Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador cidadão. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador cidadão. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 30 de outubro de 2020

O jabutizeiro do SUS - Nas entrelinhas

Quando a pandemia do novo coronavírus passar, a medicina nunca mais será a mesma. As consultas por teleconferência, introduzidas em massa durante a pandemia, vieram para ficar

A Prefeitura de Vitória (ES) tem uma das melhores redes de atendimento básico à saúde do país, resultado de sucessivas administrações, mas, sobretudo, do avanço tecnológico promovido pelo atual prefeito, Luciano Rezende (Cidadania), que encerra o seu segundo mandato. Com as inovações, foi possível ampliar o atendimento em 30%, sem contratação de médicos ou construção de novos postos de saúde. Qualquer cidadão atendido na rede, inclusive nos dois pronto atendimentos (PAs) da cidade, recebe um torpedo no celular para dar uma nota de 0 a 10 de avaliação do atendimento. A nota média, em setembro, mesmo na pandemia da covid-19, foi 9,11. O ovo de Colombo surgiu depois de uma viagem de avião, quando o prefeito recebeu uma mensagem pedindo uma nota de avaliação do serviço da companhia aérea.

A revolução tecnológica começou pelo Pronto Atendimento de São Pedro, antiga região de palafitas, erradicadas nas administrações de Vitor Buaiz (PT) e Paulo Hartung (MDB). Na administração do tucano Luiz Paulo Velozzo Lucas, da qual Rezende foi secretário de Saúde e de Educação, esses serviços foram ampliados. Mas, foi preciso muita inovação tecnológica para que a gestão da saúde fosse focada 100% na ponta do atendimento ao público. Quando os torpedos começaram a ser disparados, houve muitos questionamentos, porque tudo influencia a avaliação, e não apenas o atendimento médico propriamente dito. O PA de São Pedro, por exemplo, foi o mais mal avaliado. Esse resultado levou a que os diretores dos dois melhores postos de saúde da cidade fossem transferidos para lá, onde a população mais pobre da cidade é atendida na emergência, 24 horas, todos os dias, inclusive domingos e feriados. A média da avaliação dos usuários, em setembro passado, foi de 8,66. Mesmo com a pandemia, a menor nota de avaliação do PA de São Pedro foi 7,29, em março.

A chave para o alto desempenho foi a sinergia entre as secretarias de Saúde e da Fazenda, que colocou o time da subsecretaria de Tecnologia de Informação para desenvolver soluções que melhorassem a gestão da Saúde, obrigada a fazer mais com menos, devido à queda de 25% da arrecadação da cidade, com o fim do Fundap (fundo de desenvolvimento extinto em 2002, que beneficiava o complexo exportador capixaba). Ao contrário de outros municípios, que estão na latitude dos poços da Bacia de Campos, Vitória se beneficia pouco dos royalties de petróleo destinados aos capixabas.

Medicina a distância
Para melhorar o atendimento à população, o acesso à informação, a organização e o controle das unidades de saúde, a Secretaria Municipal de Saúde (Semus) registra a fila de atendimento, a classificação de risco, os procedimentos da sala de medicação, com prescrição e checagem de forma eletrônica. Os sistemas informatizados permitem agilizar procedimentos administrativos, gerenciais, de atendimento e acesso à informação de pacientes. Além disso, o sistema gera o prontuário eletrônico com os dados do atendimento prestado ao paciente. Para que o atendimento seja mais rápido, basta o usuário apresentar um documento com foto e ele será encaminhado para a classificação de risco. Depois, aguarda o atendimento médico ou odontológico de acordo com a gravidade do caso. As consultas são automaticamente remarcadas em caso de não confirmação. O time de engenheiros e programadores da prefeitura, funcionários de carreira, acabou com as filas de atendimento e reduziu a 5% as faltas às consultas médicas, que representavam 30% do total.

Além da rede de postos de saúde e centros de referência, a prefeitura mantém atendimentos psicossocial para adultos e infanto-juvenil, de prevenção e tratamento de toxicômanos, atenção a idosos, gestantes e pediatria. São oferecidos serviços de cardiologia, dermatologia, endocrinologia, gastroenterologia, neurologia, obstetrícia (alto risco), oftalmologia, ortopedia, otorrinolaringologia, proctologia, psiquiatria, reumatologia, urologia, homeopatia, acupuntura e pequenas cirurgias, além de tratamento odontológico (radiologia, endodontia, periodontia e prótese dentária), e de diagnóstico de câncer de boca. Tudo gratuito. Além de equipes de médicos de família, agentes comunitários de saúde e orientadores de exercícios físicos.

E quando é que os jabutis subiram na árvore? Quando a pandemia do novo coronavírus passar, a medicina nunca mais será a mesma. As consultas por teleconferência, por exemplo, que foram introduzidas em massa na rede pública de Vitória durante a crise sanitária, vieram para ficar, assim como outras inovações tecnológicas introduzidas por lá. Acontece que grandes empresas de tecnologia já estão operando na área médica, aqui no Brasil, como a Afya, que oferece ensino especializado e treinamento a distância em larga escala (Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Piauí, Pará, Tocantins e Distrito Federal). Há grande interesse na gestão dos serviços do SUS. As soluções que a Prefeitura de Vitória oferece de graça às demais prefeituras do país, via Frente Nacional de Prefeitos, na ótica dos grupos de medicina privada, são um grande business inexplorado. Por isso, as unidades básicas de saúde inacabadas do governo federal são quatro mil jabutis. Falta descobrir quem armou o “jabutizeiro” do SUS, que é muito maior. Com certeza, não foi enchente, foi mão de gente. [FATO: até quando erra o presidente Bolsonaro acerta.
O delírio de privatizar o SUS já passou - aliás foi um péssimo pensamento em voz alta. 

Para mostrar que seria um desastre para os brasileiros basta considerar que um representante da medicina privada declarou em entrevista que a desistência da privatização foi um retrocesso - se eles são contra a desistência é sinal que privatizar seria um desastre privatizando o povão iria sofrer e muito com a falta do SUS. 

O delírio da privatização teve outro aspecto bom; jogou holofotes sobre o SUS permitindo mostrar ao Brasil e mesmo ao mundo,  sua eficiência e importância.
Mostrar a todos que o SUS agiu com presteza, eficiência, mesmo quando foi exigido além do limite.]

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


quinta-feira, 30 de julho de 2020

A liberdade e a Justiça - Eugênio Bucci

O Estado de S. Paulo

A indústria ilegal da desinformação é um fenômeno sobre o qual não há jurisprudência

A determinação do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), de bloquear páginas de bolsonaristas em redes sociais provocou um bom debate. Desta vez não se trata de uma daquelas batalhas estéreis entre claques que se ofendem e não se escutam. Estamos em meio a uma discussão que mobiliza conceitos sérios, com fundamento ético e legal, sobre os limites da Justiça e os alcances da liberdade de cada um. Há argumentos legítimos e inteligentes de um lado e de outro. A hora pede reflexão. Mais do que embarcar no Fla-Flu jurídico, devemo-nos dedicar a entender com calma o que está em jogo.

Comecemos pela pergunta incômoda: a autoridade judicial pode, no âmbito de um inquérito (no caso, o Inquérito 4.781, mais conhecido como o “inquérito das fake news”), [pedimos vênia ao articulista para usar a 'alcunha' = inquérito do "fim do mundo" - seja pelo que representa contra a democracia, seja pela forma 'esquisita' como qual foi instalado, seja pelo absurdo de um só personagem ser investigador, promotor, denunciador, julgador e, pasmem, instância revisora máxima - sem esquecer outros pontos que são brilhantemente apontados pelo autor da matéria.] impedir preventivamente a manifestação das pessoas investigadas? 
Pode o juiz impor a mordaça a um cidadão cujos atos ainda não foram julgados?

Os que respondem “sim” a essa pergunta argumentam que os trâmites da Justiça e das investigações policiais normalmente restringem direitos fundamentais. Nada de novo sob o sol, portanto. Na terça-feira, em webinar no site Poder 360, ninguém menos que o presidente do Supremo, Dias Toffoli, seguiu essa linha de raciocínio. Lembrando que até mesmo o direito de ir e vir pode ser suspenso pela autoridade judicial no curso de uma investigação (é o que acontece quando o suspeito vai para a cadeia, em regime de prisão preventiva, mesmo antes de seu suposto crime ter sido julgado pela Justiça), Toffoli sustentou a tese de que a supressão preventiva de páginas de pessoas investigadas nas redes sociais constitui um expediente análogo, igualmente aceitável e legítimo, além de legal.

O argumento, bem construído, soa ainda mais convincente quando observamos que aqueles que tiveram suas contas derrubadas nas redes não foram cassados em sua liberdade de expressão, pois seguem se manifestando com alta estridência em outros canais – apenas aquelas contas específicas, nas quais foram identificadas condutas e postagens suspeitas, foram bloqueadas. Além disso, o bloqueio das contas desses bolsonaristas seria indispensável para o bom curso das investigações. Por tudo isso, o argumento procede. Há, porém, outro ponto de vista. Quando perguntados se um juiz teria poderes para impor a mordaça a um cidadão cujos atos ainda não tivessem sido julgados, não são poucos os que respondem “não”. Nesse grupo não figuram apenas os sabujos do presidente da República, empenhados em rebaixar a União ao papel de despachante de blogueiros fascistas. Nesse grupo estão também aqueles que não apoiam em nada o governo e se preocupam com precedentes que, no bojo do inquérito das fake news, venham a enfraquecer no futuro o respeito à liberdade de expressão. Estes (os que prezam a democracia) consideram que um inquérito policial não deveria ter a prerrogativa de atropelar o livre curso do debate público. Admitem, por certo, que todos devem ser responsabilizados (julgados e punidos) pelos abusos que cometerem no uso da liberdade, mas não aceitam a supressão preventiva de um milímetro que seja dessa liberdade.

É fato que hoje estamos falando de um inquérito que apura o comportamento de milícias virtuais abjetas, que disseminam o ódio, o preconceito, o fanatismo e a desinformação mais delirante, atentando diariamente contra os mais preciosos alicerces da República e da democracia. As contas bloqueadas, todo mundo sabe, reúnem um festival de ultrajes e baixezas inomináveis, com pregações contra os direitos fundamentais e as liberdades democráticas. Portanto, para um democrata, é confortável dar de ombros a uma ação da Justiça que limite, ao menos um pouco, as violências virtuais perpetradas por esses terroristas do simbólico. Mas o que acontecerá se, amanhã, outro inquérito, com outras motivações, vier a interditar páginas que não primem pela mesma vileza? 
A cargo de quem ficaria o critério de arbitrar sobre o que deve e o que não deve ser proibido?

A muitos democratas preocupa a hipótese de que o inquérito das fake news hoje abrigue um componente de censura que venha a produzir estragos amanhã. Para estes, não dá para apoiar o bloqueio das páginas desta vez só porque nos enoja o conteúdo bloqueado. E se gostássemos desse conteúdo, qual seria a nossa reação? Será mesmo essencial, para o êxito das investigações, que essas páginas sejam suprimidas das plataformas sociais?

Os dilemas implicados aí nada têm de corriqueiros. São dilemas ameaçadores e desconhecidos – a indústria ilegal da desinformação, cujos estragos estão apenas começando a se mostrar, é um fenômeno recente, sobre o qual não há jurisprudência em nenhum lugar do mundo. No Brasil é ainda pior, porque aqui o Poder Executivo age como um gabinete do ódio contra as liberdades. Diante disso, a responsabilidade que pesa sobre o STF é quase sobre-humana. Que nossos ministros saibam honrar a melhor tradição da Suprema Corte, de consolidação das liberdades e fortalecimento da democracia, e trilhem o melhor caminho. [Destacamos que a classificação quase sobre-humana, ainda que sem o quase, não credencia os integrantes da Suprema Corte a terem a pretensão de que são supremos.] 
 Eugênio Bucci, jornalista e professor - O Estado de S. Paulo


quarta-feira, 22 de julho de 2020

Cidadão, não! Militar! - O Estado de S.Paulo

Bolsonaro transforma militares em casta ainda mais privilegiada

“É proibido militar estar na política? Não!” Jair Bolsonaro tem incontáveis defeitos, mas a dissimulação não é um deles. Poucos políticos são tão transparentes em suas intenções, seus propósitos e suas cismas. Não vou falar aqui em ideias, porque é uma categoria mais difícil de discernir na “obra” do presidente. Bolsonaro não faz questão de disfarçar que quer pisar no acelerador do processo de militarização do seu governo. Começou a mover o barco nessa direção já no ano passado, e enfunou as velas de vez em 2020.
Levantamento do Tribunal de Contas da União apontou o espantoso contingente de 6.157 militares, da ativa e da reserva, em cargos civis no governo, sendo 2.643 em cargos comissionados. Trata-se de um aumento de 108,22% de 2016 para cá. Diante dessa evidência incontestável não adianta os militares engrossarem a voz e baterem o coturno no chão quando são chamados a assumir responsabilidades pelas políticas de Estado determinadas pelo “capitão”.

[o que desanima os opositores do 'capitão, inimigos, define melhor,  é que aos poucos os militares vão consolidando suas posições = por competência.
Aos que não sabem, ou preferem esquecer, Pandiá Calógeras, engenheiro civil, foi um excelente ministro da Guerra no governo Epitácio Pessoa.]

A militarização do governo é um movimento combinado com outros que o bolsonarismo vem empreendendo nos últimos meses, como o aumento da influência política sobre as polícias militares – a ponto de, hoje, haver em muitos Estados comando paralelo ao dos governadores. [Nos tempos que as coisas funcionavam no Brasil - e bem - inclusive, sem limitar - o cargo de secretário da Segurança Pública, nos estados, era ocupado por um oficial das Forças Armadas,  reserva remunerada, normalmente, oficial general com duas estrelas -  Também está em linha com a ideia do presidente, gritada em alto e bom som na dantesca reunião ministerial de 22 de abril, de “escancarar” a questão do armamento para a população, afrouxando limites, regras e fiscalização sobre a posse e o porte de armas e o acesso à munição.

Tudo isso coaduna com a visão de governabilidade na qual Bolsonaro de fato acredita, que é diversa dessa que ele vem tentando implementar ao chamar o Centrão para a festa antes restrita aos fardados e aos ideológicos. Uma governabilidade em que o presidente é louvado por adoradores fanatizados pelas redes sociais, promove a guerra cultural permanente como forma de manter vivo o fantasma do “comunismo” contra o qual seria o único remédio e que é amparada, na retaguarda, por esse estafe militar cada vez mais numeroso e incumbido de funções primordiais.

Com um general da ativa à frente da Saúde os militares não poderão se queixar se forem corresponsabilizados pelas atitudes inconsequentes do presidente durante a pandemia, do lobby da cloroquina – transformado por pressão dele em protocolo da pasta! – à incitação ao descumprimento do isolamento social. Da mesma maneira, ao colocar o vice-presidente (e general) Hamilton Mourão como tutor do ministro Ricardo Salles e responsável pelo pepino da situação da Amazônia, Bolsonaro joga no colo das Forças Armadas a cobrança internacional, que se dá por meio de países, organismos multilaterais e, cada vez mais, empresas e importadores dos produtos brasileiros, pela absoluta falta de uma política ambiental que atenda aos princípios mínimos do que a economia global exige.

O Estado de S. Paulo - Política - Vera Magalhães



quarta-feira, 8 de julho de 2020

‘Cidadão, não. Engenheiro formado’ - Elio Gaspar

Folha de S. Paulo -  O Globo

Câmeras tornaram-se um remédio eficaz para combater os demófobos - Graças aos vídeos, cenas de humilhação do outro custam caro     

A cena foi a mesma. Na Barra da Tijuca, um fiscal da Vigilância Sanitária interpelou um casal num estabelecimento onde não se respeitava o isolamento social. O marido desafiou-o, dizendo que ele não tinha uma trena para medir os espaços. O fiscal disse: “Tá, cidadão”. Até aí, seria o jogo jogado, mas a senhora foi adiante: — Cidadão, não. Engenheiro formado e melhor que você. Salvo os macacos, os bípedes passaram a usar o tratamento de “cidadão” durante a Revolução Francesa, que derrubou a hierarquia nobiliárquica.
Dias depois a engenheira química Nívea Del Maestro foi demitida da empresa de transmissão de energia onde trabalhava. Em nota, a Taesa informou: “A companhia não compactua com qualquer comportamento que coloque em risco a saúde de outras pessoas ou com atitudes que desrespeitem o trabalho e a dignidade de profissionais que atuam na prevenção e no controle da pandemia.”
Com a mesma retórica, em maio passado, o joalheiro Ivan Storel recebeu um PM que foi à sua casa em Alphaville (SP) atendendo a um chamado que denunciava violência doméstica: — Você pode ser macho na periferia, mas aqui você é um bosta. Aqui é Alphaville, mano. (...) Eu ganho R$ 300 mil por mês, você é um merda de um PM que ganha R$ 1 mil.
Storel viria a desculpar-se, dizendo que estava sob o efeito do álcool e dos remédios que toma por estar em tratamento psiquiátrico. Dias antes, em Nova York, um cidadão que observava passarinhos no Central Park, pediu a uma senhora que prendesse a coleira de seu cachorro. Ela se descontrolou e chamou a polícia, dizendo que “um afro-americano está ameaçando minha vida”. Ela foi demitida da firma de investimentos onde ganhava US$ 70 mil dólares anuais.
Nos três casos, a arma dos ofendidos foi a câmera de seus celulares. Postas na rede, as cenas viralizaram. É a mesma arma que registra a violência policial nas periferias das grandes cidades brasileiras. As câmeras tornaram-se um remédio eficaz para combater os demófobos prontos para aplicar carteiradas sociais no “outro”, hipoteticamente inferior. Ao “você sabe com quem está falando”, o progresso contrapôs o “você sabe que está sendo filmado?”
Mesmo dentro das suas lógicas infames, as duas senhoras estavam enganadas. O fiscal da cena carioca era doutor em Medicina Veterinária pela Universidade Federal Rural e o afro-americano do Central Park formou-se em Harvard. O fiscal do Rio e o PM de São Paulo representavam o Estado, que, na cabeça dos demófobos, é um ente a serviço do andar de cima. “A gente paga você, filho. O seu salário sai do meu bolso”, ensinou a senhora da Barra da Tijuca.
O afro-americano do Central Park lastimou que a vida da mulher tivesse virado de cabeça para baixo por causa da notoriedade que a cena viralizada lhe deu, mas recusou-se encontrá-la para um ritual de pacificação. Em geral, essas cenas de humilhação do “outro” duram poucos segundos e, sem os vídeos, não teriam consequência. Graças a eles, custam caro. A vida dos brasileiros melhorará quando vídeos semelhantes, mostrando cenas de violência policial contra jovens do andar de baixo, tiverem algum efeito. Por enquanto, ele é nulo, até mesmo porque em muitas cidades os policiais costumam prender quem os filma.

Folha de S. PauloO Globo - Elio Gaspari, jornalista



domingo, 28 de junho de 2020

População está mais armada, o que gera preocupação a especialistas

Entre janeiro e maio, a Polícia Federal concedeu a maior quantidade de autorizações de posse de armas de fogo para o período na história. A bancada da bala comemora os resultados, mas especialistas alertam para crescimento da violência a médio prazo

Os números de portes de armas de fogo e de novas armas cresceram nos primeiros cinco meses de 2020, em relação ao mesmo período do ano passado. Os dados são da Polícia Federal (PF). A bancada da bala no Congresso comemora os resultados, mas especialistas alertam que, a médio prazo, esse crescimento trará mais violência. A segurança pública é dever do Estado, conforme consta na Constituição de 1988. [enquanto o Estado não cumpre esse dever, a solução é a população assumir.
Mais bandidos morrerão e a tendência é os bandidos reduzirem o ímpeto criminoso, já que sempre dão preferência aos que estão desarmados.] Mais importante do que facilitar o acesso a esses instrumentos, segundo os especialistas consultados, é dar melhores condições de trabalho e infraestrutura às polícias.

Para os entrevistados, o fato de o presidente Jair Bolsonaro defender maior acesso a armamentos refletiu, principalmente, no aumento do número de armas novas em circulação, que caiu de 242.774 para 194.870, entre 2018 e 2019, mas voltou a subir de janeiro a maio de 2020. Para se ter uma ideia, enquanto, nos primeiros cinco meses do ano passado, foram 72.044 registros, no mesmo período deste ano, a quantia subiu para 81.074, um acréscimo de 12,5%. Já o número de porte de armas apresentou um crescimento mais constante. De 2018 a 2019, foi de 8.680 para 9.268. E, comparando os cinco primeiros meses de 2019 com o mesmo período de 2020, passou de 3.250 para 3580, o equivalente a 10,1%.

[complicado é que no Brasil o que mais tem é 'especialistas' em nada, mas que aceitam palpitar  conforme a vontade do entrevistador.
O que prova a incompetência indiscutível dos ditos especialistas é que os especialistas desde inicio de março que tentam acertar o pico da pandemia - começou para meados de abril, passou para inicio de maio, meados e agora está para meados de julho.
Acertar a data do pico da pandemia só é um pouco mais difícil que acertar a data de inauguração das obras do Ibaneis - além de atrasar várias datas, quando inaugura é uma parte, a chamada inauguração meia boca.]

Já o presidente da Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, Capitão Augusto (PL-SP), festejou o aumento no número de armas. “Eu vejo com bons olhos. Já mostra que revertemos a tendência dos governos petistas. É motivo para comemorar. Estamos falando de armas para o cidadão de bem, e não para marginais”, argumentou. “O desarmamento acarretou no aumento de homicídios. O importante é deixarmos a população mais segura. O cidadão de bem vai estar mais seguro. Antes, o marginal tinha certeza de que poderia entrar em uma residência ou roubar um carro. Hoje, existe a dúvida se o cidadão está armado ou não. Então, é uma ação intimidatória”, opina.

Correio Braziliense, MATÉRIA COMPLETA


segunda-feira, 15 de junho de 2020

Após ataques ao STF, Mendonça diz que 'instituições devem respeitar o povo'

Na contramão de outras autoridades, ministro da Justiça afirmou que ''todos devemos fazer uma autocrítica''

O ministro da Justiça, André Mendonça, divulgou uma nota neste domingo (14/6) sobre os ataques de manifestantes bolsonaristas ao Supremo Tribunal Federal (STF). Ao contrário de outras autoridades — como o próprio presidente da Corte, Dias Toffoli —, que condenaram os atos, Mendonça disse que as instituições devem respeitar o povo e que "todos devemos fazer uma autocrítica".

"A democracia pressupõe, acima de tudo, que todo poder emana do povo. Por isso, todas as instituições devem respeitá-lo. Devemos respeitar a vontade das urnas e o voto popular. Devemos agir por este povo, compreendê-lo e ver sua crítica e manifestação com humildade. Na democracia, a voz popular é soberana", disse o ministro.

Em seguida, Mendonça ressalta que "a democracia pressupõe o respeito às instituições democráticas" e conclui: "Portanto, todos devemos fazer uma autocrítica. Não há espaço para vaidades. O momento é de união. O Brasil e seu povo devem estar em 1º lugar".

Na noite de sábado, manifestantes a favor do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) soltaram fogos em direção ao STF e proferiram ofensas aos ministros e ao governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB). O ato foi uma resposta a uma ação da Secretaria de Segurança e do DF Legal que retirou acampamentos de bolsonaristas da Esplanada dos Ministérios, com base em um decreto que proíbe aglomerações como forma de conter a pandemia de covid-19. Após a desocupação, Ibaneis ainda decretou o fechamento da Esplanada ao longo do domingo.

Dias Toffoli criticou o ato. "O Brasil vivenciou mais um ataque ao Supremo Tribunal Federal, que também simboliza um ataque a todas as instituições democraticamente constituídas", afirmou. O presidente do STF ainda classificou o protesto como antidemocrático e o acusou de ser financiado ilegalmente e ter o estímulo de integrantes do próprio Estado. "O Supremo jamais se sujeitará, como não se sujeitou em toda a sua história, a nenhum tipo de ameaça, seja velada, indireta ou direta e continuará cumprindo a sua missão", disse, em nota. 

Demissão no comando da PF e prisãoA ação no STF reverberou no comando da Polícia Militar do DF. Na manhã deste domingo (14/6), Ibaneis Rocha exonerou o subcomandante-geral da PM, Coronel Sergio Luiz Ferreira de Souza, responsável pelo comando geral neste fim de semana.

[o cidadão Renan Silva Sena, identificado como apoiador do presidente Bolsonaro, foi liberado ontem mesmo pela Polícia Civil do DF - responderá as acusações em liberdade.
Renan é o mesmo que em maio, em um momento infeliz e ao que parece também de descontrole emocional, xingou e hostilizou profissionais da Saúde, que realizavam um protesto silencioso na Praça dos Três Poderes.

Ontem, domingo, pela manhã alguns apoiadores do presidente Bolsonaro realizaram pequeno ato público nas proximidades do Palácio do Planalto,  e logo após se retiraram sem, sem confronto com a PM-DF.
Na tarde, houve buzinaço em frente ao Palácio do Buriti e concentração de apoiadores do presidente nas proximidades do QG do Exército - Forte Apache - tendo tudo transcorrido com tranquilidade e de forma democrática.]

Também no domingo, a Polícia Civil do DF prendeu um homem identificado como Renan Silva Sena, que aparece em um vídeo soltando os fogos em direção ao STF e xingando o governador Ibaneis Rocha. Renan é o mesmo homem que, em maio, hostilizou e agrediu verbalmente enfermeiras que estavam em um protesto silencioso na Praça dos Três Poderes.

Confira a íntegra da nota:

"Brasília, 14/06/2020 - Em tempos tão difíceis, é essencial voltarmos aos princípios:

1º. A democracia pressupõe, acima de tudo, que todo poder emana do povo. Por isso, todas as instituições devem respeitá-lo. Devemos respeitar a vontade das urnas e o voto popular. Devemos agir por este povo, compreendê-lo e ver sua crítica e manifestação com humildade. Na democracia, a voz popular é soberana.

2º. A democracia pressupõe o respeito às suas instituições democráticas. Qualquer ação relacionada à Presidência da República, ao Congresso Nacional, ao STF ou qualquer instituição de Estado deve pautar-se por esse respeito.

3º. Portanto, todos devemos fazer uma autocrítica. Não há espaço para vaidades. O momento é de união. O Brasil e seu povo devem estar em 1º lugar.

André Mendonça
Ministro da Justiça e Segurança Pública" 

Correio Braziliense


domingo, 19 de abril de 2020

19 de abril - O Dia do Exército

Parabéns ao nosso Exército que neste momento dificil para a população está demonstrando, -  ao lado das forças irmãs Aeronáutica e Marinha, -  na prática o seu lema: "braço forte, mão amiga."

Ordem do Dia

19 de abril de 1648.
Quase  quatro séculos nos separam dos feitos dos heróis da Batalha de Guararapes. Aqueles brasileiros lutaram sem temor para defender o território colonial do invasor estrangeiro e, ao mesmo tempo, inauguraram um sentimento genuíno de pertencimento à terra e de amor à Pátria. Plantaram a semente de um país forte e soberano, de um povo capaz, guerreiro e solidário.

Naquele dia, nasceu o embrião do Exército Brasileiro, mescla indissolúvel de homens e mulheres, de índios, negros, mestiços e brancos; parcela indissociável da coletividade.

Desde então, tornamo-nos, ao costado da Marinha do Brasil e na ala da Força Aérea Brasileira, os guardiões deste berço sagrado, em vigília permanente para a defesa da Pátria, dos Poderes Constitucionais, da Lei e da Ordem.

Lutando sem temor, conquistamos nossa independência, moldamos nosso território e consolidamos nossa democracia. Enfrentamos toda sorte de oponentes e ameaças internas e externas. Vencemos. Definitivamente, vencemos todos aqueles que se apresentaram como inimigos do Brasil.

Aos que, no passado, lutaram sem temor, compondo as fileiras verde-oliva, dando o seu sangue e, até mesmo, suas vidas pela grandeza do Exército e da Pátria, o reconhecimento, a gratidão e a ratificação do compromisso prestado perante o Pavilhão Nacional.

Aos paladinos imortais Francisco Barreto de Menezes, Maria Quitéria, Caxias, Osório, Mallet, Mascarenhas de Morais e muitos outros que, empunhando armas, conduziram os destinos desta invicta instituição, a nossa solene saudação militar.

Profético, Pero Vaz de Caminha, escrivão da esquadra descobridora, ao aportar em Vera Cruz, não hesitou em escrever a El Rei de Portugal, dizendo que “nessa terra, em se plantando, tudo dá.”

A semente, por certo, germinou. Vera Cruz transformou-se em um país continental, abençoado por Deus e habitado por gente trabalhadora, ordeira e feliz.

À altura de sua grandeza, o Brasil possui, hoje, uma Força Terrestre comprometida, preparada e eficiente, em sintonia com as necessidades e aspirações do país.

Agora mesmo, na Operação COVID-19, estamos na linha de frente, apoiando o governo federal, os governos estaduais e os municípios no combate a uma das maiores crises vividas pelo Brasil nos últimos tempos. A construção de hospitais de campanha, a desinfecção de instalações públicas, a produção de medicamentos e de materiais de proteção individual, a distribuição de alimentos e a participação em campanhas de conscientização, vacinação e doação de sangue, além de muitas outras ações, já empregam, diariamente, mais de 25 mil militares do Exército em todas as regiões do país.

Nação brasileira, nossa razão de ser e existir, conte sempre com o Braço Forte e a Mão Amiga do seu Exército. Amálgama da sociedade, cônscios dos nossos deveres de militar e cidadão, dos Pampas à Amazônia, do litoral ao Pantanal, exclusivamente dedicados, disciplinados, aptos e capacitados, somos 220 mil combatentes prontos para lutar sem temor!

Brasil Acima de Tudo!

General de Exército Edson Leal Pujol
Comandante do Exército

segunda-feira, 13 de abril de 2020

PÉ DE CABRA LEGISLATIVO - Percival Puggina

Existem vários Brasis. Nestes dias de covid-19, um deles está em confortável prisão domiciliar e acha o ministro Mandetta muito carismático. Outro mora na Rua da Amargura, num apinhado barracão de zinco, “pendurado no morro, pedindo socorro à cidade a seus pés”. E tem 600 merréis para viver até sabe Deus quando, doutor. Outro habita o setor público e sabe tudo de direitos e cláusulas pétreas arremessadas sobre o setor privado, produtor de todos os bens e serviços, gerador de quase todos os empregos, exaurido pagador de todos os custos e garantidor de todas as dívidas.

Em 1215, na Inglaterra, o rei João I, dito João Sem Terra, assinou com os barões um documento que ficou conhecido como Magna Carta, limitando o poder da realeza, especialmente seu poder de tributar. Surgia ali o óvulo fecundado, o zigoto da responsabilidade fiscal, que no Brasil tem sido, historicamente, fraudada, frustrada e vilipendiada em todos os níveis de governo. É neles, nesses níveis, que os parlamentos aprovam, minuciosamente, um a um, todos os privilégios que entornam o caldo da despesa pública. É também neles que prospera a fabulosa máquina da política e da administração, que em grande parte funciona para si mesma.

Quantos planos de recomposição de dívidas já testemunhei como cidadão e pagador de impostos? 
Quantos serviram apenas para alargar os horizontes de novos surtos de irresponsabilidade fiscal? 
Não se pode desprezar o peso desse fator cultural na operação da política brasileira. De uns anos para cá, inverteram-se os papéis cumpridos em oito séculos de história da Magna Carta. Alternam-se e altercam-se. Ora os reis, ora os parlamentos são pródigos, gastadores, perdulários. É deles o pé de cabra que arromba o erário em plena luz do dia, sob as vistas da mídia que hoje só tem olhos para escanear e sacanear o presidente Bolsonaro.

O PLP 149/2019, chamado Plano Mansueto, foi mais um desses planos de saneamento de estados e municípios, que poderiam refazer suas dívidas, condicionados a iniciativas de cunho liberal que reduzissem o peso da máquina pública. Venda de estatais, contenção da despesa de pessoal no limite máximo de 51% da receita, etc. compunham a parte principal das condições exigidas pelo PLP.
Aí, mais uma vez, o Congresso Nacional, precisamente a Câmara dos Deputados, mete o pé de cabra legislativo e arromba o Tesouro Nacional, elaborando um substitutivo que, de carona no “corona”, transforma o projeto num imenso donativo federal. O projeto permite que governadores e prefeitos joguem, incondicionalmente, suas dívidas históricas no colo da União, acomodam seu fluxo de caixa como se não houvesse covid-19, nem recessão, enquanto os deputados garantem o sorriso agradecido de seus prefeitos e governadores.

E a União? Ora, quem se importa com o Brasil? Mete o pé de cabra, arromba o Tesouro e bota o estrago na conta do Bolsonaro, porque bons, mesmo, são o Maia e o Alcolumbre. Não é mesmo, senhores da grande imprensa?

Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. 
Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


terça-feira, 11 de junho de 2019

As controversas mensagens entre Dallagnol e Moro

Faltam informações sobre contexto e sentido de conversas divulgadas de forma fracionada

A Operação Lava-Jato se notabilizou por descobertas de grande repercussão em torno do esquema montado pelo lulopetismo e empreiteiras, para desviar dinheiro público por meio da Petrobras e de outras empresas públicas. Foi dessa forma que altas autoridades nos governos Lula e Dilma terminaram apanhadas pela força-tarefa. Entre elas, o próprio ex-presidente Lula, preso em Curitiba, por ter sido condenado no processo do tríplex do Guarujá.

Agora, é a Lava-Jato que se torna alvo, com a divulgação pelo site Intercept Brasil de mensagens atribuídas ao ainda juiz Sergio Moro, da Lava-Jato, e ao procurador Deltan Dallagnol, também da força-tarefa. O site sugere que frases dispersas apontam para o conluio entre o magistrado e Dallagnol. A defesa de Lula e de qualquer outro tem, é claro, direito de protestar e recorrer pelas vias apropriadas. Mas não se pode menosprezar o fato de que os processos da Lava-Jato, em que se destacam políticos e grandes empreiteiros, como Marcelo Odebrecht, têm sólida fundamentação em provas.

Se o juiz e o promotor quebraram alguma norma, reclamações devem também ser encaminhadas ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho do Ministério Público (CNMP). Em ambos, pedidos de investigação já foram apresentados. O PT adotou, no combate político à Lava-Jato e em defesa de Lula, o argumento da falta de isenção de Moro e de procuradores, Dallagnol o principal deles. Tem agora grossa munição para sua artilharia. Mas sempre no campo da luta política, porque essa estratégia não pode contaminar o Judiciário e os conselhos da magistratura e dos procuradores.

São previstos recursos de sentenças no Judiciário para reduzir a margem de erros, inclusive causados por qualquer influência externa. É o que tem acontecido nos processos da Lava-Jato, em que pedidos de revisão de penas são normalmente julgados, com os direitos dos acusados devidamente respeitados.  Sabe-se que é natural o convívio entre procuradores e juízes. E a constituição de forças-tarefas (entre MP, polícia e Justiça) é de comprovada eficácia. O próprio site que divulga os diálogos consultou juristas que “disseram que a proximidade entre procuradores e juízes é normal no Brasil — ainda que seja imoral e viole o código de ética dos magistrados”.

Assusta em tudo isso a possibilidade do hackeamento de conversas, seja entre quem for. É crime grave, que expõe todos e viola direitos básicos do cidadão. A origem do material e a forma como foi divulgado deixam dúvidas. Não se sabe se os diálogos estão completos e no devido contexto. É impossível ter segurança de que não há omissões que mostrariam que o procurador e o juiz agiram de forma correta. Os diálogos, por óbvio, reativam paixões políticas, o que costuma embaralhar o raciocínio. Nessa hora, deve-se ter a frieza necessária para esperar que tudo seja esclarecido.
 

sábado, 8 de junho de 2019

Grande ideia

O universo ecológico diz que o Brasil deveria eliminar seus problemas ambientais urbanos e preservar a natureza. Grande ideia. É só executar


Publicado na edição impressa de VEJA

A mais rica cidade do Brasil é atravessada de ponta a ponta, ao longo de quase 25 quilômetros, por um dos mais extensos, perigosos e sinistros esgotos a céu aberto do planeta o Rio Tietê. Essa fossa, riquíssima em tudo o que pode haver em matéria de coisa podre, de lixo e de tóxicos em seus estados mais agressivos, é confinada entre avenidas gigantes dos dois lados, as célebres “Marginais”, pelas quais passam diariamente cerca de 2 milhões de veículos com toda a emissão de gás carbônico a que têm direito. Um sujeito que cair ali dentro pode perfeitamente não ter tempo de se afogar ─ corre o risco real de morrer envenenado antes, no meio da pasta química mortal que substitui há décadas a água corrente do rio. Nenhuma forma conhecida de vida sobrevive dentro desse horror. Isso é só uma parte do problema.

Pouco antes de sair do município de São Paulo, em direção à sua foz 1.100 quilômetros adiante, o Tietê encontra o canal do Rio Pinheiros ─ outro sério concorrente ao título de Oitava Maravilha da Poluição Urbana do Mundo, negro de imundície e igualmente ladeado por duas avenidas de tráfego insano. Sua única vantagem: é um pouco mais curto que a cloaca irmã.

Parece claro que existe aí um problema ambiental monstruoso, desses que teriam de ser resolvidos antes de quaisquer outros pelas autoridades e defensores da natureza em qualquer país mais ou menos civilizado do mundo ─ até porque prejudica diretamente os 21 milhões de brasileiros que moram na área metropolitana de São Paulo. Parece, mas não é. Não apenas não é: não passa pela cabeça de ninguém que possa ser assim, entre os milhares de ambientalistas, ecologistas, engenheiros ambientais, naturalistas, indigenistas, procuradores, fiscais e o resto dos burocratas que infestam as repartições de defesa do meio ambiente nos três níveis da administração. Isso sem contar, naturalmente, com as ONGs “do verde”; para essas, então, falar em poluição urbana é praticamente um crime. A única questão ambiental válida, em tal mundo, é o pacote que engloba florestas, cerrados, mangues, ilhas perdidas, fauna, flora, bagres de rio ─ tudo, em suma, que não inclua o ser humano, salvo se ele for índio. O Rio Tietê que se dane. O que interessa é pegar o cidadão que cortou um pé de gabiroba num sítio perdido em algum fim de mundo, ou exigir prisão inafiançável para o infeliz que matou um macaco-prego no sertão do Ceará.

O verdadeiro desastre ambiental do Brasil do século XXI não está no meio do mato, e sim na cara de todo o mundo, todos os dias; não afeta sapos ou papagaios, mas mata gente de carne e osso. Centenas de cidades brasileiras com mais de 50.000 habitantes são envenenadas por rios mortos como o Tietê e o Pinheiros. Não menos que 50% da população, ou 100 milhões de pessoas, não dispõem de esgotos.

Uns outros 40 milhões, possivelmente, não têm acesso a água tratada de boa qualidade. Há 3.000 lixões em pleno funcionamento em 1.600 cidades por todo o país ─ aterros ao ar livre onde lixo e todo tipo de detritos são jogados e abandonados, sem qualquer tratamento. Desde 2014 não deveria mais existir nenhum lixão aberto no Brasil, por exigência da lei; só que há mais lixões hoje do que havia cinco anos atrás. Essas cordilheiras de dejetos contaminam a água, poluem o ar e envenenam o solo. Cerca de 95 milhões de cidadãos, segundo cálculos das empresas de limpeza pública, têm sua saúde e qualidade de vida diretamente prejudicadas pelo descarte no lixo no meio da população em geral.

Mas quem é que está ligando para isso, entre os autocratas ambientais? Suas paixões são outras. Entre os surtos que vivem tendo, tornou-se conhecido, recentemente, o bloqueio que o Ministério Publico comanda há oito anos contra a construção da linha mestra de transmissão de energia elétrica em Roraima. Como os 350 índios waimiri ─ isso mesmo, 350 que vivem nos 225.000 quilômetros quadrados de Roraima têm objeções ao linhão, o MP vem vetando sistematicamente as obras, desde sua aprovação em 2011. Com isso, a maior parte do território do Estado, e seus 500.000 habitantes, não recebem um único watt de eletricidade brasileira. São obrigados a depender de fornecimento importado da Venezuela ─ que hoje não consegue produzir nem papel higiênico, e vive falhando na entrega. Há, agora, um esboço de solução. A população de Roraima reza.
O universo ecológico diz que o Brasil deveria, ao mesmo tempo, eliminar seus problemas ambientais urbanos, permitir o progresso e preservar a natureza. Grande ideia. É só executar.

Revista Veja

quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Entidades de magistrados repudiam episódio com Lewandowski em avião

'Liberdade de expressão não autoriza o desrespeito às instituições e a perturbação de voos', diz nota 

[criticar o Supremo, em função da INSEGURANÇA JURÍDICA e  do DESRESPEITO as competência de cada um dos 3 Poderes da República, é direito de qualquer cidadão

Lewandowski é um dos passíveis de inúmeras críticas.

Inaceitáveis são as atitudes cabíveis de ser interpretadas como 'agressão pessoal' - situação que ocorreu com Lewandowsky.]

As principais entidades representativas da magistratura brasileira divulgaram nesta quarta-feira (5) uma nota repudiando o episódio em que um advogado criticou o STF ao ministro da corte Ricardo Lewandowski em um voo no qual eles eram passageiros, na terça (4).

O documento também critica a “afronta feita pelo MBL” ao prédio do tribunal, em Brasília –o grupo projetou a mensagem “Vergonha STF” na fachada sede da instituição. Antes de o avião decolar, o advogado Cristiano Caiado de Acioli afirmou a Lewandowski que “o Supremo é uma vergonha, viu?”. O ministro responde e pede que chamem a PF para prender Acioli.
“A ninguém é dado o direito de perturbar a tranquilidade de passageiros em voos comerciais, tendo as autoridades constituídas não só o direito como o dever do exercício do poder de polícia para coibir a prática de comportamentos impróprios, que possam desaguar em desinteligências ou perturbações aptas a comprometer a própria condução da aeronave”, diz a nota.

O texto ainda afirma que “a liberdade de expressão é um direito fundamental, propicia o debate democrático e o exercício da crítica, mas não autoriza a prática de agressões pessoais, a invasão da privacidade ou o desrespeito às instituições e a perturbação de voos. Trata-se de reconhecer as mais comezinhas regras de civilidade e convivência, que vêm em socorro de qualquer cidadão, como também da coletividade”.

Assinam a nota a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), a Associação dos Magistrados do Distrito Federal (Amagis-DF) e a Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM).

terça-feira, 18 de setembro de 2018

Militar ou não militar

Militar também é cidadão? Sem dúvida. Mas à instituição à qual ele pertence é confiado o exercício do componente mais pesado do monopólio do uso da força que a Nação delega ao Estado


Militar também é cidadão?
Sem dúvida. Mas à instituição à qual ele pertence é confiado o exercício do componente mais pesado do monopólio do uso da força que a Nação delega ao Estado. E isso põe regras rígidas para os que encarnam essa instituição participarem da discussão política, especialmente da parte dela que diz respeito à conquista e ao exercício do governo. Como o poder, mais que tudo, corrompe, convém manter uma distância profética entre o poder armado e o poder desarmado (assim como também, e pela mesma razão, entre o poder político e o poder econômico). Os dois (ou os três) concentrados nas mesmas mãos, diz a História que não registra exceções, produzem tentações fortes demais para a natureza humana resistir e esse é o caminho mais curto para o poder absoluto, aquele que corrompe absolutamente.

Um militar tem todo o direito, portanto, de desligar-se da instituição das Forças Armadas para tentar uma carreira política. Mas militares da ativa ou da reserva ainda ligados às Forças Armadas, se quiserem enveredar por esse caminho, têm de escolher entre o desligamento da instituição ou manter, acima de tudo, o respeito à hierarquia que lhe impõe silêncio no debate político-eleitoral.  O limite desse racional está na definição das atribuições constitucionais das Forças Armadas, a primeira das quais é defender a própria Constituição, cujos fundamentos básicos são a soberania do povo sobre o Estado e o princípio da alternância no poder, que definem a natureza democrática do regime.

As Forças Armadas brasileiras vêm respeitando irrepreensivelmente esse limite desde 1985. Agora essa fronteira começa a ficar menos nítida. Mas seria falsear a verdade apontar os últimos pronunciamentos que passaram da medida como manifestações espontâneas de pessoas ou instituições sedentas de poder.  A mais nefasta das especialidades da esquerda radical militante aquela que põe as ideias à frente das “narrativas” e as faz independentes dos fatos na estruturação da sua “lógica” é materializar os fantasmas que cria. Se há algum grau de atrito dentro dos limites da convivência e da tolerância entre classes, raças, gêneros, preferências ideológicas e o que mais possa diferenciar pessoas de pessoas, ela trabalha sempre no sentido de acirrá-lo até transformá-lo na “guerra” com que justifica o seu próprio radicalismo e, no extremo, a eliminação física do adversário transformado em “inimigo”.


As declarações de militares assinaladas em condição de impedimento não são propriamente ações, são mais exatamente reações. O partido ou o candidato que oficialmente aponta como exemplo regimes como o da Venezuela e outros que se estabelecem exclusivamente pela força, está assumindo uma posição de fato contra a democracia e a alternância de poder prescritas pela Constituição. Também não foram os militares, são a presidente do PT em pessoa e os dois candidatos que disputam a simpatia da esquerda – o “poste” finalmente erguido e Ciro Gomesque têm afirmado textualmente que suas candidaturas são uma etapa do projeto de anular a condenação de Lula pela Justiça e pelas leis vigentes no Brasil (“à bala” se alguém resistir, na versão de Ciro). Tudo isso não apenas soa, como frequentemente se apresenta explicitamente como ameaça direta contra a democracia e o princípio da alternância no poder.

E o que dizer de um Supremo Tribunal Federal que, coroando uma sequência de manobras de uma insistência impossível de interpretar como fortuita, proíbe a produção de uma prova física do voto como as de que dispõem todos os países democráticos do mundo depois de ela ter sido aprovada uma vez pelos representantes eleitos do povo e reconfirmada, depois de vetada pela “presidenta” petista, com votação muito mais que suficiente para reverter um veto presidencial? Ou da sucessão de decisões votadas pelos representantes eleitos do povo e em seguida anuladas, seja por votações do plenário, seja por decisões monocráticas de ministros do STF que, de troco, legislam em causa própria atribuindo-se aumentos de salário indecentes num quadro de economia de guerra para o resto do País? Onde tudo isso deixa o princípio da soberania do povo?


A válvula de escape que resta quando as demais instituições rateiam é o chamado 4.º Poder da República. Mas também a imprensa tem falhado. Só que há uma realidade aqui fora que já foi a um extremo tal que não há mais como contemporizar. A estratégia de paralisar o governo Temer esfriou a memória nacional e diluiu os direitos autorais do desastre econômico do lulismo. Isso, mais a velha mistura de desinformação com miséria assistida, explica a posição de um terço do eleitorado. A penúria em que essa paralisia deixou a classe média meritocrática, os microempresários, os caminhoneiros, os prestadores de pequenos serviços, os aposentados do País real e até a fatia de baixo do funcionalismo mal pago (que inclui boa parte dos militares e dos policiais), explica o outro terço. De um jeito ou de outro, esse Brasil tem de se fazer ouvir. Cada fato omitido, cada pergunta que deixar de ser feita pelos atores contratados pelos sistemas democráticos para atuarem nessas ocasiões acaba por voltar na boca de alguém que deveria ficar do lado de fora do debate eleitoral. Daí ser a verdade – inteira – não apenas o melhor, mas o único remédio receitável para uma democracia que se quer representativa.

Mas por mais “justificados” pelos fatos que tais desabafos possam estar, é preciso resistir à tentação de fazê-los. O Brasil, à beira de um processo de entropia que uma vez instalado se torna irreversível, já viu esse filme. Andar à margem da democracia, não importa por qual margem, é para os antidemocratas. Por isso ao terço restante do eleitorado – aquele que insiste na democracia sem aspas, nem vírgulas, nem hiatos – resta, por enquanto, uma escolha de Sofia que toda e qualquer suspeição em torno do respeito ao principal só fará tornar ainda mais difícil.

Por: Fernão Lara Mesquita, jornalista. 

sábado, 24 de fevereiro de 2018

O cidadão a sós

'Volta dos militares' para consertar tudo isso? Pode-se achar a pior opção - e tem tudo para dar errado - mas, na verdade, crescem motivos para pensar assim

Baile funk - Seu principal derivado, o estupro coletivo de garotas menores de idade, tornou-se símbolo de orgulho do “morro” (//Reprodução)

A intervenção do Exército no Rio de Janeiro, em mais uma tentativa de combater a ocupação armada da cidade pelos criminosos, recebeu a aprovação de 80% da população — é o que mostram os primeiros levantamentos feitos logo após a chegada das tropas federais a esse pedaço do território brasileiro onde o crime está em guerra aberta contra os cidadãos. Houve, naturalmente, reações preocupadas por parte de muita gente — e não apenas da esquerda. (Com aquele seu instinto que nunca falha na hora de ficar contra a opinião da maioria, o PT e sua periferia, automaticamente, escandalizaram-se com a intervenção. O que fizeram é o que sempre fazem quando se trata de escolher entre a criminalidade, que a seu ver toma parte nas “lutas populares”, e a ordem pública, que consideram coisa de “direita”: ficaram, de olhos fechados, a favor do crime.) Junto com a reação habitual dos nossos revolucionários, veio o espanto apreensivo de uma parte do Brasil “civilizado”. O apoio maciço à intervenção no Rio, segundo dizem, mostraria uma angustiante e apressada inclinação do brasileiro a acreditar que os militares são “a solução” para tudo crime, corrupção, incompetência e todas as demais taras do Estado e da sociedade no Brasil. Seria uma expectativa ruim, mesmo porque é impossível de ser atendida.



Não dá para medir com exatidão se os brasileiros acreditam mesmo em soluções militares. Mas, com certeza, uma população que há muito tempo não tem o mínimo motivo para levar a sério o governo, é insultada abertamente pelas decisões de um Supremo Tribunal Federal que presta vassalagem a condenados por corrupção e é tratada como débil mental pelo pior conjunto de deputados e senadores hoje presentes sobre a face da Terra não poderia mesmo pensar como se estivesse vivendo na Inglaterra. Que raio se pretende, então, que as pessoas achem? Está cada vez mais difícil para o cidadão, e daqui a pouco pode tornar-se impossível, ficar a sós vendo em silêncio os seus direitos mais básicos ser violados pelos criminosos, com a proteção de leis feitas para atender aos interesses de bandidos e seus defensores. Salvo os próprios criminosos à mão armada, as quadrilhas que roubam o Erário e o resto dos marginais em circulação por aí, ninguém pode permanecer calmo enquanto o sistema judiciário, a partir de seu degrau mais alto, solta sistematicamente quem deveria estar preso ou mantém fora da prisão quem foi condenado e deveria estar lá dentro. Para a população brasileira, no fim das contas, a situação criada no país é simplesmente incompreensível. “Volta dos militares” para consertar isso? Todo mundo está no direito de achar que se trata da pior opção, mesmo porque é o tipo da coisa que tem tudo para dar errado. Mas é inútil esconder que todo mundo também está no direito de achar exatamente o contrário. Na verdade, há um número cada vez maior de motivos concretos para pensar assim.

 
“Ninguém pode permanecer calmo enquanto o Judiciário solta quem deveria estar preso ou mantém fora da prisão quem deveria estar lá dentro”

O que querem, sinceramente, que o cidadão pense quando vê uma assassina que ajudou a matar o próprio pai a golpes de barra de ferro ser solta, com o apoio enfurecido do Ministério Público, para passar fora da prisão o Dia dos Pais justamente o Dia dos Pais? É a lei, dizem advogados, promotores e juízes — mas não lhes passa pela cabeça que uma coisa dessas está acima do entendimento de qualquer ser humano deste planeta. O recado que dão é o seguinte: se a lei é demente, problema seu. Obedeça e cale a boca. Como condenar alguém por sonhar com “os militares”, quando uma promotora de Justiça, que é paga (com todos os “adicionais”) para nos defender dos criminosos, diz que “bandido bom é bandido vivo, e com direitos”? [acrescentando uma indagação do Blog Prontidão Total:
O que querem, sinceramente, que o cidadão pense quando vê uma assassina que ajudou a matar sua enteada (Isabella Nardoni, cinco anos) seja liberada para passar fora da prisão exatamente o Dia das Crianças?] 

 MATÉRIA COMPLETA, clique aqui



sábado, 9 de dezembro de 2017

Como sua vida vai piorar se a Previdência ficar sem reforma

Governo economizará R$ 331 bilhões até 2025 se a proposta atual de reforma da Previdência for aprovada neste ano 


O governo brasileiro encerra 2017 torrando dinheiro como se fosse o fim dos tempos. Gasta como um novo-rico sem noção, destinado a cair na pobreza. Essa trajetória resulta de muitos fatores e decisões ruins acumuladas ao longo de vários governos, mas uma distorção evidente a aumentar o problema é quanto o país gasta com aposentadorias e benefícios. Hoje, esses tópicos deixam apenas 43% do gasto público para outras áreas. Sem uma reforma da Previdência, até 2026 eles continuarão a devorar parcela maior da despesa pública, até deixarem apenas 20% para todo o resto, pela projeção do Ministério da Fazenda. O economista brasileiro Otaviano Canuto, diretor executivo no Banco Mundial, acompanha de perto as contas de vários países latino-americanos e chega ao mesmo diagnóstico: o problema não se resolverá com remendos orçamentários. Quanto mais cedo a reforma for feita, melhor. Quanto mais for adiada, mais prejudicará o cidadão.

>> O governo está muito longe de conseguir os votos para a Reforma da Previdência

O teto de gastos, que limita o crescimento das despesas do governo, pode ser descumprido já em 2019 se nada for feito até lá, prevê o Itaú Unibanco. “Já vemos o governo cortando investimento. E vai precisar reduzir todo o gasto. O exemplo dos passaportes (cuja produção foi interrompida por um mês neste ano) foi anedótico. Teremos problemas em outras áreas e a população vai sentir isso”, diz Nelson Marconi, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EESP). O mecanismo do teto, que proíbe que o gasto avance em ritmo superior à inflação do ano anterior, foi a primeira vitória da equipe econômica chefiada pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Mas, se a Previdência continuar a ocupar mais espaço no orçamento público, sacrificará outras áreas (a Previdência brasileira é muito mais custosa, em relação ao orçamento público e ao PIB, que a de países com perfil demográfico semelhante).

>> Trecho da reportagem de capa de ÉPOCA desta semana

 

terça-feira, 21 de novembro de 2017

Para o Banco Mundial, Brasil tem de reduzir privilégios de servidores

O lado mais cruel da ineficiência

O Brasil gasta muito e gasta mal. Essa constatação não é nova, mas ganha importante dimensão com base em estudo realizado pelo Banco Mundial (Bird) sobre a eficiência dos gastos públicos no país. Pelos cálculos da instituição, o governo poderia economizar 7% do Produto Interno Bruto (PIB), cerca de R$ 440 bilhões, por ano promovendo reformas, cortando privilégios de servidores, reduzindo subsídios, aprimorando o sistema de financiamento do ensino público e ajustando os programas sociais.
Para o Banco Mundial, não há mais espaço para o Brasil insistir em um sistema no qual gasta mais do que arrecada. O ajuste fiscal, no entender da instituição, é necessário para estabilizar a dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) e respeitar o teto de gastos. Isso passa por um corte cumulativo de quase 25% nas despesas primárias federais (em proporção do PIB), o que exige um rigoroso exercício de priorização, algo que nunca se viu no país.
Na avaliação do Bird, que apresentará seu relatório nesta terça-feira, 21, aos ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira, não há dúvidas de que a fonte mais importante para o ajuste fiscal de longo prazo é a reforma da Previdência. Pelo projeto negociado com o Congresso, será possível reduzir à metade o deficit estimado para o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), de 16% para 7,5% do PIB, até 2067. Além disso, a reforma resultará em economia de aproximadamente 1,8% do PIB até 2026, se incluída a desvinculação do piso da aposentadoria do salário mínimo.
Apesar de, na visão do banco, a proposta de reforma da Previdência ser socialmente justa, pois a maior parte do ajuste pegará pessoas com salários acima da média, há muitas falhas no projeto preparado pelo governo. Segundo o Bird, as propostas de mudança não abordam, suficientemente, o rombo do Regime Próprio de Previdência do Servidor (RPPS), que paga benefícios extremamente generosos a funcionários públicos contratados antes de 2003.
Muitos buracos
 A reforma também não resolve os déficits dos sistemas de previdência de estados e municípios, rombos que devem aumentar drasticamente ao longo dos próximos cinco ou 10 anos. Isso, destaca o Banco Mundial, explicita que serão necessárias medidas adicionais para tornar os regimes previdenciários de servidores mais equitativo e sustentável financeiramente. No caso do governo federal, a instituição multilateral propõe a redução dos privilégios previdenciários concedidos aos servidores contratados antes de 2003, por meio, por exemplo,  de contribuições adicionais pagas em cima das aposentadorias.  O Bird é enfático em relação à necessidade de frear os gastos com o funcionalismo público brasileiro. Pelos cálculos de técnicos da instituição, o número de servidores não é grande para os padrões internacionais. O grande problema está no nível dos salários desse grupo de trabalhadores, em média, 67% superior aos rendimentos observados no setor privado, independentemente do nível de educação. [curiosidade enviada ao Blog Prontidão Total por e-mail: "a ironia de tudo, está em que um dos poucos planos econômicos do Brasil que deu certo - o Plano Real - não foi discutido antes, nem durante sua elaboração, nem após sua entrada em vigor com organismos internacionais tais como: Banco Mundial, Bird, FMI - todos os planos que foram discutidos com gringos deram errado.]
Esse prêmio salarial do setor público, na avaliação do Banco Mundial, é atípico em relação a padrões internacionais, fazendo com que a grande maioria (83%) dos servidores federais integre o um quinto mais rico da população. Para os técnicos da instituição, a redução desse prêmio salarial pela metade resultaria em economia de 0,9% do PIB. “Os dados disponíveis já são suficientes para recomendar a suspensão de reajustes do funcionalismo no curto prazo”, frisa.
Programas sociais
Não é só. O governo também pode economizar entre 0,15% e 0,20% do PIB anualmente por meio do aperfeiçoamento das licitações públicas, seja diversificando os ofertantes e melhorando o gerenciamento, seja reduzindo o efeito da sazonalidade dos preços. Outro ponto importante para engordar os cofres públicos passa, segundo o Bird, pela eliminação ou reformulação de programas de subsídios, como o Simples, a desoneração da folha de pagamento das empresas, o programa Inovar-Auto e a Zona Franca de Manaus.
No caso dos programas sociais, ressalta o Banco Mundial, é preciso reformular todos, incluindo o Bolsa Família, o abono salarial e o seguro-desemprego. Para a instituição, se fossem reduzidas as ineficiências, o governo poderia gastar 37% menos no sistema de educação básica e 47% menos no ensino médio. Nas universidades, as despesas poderiam cair 0,5% do PIB. O banco ressalta que aproximadamente um quarto do dinheiro que a União gasta com as universidades federais é desperdiçado.
No setor de saúde, 0,3% do PIB poderia ser economizado se os recursos fossem bem geridos, mantidos os mesmos serviços, e 0,3% se acabassem os créditos tributários no Imposto de Renda para despesas privadas com saúde. No entender do Bird, esses são os caminhos para o Brasil ter um Estado mais comprometido com o cidadão, que é taxado, mas não tem em troca serviços públicos de qualidade.

Correio Braziliense - Blog do Vicente