O
Palácio do Planalto distribuiu neste domingo um vídeo em defesa do golpe de 1964. A narrativa do material usa a mesma definição adotada pelo presidente
Jair Bolsonaro e alguns de seus ministros militares para classificar o fato histórico.
Para eles,
a derrubada de João Goulart do poder, que marcou o início do período de 21 anos de ditadura militar no
Brasil,
foi apenas um movimento para conter o avanço do comunismo no País. "O
Exército nos salvou. O Exército nos salvou. Não há como negar. E tudo
isso aconteceu num dia comum de hoje, um 31 de março. Não dá para mudar a
história", diz o apresentador do vídeo. Hoje, o golpe completa 55
anos. Segundo a
Comissão Nacional da [in]Verdade, 434 pessoas foram mortas
pela repressão militar ou desapareceram durante a ditadura
(1964-1985).
A
peça tem aproximadamente dois minutos, não traz a indicação de quem
seria seu autor e foi
distribuída por um número oficial de WhatsApp do Planalto, usado pela
Secretaria de Comunicação da Presidência para
o envio de mensagens de utilidade pública, notícias e serviços do
governo federal. Para receber os conteúdos, os jornalistas precisam ser
cadastrados no sistema.
A assessoria de imprensa do Planalto foi procurada e, como resposta,
disse que o Planalto não irá se pronunciar. A equipe também confirmou
que o canal usado para disparar o vídeo é mesmo oficial.
"Sobre o vídeo a
respeito do dia 31 de março, ele foi divulgado por meio de nosso canal
oficial do governo federal no WhatsApp. O Palácio do Planalto não irá se
pronunciar".
O mesmo vídeo foi compartilhado hoje mais cedo no Twitter pelo deputado federal e filho do presidente,
Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).
"Num dia como o de hoje o Brasil foi liberto. Obrigado militares de 64!
Duvida? Pergunte aos seus pais ou avós que viveram aquela época como
foi?", diz Eduardo
no post que anuncia o vídeo.
Um dos trechos do material afirma que
"era, sim, um tempo de medo e
ameaças, ameaças daquilo que os comunistas faziam onde era imposto sem
exceção, prendiam e matavam seus próprios compatriotas" e
"que havia,
sim, muito medo no ar, greve nas fábricas, insegurança em todos os
lugares". Diante disso, conta o apresentador
, o Exército foi
"conclamado" pelo povo e precisou agir. "Foi aí que, conclamado por
jornais, rádios, TVs e, principalmente, pelo povo na rua, povo de
verdade, pais, mães, igreja que o Brasil lembrou que possuía um Exército
Nacional e apelou a ele. Foi só aí que a escuridão, graças a Deus, foi
passando, passando, e fez-se a luz".
O apresentador convida as
pessoas a conhecer essa verdade buscando mais detalhes e depoimentos nos
jornais, revistas e filmes da época. Na parte final, o vídeo é
concluído sob o Hino Nacional, e um outro narrador, agora apenas com voz
e sem imagem, diz:
"O Exército não quer palmas nem homenagens. O
Exército apenas cumpriu o seu papel".
Celebrações
No último sábado, a
Justiça Federal cassou liminar que proibia o governo de promover os eventos alusivos ao golpe de 1964. A decisão foi da desembargadora de plantão no
Tribunal Regional Federal da
1ª região, Maria do Carmo Cardoso. Apesar de
"reconhecer a
sensibilidade do tema em análise", ela decidiu que a recomendação do
presidente Bolsonaro para comemorar a data se insere no âmbito do poder
administrador.
"Não visualizo, de outra parte, violação ao
princípio da legalidade, tampouco violação a direitos humanos, mormente
se considerado o fato de que houve manifestações similares nas unidades
militares nos anos anteriores, sem nenhum reflexo negativo na
coletividade", escreveu a magistrada.
A liminar
havia sido concedida na noite de sexta-feira,
29, pela juíza Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara da Justiça Federal em
Brasília, atendendo a um pedido da Defensoria Pública da União. A
Advocacia-Geral da União (AGU) recorreu ainda na sexta e, na manhã de sábado, saiu a sentença da desembargadora.
Antecipando-se à data, o
Exército realizou na semana passada no Comando Militar do Planalto, em
Brasília,
cerimônia para relembrar o 31 de março. Na solenidade, em que esteve
presente o comandante da Força, general Edson Leal Pujol, o episódio foi
tratado como
"movimento cívico-militar". Os oito comandos do Exército
também já realizaram semana passada cerimônias alusivas ao 31 de março.
Conforme revelou o jornal o
Estado, Bolsonaro orientou os quartéis a celebrarem a data histórica, que havia sido retirada do calendário de comemorações das
Forças Armadas desde 2011, no governo de
Dilma Rousseff. A determinação de Bolsonaro foi para que na data as unidades militares fizessem
"as comemorações devidas".
O Estado de S. Paulo