Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Tancredo Neves. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Tancredo Neves. Mostrar todas as postagens

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

O reino da treva quis taxar o Sol - Elio Gaspari

Empresários e eletrotecas queriam tungar a disseminação de uma energia limpa

Imposto para energia solar é o reino da treva querendo taxar o Sol

Ou a Aneel faz um debate limpo ou o Congresso limitará seus poderes

Em menos de 24 horas o presidente Jair Bolsonaro e os presidentes da Câmara e do Senado desmancharam uma costura que vinha sendo armada há anos pelas distribuidoras de energia e pela Agência Nacional de Energia Elétrica. À primeira vista, o propósito dos empresários e dos eletrotecas era tungar os consumidores de energia solar, mas a coisa ia mais longe: queriam tungar a disseminação de uma energia limpa. 

Desde 2012 sabia-se que em 2020 a Aneel rediscutiria os incentivos dados à produção e ao consumo de energia solar. Essa questão poderia ter sido conduzida de forma transparente, honesta e inteligente. Preferiu-se o caminho dos corredores, da onipotência e da treva. Primeiro, plantando-se uma versão segundo a qual o sujeito que coloca placas de energia solar no telhado de sua casa recebe subsídios. Falso. Subsídio haveria se o cidadão consumisse R$ 100 de quilowatts e só pagasse R$ 90. No caso, quem tem placas de energia solar paga às distribuidoras até o último centavo pela energia que consome. Só não paga por aquela que o Padre Eterno lhe manda durante o dia. Hoje a energia solar representa 1% do consumo e em 2019 a Aneel estimava em R$ 340 milhões os incentivos dados aos consumidores, sabendo que o subsídio ao uso do carvão custa R$ 1 bilhão.

Em outubro passado deu-se o grande golpe. A Aneel jogou fora meses de discussões e apresentou uma nova proposta para consulta pública que tungava entre 30% e 60% da economia conseguida por quem viesse a instalar painéis solares em suas casas ou em seus edifícios a partir de 2020. As consultas públicas anteriores haviam durado até quatro meses, com três reuniões presenciais. Dessa vez resolveriam tudo em 45 dias, com uma só reunião. Coisas de Brasília. Nesses dias, dando um toque pitoresco ao debate, um senador apresentou projeto classificando, como “bens da União” os “potenciais de energia eólica e solar”. Tradução: lá vem imposto.

Com o tranco dado por Bolsonaro, Rodrigo Maia e David Alcolumbre, a Aneel tirou a girafa do picadeiro e disse que vai reexaminar a questão. (Vale lembrar que o Ministério da Economia havia emitido um parecer endossando a ideia da girafa. Lá viceja também a ideia de se taxar o uso da internet em transações bancárias.)
Os eletrotecas e os empresários menosprezaram o ensinamento de Tancredo Neves: “Esperteza, quando é muita, come o dono”. Há dois tipos de consumidores de energia solar. Num estão as pessoas que têm placas nos telhados de suas casas, edifícios ou conjuntos residenciais. No outro, há os consumidores abastecidos por empresas que montam grandes fazendas captadoras de energia solar e funcionam como verdadeiras usinas geradoras. (Uma residência que paga R$ 300 mensais e instala painéis solares investindo R$ 15 mil derruba a conta para R$ 50.) Nos dois casos, usam uma energia limpa, mas pode-se dizer que as duas operações, mesmo semelhantes, não são iguais. Se os espertalhões tivessem exposto essa diferença, sem pensar numa tunga ampla, geral e irrestrita, talvez não tivessem tomado a pancada que tomaram.
Agora, ou a Aneel faz um debate limpo, ou o Congresso limitará seus poderes de taxação planetária.

Folha de S. Paulo - O Globo - Elio Gaspari, jornalista
 

domingo, 10 de novembro de 2019

O inferno II - VEJA - Gustavo Krause

Blog do Noblat

O que nós temos a dizer dos que duvidam da solidez da nossa democracia?

A democracia não é o paraíso.  O notável pensador político, Norberto Bobbio, em O Futuro da Democracia, apontava pelo menos seis promessas (ou ilusões) não cumpridas pela democracia. Por sua vez Rousseau, afirmava: “Se houvesse um povo de deuses, seria governado democraticamente, mas aos homens não convém tão perfeito governo”  Em contrapartida, a ausência da democracia é o inferno sob formas de tirania, entres as quais, a mais perversa: sistema totalitário.

Neste sentido, a nossa experiência histórica tem muito a dizer pelas agruras sofridas: uma democracia jovem, submetida a uma transição arriscada, mais lenta e menos segura do que prometia a estratégia da transição do governo militar para o governo civil.  Com evidentes sinais de consolidação (integração da sociedade civil, estado de direito, sociedade econômica, gestão pública e sociedade política), eis que a direita e a esquerda populistas ameaçam, globalmente, as democracias liberais, desta vez, chegando ao poder, não pela força, mas pelos instrumentos da democracia representativa. Uma vez instaladas no governo, as lideranças “legitimadas” pelo voto, enfraquecem à exaustão a teia protetora das instituições democráticas a ela sobrepondo o poder despótico.

O que nós temos a dizer dos que duvidam da solidez da nossa democracia? É provável que nenhuma democracia nascente tenha sido tão testada: a enfermidade letal do Presidente Tancredo Neves, o governo fraco de Sarney, mas ao qual se deve a capacidade de superar crises; cooperar decisivamente com o processo constituinte; suportar uma oposição virulenta; sobreviver à recessão e à superinflação.

O que veio depois? A maior crise, até então, do presidencialismo: o impeachment de Collor e mais uma vez um governo provisório de Itamar Franco, objeto de todos os preconceitos, que eliminou a inflação graças ao engenhoso plano de estabilização sob à lúcida liderança do Ministro da Fazenda e sucessor, Fernando Henrique Cardoso. Seguem-se o fenômeno e a tragédia: o operário e retirante nordestino chega ao Palácio do Planalto nos braços do povo com um projeto de poder a ser viabilizado por uma corrupção sistêmica. As instituições e os ritos democráticas prevaleceram: colocaram Lula na cadeia, destituíram a Presidente, empossaram Temer.

Dito isto, os esbirros juvenis e insensatos ao contrário de ameaçar, fortalecem a democracia. O STF vai dar a palavra final sobre a prisão de condenados em segunda instância. A decisão será acatada e respeitada. Resta a última instância: o oitavo fosso do quinto círculo do inferno de Dante onde os corruptos vão arder para sempre.

Blog do Noblat - Ricardo Noblat, jornalista - VEJA

Gustavo Krause foi ministro da Fazenda de Itamar Franco 



 

segunda-feira, 30 de setembro de 2019

Uma conjuntura muito favorável ao poder, mas com aquele probleminha - Análise Política

Alon Feuerwerker

O modus operandi congressual do bolsonarismo vai ficando cada vez mais nítido. Não há obsessão por tratorar o Legislativo. No plano parlamentar, aceita-se o jogo. O que os parlamentares perderam em espaço político na Esplanada, ganharam em oportunidades de protagonismo. O governo manda os projetos, o Parlamento faz quase o que bem entende, depois o presidente veta, e o Legislativo também derruba os vetos que deseja.

Não sei se chega a ser uma nova política, mas tem boa dose de novidade, ao menos neste último meio século. Nos governos militares, o Congresso, quando estava aberto, era uma máquina carimbadora do Executivo, graças também ao bipartidarismo, aos atos institucionais e às cassações periódicas de mandatos. [as vezes surge uma curiosidade: para que serve o Congresso se só tumultua e onera os cofres públicos?] Quando nada disso era suficiente vinha o fechamento. Como por exemplo no Pacote de Abril de 1977.

Depois nasceu a Nova República, uma oportunidade do país aos políticos. 
[Nova República = a institucionalização da corrupção,  do maldito politicamente correto, do excesso de direitos e da judicialização de tudo.]  Mas Tancredo Neves morreu, José Sarney virou um presidente não tão forte, e sofreu a dualidade de poder imposta pela Constituinte e Ulysses Guimarães. E teve de escancarar a máquina aos políticos para sobreviver. Sucedeu-o Fernando Collor, que quis fazer uma nova política e acabou derrubado. Por questiúnculas, como Dilma Rousseff um quarto de século depois.

E surgiu Fernando Henrique Cardoso para derrotar o PT de Luiz Inácio Lula da Silva, que estava forte depois da queda do seu antípoda, Collor. FHC governou à moda tradicional, e teve tranquilidade, também porque a nova política tinha dado errado. E graças à velha e boa política o tucano sobreviveu à debacle do Real na transição do primeiro para o segundo mandato. O país parecia vacinado contra impeachments. Parecia.

Lula governou conforme a cartilha da Nova República. Aprendendo com Sarney, Collor e Fernando Henrique, procurou montar uma base sólida no Congresso para evitar surpresas. Também por isso, escapou na crise do chamado mensalão, reelegeu-se e elegeu a sucessora. Que se sentiu num momento suficientemente forte para deixar os aliados na rua da amargura da Lava Jato. Deu no que deu. Agora Jair Bolsonaro propõe uma nova oportunidade para um modelo que falhou duas vezes.

Verdade que o atual presidente faz isso numa conjuntura excepcionalmente favorável. Para começar, dois terços do Congresso estão potencialmente alinhados com a agenda do Executivo. O governo acha, e tem uma dose de razão, que mesmo se nada fizer o Legislativo terá de andar na linha do Executivo, pois os deputados e senadores não  terão como explicar aos seus eleitores se fizerem diferente.

E o financiamento empresarial de campanhas está vetado, o que diminui a atratividade da ocupação de certos espaços ministeriais e nas estatais. Claro que sempre o olho pode crescer. Mas o mar não está pra peixe. E os partidos estão razoavelmente abastecidos pelos recursos públicos para sobreviver e fazer suas campanhas. Então, se o Planalto executa com competência o orçamento das emendas, tem combustível para navegar.

Para ajudar, o reinado absolutista da Lava Jato parece ter entrado no seu até agora pior inverno. E Bolsonaro tem assim facilitada a tarefa de recolocar o gênio dentro da garrafa, ou pelo menos tentar. Era previsível, e foi previsto, que o Bonaparte saído das urnas precisaria restabelecer o Poder Moderador do Executivo, tradicional desde que D. Pedro I fechou a Constituinte e outorgou a primeira Carta do Brasil independente.

Nisso, no essencial, Planalto, Congresso e Supremo vêm jogando juntos, pois interessa a todos acabar, ou pelo menos reduzir, a disfuncionalidade institucional em que o país foi atirado desde que Executivo e Legislativo ficaram acuados pela Lava Jato. E, enquanto esta permanece uma ameaça letal, seria pouco inteligente os três lugares geométricos da Praça dos Três Poderes ficarem de mimimi uns com os outros.

Sem contar que o PT não está propriamente infeliz com o esforço bolsonarista para controlar a fera. Sempre há a possibilidade, claro, de a Lava Jato voltar a se concentrar só no PT,
mas até isso teria um lado útil para o petismo: reforçaria a narrativa de vitimização, já bem nutrida pelas interessantes revelações do The Intercept e parceiros. Depois da VazaJato, a Lava Jato nunca mais será a mesma, apesar das juras de amor do novo PGR.

Então está tudo bem? Não, tem aquele probleminha: quase 13 milhões de desempregados, fora os subempregados e desalentados em geral. Eis a fenda na represa, fenda que se não for fechada embaralha bem esse jogo. Ninguém vai querer ser sócio do fracasso. Mas enquanto não chega o dia do juízo político o bolsonarismo aproveita o mar de almirante para radicalizar na guerra de posição, inclusive no campo cultural. Já que Gramsci está na moda. 


Análise Política - Alon Feuerwerker, jornalista



terça-feira, 17 de setembro de 2019

No meio do caminho tinha um tanque - Bolsonaro à caça do traidor - Blog do Noblat

 Blog do Noblat - Veja

Witzel invadiu os domínios do capitão


Anteontem, ainda hospitalizado, o presidente Jair Bolsonaro negou que tivesse ordenado ao PSL carioca a retirada do apoio ao governador Wilson Witzel (PSC). Ontem, o PSL carioca anunciou que seus 12 deputados estaduais deixarão de apoiar Witzel.

Nada de mais. Nada de original. Bolsonaro não tem compromisso com o que diz. E por não ter, orientou seus correligionários a dizerem que o rompimento se deve ao fato do governador do Rio ter revelado que será candidato a presidente em 2022.
Não foi por isso. É fake! Bolsonaro foi o primeiro a saber que Witzel pretende se candidatar à sua sucessão. Mas desde que ele, Bolsonaro, não seja candidato. Como Bolsonaro soube disso? Ouviu do próprio governador ao sobrevoar o Rio em um helicóptero ao lado dele.

Testemunhas da confissão de Witzel: agentes de segurança de Bolsonaro e o ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Bolsonaro ouviu a confissão calado, e não gostou. Ela serviu para aumentar sua desconfiança e antipatia pelo governador. O copo d’água transbordou quando Bolsonaro assistiu Witzel pontificar no desfile militar de 7 de setembro a bordo de um tanque de guerra do Exército. O que é isso? Witzel quer fazer média com os militares, [um dos redutos.] reduto eleitoral de Bolsonaro? Pode parar!
E o PSL desembarcou

Reforma ministerial adiada



O presidente Jair Bolsonaro desembarcou, ontem, em Brasília furioso com a informação de que encomendou aos auxiliares que o cercam mais de perto o esboço de uma ampla reforma ministerial que pretende fazer em breve. Está à caça da fonte, ou das fontes, que vazaram a informação para as jornalistas Helena Chagas e Lydia Medeiros, editoras do boletim TAG Reporter. Este blog obteve a mesma informação.

Recomenda-se ao presidente que amplie a investigação que pretende fazer em busca do que chama de “traidor” infiltrado entre as pessoas de sua confiança. A quem poderia interessar o vazamento da notícia? Resposta óbvia: a quem desejasse abortar o que estava sendo estudado. Ou porque seria prejudicado com a reforma ou simplesmente porque discordava dela a essa altura. O governo passaria cedo demais o recibo de que vai mal.

O episódio da reforma negada por Bolsonaro, especialista em se desdizer e em desmentir o que com frequência acaba se confirmando adiante, lembra episódio parecido que ocorreu em 1984 quando a eleição de Tancredo Neves para presidente era dada como certa. Em um esforço desesperado para vencer, Paulo Maluf, candidato do regime militar, convenceu o presidente João Figueiredo a fazer uma reforma ministerial a seu favor.

A informação vazou para Tancredo. Então pela primeira e última vez na sua vida, ele deu uma entrevista coletiva em “off”. Repassou a informação para um grupo de repórteres dos maiores jornais da época mediante a condição de não ser citado. Deu o nome dos ministros que seriam demitidos e dos que entrariam com a missão de ajudar Maluf. Ao ver a informação publicada no dia seguinte, Figueiredo desistiu da reforma.

Não se cobre a Bolsonaro conhecimentos históricos nem sabedoria política em excesso, apanágio de figuras que existiram no passado e de raras que ainda vivem. Bolsonaro é binário – preto ou branco, terra ou ar, amigo ou inimigo. É da sua formação. Paraquedista faz parte das chamadas Forças Especiais do Exército. O governo está repleto deles. Não é estimulado a pensar muito e tampouco a discutir. Ordem é ordem. Quando acionado, cai atirando para matar ou morrer. Selva!

Fora do hospital antes da hora

Tudo bem
Seria um exagero dizer que o presidente Jair Bolsonaro se deu alta do hospital onde foi internado em São Paulo para mais uma operação por conta da facada que levou há um ano em Juiz de Fora. Mas se tivesse dependido unicamente dos médicos que cuidam dele, Bolsonaro ficaria por lá mais alguns dias. Sua recuperação foi boa e não há indicação de retrocesso. Bolsonaro voou de volta a Brasília porque, na sua paranoia, enxerga perigos por todos os lados e não confia em ninguém – salvo na mulher e nos seus filhos.
Está disposto a fazer o que disse – comparecer à abertura da Assembleia Geral da ONU, em Nova Iorque, nem que seja em cadeira de rodas. Um bom paraquedista não foge ao combate. Os médicos acham cedo demais para que ele viaje – mas que médicos dizem não a um presidente da República? Está para nascer o primeiro. Não disseram não a Tancredo Neves e foi o que se viu.
O racha em meio aos bolsonaristas preocupa Bolsonaro e os garotos. Aumenta entre os devotos do capitão a desconfiança de que esfriou seu compromisso com o combate à corrupção. E tudo por causa do envolvimento de Flávio com desvio de dinheiro público, do acordo entre Bolsonaro e o ministro Dias Toffoli para salvar Flávio, e, por consequência, o enfraquecimento de Moro. A viagem a Nova Iorque foi esvaziada. Descartaram-se encontros com Bolsonaro pedidos por chefes de Estado. O presidente preferiu se reunir com generais americanos no Texas.
Até lá, deverá estar se alimentando normalmente. No momento, alimenta-se de coisas cremosas. Evoluirá para as pastosas. Está proibido de falar muito. Mas como forçá-lo a obedecer? Resta aos devotos e às pessoas de bom coração torcerem para que tudo dê certo. Selva! Ou melhor: Amém!
Blog do Noblat - Ricardo Noblat, jornalista - Veja


quarta-feira, 28 de agosto de 2019

Contestação à Anistia perde força após 40 anos- O Estado de S. Paulo

Marcelo Godoy

Cobranças por revisão da lei diminuem com decisão do Supremo e a gestão Bolsonaro


Depois de 40 anos, a Lei da Anistia vive o momento de menor contestação. Além da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de 2010, que decidiu por sua constitucionalidade, a atual correlação das forças políticas no governo de Jair Bolsonaro (PSL) afasta a possibilidade de sua revisão. Militares e opositores da ditadura ainda consideram as feridas do período abertas – torturas, mortes e desaparecimentos –, mas não enxergam espaço, na Justiça ou no Parlamento, para qualquer mudança na legislação.

Parte do pacto feito pelos militares e pelos civis para garantir a abertura, a Lei 6.683/1979 considerou anistiados todos os delitos políticos e os chamados crimes conexos cometidos entre 1961 e 1979. Excluíam-se da anistia os condenados por terrorismo, sequestro e atentados, que mais tarde teriam as penas reformadas e, por fim, seriam anistiados com a Emenda à Constituição número 26, em 1985, que também convocou a Assembleia Constituinte.

Pretendida pelo governo do general João Figueiredo e promulgada em 28 de agosto de 1979, a lei foi a 34.ª anistia concedida desde a fundação da República. Buscava-se, segundo os militares, pacificar e reconciliar o País. Após dez anos de exílio, o jornalista Fernando Gabeira desembarcou então no Rio. Houve festa. “A favor da pacificação está o tempo. Com ele, discutir a anistia fica fora do lugar, pois a polarização de 1964 não existe mais. A guerra fria acabou; só existe na visão de radicais.”

Para Gabeira, o pacto da transição é intocável. “Como fato da realidade política e como produto da atual correlação de forças, com a eleição de Bolsonaro, o tema não deve ser reaberto.” Ele diz que festejara à época a anistia e não vê por que, uma vez mudada a correlação de forças, mudar de opinião. “Mas respeito quem desejava rever a lei.”

A consolidação da lei é defendida também por um dos parlamentares que a votaram no Congresso, o então senador Pedro Simon (MDB-RS). “O MDB tinha o seu projeto de anistia. E o governo, o seu”, conta o senador, que foi a Nova York com o senador Tancredo Neves (MDB-MG) negociar o apoio do ex-governador Leonel Brizola para o projeto. “Mas o Brizola defendeu o projeto do governo, pois temia que o nosso não atendesse aos exilados.”

No Brasil, a luta pela anistia tinha aliados como o Comitê Brasileiro pela Anistia (CBA), a ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Brasileira de Imprensa (ABI). No governo, o projeto era conduzido pelo senador Petrônio Portela e pelo general Golbery do Couto e Silva. Havia resistências ao projeto do governo no MDB, conta o então deputado federal Miro Teixeira (MDB-RJ): “A discussão continuou no partido até que o Teotônio Vilela (senador por Alagoas) disse: ‘A lei é essa ou não teremos anistia’.”

A votação na Câmara foi apertada. A oposição e dissidentes da Arena ainda tentaram aprovar um substitutivo, que garantia uma anistia ampla irrestrita, mas a proposta acabou derrotada por cinco votos (201 a 206). Para Simon, a lei “deu um sentido de normalidade à vida pública brasileira, abrindo caminho até para a legalização dos partidos comunistas nos anos 1980.” Para Miro, não há um ponto final com a lei. “As feridas da tortura nunca cicatrizarão para quem foi torturado.” São essas feridas que levam o senador Major Olimpio (PSL-SP) considerar que se está longo de uma pacificação. “O presidente Figueiredo quis uma anistia para os dois lados. Esse gesto, até mal interpretado, foi salutar.” Na época, Olimpio era cadete da PM de São Paulo. “Não me esqueço, porém, que o capitão Carlos Lamarca matou o tenente Alberto Mendes Júnior.”

Quem também não esquece é o ex-deputado Marcos Tito (MDB-MG), que teve o mandato cassado em 1977 com base no AI-5. Ele estava entre os anistiados. “A anistia não reparou e todas as demais perseguições.” Em dois momentos a lei foi contestada. A primeira vez, quando se tentou aprovar na Constituinte que o crime de tortura era imprescritível – a esquerda foi derrotada pelo Centrão. Depois, quando o STF analisou se a lei estava de acordo com a Constituição de 1988, a Corte decidiu por 7 votos a 2 que a lei tinha validade. “A lei marcou o fim da ditadura. Sabemos que ela dificilmente vai mudar. Mas, se a Justiça está bloqueada, isso não impede que a luta se faça em defesa da memória dos que combateram a ditadura”, afirmou o secretário de Direitos Humanos do PT e ex-preso político, Adriano Diogo.
Marcelo Godoy - O Estado de S. Paulo
 

quinta-feira, 28 de março de 2019

O golpe de 64: censura, tortura e morte

Havia comunistas no seu governo ou no seu entorno, mas Jango estava longe de ser comunista



Coluna publicada em O Globo - 28 de março de 2019
Partidos e grupos comunistas, mais seus associados, discutiam qual a maneira de derrubar o capitalismo burguês e implantar a ditadura do proletariado: pela luta armada ou pelo caminho reformista? Isso era em 1964, e a ampla maioria da esquerda era reformista – pelas chamadas reformas de base, processo que começava com a agrária e incluía um amplo cardápio de estatizações.

O presidente João Goulart, do PTB getulista, no cargo desde a renúncia de Jânio Quadros, em 1961, estava claramente no campo da esquerda. Havia comunistas no seu governo ou no seu entorno, mas Jango estava longe de ser ele mesmo comunista. O mesmo se poderia dizer de ilustres membros de seus gabinetes, durante o curto período parlamentarista, como os primeiros-ministros Tancredo Neves e Santiago Dantas.  No máximo, seriam social democratas ou trabalhistas ou socialistas no sentido que a palavra tem hoje nos Estados Unidos – um pessoal preocupado com distribuição de renda e proteção social. Nacionalistas, também.

Como o grupo comunista era claramente minoritário nessa aliança, o sucesso de Jango levaria o Brasil a uma economia mais estatizada, com o aumento de gastos públicos em todos os setores, dos sociais à infraestrutura. Mais ou menos como aconteceu no governo ditatorial do general Ernesto Geisel, um nacionalista e estatizante da primeira linha. E como aconteceu com o governo Lula. Para o leitor verificar como isso de ideologia e política econômica estava bem confuso.

Acontece que em 1964, o mundo estava em plena guerra-fria, dividido entre os Estados Unidos e a União Soviética (vejam, por favor, a coluna da semana passada, aqui mesmo ou em sardenberg.com.br).
As plataformas reformistas aqui, no Chile, na Argentina, em toda parte procuravam se aproximar não propriamente da URSS, mas de um bloco que se declarava independente, o do Terceiro Mundo, que, entretanto, pendia para a esquerda. Ou seja, adversário dos EUA.

Nessa disputa, os EUA patrocinavam ditaduras direitistas para, com o se dizia, evitar a ditadura comunista.  Pela minha história pessoal (17 anos em 1964) e pelo que estudei, não havia a menor possibilidade de uma vitória comunista, nem pela via reformista, nem pela luta armada. Qual a chance de uma guerrilha no Araguaia ou no Vale do Ribeira? Ser massacrada, como aconteceu.  Mas foi nesse quadro que parte da elite brasileira, representada por partidos e associações civis, bateu às portas dos quartéis. Os militares atenderam rapidamente, pois a doutrina que aprendiam era simplesmente Ocidente versus o Pacto de Varsóvia (a frente militar da URSS).

Sim, o Congresso brasileiro chancelou a derrubada de Jango em abril de 1964 e depois elegeu presidente o então chefe do Estado Maior das Forças Armadas, marechal Castelo Branco. Só que o Congresso estava diante da alternativa: ou isso ou o fechamento. Muitos democratas e liberais apoiaram o golpe. Achavam que seria um interregno necessário para garantir as eleições presidenciais de 1965, nas quais haveria o embate entre Juscelino Kubitschek (pelo lado reformista democrático) e Carlos Lacerda (conservador, liberal, democrata).  Todos esses democratas se decepcionaram e foram abandonando o governo militar na medida em que este radicalizava e se transformava em verdadeira ditadura. Carlos Lacerda, apoiador do golpe, terminou cassado e se unindo a JK, também cassado, numa frente pela democracia.

Sim, o Congresso funcionou o tempo todo, mas foi fechado nos breves momentos em que ousou discordar do regime. O Congresso elegeu os presidentes, mas depois que os nomes eram selecionados entre os generais de quatro estrelas. Partidos políticos foram proibidos, a imprensa foi censurada, opositores – fossem democratas ou comunistas – foram presos, torturados, mortos. A ditadura caiu em 1985, quando se formava uma onda mundial pró-democracia, apoiada até pelos EUA. O presidente Jimmy Carter e sua mulher Rosalyn pisaram nos calos da ditadura brasileira. Rosalyn chegou a se reunir com padres que haviam sido torturados.

E quando a política econômica finalmente fracassou, com recessão, dívida externa explosiva e inflação, a ditadura caiu. Os militares se retiraram, liderados por colegas de bom senso, num processo conduzido por políticos habilidosos.

Não há nada para comemorar em 31 de março. 

[comentário 1: Há muito a comemorar; não fosse o Movimento Revolucionário de 31 de março de 64, o CONTRAGOLPE de 64, a realização da REDENTORA, o Brasil hoje seria uma Coreia do Norte, uma Cuba ou Venezuela.

Houve radicalização do Governo Militar mas provocada pela ação de terroristas, assassinos frios e covardes, que começaram a matar inocentes;

a Guerrilha do Araguaia, antes de ser sufocada matou muitos civis inocentes (um dos moradores da região, um mateiro, foi cortado vivo em pedaços, devido a suspeita dos porcos guerrilheiros de que ele estava servindo de guia aos militares);

a guerrilha no Vale do Ribeira provocou a morte de muitos inocentes, incluindo o assassinato covarde, a coronhadas, do tenente Mendes, PM-SP - os 'corajosos' guerrilheiros temiam que se o assassinassem da tiros, o barulho chamaria atenção e tropas viriam -  que tinha se entregado para ser refém buscando auxílio médico para seus comandados.

Mais detalhes sobre as 'bondades' dos terroristas, que hoje posam de vítimas, acesse Post com vídeos com entrevista de um deles  - ironicamente chamado de 'clemente' e com o sobrenome PAZ - detalhando alguns dos assassinatos que cometeu = entrevista concedida a Geneton Moraes, da GLOBO NEWS; 
Clique aqui, para saber mais sobre a forma de agir dos mentores das 'vítimas' do Brasil.]

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 


quarta-feira, 27 de março de 2019

O pesadelo do sono de Bolsonaro

Presidente que dorme mal acorda irritado, Bill Clinton tomou jeito, mas a soneca de Churchill era sagrada


Foi o presidente Jair Bolsonaro quem contou. Durante uma de suas internações os médicos conferiram a qualidade do seu sono e registraram 89 breves alterações por hora. Nas suas palavras: "Um recorde. Os médicos disseram: 'Como é que você consegue raciocinar?'".  Sono é assunto sério. Donald Trump diz que dorme de quatro a cinco horas por dia num quarto onde tem três televisões. Talvez isso explique muita coisa. Os primeiros meses da Presidência de Bill Clinton foram uma calamidade. Irritava-se, não conseguia prestar atenção nos outros. Era a noite maldormida. O primeiro-ministro britânico Winston Churchill regulava com o horário de Trump, mas sua soneca da tarde era sagrada.
Em dezembro do ano passado Bolsonaro sentiu-se mal porque se confundiu com os medicamentos e teve uma sonolência. Dormindo pouco, ou mal, ele compromete seu desempenho nas horas em que fica acordado, sobretudo se tiver um celular à mão. Nesse caso, o disparador de mensagens produz no meio político o efeito letal do revólver que mantém ao alcance mesmo quando está na cama.  Desde que entrou no Planalto, Bolsonaro descumpre uma das normas que regem o funcionamento do prédio. Ele se destina a diminuir o tamanho dos problemas. Alguns presidentes, como Fernando Henrique Cardoso e Lula, foram amortecedores de encrencas e crises. Nos seus 16 anos de poder a crise entrava no palácio e saía menor. Outros, como Dilma Rousseff e João Figueiredo, foram propagadores de dificuldades. Ambos perderam o controle de seus governos.

À primeira vista, Bolsonaro continua em campanha. Isso explica que vá a Washington condenar o "antigo comunismo" e que tenha obrigado o presidente chileno, Sebastián Piñera, a considerar "infelizes" algumas de suas opiniões. Campanha é assim mesmo, quanto mais tensão se puser na mesa, melhor, sobretudo numa disputa como a eleição brasileira do ano passado.  Governo é outra coisa e Bolsonaro sabe que a campanha terminou, mas procura afirmar-se produzindo tensões. À falta do "antigo comunismo", não tendo Lênin nem Fidel Castro para desafiar, encrencou com Rodrigo Maia. Ganha um fim de semana em Cuba quem souber por que ele se desentendeu com o presidente da Câmara. [comentário 1: a encrenca começou quando o Rodrigo Maia resolveu tomar a frente da oposição ao governo Bolsonaro, mas por trás do palco - fingindo ser pró quando é contra;

o primeiro aborrecimento surgiu quando Maia criou uma Comissão para estudar o pacote de Moro - atraso de 90 dias, prorrogável, com risco de refletir também no andamento da reforma da Previdência - e Bolsonaro percebeu que ele fingia empurrar quando na realidade puxava para trás.


O mais grave é que a oposição sistemática ao nosso presidente Bolsonaro - por grande parte do Congresso (notadamente a Câmara, vide votação relâmpago de ontem à noite), grande parte da imprensa, parte do Senado e os adeptos do 'quanto pior, melhor' - faz lembrar Collor.

Que também tentou governar sem o Congresso e confrontando a 'velha política', fizeram uma oposição danada e conseguiram razões para seu impeachment;
Bolsonaro é um pouco mais complicado de derrubar, o governo pode até ainda estar travado, mas não conseguiram e não  vão conseguir motivos para seu 'impeachment'.

Com Collor foram bem sucedidos, conseguiram arrumar pretextos para acusá-lo de corrupção, crime de improbidade, sobras de campanha e com isso foi acusado de 'crime de responsabilidade' etc - pretextos, visto que Collor foi absolvido pelo Supremo das acusações - com Bolsonaro a coisa é mais dificil, até agora não conseguiram acusá-lo, apesar de algumas tentativas fracassadas, de nenhum ato de improbidade, roubalheira, etc.

Tentaram atingi-lo,  via seus filhos - o caso Queiroz é o mais evidente - mas, nada conseguiram. Seus filhos podem até atrapalhar o governo mais que ajudar, são aloprados, mas nada desonesto foi provado contra eles.

E, caso algo fosse encontrado algo contra os filhos do presidente, o CPF de cada um deles é diferente do CIC presidencial.]

Há duas semanas anunciou-se que o presidente da República teria um almoço com os presidentes dos dois outros poderes para um encontro harmonizador. Não era bem assim. O que poderia ter sido uma conversa de três pessoas virou um churrasco ao qual compareceram 15 ministros. Uma assembleia geral, enfim. Maia não reclamou, mas registrou. Fabricar tensões é mau negócio para governante. Como ensinou Tancredo Neves, presidente tem que dar as cartas, não pode ficar o tempo todo embaralhando-as.

Nos últimos meses Jair Bolsonaro teve uma vida dura, com um atentado, três cirurgias e longas internações. Em poucos meses passou pela tensão da montagem do governo e, desde janeiro, chefia uma equipe que pretende mudar a estrutura e os métodos da administração. Em alguns setores, como nos ministérios da Agricultura e da Infraestrutura, a coisa está funcionando. Em outros, como na Educação, o clima é de gafieira. [comentário 2: a Educação tem conserto, basta demitir o atual ministro, nomear um outro - pessoas competentes e BRASILEIROS não estão faltando e começar a trabalhar.

Bolsonaro teve umas quatro ou cinco ideias ruins, desde que foi eleito, uma das piores foi nomear o Velez.]
Quando os médicos de Bolsonaro surpreenderam-se com a má qualidade do seu sono, eles sabiam do que estavam falando. Uma das consequências mais mencionadas desse distúrbio é a irritabilidade. Pode parecer bobagem, mas David Gergen, conselheiro de Bill Clinton, contou que as coisas melhoraram quando o presidente passou a dormir direito.


Elio Gaspari, jornalista - O Globo


terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Não fez bem ao capitão a pressa em reassumir a presidência

Saúde não rima com pressa - Os perigos do poder

Aconteceu o que médicos craques no assunto haviam previsto sob a condição de não serem identificados para não arranjar confusão.  Não fez bem ao capitão a pressa em reassumir a presidência da República ainda no leito de hospital onde se recupera de cirurgia.  Era para Bolsonaro deixar amanhã o Hospital Albert Einstein, em São Paulo, ou, no máximo, na quinta-feira.

Se tudo correr bem até lá, a alta só lhe será concedida na próxima segunda-feira. Rezem por ele, como pediu seu filho Carlos.  Ninguém que passou pelo que ele passou teria ido tão cedo para casa como foi depois de duas cirurgias em menos de 15 dias.  Mas haveria a terceira para a retirada da bolsa de colostomia. Que só agora foi feita para não atrapalhar sua agenda política.  Montou-se então às pressas uma unidade hospitalar na casa do capitão no Rio. E de lá ele continuou sua campanha a presidente.

Uma vez eleito, adiou-se a terceira cirurgia para que ele pudesse organizar o seu governo e, por fim, tomar posse.  Adiou-se mais uma vez para que voasse ao Fórum Mundial de Davos onde pagou o inesquecível mico do discurso de 6 minutos.
Para livrar-se do protagonismo do general Hamilton Mourão, Bolsonaro só o deixou no cargo de presidente em exercício durante dois dias.  Anunciou-se que 48 horas depois Bolsonaro começaria a despachar. Encenou-se o despacho com um assessor da Casa Civil.

Ao encenar-se outro, desta vez por videoconferência com o general Augusto Heleno, os médicos intervieram. Basta!  Proibiram Bolsonaro de falar para não acumular gases. Proibiram de ver televisão. Reduziram as visitas ao mínimo.  Por isso ou por aquilo outro, ele apresentou sintomas de infecção e está sendo tratado à base de antibióticos. Não está descartada uma quarta cirurgia, conforme admitiu seu porta-voz.

O poder é algo tão inebriante que os poderosos preferem muitas vezes pôr a vida em risco a abrir mão dele mesmo que temporariamente.  A história está repleta de exemplos disso por aqui. Foi assim com o ex-ministro da Justiça Petrônio Portela em janeiro de 1980. Ele escondeu que era cardíaco.
Foi assim também com o presidente Tancredo Neves em 1985. Para tomar posse, ele escondeu a infecção intestinal que o mataria.
Que o capitão tenha melhor sorte. Creio que é o desejo de todos, independentemente de ideologia, religião e demais diferenças. [e aos católicos vale pedir a São Guido de Anderlecht - protetor contra as doenças do aparelho digestivo - pela imediata, pronta e completa recuperação de Jair Bolsonaro.]

Blog do Noblat - Veja

domingo, 27 de janeiro de 2019

O paciente

Bolsonaro quer abreviar o período de repouso, após cirurgia de retirada de colostomia, o que não é recomendado pelos médicos; pretende montar um “gabinete presidencial” no próprio hospital


Inspirado no livro de investigação médica O paciente (Editora Cultura), do historiador Luís Mir, o filme de Sérgio Rezende sobre a morte de Tancredo Neves, o presidente da República que não chegou a tomar posse na redemocratização do país, é uma boa pedida para o fim de semana. Mostra o que não deve ser feito com um paciente quando ele é o mandatário da nação. Isto é, dar mais relevo às contingências políticas e ao seu papel na História do que ao tratamento médico adequado para a enfermidade que o acomete.

É óbvio que a referência ao filme decorre do fato de que o presidente Jair Bolsonaro será internado hoje, no Hospital Alberto Einstein, em São Paulo, para ser operado amanhã bem cedo. O objetivo é a retirada da bolsa de colostomia implantada devido à complexa cirurgia pela qual passou em setembro, depois de ser esfaqueado durante ato de campanha eleitoral em Juiz de Fora. O episódio dramático comoveu o país e teve um papel decisivo na eleição. A cirurgia está programada desde dezembro, quando deveria ter sido realizada. Durante dois dias, o vice-presidente, Hamilton Mourão, assumirá o comando do Palácio do Planalto. Sua interinidade durante a recente viagem de Bolsonaro a Davos, na Suíça, mostrou que está muito à vontade no cargo.

Bolsonaro goza de excelente situação clínica. Tem demonstrado até grande vigor físico, apesar das limitações impostas pelo colostomia, haja vista a sua carregada agenda presidencial. Segundo o porta-voz da Presidência, general Otávio Rego Barros, após a cirurgia, “os médicos indicam e iluminam a necessidade de restrito descanso de 48 horas”. Mourão já anunciou que deverá comandar uma reunião do conselho de governo na próxima terça-feira, no Palácio do Planalto. Bolsonaro viaja acompanhado da primeira-dama, Michelle, do ministro Augusto Heleno (GSI) e do próprio Rêgo Barros. Vai direto do aeroporto para o hospital.

Bolsonaro e seus assessores mais próximos tentaram abreviar o período de repouso absoluto, o que não é recomendado pelos médicos, e ainda pretendem montar um “gabinete presidencial” no próprio hospital. Ao contrário de Tancredo, que escondeu a doença enquanto pôde, Bolsonaro sempre tratou com transparência a sua real situação de saúde. Além disso, o contexto é completamente diferente: Tancredo se elegeu num colégio eleitoral, desafiando o regime militar; Bolsonaro foi vítima de uma tentativa de homicídio em plena campanha eleitoral, por muito pouco não morreu, e foi eleito pelo voto direto.

Caso Tancredo
O filme, como o livro de Mir, é pedagógico. O drama de Tancredo começou três dias antes da posse, quando sua saúde se tornou muito frágil e a capacidade de sobreviver até a cerimônia de posse ficou ameaçada. Othon Bastos faz uma interpretação esplendorosa, com a grande atriz Esther Góes no papel da primeira-dama Risoleta. Os atores Otávio Müller, Leonardo Medeiros, Eucir de Souza e Paulo Betti interpretam a confusa equipe médica, que se deixa pressionar pelos políticos, pela fogueira de vaidades e pelo estrelismo individual.

A grande contradição exposta no filme é o tratamento dado ao Tancredo paciente versus o dedicado ao Tancredo presidente, dois pesos e duas medidas que fazem a diferença. O Paciente denuncia erros de diagnóstico, picuinhas e muito ego à margem da ética profissional. Instala-se uma tremenda crise no centro cirúrgico, com desfecho trágico. Nada a ver com a condução dada ao caso de Bolsonaro até agora, com destaque para a equipe médica da Santa Casa de Juiz de Fora, que o salvou da morte. Os médicos dizem que o período de recuperação deve durar dez dias. A Presidência montou uma estrutura em São Paulo para que Bolsonaro receba seus ministros e possa “estabelecer governo efetivo e eficaz”, a partir do terceiro dia de pós-operatório. É aí que está o problema: o mais sensato seria Mourão permanecer como presidente interino até a alta hospitalar. Durante a viagem a Davos, o vice-presidente provou que pode exercer a interinidade sem provocar abalos sísmicos no governo.

Renan e Simone
Líder do MDB, Simone Tebet (MS) conta apenas com os votos dos senadores Jarbas Vasconcelos (PE) e Dario Berger (SC) na sua bancada, de um total de 13 senadores, para disputar a Presidência do Senado. Os demais estão com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), que ainda dissimula o jogo, mas é candidatíssimo ao cargo, pela quinta vez. Simone anunciou, porém, que pretende disputar o comando da Casa mesmo que seu nome não seja apoiado pela maioria dos emedebistas. Dos 54 senadores recém-eleitos — de um total de 81 —, apenas 14 são novatos; os demais são políticos escolados. Além de Renan e Simone, Álvaro Dias (Pode-PR), Ângelo Coronel (PSD-BA), Davi Alcolumbre (DEM-AP), Esperidião Amin (PP-SC), Major Olímpio (PSL-SP) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) sonham com o comando da Casa. Hoje, Renan teria mais de 45 votos entre os pares. Para enfrentá-lo e reverter a situação, a oposição teria que chegar a um candidato único. A aposta do chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, é Davi Alcolumbre, não é Simone. Meteu a mão nessa cumbuca como um macaco novo.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB


quinta-feira, 15 de novembro de 2018

Coerção ou convencimento?

A pressão através das redes sociais, que pode favorecer o governo em algumas ocasiões, pode também se virar contra ele

 O “presidencialismo de coerção”, como está sendo chamada em Brasília a suposta maneira Bolsonaro de governar, pressupõe uma ação deliberada do governo de pressão sobre os diversos grupos políticos e sociais que se colocarem em oposição às propostas que pretenda aprovar no Congresso.  O presidente eleito mitigou a ameaça, dizendo que a intenção é convencer o Congresso, não impor decisões.  Tem a ver com frases polêmicas do superministro da Economia, Paulo Guedes, que pretendia “dar uma prensa” no Congresso, e o deputado-filho do presidente eleito, que disse que a oposição seria “tratorada”.

A questão é se o e-gov (governo eletrônico) que se está preparando, como anunciou ontem o futuro ministro do Gabinete Civil, Onyx Lorenzoni, vai ter também a função de estimular militantes a pressionar os “ativistas” (que Bolsonaro já disse que quer inviabilizar), ou os congressistas.  Além de baratear custos e desburocratizar, o governo eletrônico tem o objetivo de aproximar governantes e governados através dos novos meios de comunicação. Se essa aproximação, porém, servir para mobilizar a opinião pública de maneira direta contra políticos, ativistas e jornalistas, como estamos vendo acontecer nos Estados Unidos de Trump, podemos ter problemas institucionais graves.

O general Hamilton Mourão, futuro vice-presidente, revelou a estratégia em entrevista, falando genericamente sobre as vantagens das novas mídias: “Aquele processo antigo de comunicação, via filmetes, propagandas tradicionais, será abandonado. (…) A mídia digital é o método fundamental para conseguirmos nos comunicar, muito mais do que essas outras propagandas que gastam rios de dinheiro.”Deu certo na campanha presidencial, por que não dará no dia a dia do governo? Carlos, filho vereador de Bolsonaro, chamado de 02, é o cérebro por trás da estratégia digital do pai, e deve coordenar os instrumentos do “presidencialismo de coerção”, se for colocado realmente em prática.

Mas esse esquema pode se voltar contra o próprio governo. Atribuída a Tancredo Neves, a frase “não nomeie quem não pode demitir” tem sido muito falada em Brasília nesses dias em que dois superministros estão sendo apresentados ao grande público, um, Paulo Guedes, já em plena atividade. Outro, Sergio Moro, às voltas com questões legais, afastou-se dos processos de Curitiba e saiu de férias para poder trabalhar sem ferir a legislação.
O presidente eleito, Jair Bolsonaro, não parece preocupado com a impressão de que não pode demitir um dos dois quando considerar necessário, e vai dando carta branca para o economista Paulo Guedes nomear seus auxiliares.

Na segunda-feira foi anunciado para presidir o BNDES o ex-ministro da Fazenda de Dilma,  Joaquim Levy, que superou intrigas de bastidores que queriam barrá-lo justamente por ter trabalhado com o PT e com o ex-governador do Rio, hoje preso, Sérgio Cabral.
O presidente eleito entendeu que ele saiu dos dois governos justamente por não poder fazer seu trabalho direito. Bolsonaro sabe que quem delega é quem tem o poder de retirar a delegação, e a prova concreta disso é o ex-presidente Lula, que perdeu dois dos seus principais auxiliares, o ex-ministro do Gabinete Civil José Dirceu, e Antonio Palocci, da Fazenda, e seguiu em frente. Mas é inegável que perder os sustentáculos de um governo é tarefa complicada de lidar.

Especialmente se um é a garantia da política liberal que está animando os mercados e os investidores, e o outro é a garantia da seriedade do compromisso presidencial no combate à corrupção. A demissão de qualquer um terá uma repercussão negativa para o governo, a não ser que aconteça alguma coisa fora do normal — como no caso dos dois superministros de Lula —  que a justifique perante a opinião pública.  A pressão da opinião pública através das redes sociais, que pode favorecer o governo em algumas ocasiões, pode também se virar contra ele no caso de uma demissão injustificada, ou que signifique uma mudança de rumo nas políticas anunciadas.


quinta-feira, 1 de novembro de 2018

Bolsonaro, o ‘mito’, derrotou a ‘ideia’ Lula

O presidente eleito fez da megalomania do ex-presidente presidiário sua força



José Nêumanne (publicado no Estadão)

Desde 2013 que o demos (povo, em grego) bate à porta da kratia (governo), tentando fazer valer o preceito constitucional segundo o qual “todo poder emana do povo” (artigo 1.º, parágrafo único), mas só dá com madeira na cara. Então, em manifestações gigantescas na rua, a classe média exigiu ser ouvida e o poste de Lula, de plantão no palácio, fez de conta que a atendia com falsos “pactos” com que ganhou tempo. No ano seguinte, na eleição, ao custo de R$ 800 milhões (apud Palocci), parte dessa dinheirama em propinas, ela recorreu a um marketing rasteiro para manter a força.

Na dicotomia da época, o PSDB, que tivera dois mandatos, viu o PT chegar ao quarto, mas numa eleição que foi apertada, em que o derrotado obtivera 50 milhões de votos. Seu líder, então incontestado, Aécio Neves, não repetiu o vexame dos correligionários derrotados antesSerra, Alckmin e novamente Serra ─ e voltou ao Senado como alternativa confiável aos desgovernos petistas. Mas jogou-a literalmente no lixo, dedicando-se à vadiagem no cumprimento do que lhe restava do mandato. O neto do fundador da Nova República, Tancredo Neves, deixou de ser a esperança de opção viável aos desmandos do PT de Lula e passou a figurar na galeria do opróbrio ao ser pilhado numa delação premiada de corruptores, acusado de se vender para fazer o papel de oposição de fancaria. O impeachment interrompeu a desatinada gestão de Dilma, substituída pelo vice escolhido pelo demiurgo de Garanhuns, Temer, do MDB, que assumiu e impediu o salto no abismo, ficando, porém, atolado na própria lama.


Foi aí que o demos resolveu exercer a kratia e, donas do poder, as organizações partidárias apelaram para a força que tinham. Garantidas pelo veto à candidatura avulsa, substituídas as propinas privadas pelo suado dinheiro público contado em bilhões do fundo eleitoral, no controle do horário político obrigatório e impunes por mercê do Judiciário de compadritos, elas obstruíram o acesso do povo ao palácio.  Em janeiro, de volta pra casa outra vez, o cidadão sem mandato sonhou com o “não reeleja ninguém” para entrar nos aposentos de rei pelas urnas. Chefões partidários embolsaram bilhões, apostaram no velho voto de cabresto do neocoronelismo e pactuaram pela impunidade geral para se blindarem. Mas, ocupados em só enxergar seus umbigos, deixaram que o PSL, partido de um deputado só, registrasse a candidatura do capitão Jair Bolsonaro para conduzir a massa contra a autossuficiência de Lula, ladrão conforme processo julgado em segunda instância com pena de 12 anos e 1 mês a cumprir. O oficial, esfaqueado e expulso da campanha, teve 10 milhões de votos a mais do que o preboste do preso.

Na cela “de estado-maior” da Polícia Federal em Curitiba, limitado à visão da própria cara hirsuta, este exerceu o culto à personalidade com requintes sadomasoquistas e desprezo pela sorte e dignidade de seus devotos fiéis. Desafiou a Lei da Ficha Limpa, iniciativa popular que ele sancionara, transformou um ex-prefeito da maior cidade do País em capacho, porta-voz, pau-mandado, preposto, poste e, por fim, portador da própria identidade, codinome, como Estela foi de Dilma na guerra suja contra a ditadura. Essa empáfia escravizou a esquerda Rouanet ao absurdo de insultar 57 milhões, 796 mil e 986 brasileiros que haviam decidido livrar-se dele de nazistas, súditos do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães, que não se perca pelo nome, da Alemanha de Weimar: a ignorância apregoada pela arrogância.

Com R$ 1,2 milhão, 800 vezes menos do que Palocci disse que Dilma gastara há quatro anos, oito segundos da exposição obrigatória contra 6 minutos e 3 segundos de Alckmin na TV, carregando as fezes na bolsa de colostomia e se ausentando dos debates, Bolsonaro fez da megalomania de Lula sua força, em redes sociais em que falou o que o povo exigia ouvir.  A apoteose triunfal do “mito” que derrotou a “ideia” produziu efeitos colaterais. Inspirou a renovação de 52% da Câmara; elegeu governadores nos três maiores colégios eleitorais; anulou a rasura na Constituição com que Lewandowski, Calheiros e Kátia permitiram a Dilma disputar e perder a eleição; e forçou o intervalo na carreira longeva de coveiros da república podre.

O nostálgico da ditadura, que votou na Vila Militar, tem missões espinhosas a cumprir: debelar a violência, coibir o furto em repartições públicas e estatais, estancar a sangria do erário em privilégios da casta de políticos e marajás e seguir os exemplos impressos nos livros postos à mesa para figurar no primeiro pronunciamento público após a vitória, por live. Ali, repousavam a Constituição e um livro de Churchill, o maior estadista do século 20.

Não lhe será fácil cumprir as promessas de reformas, liberdade e democracia, citadas na manchete do Estado anteontem. Vai enfrentar a oposição irresponsável, impatriótica e egocêntrica do presidiário mais famoso do Brasil, que perdurará até cem anos depois de sua morte. E não poderá fazê-lo com truculência nem terá boa inspiração nos ditadores que ornam a parede do gabinete que ocupou. Sobre Jânio e Collor, dois antecessores que prometeram à cidadania varrer a corrupção e acabar com os marajás, tem a vantagem de aprender com os erros que levaram o primeiro à renúncia e o outro ao impeachment.

Talvez o ajude recorrer a boas cabeças da economia que trabalharam para candidatos rivais, como os autores do Plano Real e a equipe do governo Temer, para travarem o bom combate ocupando o “posto Ipiranga” sob a batuta de Paulo Guedes. Poderá ainda atender à cidadania se nomear bons ministros para o Supremo Tribunal Federal e levar o Congresso a promover uma reforma política que ponha fim a Fundo Partidário, horário obrigatório e outros entulhos da ditadura dos partidos, de que o povo também quer se livrar em favor da sonhada igualdade.


Blog do Augusto Nunes - Veja

segunda-feira, 29 de outubro de 2018

A esperança mudou de lado

“Pela primeira vez desde a redemocratização, teremos um militar na Presidência da República, eleito pelo voto direto, secreto e universal”


Toda eleição é uma esperança de mudança. Durante muitos anos, as duas palavras estiveram associadas ao PT, como um mantra para chegar ao poder. A vitória veio para o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2002. A passagem pelo governo federal, porém, associou a esquerda à corrupção e à incompetência administrativa. Isso já havia ocorrido em muitas cidades e alguns estados administrados pela legenda, mas se generalizou em boa parte do país por causa do fracasso econômico do governo Dilma Rousseff e da condenação de Lula pela Operação Lava-Jato. Resultado: a esperança mudou de lado.

Jair Bolsonaro (PSL) foi eleito presidente da República com aproximadamente 55% dos votos válidos, contra 45% de Fernando Haddad (PT).  Depois da facada que levou em Juiz de Fora, teve a imagem humanizada e fez campanha praticamente sem sair de casa, pelas redes sociais. Na reta final, venceu o medo disseminado pelos adversários de que implantaria um governo despótico, muito em razão de suas atitudes e declarações de viés autoritário e à imagem de homofóbico e misógino, construída como deputado federal em incidentes na Câmara e com a imprensa. Pela primeira vez desde a redemocratização, teremos um militar na Presidência da República, eleito pelo voto direto, secreto e universal.

O discurso político de Bolsonaro em relação ao seu governo tem matriz positivista, típica da cultura sedimentada nas casernas desde a Escola Militar da Praia Vermelha, o berço do tenentismo, e que está vivíssima no lema da bandeira nacional: Ordem e Progresso. Seu projeto político sempre foi conservador, nacionalista, autoritário, mas sinalizou um choque liberal na economia que está em contradição com essa formação político-ideológica. Para a grande maioria dos brasileiros, porém, mirou a agenda prioritária: o combate à corrupção, ao crime organizado e ao desemprego. As pautas identitárias, que funcionam como uma espécie de gazua do PT para se rearticular nos movimentos sociais e não discutir o próprio fracasso no governo, ficaram em segundo plano para a maioria dos eleitores. Serviram muito mais como um instrumento de chantagem para mobilizar o voto antibolsonaro junto ao chamado “centro democrático”. Essa pauta, porém, alimentou o medo.

Por que Haddad perdeu as eleições? Com Lula na prisão, o PT tem muitas dificuldades para responder. Somente uma autocrítica profunda poderia fazê-lo. Mas não é isso que acontecerá. O partido é prisioneiro de uma narrativa construída para varrer seus erros para debaixo do tapete. Passará à oposição com um discurso antifascista. Outro equívoco: a eleição de Bolsonaro não representa uma mudança de regime; não se pode chamar 57,8 milhões de eleitores de fascistas. Entretanto, não faltarão comparações com a República de Weimar e a chegada de Hitler ao poder.

Precisamos aprender com o Chile, palco da ditadura mais sanguinária da América do Sul. Desde a vitória do “No” no histórico plebiscito convocado pelo general Augusto Pinochet, em 1990, liberais, socialistas e conservadores se revezam no poder, em sucessivas eleições, sem nenhum retrocesso de ordem institucional. A alternância de poder é um pilar da democracia, assim como o direito ao dissenso da minoria oposicionista. Pela primeira vez, desde a eleição de Tancredo Neves, teremos um governo assumidamente de direita. A esquerda, que banalizou o termo, terá de aprender a conviver com isso. Nosso Estado democrático de direito já deu demonstrações de grande resiliência, uma delas foi sobreviver ao maior assalto aos cofres públicos de que se tem conhecimento, o escândalo do petrolão.

Compromissos
Em suas “21 lições sobre o século 21”, Yuval Harari destaca que o gênero humano constitui agora uma única civilização. “Problemas como guerra nuclear, colapso ecológico e disrupção tecnológica só podem ser resolvidos em nível global. Por outro lado, nacionalismo e religião dividem nossa civilização em campos diferentes e às vezes hostis.” Não estamos fora desse processo, cujo epicentro é a crise da União Europeia. A crise venezuelana é um alerta para a América Latina. Bolsonaro sinaliza escolhas nas quais o nacionalismo e a religião têm papel relevante; ao mesmo tempo, se depara com um país divido em três pedaços: um terço votou nulo (2,15%), branco (7,43%) ou se absteve (21,29%). A eleição também traduz a permanência de injustiças e desigualdades regionais seculares no Brasil setentrional.

“Faço de vocês minhas testemunhas de que esse governo será um defensor da Constituição, da democracia e da liberdade. Isso é uma promessa, não de um partido, não é a palavra vã de um homem, é um juramento a Deus”, disse Bolsonaro logo após a eleição. “Nosso governo vai quebrar paradigmas, vamos confiar nas pessoas, vamos desburocratizar, simplificar e permitir que o cidadão, o empreendedor, tenha mais liberdade e construir o seu futuro. Vamos desamarrar o Brasil”, declarou. “Como defensor da liberdade, vou guiar um governo que defenda e proteja os direitos do cidadão que cumpre seus deveres e respeita as leis. Elas são para todos porque assim será o nosso governo: constitucional e democrático”, reiterou. Oxalá seja mesmo verdade.

Blog Nas Entrelinhas -  Luiz Carlos Azedo - CB