus tratos não fossem registradas oficialmente. Danielli foi enterrado como indigente no cemitério de Perus, em São Paulo. O laudo de exame de corpo de delito indica que a vítima fora alvejada ao trocar tiros com policiais durante uma tentativa frustrada de fuga e morrera de anemia aguda traumática

A versão, forjada por Ustra em conjunto com os médicos legistas Isaac Abramovitch e Paulo de Queiroz Rocha (já falecidos), desconsidera as evidentes marcas de tortura no corpo do militante e a impossibilidade óbvia de ele estar armado naquelas circunstâncias. Anos mais tarde, especialistas apontaram uma série de falhas técnicas ao revisar o documento, como a ausência de informações sobre os hematomas, visíveis nas fotos do corpos, e os orifícios das supostas balas. 

Ustra, Gravina e Calandra devem responder por homicídio triplamente qualificado, uma vez que a morte foi causada por motivo torpe, com emprego de tortura e mediante recurso que impediu a defesa da vítima. O coronel reformado foi denunciado também por abuso de autoridade, pois ordenou e executou a prisão de Danielli sem as formalidades legais exigidas na época, como a comunicação do fato a um juiz para fins de controle da lisura do ato.

O procurador da República Anderson Vagner Gois dos Santos, autor da denúncia, destaca que os crimes não são passíveis de prescrição ou anistia, uma vez que foram cometidos em contexto de ataque sistemático e generalizado à população, em razão da ditadura militar.
O Estado brasileiro tinha pleno conhecimento desse ataque, o que qualifica as práticas como crimes contra a humanidade.(MPF)

Fonte: Diário do Poder


quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Autópsia da sombra

O cinismo da esquerda nojenta, hoje incrustada no (des)governo, chega ao ponto de usar traidores para versões mentirosas.

O que o traidor Marival cita nunca foi comprovado apesar das exaustivas investigações

O depoimento terrível de um ex-sargento que transitava no mundo clandestino da repressão
militar resgata parte da história de uma guerra suja

Nota dos editores: publicamos este artigo para mostrar o quanto a esquerda é nojenta e joga sujo

Marival Dias Chaves do Canto tem 45 anos, é moreno, musculoso e está bem conservado para a idade. Nascido na Bahia, morou muitos anos em São Paulo e hoje é dono de um modesto negócio em Vitória, no Espírito Santo. Visto à distância, é um cidadão como qualquer outro. De perto, tem algumas peculiaridades. Chaves, como é conhecido, é um homem tenso, habituado a represar suas emoções. Usa um linguajar que mistura termos policiais e políticos. No seu vocabulário, aparecem com freqüência palavras como "subversivos", para designar os militantes de organizações de esquerda, ou "elemento", quando se refere a uma pessoa qualquer. Na semana passada, Chaves encerrou uma longa série de depoimentos a VEJA e, nas páginas do seu relato, constata-se que Chaves está mesmo longe de ser um cidadão tranqüilo. Ele é o primeiro ex-agente dos órgãos de informação do Exército a contar tudo o que sabe, com os terríveis e esclarecedores detalhes sobre a barbárie dos porões dos anos de chumbo da ditadura militar.

Há mais de uma década, o ex-sargento Chaves vem amadurecendo sua decisão de falar. Quando ainda transitava pelo ventre da besta, entrando e saindo das masmorras de tortura e gastando horas lendo depoimentos de presos políticos. Chaves preocupava-se em memorizar e anotar detalhes. No mês passado, entendeu que a decretação do impeachment do presidente Fernando Collor mudara o país e, em especial, as Forças Armadas, que se mantiveram na legalidade de meras espectadoras da crise. Resolveu contar tudo. Há duas semanas, chamou a mulher e as duas filhas, de 16 e 18 anos, para dizer pela primeira vez que atuava na repressão militar. No início, elas reagiram assustadas. Mais adiante, emocionadas, acabaram estimulando sua decisão de falar. Uma de suas filhas havia saído às ruas para pedir o afastamento de Collor, engrossando o movimento dos caras-pintadas e relembrando os anos rebeldes, e só depois soube que o pai participara ativamente daquele período. "Elas acharam que era importante contar tudo para passar essa parte da História a limpo", afirma Chaves. Tinham razão.

VISITA À PONTE - O dramático relato do ex-sargento sobre a vida e morte nos porões não tem a abrangência cronológica dos vinte anos de ditadura, muito menos o peso do relato de alguém que coordenou as ações e, portanto, contava uma visão global do assunto. A partir da derrubada do presidente João Goulart em 1964, começou a ser deflagrada uma guerra suja e surda no Brasil. Foi menos violenta do que na Argentina, onde houve quase 10.000 desaparecidos. Mas o ciclo da ditadura no Brasil colocou em ação 13.000 militantes de esquerda, distribuídos em 29 organizações que pegaram em armas e outras 22 que optaram pela chamada resistência pacífica. Do outro lado da trincheira, havia pelo menos 400 militares envolvidos diretamente em operações clandestinas. Nesse embate, terroristas assaltaram bancos, seqüestraram e assassinaram. Do outro lado, prenderam pessoas ilegalmente, torturaram e mataram. No total, mais de 4.600 pessoas tiveram seus direitos políticos cassados, cerca de 10.000 foram exiladas e, na lista dos desaparecidos, existem 144 nomes.

400 contra 13.000

O depoimento de Chaves é um relato parcial. Sua importância reside em mostrar por dentro, e pela primeira vez, a rotina da repressão política. Na tarde de sexta-feira da semana passada, chegou a tomar um avião para São Paulo e ir à Rodovia SP-255, que dá acesso à cidade de Avaré, no interior do Estado. Ali, há duas pontes. Chaves queria vê-las para saber de qual delas eram jogados os corpos de presos assassinados. Estava satisfeito com seu desabafo. "Foi a cúpula militar que se beneficiou com cargos e funções na época da repressão", afirma. "A grande maioria silenciosa queria o Exército profissional, como ele é hoje."

Nos porões, Chaves garante que nunca torturou nem teve envolvimento direto com assassinatos ou ocultação de cadáveres. "Se tivesse feito isso, não estaria dando esse depoimento", diz. Sua missão era avaliar os depoimentos dos presos e cruzá-los com as informações repassadas ao Exército pelos militantes de esquerda que haviam se convertido em informantes. Em 1965, entrou para o Exército, servindo no Arsenal de Guerra em São Paulo. Três anos mais tarde, já sargento, teve o primeiro contato com atividades de informação. "Ficamos sabendo que a vanguarda Pós-Revolucionária, do capitão Carlos Lamarca, estava pintando um canhão com as cores das Forças Armadas para usar numa ação terrorista", relembra Chaves. Depois de fazer cursos de operação na selva, Chaves foi para o Destacamento de Operações de Informações, o DOI, chefiado pelo coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra. Começava seu convívio com o porão.

PEDIDO DE DEMISSÃO - O ex-sargento Chaves trabalhou no DOI paulista até 1976. Dali, mudou-se para Imperatriz, no Maranhão, onde servia num Batalhão de Infantaria da Selva. De Imperatriz, passou por Manaus, até ser destacado para servir em Brasília, no Comando Militar do Planalto, em 1980. No ano seguinte, Chaves, passou para o Centro de Informações do Exército, que comandava as operações do porão. Nessa época, chegou a ser destacado para fazer a segurança do então ditador da Argentina, Leopoldo Galtieri, durante uma visita ao Brasil. Em 1985, tomou uma decisão rara na caserna. Pelos trâmites burocráticos normais, encaminhou uma correspondência pedindo sua demissão do Exército. "Foi duro. Perdi noites de sono, caminhando pela casa, até resolver que não era mais possível suportar aquela pressão", conta. Com sua demissão, Chaves renunciou a mais de vinte anos de sua carreira militar e perdeu todos os benefícios que recebem os militares quando passam para a reserva. Se tivesse permanecido, seria capitão. Hoje, Chaves é um ex-sargento, com a vantagem de que não pode ser punido pelas suas revelações.

A lei da barbárie

Num relato sobre a selvageria do porão, o ex-sargento conta como eram mutilados, esquartejados e ocultados os corpos de presos políticos

Há um ano, o editor Expedito Filho conversou pela primeira vez com o ex-sargento Marival Dias Chaves do Canto, que trabalhou dezessete anos como agente do Destacamento de Operações Internas, o DOI-Codi, em São Paulo, e do Centro de Informações do Exército, em Brasília. Há três semanas, Chaves, especializado em análise de informações, decidiu enfim revelar tudo o que sabe sobre prisão, tortura, assassinato e desaparecimento de cadáveres de presos políticos. Foram mais de vinte horas de entrevista, cujos principais trechos são publicados a seguir:

VEJA - Como eram mortos os presos políticos?

CHAVES - Sei que em São Paulo alguns morriam na tortura. Os que resistiam eram liquidados pelos agentes da repressão política com uma injeção usada para matar cavalos de até 500 quilos. A injeção era aplicada na veia do preso político, que morria na hora. Quem já assistiu a uma cena dessas sabe que é uma das coisas mais grotescas e repugnantes que se pode fazer a um ser humano. Eles matavam e esquartejavam. Agentes que estiveram numa casa mantida pelo Centro de Informações do Exército em Petrópolis, no Rio de Janeiro, me contaram que os cadáveres eram esquartejados, às vezes até em catorze pedaços, como se faz com boi num matadouro. Era um negócio terrível. Eles faziam isso para dificultar a descoberta e a identificação do morto. Cada membro decepado era colocado num saco e enterrado em local diferente. A casa de Petrópolis foi onde o Centro de Informações do Exército mais matou presos e ocultou cadáveres. Os militantes detidos em diversas regiões do país eram enviados dos Estados diretamente para Petrópolis.

VEJA - Quantas casas de tortura e morte eram mantidas pelo Centro de Informações do Exército?

CHAVES - Do final da década de 60 até o início dos anos 70, havia uma casa no bairro de São Conrado, no Rio. Depois, por razões de segurança, mudou-se o centro de tortura e morte para Petrópolis. Eram levados para lá os presos condenados à morte, mas alguns conseguiram sobreviver. Em 1972, o II Exército, em São Paulo, montou os seus centros clandestinos de tortura e assassinatos. Durante um curto período, o Destacamento de Operações de Informações, o DOI, utilizou um sítio na região sul de São Paulo. Ali foram assassinados Antônio Bicalho Lana e a sua companheira Sônia Moraes, ambos da Ação Libertadora Nacional, a ALN.

VEJA - Mas a versão oficial é de que Lana e Sônia teriam morrido durante um tiroteio...

CHAVES - É mentira. Eles foram torturados e assassinados com tiros no tórax, cabeça e ouvido. Os cadáveres foram colocados no porta-malas de um carro e levados até o bairro de Santo Amaro, na Zona Sul de São Paulo. Ali, encenou-se a farsa do tiroteio para simular a morte deles.

VEJA - Depois de abandonar esse sítio, o Destacamento de Operações de Informações abriu outro em São Paulo?

CHAVES - Sim. Era uma época de matança febril. No final de 1973, o DOI usou uma casa no bairro do Ipiranga, na Zona Sul de São Paulo. Nesse período montou outro centro clandestino na estrada de Itapevi. Entre 1965 e 1966, funcionou ali uma boate chamada Querosene, que pertencia ao irmão do então subtenente Carlos, fundador da Operação Bandeirantes, a Oban. Só em 1975, por questões de segurança, o cárcere de Itapevi foi substituído por uma fazenda, na beira da Rodovia Castello Branco, a 30 quilômetros de São Paulo. A fazenda era de um amigo do major do exército André Leite Pereira Filho.

VEJA - Como eram equipados os centros de matança?

CHAVES - Eles tinham as coisas de uma casa normal, além dos aparatos de repressão. Nas casas do Ipiranga e da estrada de Itapevi, havia até grilhões para acorrentar os pés e as mãos dos presos às camas e a blocos de cimento.

VEJA - A ocultação dos cadáveres era uma operação improvisada ou havia algum plano?

CHAVES - Matar subversivos era uma atividade altamente profissional. Nas casas de São Paulo, havia uma equipe especializada na ocultação dos cadáveres. Os agentes sabiam exatamente o que fazer. Primeiro, amputavam as falangetas dos dedos, para evitar que os mortos fossem reconhecidos através das impressões digitais. Depois, amarravam as pernas para trás, de que forma que o corpo ficasse reduzido à metade, e esfaqueavam a barriga. O esfaqueamento era para evitar que o corpo, se jogado num rio, viesse à tona algum tempo depois. Eles também colocavam o corpo dentro de um saco e amarravam-no num concreto, de 40 a 50 quilos, para garantir que o corpo ficaria no fundo do rio.

VEJA - Há dezenas de famílias que até hoje não sabem onde encontrar os corpos dos seus parentes. O senhor tem idéia de onde eram enterrados?

CHAVES - Tenho. Boa parte dos mortos não está sob a terra mas sob a água. Se alguém fizer uma busca no rio debaixo de uma ponte que fica na estrada que liga a cidade de Avaré, no interior de São Paulo, à Rodovia Castello Branco, poderá achar muitos corpos. Existe ali um cemitério debaixo d'água.

VEJA - O senhor sabe identificar alguns desaparecidos que estejam no rio de Avaré?

CHAVES - Conheço a identidade de oito deles, todos do Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro - o antigo PCB. Boa parte deles caiu nas mãos da repressão durante a Operação Radar.

VEJA - O que foi essa Operação Radar?

CHAVES - Foi uma grande ofensiva do Exército, iniciada em 1973, para dizimar o PCB. A Operação Radar culminou com a apreensão da gráfica do jornal Voz Operária, do PCB.

VEJA - Foi nessa operação que parte do Comitê Central do PCB foi capturada?

CHAVES - Sim, e depois jogada no rio de Avaré. É o caso de Hiram de Lima Pereira, interrogado em Itapevi, e de Luís Inácio Maranhão Filho, preso em São Paulo em 1974. Levado para Itapevi, Maranhão Filho morreu com a injeção para matar cavalo. João Massena Melo é outro. Também está no rio e morreu com a injeção para cavalo. Orlando Bonfim Júnior, da cúpula do PCB, está no rio de Avaré. Bonfim foi preso no Rio pelo Destacamento de Operações de Informações de São Paulo e levado para o cárcere na Rodovia Castello Branco. Outro que está no rio é Elson Costa, assassinado em 1975. Ele era o encarregado da seção de agitação e propaganda do partido. Na casa de Itapevi, foi interrogado durante vinte dias e submetido a todo tipo de tortura e barbaridade. Seu corpo foi queimado. Banharam-no com álcool e tocaram fogo. Depois, Elson ainda recebeu a injeção para matar cavalo. O corpo de Itair José Veloso também foi jogado da ponte. Ele foi preso no Rio, pelo DOI de São Paulo. Era o inverno de 1975 e o que o levou à morte foi banho de água gelada. Morreu de choque térmico.

VEJA - Por que o DOI de São Paulo fazia prisões no Rio?

CHAVES - Durante a Operação Radar, o DOI de São Paulo passou a fazer uma série de operações no Rio de forma absolutamente clandestina e ilegal. O Rio não era área de jurisdição do DOI de São Paulo.

VEJA - Como era a rivalidade entre os órgãos de informação do Exército, da Marinha e da Aeronáutica?

CHAVES - Existia uma rivalidade grande entre o Centro de Informações do Exército e o Centro de Informações da Marinha, o Cenimar. O Centro de Informações e Segurança da Aeronáutica, o Cisa, chegou a juntar-se ao Exército numa campanha contra os arapongas da Marinha. Era uma confusão.

VEJA - Voltando ao rio de Avaré. O senhor falou em oito nomes, mas contou só seis.

CHAVES - Um é Jayme Amorim de Miranda, também preso na Operação Radar, numa das incursões do DOI de São Paulo ao Rio. Foi transferido para Itapevi. Seu irmão Nilson Miranda, que era secretário-geral do PCB de Porto Alegre, estava preso no Ipiranga. Um não sabia onde estava o outro. O Nilson sobreviveu. O último corpo que sei ter sido jogado da ponte é o de José Montenegro de Lima. Mas esse é um caso especial.

VEJA - Especial por quê?

CHAVES - Porque mostra que dentro dos órgãos de repressão também havia uma quadrilha de ladrões. Logo depois da invasão da gráfica do Voz Operária, Montenegro recebeu do partido 60.000 dólares para recuperar uma estrutura de impressão do jornal. Uma equipe do DOI prendeu Montenegro, matou-o com a injeção, e depois foi na sua casa pegar os 60.000 dólares. O dinheiro foi rateado na cúpula do DOI.

VEJA - Até agora o senhor falou de gente presa no Rio e levada para São Paulo. E no sentido inverso?

CHAVES - Também havia. É o caso de Issami Okano, da ALN, e de Walter de Souza Ribeiro, do PCB. Também morreram em Petrópolis David Capistrano (pai do candidato à prefeitura de Santos pelo PT, David Capistrano Filho) e José Romam, ambos do PCB. O major Brand chefiava a equipe que os prendeu. Capistrano foi levado para o Rio. Ambos foram mortos em Petrópolis, onde a prática de ocultação dos corpos era através do esquartejamento. Foi o caso também de Ana Rosa Kucinski e seu marido, Wilson Silva. Foram delatados por um cachorro, presos em São Paulo e levados para a casa de Petrópolis. Acredito que seus corpos também foram despedaçados.

VEJA - O que eram os "cachorros"?

CHAVES - Era assim que chamávamos os infiltrados. Os militantes de grupos. de esquerda que colaboravam com a repressão, contando os planos das suas organizações e delatando seus companheiros.

VEJA - O senhor coordenava os cachorros?

CHAVES - Não. Meu trabalho consistia em fazer a análise de informações. Eu lia os depoimentos de presos políticos tomados sob tortura e examinava as informações enviadas pelos nossos infiltrados no PCB, na ALN, no PC do B e na VAR-Palmares. Também fazia coleta de dados, investigações, vigilância e escuta telefônica. Quem coordenava os cachorros era um oficial. Tivemos o doutor Patrício e o doutor Jairo, que conheço só pelos codinomes.

VEJA - O senhor conheceu algum infiltrado?

CHAVES - Conheci vários. Severino Teodoro de Mello, do PCB, João Henrique Ferreira de Carvalho, o "Jota", da ALN. Sabia também de três infiltrados do PC do B. Eram o Luciano Rosa de Siqueira, o advogado Hamilton de França e o médico Fiúza de Mello. Todos trabalhavam para o Exército.

VEJA - Como se convencia esses militantes a fazerem espionagem para o Exército?

CHAVES - Não havia um modelo. Teodoro de Mello, por exemplo, foi preso em 1974 e levado para Itapevi. De lá, foi transferido para outro cárcere, na cidade de São Paulo. Depois de interrogado, ele assinou um contrato de trabalho e recebeu uma importância em dinheiro. Não me lembro quanto.

VEJA - Como foi a cooptação de Luciano de Siqueira, do PC do B?

CHAVES - Luciano virou cachorro numa operação do Centro de Informações do Exército em Pernambuco, que visava desmantelar a Ação Popular, a AP, e o próprio PC do B. Nessa operação, ele foi preso, torturado e virou infiltrado. Em 1977, quando o general Sylvio Frota foi demitido do Ministério do Exército, o Centro de Informações do Exército abandonou todos os cachorros e só restabeleceu contato com eles em 1982. Participei desse recontato, que foi chefiado pelo Paulo Malhães. Não estive pessoalmente com Luciano, mas sei que ele morava no bairro Janga, próximo a Olinda, Pernambuco.

VEJA - Que tipo de informação os cachorros passavam?

CHAVES - O Luciano Siqueira fez várias tarefas. Foi ele quem permitiu a prisão de muita gente da AP e do PC do B no Nordeste. Em 1982, quando o PC do B estava lançando candidatos a deputados pelo PMDB, ele fez relatos detalhados sobre essas reuniões. Quando estava em São Paulo, participando de reuniões do partido, ele em coordenado pelo coronel Ênio da Silveira. Já o Teodoro de Mello, do PCB, foi quem elucidou uma série de dúvidas durante a Operação Radar. Ele ajudou a identificar muita gente que só conhecíamos pelo nome de guerra. Com isso, descobrimos que era gente graúda, da direção do partido. Mello foi um divisor de águas. A partir de suas informações, foi possível prender, torturar e assassinar vários comunistas.

VEJA - O CIE dava algum tipo de proteção aos cachorros?

CHAVES - Claro. Às vezes até os companheiros dos cachorros se beneficiavam disso. Dou um exemplo. O Alanir Cardoso, ex-preso político, até hoje diz que Luciano Siqueira não era infiltrado porque não contou que tinha um encontro com Alanir marcado para o dia seguinte à sua prisão. Só que se prendêssemos Alanir ficaria evidente que Luciano era um infiltrado.

VEJA - Mas não havia segurança direta para os cachorros?

CHAVES - Havia. Em 1975, Teodoro de Mello viajou acompanhado por uma equipe de agentes do Destacamento de Operações de Informações, chefiada pelo coronel Ênio da Silveira, até Rivera, no Uruguai. Fiz contato pessoal com Mello durante o trajeto. Sozinho, ele poderia ter problemas com autoridades no sul, já que era procurado por toda parte.

VEJA - Não seria mais prático deixar Mello no Brasil?

CHAVES - Ele tinha de sair do país porque nessa fase o PCB estava sofrendo muitas baixas em função da repressão. Era perigoso que ele continuasse no Brasil. Ele era infiltrado do Destacamento de Operações de Informações e poderia ser preso por um outro órgão, como o Cenimar da Marinha, ou o Dops. Na Argentina, ele se encontraria com o dirigente comunista Armando Ziller e depois iria para a União Soviética. Em Moscou, trabalhou como secretário de Luís Carlos Prestes, secretário-geral do partido, e chegou a mandar de lá cartas para o coronel Ênio da Silveira, relatando os planos dos dirigentes comunistas brasileiros.

VEJA - Havia algum cachorro que trabalhasse tão bem a ponto de servir como modelo?

CHAVES - Sim, o João Henrique de Carvalho, o "Jota". Ele deu o tiro de misericórdia na ALN e em outras organizações que tinham ligações com a ALN. Por seu trabalho, Jota era citado pela antiga Escola Nacional de Informações como modelo de infiltrado.

VEJA - Jota contribuía diretamente para a morte de alguns de seus companheiros?

CHAVES - Sem dúvida. A delação dele permitiu a eliminação de pelo menos umas vinte pessoas. Ele é responsável pela morte de Antônio Bicalho Lana e sua mulher, Sônia Moraes. Também delatou Issami Okano, de ALN. A partir de 1973, Jota delatou todos os comandos da ALN. Foi por causa do seu trabalho que Wilson Silva e sua mulher, Ana Rosa Kucinscki, foram presos, torturados e mortos.

VEJA - O senhor tem alguma informação sobre a morte do jornalista Wladimir Herzog, em 1975?

CHAVES - Quem pode esclarecer tudo sobre a morte de Herzog é o major André Leite Pereira Filho. Ele era o chefe das equipes de interrogatório, inclusive da que matou Herzog.

VEJA - O senhor sabe o paradeiro do ex-deputado Rubens Paiva?

CHAVES - Ele foi levado por um destacamento do I Exército para a casa de Petrópolis, onde o mataram. Usaram o método de cortar o corpo aos pedaços e enterrar em locais diferentes.

VEJA - Mas Amilcar Lobo, o médico do Exército que costumava tratar dos torturados, garante que atendeu Rubens Paiva no quartel da Polícia do Exército do Rio de Janeiro...

CHAVES - A ex-guerrilheira Inês Etienne já desmentiu Amilcar Lobo. Ele pode ter visto Rubens Paiva vivo na Polícia do Exército, mas ele morreu em Petrópolis. Todo mundo sabe que Amilcar Lobo atendia os torturados na casa de Petrópolis. Além disso, duas pessoas participaram do episódio Rubens Paiva: os irmãos Jacy e Jurandyr Ochsendorf e Souza.

VEJA - É verdade que alguns desaparecidos foram enterrados numa fazenda em Rio Verde, no interior de Goiás?

CHAVES - Márcio Beck Machado e Maria Augusta Thomaz, ambos do Movimento da Libertação Popular, o Molipo, foram mortos e enterrados numa fazenda de Rio Verde. Grupos de direitos humanos estavam próximos de chegar ao local onde eles estavam enterrados. Mas o Centro de Informações do Exército soube da atividade dos grupos de direitos humanos e, através do major Leite Pereira, montou uma equipe para desenterrar os cadáveres e sumir com os corpos. Só o major pode dizer onde os dois estão hoje.

VEJA - Há muita mentira sobre o destino de presos políticos?

CHAVES - Acho que nunca se mentiu tanto nem se cometeu tanta atrocidade. Há inúmeros exemplos. A repressão fez noticiar que João Batista Franco Drummond, do PC do B, morrera num atropelamento. Mentira. Ele morreu no Departamento de Operações de Informações do II Exército. Foi torturado, escapou da segurança, subiu numa torre de transmissão e de lá voou para a morte. Eduardo Leite, da Ação Libertadora Nacional, foi preso em 1970 pela equipe do delegado Sérgio Paranhos Fleury e ficou na casa da morte de São Conrado. Depois, foi transferido para São Paulo e assassinado. Para despistar, fizeram um teatrinho.

VEJA - O que eram esses teatrinhos?

CHAVES - O preso morto era levado para um local público, onde equipes do DOI simulavam um tiroteio com mortes. Na hora de levar o "corpo" para o IML, faziam-se substituições. O agente que se fingiu de morto era substituído pelo corpo do preso. No IML o legista Harry Shibata e outros legalizavam a morte em combate.

VEJA - Não havia entre os agentes algum comentário de repúdio a essa matança, alguma indignação?

CHAVES - Pelo contrário. Os comentários eram ufanistas. No caso da prisão de Antônio Bicalho Lana houve vibração. Na repressão existiam dois tipos de pessoa. O primeiro, com vocação para matar, inspirado pelo ódio. O outro, não tinha vocação para o crime, mas estava impregnado pela doutrina da segurança nacional. Esses matavam por achar que estavam salvando o país do comunismo.

VEJA - Como o senhor se sentia diante disso?

CHAVES - Muito mal. Cheguei a passar muitas noites sem dormir. Mas procurava levar uma vida normal. Anotava alguns relatos em folhas de papel e ficava pensando no dia em que contaria tudo. Eu era um homem acuado. Não tinha amigos e não podia desabafar sequer com minha mulher. Ao acordar, enfrentava a mesma rotina. Era um horror.

VEJA - Como se comportavam os que comandavam a repressão? Eram pessoas violentas no dia-a-dia?

CHAVES - O coronel Ênio da Silveira era extremamente violento. Para ele, a doutrina de segurança nacional estava acima de qualquer coisa. Ele tinha curso de todos os níveis na área de informação. Com os comandados, era até gentil. Mas quando queria, era duro e enérgico. Suicidou-se em 1986. O coronel Paulo Malhães, que chefiava contatos com os infiltrados, rezava pela mesma cartilha. Ele esteve no Chile, onde interrogou e torturou brasileiros e chilenos. Já o coronel Fred Perdigão, que pertencia ao Centro de Informações do Exército desde a sua época de capitão, tinha influência suficiente no porão para viver levando presos de São Paulo para Petrópolis. Ele participou do desaparecimento de Ana Kucinski e Wilson Silva.

VEJA - Havia um pacto de silêncio entre matadores e torturadores?

CHAVES - Depois de cada caso, na hora do almoço, e durante viagens em quartos de hotel, os agentes comentavam o que tinha ocorrido. As conversas eram simuladas e ninguém dizia claramente: eu matei.

VEJA - Nenhum agente ameaçou sair do Exército e contar tudo?

CHAVES - O sujeito que durante a repressão tentasse se afastar corria o risco de ser justiçado. Um agente, que conheço só pelo codinome de "Júnior", foi afastado da seção de investigações por tentar extorquir dinheiro do jornalista Bernardo Kucinski, irmão de Ana, em troca de informações sobre o paradeiro dela. A seção de investigação pensou em justiçá-lo porque ele disse que iria procurar a Comissão de Justiça e Paz de São Paulo para denunciar fatos sobre a subversão.

VEJA - Por que o senhor resolveu falar?

CHAVES - As atividades de combate à subversão aos poucos foram me dando nojo, enjôo, náuseas, vômitos, tudo que você pode imaginar. Eu via as coisas acontecerem, discordava e não podia me manifestar. O regulamento disciplinar do Exército era muito rígido. Existia ainda a norma geral de ação, que impedia o integrante do órgão de informação de se manifestar ou discutir uma ordem. Se deixasse de cumprir, ocorriam punições e, em seguida, a pecha de contrário à Revolução de 64. Não fui formado para esse tipo de atividade. Fui cooptado e quando acordei estava envolvido. O próprio sistema procurava comprometer os envolvidos. O medo da repressão era muito grande. Eles criavam símbolos na própria força para mostrar que ninguém poderia reagir. Matar o capitão Carlos Lamarca, por exemplo, foi questão de honra. Por isso, da mesma forma que eu, muita gente acabou ficando, apesar de discordar. Em 1985, senti que era hora de me afastar porque os governos militares tinham chegado ao fim. Era a hora de me afastar sem me comprometer.

VEJA - O senhor acha que não se comprometeu?

CHAVES - Se tivesse matado alguém não faria este depoimento. É claro que meu trabalho, e aí faço mea-culpa, contribuiu muito para causar esses males. Há pessoas honestas que participaram da repressão e não concordavam com aquela violência insana. Mas até hoje não têm coragem de contar o que sabem, que a única lei do porão era a barbárie.

VEJA - O senhor se considera um democrata?

CHAVES - Nosso país só será grande vivendo uma profunda democracia. Eu estive dentro dos porões da repressão e sei o que uma ditadura sangrenta significa. E espero que esse depoimento contribua para o aprimoramento da democracia.

VEJA - Se uma entidade de defesa dos direitos humanos o procurar para falar sobre desaparecidos, o senhor irá colaborar?

CHAVES - Estou disposto a ajudar em todos os sentidos. Quero prestar um serviço ao país.

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