Bolsonaro quer abreviar o período de repouso, após cirurgia de
retirada de colostomia, o que não é recomendado pelos médicos; pretende
montar um “gabinete presidencial” no próprio hospital
Inspirado no livro de investigação médica O paciente (Editora
Cultura), do historiador Luís Mir, o filme de Sérgio Rezende sobre a
morte de Tancredo Neves, o presidente da República que não chegou a
tomar posse na redemocratização do país, é uma boa pedida para o fim de
semana.
Mostra o que não deve ser feito com um paciente quando ele é o
mandatário da nação. Isto é, dar mais relevo às contingências políticas e
ao seu papel na História do que ao tratamento médico adequado para a
enfermidade que o acomete.
É óbvio que a referência ao filme decorre do fato de que o presidente
Jair Bolsonaro será internado hoje, no Hospital Alberto Einstein, em
São Paulo, para ser operado amanhã bem cedo.
O objetivo é a retirada da
bolsa de colostomia implantada devido à complexa cirurgia pela qual
passou em setembro, depois de ser esfaqueado durante ato de campanha
eleitoral em Juiz de Fora. O episódio dramático comoveu o país e teve um
papel decisivo na eleição. A cirurgia está programada desde dezembro,
quando deveria ter sido realizada. Durante dois dias,
o vice-presidente,
Hamilton Mourão, assumirá o comando do Palácio do Planalto. Sua
interinidade durante a recente viagem de Bolsonaro a
Davos, na Suíça,
mostrou que está muito à vontade no cargo.
Bolsonaro goza de excelente situação clínica. Tem demonstrado até
grande vigor físico, apesar das limitações impostas pelo colostomia,
haja vista a sua carregada agenda presidencial. Segundo o porta-voz da
Presidência, general Otávio Rego Barros, após a cirurgia,
“os médicos
indicam e iluminam a necessidade de restrito descanso de 48 horas”.
Mourão já anunciou que deverá comandar uma reunião do conselho de
governo na próxima terça-feira, no Palácio do Planalto. Bolsonaro viaja
acompanhado da primeira-dama, Michelle, do ministro Augusto Heleno (GSI)
e do próprio Rêgo Barros. Vai direto do aeroporto para o hospital.
Bolsonaro e seus assessores mais próximos tentaram abreviar o período
de repouso absoluto, o que não é recomendado pelos médicos, e ainda
pretendem montar um
“gabinete presidencial” no próprio hospital. Ao
contrário de Tancredo, que escondeu a doença enquanto pôde
, Bolsonaro
sempre tratou com transparência a sua real situação de saúde. Além
disso, o contexto é completamente diferente: Tancredo se elegeu num
colégio eleitoral, desafiando o regime militar; Bolsonaro foi vítima de
uma tentativa de homicídio em plena campanha eleitoral, por muito pouco
não morreu, e foi eleito pelo voto direto.
Caso Tancredo
O filme, como o livro de Mir, é pedagógico. O drama de Tancredo começou
três dias antes da posse, quando sua saúde se tornou muito frágil e a
capacidade de sobreviver até a cerimônia de posse ficou ameaçada. Othon
Bastos faz uma interpretação esplendorosa, com a grande atriz Esther
Góes no papel da primeira-dama Risoleta. Os atores Otávio Müller,
Leonardo Medeiros, Eucir de Souza e Paulo Betti interpretam a confusa
equipe médica, que se deixa pressionar pelos políticos, pela fogueira de
vaidades e pelo estrelismo individual.
A grande contradição exposta no filme é o tratamento dado ao Tancredo
paciente versus o dedicado ao Tancredo presidente, dois pesos e duas
medidas que fazem a diferença. O Paciente denuncia erros de diagnóstico,
picuinhas e muito ego à margem da ética profissional. Instala-se uma
tremenda crise no centro cirúrgico, com desfecho trágico.
Nada a ver com
a condução dada ao caso de Bolsonaro até agora, com destaque para a
equipe médica da Santa Casa de Juiz de Fora, que o salvou da morte. Os
médicos dizem que o período de recuperação deve durar dez dias. A
Presidência montou uma estrutura em São Paulo para que Bolsonaro receba
seus ministros e possa
“estabelecer governo efetivo e eficaz”, a partir
do terceiro dia de pós-operatório.
É aí que está o problema: o mais
sensato seria Mourão permanecer como presidente interino até a alta
hospitalar. Durante a viagem a Davos, o vice-presidente provou que pode
exercer a interinidade sem provocar abalos sísmicos no governo.
Renan e Simone
Líder do MDB, Simone Tebet (MS) conta apenas com os votos dos senadores
Jarbas Vasconcelos (PE) e Dario Berger (SC) na sua bancada, de um total
de 13 senadores, para disputar a Presidência do Senado.
Os demais estão
com o senador Renan Calheiros (MDB-AL), que ainda dissimula o jogo, mas é
candidatíssimo ao cargo, pela quinta vez.
Simone anunciou, porém, que
pretende disputar o comando da Casa mesmo que seu nome não seja apoiado
pela maioria dos emedebistas. Dos 54 senadores recém-eleitos —
de um
total de 81 —, apenas 14 são novatos; os demais são políticos escolados.
Além de Renan e Simone, Álvaro Dias (Pode-PR), Ângelo Coronel (PSD-BA),
Davi Alcolumbre (DEM-AP), Esperidião Amin (PP-SC), Major Olímpio
(PSL-SP) e Tasso Jereissati (PSDB-CE) sonham com o comando da Casa.
Hoje, Renan teria mais de 45 votos entre os pares. Para enfrentá-lo e
reverter a situação, a oposição teria que chegar a um candidato único. A
aposta do chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, é Davi Alcolumbre, não é
Simone.
Meteu a mão nessa cumbuca como um macaco novo.