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domingo, 3 de abril de 2022

O roubo admitido - Carlos Alberto Sardenberg

Bolsonaro e Lula se ocuparam do tema Petrobras nesta semana. Sobraram equívocos, alguns curiosamente idênticos. Os dois, por exemplo, acham que a estatal só trabalha para ela mesma e para os acionistas do mercado privado.

A diferença é que, para Lula, a Petrobras do PT era uma grande empresa de tecnologia, que apoiava o desenvolvimento nacional.

Por que não é mais?

Segundo Lula, porque inventaram anarrativa” da corrupção, envolvendo não apenas a empresa, mas também seus funcionários. As mentiras foram tantas, diz o ex-presidente, que empregados da Petrobras não podiam entrar em restaurantes “porque eram chamados de ladrões”. E se, na visão de Lula, não houve corrupção, mas uma narrativa de roubalheira, cabe ao PT responder com outra narrativa, que explique isso ao povo.

Mesmo com toda a lábia de Lula, vai ser difícil. Não há uma narrativa, mas toda uma documentação, em tribunais brasileiros e internacionais, mostrando o sistema de corrupção implantado em torno da Petrobras.

Os competentes funcionários da estatal não foram acusados. Foram denunciados e punidos diretores e gerentes nomeados por indicação de partidos políticos e que se associaram a grandes empresas para arrecadar dinheiro para campanhas e, depois, para os bolsos próprios.

Essa associação entre governos, estatais e empresas contratadas vem de muito antes do PT chegar à Presidência da República. Vem das prefeituras, por exemplo, como a de Santo André. Recomendo o documentário “Celso Daniel” , da Globoplay, sobre o assassinato do então prefeito de Santo André.  
Ao longo do processo, surgiram duas versões principais. A primeira, que havia sido um crime comum, cometido por engano. Os bandidos teriam sequestrado a pessoa errada.

A segunda versão, alimentada por familiares de Celso Daniel, dizia que o então prefeito havia descoberto um esquema de corrupção com as empresas de ônibus e por isso teria sido apagado.  Não é o caso de discutir aqui qual versão deve prevalecer. Mas o documentário deixa claro que havia um esquema de arrecadação de dinheiro das empresas de ônibus.

Quem conta isso, no documentário, é um ilustre procer do PT, Gilberto Carvalho, que trabalhava com Celso Daniel.

No capítulo 3, ele conta que foi acalmar os familiares do Celso Daniel, nervosos com a história de corrupção. E disse assim, conforme se ouve a partir do segundo minuto: “Olha, qualquer grupo político, para fazer campanha eleitoral, precisa arrecadar. Essa arrecadação pode ser feita legalmente ou à margem da lei, no caixa dois e tal. No caso de Santo André, as campanhas eram feitas, o Sérgio era o encarregado. Possivelmente você tinha prática de caixa dois, sim”.

Na mesma conversa, Gilberto Carvalho apressa-se a tranquilizar os irmãos de Celso Daniel. Repete que houve caixa dois, mas afirma: “o irmão de vocês nunca se meteu em corrupção no sentido de ter proveito próprio”. Ou seja, roubar para o partido pode.

No julgamento do mensalão os advogados de Delúbio Soares, então tesoureiro do PT, admitiram que havia esquema de caixa dois, apelidado de recursos não contabilizados, e tentaram classificar essa prática como mera infração eleitoral – coisa pequena.

Essa tese era normalmente aceita nos tribunais. No julgamento do mensalão, Joaquim Barbosa à frente, foi classificada como é de fato: roubo, assalto à população. Se as empresas de ônibus precisavam pagar caixinha ao PT, de onde tiravam esse dinheiro? Das passagens que, por isso, tinham que ser mais caras.

Foi esse mesmo esquema praticado na Petrobras, levado ao máximo. E como sempre acontecia, parte do dinheiro ia para bolsos particulares.
A Lava Jato apanhou isso
.  
Mas como a onda agora é desmoralizar a operação, recomendo uma visita ao site do Secretaria do Tesouro do governo americano. Procurem por Kleptocracy Asset Recovery Rewards Program – um programa criado pelo Congresso para recuperar dinheiro de propinas.

Há, por exemplo, boa recompensa para quem indicar onde está dinheiro de propinas pagas pela Odebrecht e Braskem – esta uma associação entre Petrobras e Odebrecht.

 Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

Coluna publicada em O Globo - Economia 2 de abril de 2022

 

quinta-feira, 24 de março de 2022

MPF quer obrigar o IBGE a incluir no Censo 2022 espaço para LGBTQIA+

[Mais uma do MPF = em busca do protagonismo que perdeu para o Lula,  que desestruturou Dallagnol]

Instituto sustenta que o Censo não é adequado para sondagem ou investigação de identidade de gênero e orientação sexual

O Ministério Público Federal acionou a Justiça para que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) inclua campos para identificação de “identidade de gênero” e “orientação sexual” nos questionários do Censo 2022 e em futuras pesquisas.

A ação foi ajuizada na Justiça Federal do Acre na terça-feira 22 e requer que o IBGE seja obrigado a adicionar campos referentes à identidade de gênero e à orientação sexual nos questionários básico e amostral do estudo.

A procuradoria argumenta que o fato de não haver um “perfil social, geográfico, econômico e cultural” da comunidade LGBTQIA+ no Brasil resulta em um “verdadeiro empecilho” para a formulação de políticas públicas focadas nas necessidades destas pessoas.

Em nota, o IBGE afirmou que vai divulgar, em 25 de maio, indicadores referentes à “orientação sexual autodeclarada”, que serão inseridos na Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).

O órgão sustenta que o Censo não é a pesquisa adequada para sondagem ou investigação de identidade de gênero e orientação sexual e aponta que em razão da importância do tema desenvolveu questão específica sobre a orientação sexual na PNS. “A metodologia de captação das informações do Censo permite que um morador possa responder por ele e pelos demais residentes do domicílio. Pelo caráter sensível e privado da informação, as perguntas sobre a orientação sexual de um determinado morador só podem ser respondidas por ele mesmo”, afirmou.

A ação ajuizada pela procuradoria contra o instituto classifica como “crucial” que o Censo capte o máximo da diversidade da população: “Sem esse conhecimento, subpopulações importantes tornam-se invisíveis e iniciativas para coletar dados representativos são severamente limitadas, senão inviabilizadas, como é o caso atual da população LGBTQIA+”.

 Revista Oeste


domingo, 20 de março de 2022

Atraso de vida [= Petrobras] - O Estado de S. Paulo

J. R. Guzzo

Esta tem sido a função da Petrobras: servir aos interesses dos políticos que controlam o governo.

A alta desesperada dos preços internacionais do petróleo, por conta da guerra entre Rússia e Ucrânia, chamou as atenções para uma questão puramente brasileira: 
qual a vantagem que a população leva numa hora dessas pelo fato de ser dona, na lei e na teoria, de uma empresa petrolífera estatal? 
Dez entre dez analistas políticos levariam o resto da vida debatendo a questão para, ao fim, não oferecer nenhuma resposta coerente. 
Fica mais prático, então, responder da maneira mais simples, e com base nos fatos: a população não leva vantagem nenhuma
O preço da gasolina e do diesel, na bomba do posto, continua o mesmo, sendo o cidadão dono da estatal ou não sendo. 
Se fizerem algum truque para não aumentar, vão ter de achar dinheiro para cobrir a diferença entre o preço real e o preço que inventaram. Esse dinheiro é seu mesmo: é aquilo que você paga em impostos. Vão tirar de um bolso o que estão colocando no outro. 

 LEIA TAMBÉM:

 Litro da gasolina chega a R$ 8,399 e diesel a R$ 7,980 após mega-aumento da Petrobras

Litro da gasolina chega a R$ 8,399 e diesel a R$ 7,980 após mega-aumento da Petrobras

A ideia de uma empresa estatal como a Petrobras, num país com os usos e costumes políticos do Brasil, é, antes de tudo, um absurdo
Essas coisas podem dar certo na Noruega, ou algo assim, onde o lucro da estatal do petróleo é entregue diretamente à população, em dinheiro, sem conversa fiada, no prazo certo, dentro de um sistema transparente e compreensível para todos. 
 
Mas, aqui, empresa estatal não é empresa pública nem pertence de verdade aos acionistas; os acionistas, aliás, não passam nem da porta de entrada do prédio-sede. Tudo é propriedade privada dos que mandam no governo. Há pouco era propriedade do ex-presidente Lula e do PT. Nunca uma empresa foi tão roubada na história e nunca houve roubo tão bem comprovado, com confissões assinadas dos que roubaram e até devolução de parte do dinheiro roubado. 
 
Esta tem sido a função essencial da Petrobras, desde sua fundação há quase 70 anos: servir aos interesses materiais dos políticos que controlam o governo e a vida pública deste país. 
É verdade que, em seu último surto de roubalheira, a Petrobras chegou a extremos. 
Que empresa privada do mundo compraria, por exemplo, a refinaria americana de Pasadena, um amontoado de ferro velho imprestável? 
Que empresa privada construiria uma refinaria de petróleo em sociedade com a Venezuela de Hugo Chávez, que jamais cumpriu sua parte no negócio e deixou a Petrobras com uma fatura de US$ 20 bilhões a pagar? 
Esse dinheiro, num caso, no outro e em todos os demais, não foi pago “pelo governo”. O governo não tem um tostão. Quem pagou foi o cidadão brasileiro, e o mais pobre pagou mais – como sempre acontece quando uma conta é dividida por igual entre todos. Mas, mesmo em condições normais, sem corrupção nenhuma, a Petrobras é um atraso de vida.

A única estatal boa é a estatal que não existe.

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo 


sábado, 29 de janeiro de 2022

O negócio são os negócios - Alon Feuerwerker

Análise Política

Dias atrás o Departamento de Estado divulgou sua versão de uma conversa entre o chefe americano das Relações Exteriores e o homólogo brasileiro. O tema era a tensão entre Rússia e Ucrânia. Na versão de Washington, o relato da troca de informações foi manifestamente anti-russo. Já o lado brasileiro procurou ser comedido ao relatar e buscou certo equilíbrio.

Sendo otimista, talvez estejamos retomando um caminho virtuoso episodicamente perseguido pela política externa brasileira: não nos meter de graça nas brigas dos outros. [especialmente quando a briga é estúpida, tanto por ser resultado de uma baidada do democrata que preside os Estados Unidos (Nota da Redação do Blog Prontidão Total: o neologismo "baidada" acaba de ser criada pelo nosso departamento de pesquisa de definição de comportamentos estranhos, sendo a denominação de uma decisão meio 'mancada' tomada após uma 'cochilada' de quem decidiu.) quanto pelo fato, constatado no milênio passado de que o arsenal nuclear dos EUA possui capacidade para destruir o nosso planeta algumas vezes e o da Rússia outro tanto = considerando que a Terra só pode ser destruída uma vez é uma briga entre possuidores de armamento que só pode ser usado em conflitos localizados.
O uso de armas nucleares em um desentendimento entre EUA x Rússia é uma possibilidade tão absurda quanto a prática adotada por algumas autoridade de dar ordens cujo cumprimento não pode obrigar.] Nem sempre é possível, mas deveria ser buscado como doutrina. E implica não somente deixar de apoiar projeções de poder militar de aliados, mas rever outro tipo de ambição: a obsessão pelo nosso suposto soft power. Uma certa leitura, nas relações internacionais, da teoria do brasileiro cordial, movido pelas relações pessoais e pela emoção.

Uma rápida observação do cenário global já seria suficiente para definir o melhor caminho para um país continental e de grande população, mas ainda aprisionado pelo déficit de desenvolvimento e pelo desequilíbrio entre agricultura e indústria, e ameaçado de ficar novamente inferiorizado na divisão técnica internacional do trabalho.

Política externa não é, ou não deveria ser, no nosso caso, voltada para conferir prestígio ao detentor do poder ou para promover ideologias mundo afora. Deveríamos apropriar-nos de um lema do qual os nossos amigos americanos estão abrindo mão, por medo de ficarem para trás na globalização (que ironia!): “o negócio dos Estados Unidos são os negócios”.

O Brasil é um país que pode se dar ao luxo de concentrar-se nos negócios, com quem quer que seja, sem querer dizer como o vizinho, próximo ou distante, vai organizar sua casa. Não temos armas de destruição em massa nem pendências fronteiriças, nem participamos de blocos políticos que se definam pela oposição a alguém.

Um primeiro passo seria retomar o conceito de soberania. Se não queremos que se metam na nossa vida, comecemos por não nos meter na vida alheia. Se a pessoa gosta de comentar criticamente relações entre terceiros na política internacional, ou a política interna de outros países, deveria procurar trabalho em veículos da imprensa. Presidente brasileiro tem de cuidar dos interesses do Brasil.

E os assuntos da esfera multilateral? Tratemos nas instâncias multilaterais, sempre tomando o cuidado da razoabilidade. Temos instrumentos para isso. Basta tirar a poeira de velhos conceitos como “autodeterminação das nações” e “solução pacífica das diferenças”. E combater a tentação de achar que vamos ser sócios do intervencionismo alheio.

Enquanto isso, concentremo-nos em buscar espaços econômicos. Qual é nosso principal gargalo na economia? A taxa de investimento? O déficit de infraestrutura? A desindustrialização? Então vamos atrás de parcerias que possam nos trazer soluções. Podem ser americanos, chineses, russos, indianos, europeus, tanto faz.

Num mundo crescentemente fraturado, será um privilégio de poucos. Aproveitemos.

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Publicado na revista Veja de 19 de janeiro de 2022, edição nº 2.774

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político

 

 

domingo, 16 de janeiro de 2022

A palavra esquecida - Alon Feuerwerker

Análise Política

Quem tem caminho para chegar vitorioso a outubro de 2022, em um ou dois turnos? No momento, todos os campos, apesar do clima de estagnação. Está é natural, pois as pesquisas mostram-se algo inalteradas e convergentes. Se a eleição fosse hoje, Luiz Inácio Lula da Silva ganharia. O detalhe: a eleição não é hoje, temos pelo menos longos oito meses e meio até lá.

É um período para a terceira via tentar conectar-se ao ponto sensível das massas. O principal obstáculo é ela, a terceira via, continuar acreditando que existe na sociedade um desejo, ainda não completamente decifrado, de “rejeitar os extremos”. O problema: esse tem-se revelado um assunto forte na bolha auto nomeada centrista, mas vem sendo completamente ignorado pela maior parte da população.

Lula e Jair Bolsonaro têm hoje somados uns 60% de intenção de voto estimulado e não muito longe disso de espontâneo. Se ambos fossem vistos pelo eleitorado como “extremistas”, poder-se-ia concluir que o extremismo é mais popular do que dizem por aí. Claro que não é isso. Bolsonaro e Lula lideram porque, desculpem a tautologia, são identificados como líderes pelo respectivo campo político e por ofertarem propostas concretas para problemas reais.


 Lula vem liderando seu campo há uns trinta anos, desde que o antecessor, o PMDB da resistência ao regime militar e herdeiro até então do trabalhismo, associou-se à ruína econômica do governo José Sarney. A liderança petista estabilizou-se a partir de 1989, tanto que o PSDB, nascido naquele momento como centro-esquerda, precisou depois procurar outra freguesia, outro mercado eleitoral. Que ocupou com sucesso de 1994 a 2018.

O PSDB foi destroçado no segundo tempo da Operação Lava-Jato e quem pagou o pato quatro anos atrás foram Geraldo Alckmin, candidato a presidente, e os principais governadores da legenda. Aí o vácuo sugou Jair Bolsonaro, que calhou de estar no lugar certo na hora certa. Competência e sorte. Mas Bolsonaro não soube navegar bem na tempestade da Covid-19 e vem emagrecendo politicamente. O que anima os candidatos a sucedê-lo na turma dele.

 

Caro Editor:

No presente momento, repleto de “cientistas vacinadores”, tem uma filosofia dominante.

E que se resume a uma gozação que recebi de uma amiga.

Ela me enviou esta mensagem:

Tomei pílula anticoncepcional e engravidei.

Mas certamente teria engravidado de quíntuplos se não tivesse tomado.

Pois Lula parece consolidado na esquerda. Ciro Gomes que o diga. O desafio de todos jogadores é o mesmo: tomar para si a bandeira da prosperidade, a imagem de quem mais tem condição de levar o país, as famílias e as pessoas a uma vida melhor. Lula está em vantagem pelo currículo.[pelo currículo? possível... currículo de ladrão com múltiplas condenações, todas confirmada em múltiplas instâncias...;  pelo menos no Supremo vale como bons antecedentes ou pelo menos torna o ladrão uma vítima de ter sentado na vara errada; 
mas, o eleitor pensa diferente... ou não? ] Bolsonaro retém os fiéis ideológicos, procura trabalhar a má lembrança do segundo período Dilma Rousseff e também o fantasma das dificuldades econômicas enfrentadas por Venezuela e, em grau bem menor, Argentina. [Bolsonaro tem a seu favor, além da má lembrança acima citada e o fantasma também citado e recuperação da economia com o INEVITÁVEL FIM DA PANDEMIA.]

O presidente tem um problema adicional: não consegue se conectar às entregas de seus ministros, pela simples razão de não transmitir a impressão de estar voltado à operação governamental propriamente dita. Um exemplo extremo se dá nas tragédias causadas pelas chuvas. Agitar a própria bolha 24x7 ajuda a manter a base mais fiel, mas tem pelo menos um efeito colateral: não sobra espaço comunicacional para tentar capitalizar o que o governo efetivamente faz.

E a terceira via? Sergio Moro vem até o momento prisioneiro de um único tema, que nesta hora não leva jeito de ser a principal preocupação das pessoas: a corrupção. Ciro Gomes está encapsulado, tem seu público mas não consegue crescer para nenhum dos dois lados. E João Doria enfrenta uma certa descrença decorrente das pesquisas e de um desempenho relativamente inferior em São Paulo, quando comparado ao retrospecto de governadores tucanos paulistas candidatos a presidente.

Mas o jogo ainda está sendo jogado. E, de novo, vai ganhar quem conseguir associar-se à esperança de um futuro de prosperidade. Que obrigatoriamente estará vinculado ao desenvolvimento. Uma palavra ultimamente pouco lembrada. Mas cuja hora vai chegar. [que  começará a se manifestar alguns meses antes de outubro próximo - confiram.]

Alon Feuerwerker, jornalista e analista político 


sexta-feira, 24 de dezembro de 2021

Dia do Orgulho Hétero é aprovado, em 1º turno, pela Câmara de Cuiabá

POLÊMICA

De 16 vereadores presentes na sessão, apenas uma não foi a favor do projeto. Edna Sampaio (PT-MT) criticou a prioridade dos colegas em meio a fome da população, que faz fila por ossos 


 O autor da proposta, Marcos Paccola (Cidadania), diz que a lei irá evitar "ataques" de grupos "de ativismo homossexual" que obrigam um "comportamento bissexual" - (crédito: Câmara Municipal de Cuiabá)

Enquanto os moradores de Cuiabá dormem em fila para receber doações de “ossinhos”, a Câmara Municipal da cidade decidiu dedicar a última sessão da Casa a aprovar, entre outros, um projeto de caráter conservador. O projeto de lei que cria o Dia do Orgulho Hétero foi aprovado em primeiro turno pelos vereadores, nesta terça-feira (1/12). Se passar pelo 2º turno, os moradores do município poderão “celebrar” o dia todo terceiro domingo de dezembro.

Dos 16 parlamentares presentes, 15 foram favoráveis ao PL — oito não estavam na Casa na hora da votação. Eles apoiaram a justificativa do autor do projeto, o vereador bolsonarista tenente coronel Marcos Paccola (Cidadania), que afirma que a legislação evitará “ataques” de grupos de “ativismo homossexual”, que trazem “uma clara obrigatoriedade para que jovens e crianças tenham um comportamento bissexual”. “O que me fez propor essa lei foi uma conversa que tive com meu filho e sobrinhos, e fui revelado a algo que eu achei realmente assustador, de que na escola, para participar de determinados grupos, eles tinham que beijar meninos e meninas”, declarou ao defender o projeto no plenário da Câmara.

Foi quando o vereador percebeu que era preciso se opor à essa “desestruturação” do modelo tradicional de família.Falamos sobre o Dia do Orgulho Gay e não da existência do orgulho hétero. Então acabamos assistindo uma desestruturação que é algo que sabemos que faz parte de um marxismo cultural e do modelo tradicional de família”, pontuou. Apesar disso, ele afirma que tem amigos gays e que os direitos deles devem ser respeitados. 

A votação final — 2º turno — seria feita nesta quinta-feira (23/12), mas foi adiada para o próximo ano, após o recesso dos parlamentares. 

Única parlamentar contrária ao PL
..........
 
Edna também afirma que o projeto é uma forma de “sobrevalorizar quem já é valorizado, quem não tem problema nenhum de ser aceito e de se organizar no mundo”.

“Nós tivemos a capacidade de aprovar o Dia do Orgulho Hétero. O dia do orgulho daqueles que deveriam ter responsabilidade sobre os corpos daqueles que são vitimados por ser LGBTQIA+. Não é só feio, é vergonhoso. Eu não posso dizer que tenho orgulho de ser hetero quando as pessoas que não são estão sendo mortas justamente pelo fato de não serem”, declarou. [o complicador não é o fato de ser ou não ser gay - cada um é livre para fazer opções - e sim dos que são gays terem a pretensão absurda e ilegal de impor sua preferência sobre os demais, "o direito de cada um, termina onde começa o do outro".]

Correio Braziliense - MATÉRIA COMPLETA


quarta-feira, 24 de novembro de 2021

A confissão de Toffoli - Editorial

Gazeta do Povo

Quase um ano e meio depois de afirmar que o Supremo Tribunal Federal (STF) atua como “editor de uma nação inteira” no abusivo inquérito das fake news, o ministro Dias Toffoli atribuiu uma nova função à corte e que, assim como a de “editor”, não vem nem das leis, nem da vontade popular. Durante o 9.º Fórum Jurídico de Lisboa, o ex-presidente do Supremo afirmou que hoje o Brasil vive um “semipresidencialismo com um controle de poder moderador que hoje é exercido pelo Supremo Tribunal Federal. Basta verificar todo esse período da pandemia”.

A discussão sobre semipresidencialismo – um sistema em que o presidente da República divide formalmente poderes com o Legislativo, embora não a ponto de se falar na adoção do parlamentarismo – já vem de alguns anos e sempre retorna quando se observam impasses entre poderes, especialmente entre Executivo e Legislativo. Se há a constatação de que o Brasil de hoje já funciona em parte de modo semipresidencialista, é porque a Constituição de 1988, embora afirme que o Brasil é uma república presidencialista escolha ratificada pela população no plebiscito de 1993 –, teve entre seus redatores muitos adeptos do parlamentarismo, e que acabaram deixando sementes espalhadas pelo texto constitucional. Resultado disso é o dito “presidencialismo de coalizão”, em que o governante de turno precisa montar uma maioria parlamentar à base de muitas negociações, nas quais se recorre ao fisiologismo e à corrupção pura e simples. O que mais assusta na frase de Toffoli, no entanto, não é a menção à solução fora de lugar representada pelo semipresidencialismo, mas a um papel que o Supremo concedeu a si mesmo ao arrepio de qualquer previsão legal.

O passado recente bem demonstra a que ponto o Supremo se arrogou o papel de “superpoder”

Não existepoder moderador” de nenhum tipo no Brasil, e quem o afirma é o próprio Supremo. Em 2020, a corte havia sido chamada a esclarecer o papel das Forças Armadas na ordem institucional brasileira, e em liminar o ministro Luiz Fux (hoje presidente da corte) afirmou expressamente queinexiste no sistema constitucional brasileiro a função de garante ou de poder moderador: para a defesa de um poder sobre os demais a Constituição instituiu o pétreo princípio da separação de poderes e seus mecanismos de realização. O conceito de poder moderador, fundado nas teses de Benjamin Constant sobre a quadripartição dos poderes, foi adotado apenas na Constituição Imperial outorgada em 1824. Na conformação imperial, esse quarto Poder encontrava-se em posição privilegiada em relação aos demais, a eles não se submetendo. 
No entanto, nenhuma Constituição republicana, a começar pela de 1891, instituiu o Poder Moderador. 
Seguindo essa mesma linha e inspirada no modelo tripartite, a Constituição de 1988 adotou o princípio da separação de poderes, que impõe a cada um deles comedimento, autolimitação e defesa contra o arbítrio, o que apenas se obtém a partir da interação de um Poder com os demais, por meio dos mecanismos institucionais de checks and balances [freios e contrapesos] expressamente previstos na Constituição”.

Mais adiante, na mesma liminar, Fux afirma que “considerar as Forças Armadas como um ‘poder moderador’ significaria considerar o Poder Executivo um superpoder, acima dos demais”; ora, se é assim, não estaria Toffoli querendo fazer do Supremo esse “superpoder, acima dos demais”? E podemos perguntar mais ainda: não estaria o STF realmente agindo desta forma, acima dos demais poderes e acima das próprias leis, extrapolando completamente o seu papel de guardião e intérprete da Constituição Federal?

 
VEJA TAMBÉM:     Supremo sem freios (editorial de 14 de agosto de 2021)
    O apagão da liberdade de expressão no Brasil (editorial de 30 de agosto de 2021)
    A insegurança jurídica e o descrédito do Supremo (editorial de 11 de março de 2021)
    Vergonha para o STF, luto para o Brasil (editorial de 23 de março de 2021)


O passado recente bem demonstra a que ponto o Supremo se arrogou o papel de “superpoder”. Não bastando as inúmeras e constantes interferências nas funções dos poderes Executivo e Legislativo, a corte vem rasgando a Constituição e as leis ao promover um apagão da liberdade de expressão no Brasil, instaurar inquéritos abusivos nos quais o devido processo legal é ignorado, criar crimes sem previsão legal (como na recente equiparação da homofobia ao racismo), anular processos e decisões judiciais realizadas em completo respeito às leis penais e processuais, e inventar suspeições. Como afirmamos neste espaço em março de 2021, “quando a Constituição, a lei, a jurisprudência, os princípios legais e a coisa julgada são ignorados, entra em ação o voluntarismo. Já não existe uma única Constituição, mas tantas Constituições quanto magistrados.  
Já não existe jurisprudência, mas apenas as convicções e as conveniências de cada julgador. E, no Brasil atual, poucas instituições têm representado esse caos judicial de forma tão intensa quanto aquela que deveria ser a principal guardiã da Carta Magna e da segurança jurídica”.
 
A confissão de Toffoli pode fazer corar Montesquieu, o grande teórico iluminista da tripartição de poderes, mas já fora prevista muitos séculos antes pelo poeta romano Juvenal, que nas suas Sátiras questionava: quis custodiet ipsos custodes?, o que poderia ser traduzido como “quem vigia os vigilantes?”, ou “quem guardará os guardiões?”.  
Sem os limites que o bom uso dos freios e contrapesos traria, a tendência dos ministros do Supremo é realmente se tornarem um superpoder que decide como bem entende, sem ter de prestar contas a ninguém. E então a ressalva de que “presidir o Brasil não é fácil” soa ainda mais sarcástica, já que agir como um superpoder, decidindo como se bem entender, sem precisar negociar nada com ninguém ou sem prestar atenção a lei alguma, é a coisa mais fácil que há.


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Editorial - Gazeta do Povo


domingo, 10 de outubro de 2021

“O QUE VOCÊS TÊM AÍ?” - Percival Puggina

Telefonei para um querido e velho amigo, jurista dos bons. A essas credenciais, ele soma invejável talento para analisar política. Eu queria ouvi-lo, depois de ano e meio sem conversarmos. Impressionou-me vivamente o que falou, autorizando-me a reproduzir, como farei abaixo, sintetizando hora e meia de sua dissertação.

Na opinião do meu amigo, o 7 de setembro não foi convocado para que algo acontecesse em favor do presidente da República, mas para conter iniciativas que o ameaçavam.  
Com base instável na Câmara dos Deputados e tendo contra si a maioria do Senado, o STF e os grandes grupos de comunicação, o presidente precisava conter inimigos que avolumavam suas ações desde o início do mandato, buscando impedi-lo de disputar (à facada), assumir (ações no TSE), governar (boicotes políticos e administrativos) e cumprir o mandato (impeachment). 
 
No início de agosto, no auge da pressão, o presidente reagiu jogando toda sua força política na convocação do povo para as  manifestações nacionais do dia 7 de setembro. Prometeu comparecer, falar e ouvir a população. Jogou pesado na atração de seus apoiadores.Entenda-se a estratégia.  
É sabido que não há impeachment sem multidão na rua e o presidente mostrou suas cartas.  
Ah, jogavam pôquer? Pois as dele ficariam abertas sobre a mesa. Foi como se dissesse: “O que vocês têm aí?”. Pagou para ver. 
 
Ergueram-se contra o evento do dia da Independência todos os grandes meios de comunicação, gastando tempo em esforços para desmobilizar a população. Apelaram para o terrorismo. 
Prenunciaram violência, ações contra a democracia e riscos graves, buscando criar um ambiente psicológico de medo e rejeição. 
Mulheres e crianças eram insistentemente aconselhadas a não comparecer. Gente poderia morrer!

Impossível estimar o número de pessoas que, em virtude disso, deixaram de comparecer. Mesmo assim, milhões de brasileiros foram às ruas sem que um vidro sequer fosse quebrado, sem que um carro fosse arranhado, com as autoridades policiais sendo aplaudidas e com preces sendo dirigidas a Deus. À vista de todos, a mentira circulou de pernas curtas e de muletas. Muitas estratégias oposicionistas entraram em colapso naquele dia. [esqueceram até de mostrar na TV a simulação de panelaços!!!]

Derrotada no dia 7, a mídia amiga da oposição assumiu a publicidade da manifestação pelo impeachment agendada para o dia 12 de setembro. Como nunca se viu antes, fez eco às convocações, listando cidades e locais. Se participar do apoio ao presidente fora um perigo, ir às ruas pelo impeachment seria algo sereno, tranquilo como um entardecer na lagoa.

Só o fracasso foi clamoroso.  Tão clamoroso que teve que ser admitido. O impeachment morreu ali. Junto com ele, perderam força quaisquer ações oposicionistas que precisem de apoio popular, ou tragam para a rua, novamente, as cartas perdedoras exibidas no dia 12 do mês passado. "O que vocês têm aí?”. É assim na democracia, não?

É apenas uma análise, mas dela se pode dizer, como Giordano Bruno: “Se non è vero, è molto ben trovato” (se não é verdade, é muito bem achado).

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


quinta-feira, 2 de setembro de 2021

O Usain Bolt da ladroagem - Augusto Nunes

Único preso da Lava Jato ainda na cadeia, Sérgio Cabral bateu o recorde de Marcola

  
Lula e Sergio Cabral
Lula e Sergio Cabral -  Foto: Reprodução 
[não resistimos a um comentário:  esse olhar terno, carinhoso, de admiração (para dizer o mínimo) do coxudo Lula (segundo Merval Pereira em "as coxas do Lula") nos leva a expressar nosso entendimento do quanto a cadeia aproxima os criminosos.]
 
A façanha que tornou Sérgio Cabral merecedor de uma sala exclusiva na ala principal de um futuro (e obrigatório) Museu da Bandalheira no Brasil foi ignorada pelas primeiras páginas dos jornais, não viralizou na internet nem foi aplaudida de pé por toda a população carcerária. Em julho passado, o ex-governador do Rio de Janeiro desbancou Marcos Camacho, o Marcola, da liderança do ranking dos bandidos condenados a mais tempo de cadeia. A marca estabelecida pelo chefão do PCC — 330 anos de gaiola — parecia insuperável até a entrada em cena desse Usain Bolt da ladroagem
 
Com inverossímeis 390 anos 60 de vantagem sobre o rival —, Cabral tem tudo para ampliar a distância.  
Há quatro anos numa cela do presídio de Bangu 8, ainda não se sabe tudo o que fez. 
Qualquer que seja o recorde mais espantoso estabelecido pelo gatuno de altíssimo rendimento, é difícil entender por que só ele, entre os mais de 550 fora da lei pilhados pela Operação Lava Jato, permanece preso em regime fechado? 
Por que só a Cabral o Supremo Tribunal Federal tem negado sistematicamente a liberdade concedida a tantos patifes juramentados? [há alguns dias fizemos comparação  entre um patife juramentado - com previsão de mais de 150 anos de cana, por baixo, já que ele é como diz o articulista "capitão da seleção de larápios" (quase um terço da soma das penas aplicadas ao Cabral até agora) e deduzimos que o patife juramentado por ter dado a sorte de sentar na vara errada, logo ganharia a liberdade. 
Já o Cabral deu azar e o sentaram na vara certa, e tudo indica que não será beneficiado nem por aquela norma que impede que um criminoso fique preso por mais de 30 anos.] 

É verdade que uma soma de penas equivalente a três séculos e meio não é para um salafrário qualquer. Mas ninguém vive tanto tempo, e no Brasil nem Jack, o Estripador poderia ultrapassar o limite dos 30 anos de cadeia. Também é certo que a rede criminosa tecida por Cabral envolveu todo o secretariado, a Assembleia Legislativa, a magistratura, o Ministério Público, o Tribunal de Justiça, o Tribunal de Contas, grandes empresários, entidades de classe e agregados em geral, além de 50 vizinhos pra cá e 50 pra lá. Nenhum cofre público livrou-se do saque. Ainda assim, a taça reservada ao maior esquema corrupto do mundo está na sala de troféus de Lula, capitão da seleção de larápios que planejou o Petrolão. 

É possível que o pecado capital do ex-governador tenha sido a inclusão do ministro Dias Toffoli no elenco que apimentaria sua delação premiada. “Quem acusa um juiz do Supremo está ofendendo a instituição”, avisou o presidente da Corte, Luiz Fux, ao apoiar a prisão do deputado Daniel Silveira e do presidente do PTB, Roberto Jefferson. Quando Cabral se dispôs a contar tudo o que sabe, (Como Toffoli ganhou o apelido ‘amigo do amigo de meu pai’) não estava tão claro que, aos olhos dos integrantes do Pretório Excelso, mexer com um é mexer com todos. O próprio Timão da Toga tratou de sepultar o acordo.

Grogue com a sucessão de contragolpes, Cabral vai-se rendendo às evidências de que, mesmo com a Lava Jato algemada pela aliança entre réus, parlamentares com culpa no cartório e juízes cúmplices, o Brasil não voltou a lembrar o imenso viveiro de condenados à perpétua impunidade. Naquele país obsceno, o vigarista que se elegeu governador em 2006 e renovou o mandato em 2010 viveu seus anos dourados, eternizados em vídeos que mostram em ação um astro do bloco Sabe Com Quem Está Falando? Em outubro de 2012, por exemplo, um repórter da TV Globo perguntou-lhe se temia a surpreendente quebra do sigilo bancário da Construtora Delta, pertencente ao amigo e patrocinador Fernando Cavendish. “Imagina! Por que que eu temeria?”, irrita-se o reizinho do Rio. “Por que que eu temeria?”, repete a voz de soprano. “Acho até um desrespeito da sua parte me perguntar isso. Uma coisa é a relação pessoal que eu tenho com empresários ou não empresários, outra coisa é a impessoalidade da decisão administrativa”.

Sérgio Cabral transformara a galeria C do Presídio de Benfica num hotel com grades.

Em outras cenas deprimentes, Cabral debocha do menino negro que se negara a enxergar o Rio Maravilha que o governador exibia ao amigo Lula, assassina o idioma inglês na Sapucaí para apresentar Dilma Rousseff a uma Madonna perplexa, louva num palanque casos de polícia em campanha eleitoral, diverte-se num restaurante em Paris no meio de um bando que celebra a pandemia de propinas com o rosto coberto por guardanapos, capricha no sorriso abobalhado ao ouvir Lula comunicando aos ouvintes que o eleitorado do Rio tinha o dever moral de votar no vigarista a seu lado. A vida em companhia de Adriana Ancelmo, a quem chamava de Riqueza, que chamava o maridão de Meu Anjo, era uma festa permanente. A direção dos ventos mudou com as grandes manifestações de protesto de 2013, o olho do furacão chegou junto com a polícia às 6 da manhã, mas mesmo depois de instalado em Bangu 8 Cabral não enxergou as dimensões do desastre.

Poucas semanas depois do confisco do direito de ir e vir, o Ministério Público fluminense constatou que o prisioneiro Sérgio Cabral transformara a galeria C do Presídio de Benfica num hotel com grades. 
Os colchões esbanjavam conforto, os lençóis eram muito mais brancos. Sobrava em todos os aposentos a água que faltava nas celas comuns. 
As dependências do chefe dispunham de halteres, chaleira, sanduicheira, aquecedores, corda para crossfit e comida de restaurante cinco estrelas. 
O cardápio selecionado por Cabral oferecia três tipos de queijo francês: Babybel, Saint Paulin (embalado em bolinhas e vendido a R$ 279 o quilo) e Chavroux (feito à base de leite de cabra e orçado em R$ 230 a R$ 300 o quilo). O presunto fabricado na região do Porto exibia a grife portuguesa Primor e podia ser encontrado nas melhores lojas do ramo por R$ 225 o quilo. Os potes de castanhas especiais do Pará custavam R$ 120 o quilo. 
O serviço se estendia à cela da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo, presa um andar acima do marido. Agora casada outra vez, Riqueza reivindica na Justiça a posse da casa que dividia com Cabral para ali morar com o novo marido.

A capitulação ocorreu dois anos mais tarde. Em mais uma audiência com o juiz Marcelo Bretas, que tratara com rispidez nos primeiros encontros, o ex-governador muitos quilos mais magro demitiu a arrogância e declarou-se culpado. Com uma atenuante não prevista nos códigos legais: roubara uma imensidão de reais por ser “viciado em poder e dinheiro”. O tiro parece ter saído pela culatra por uma bela, boa e simples razão: se existe mesmo essa espécie de vício, a cura está em longas temporadas na gaiola. Dependente ou não, poucas vezes se viu alguém juntando tantas propinas para enfrentar possíveis crises de abstinência.

Em 2011, histórias sobre a vida principesca do casal já iluminavam a face escura de Sérgio de Oliveira Cabral Santos Filho. Numa noite de segunda-feira, o jornalista Sérgio Cabral, pai do governador, foi entrevistado no programa Roda Viva, então comandado por Marília Gabriela. Participei da conversa. A certa altura, o entrevistado queixou-se de notícias que não melhoravam a imagem de Serginho, contou que frequentemente escondia da mãe os jornais, reiterou a confiança na honradez do herdeiro e afirmou que o considerava o melhor governador que o Rio já tivera. Hoje com 84 anos, o jornalista está perdendo a guerra contra o mal de Alzheimer. Quando alguém se refere a Serginho, diz que o filho morreu.

Continue lendo: Onze homens e nenhum segredo:

Leia também “A suprema sem-vergonhice”

Augusto Nunes - Revista Oeste 

 

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

O desafio - Alon Feuerwerker

O desafio do momento no Brasil é fazer a vacinação completa avançar mais rapidamente. Na comparação com países que começaram a vacinar mais cedo, já emparelhamos quando o tema é a primeira dose. Mas ainda estamos atrás na aplicação da segunda (leia).

Isso fica ainda mais relevante quando dois movimentos convergem: a reabertura acelerada das atividades econômicas e a provável chegada com mais intensidade da variante Delta, que aparentemente surgiu na Índia e caminha para ter a hegemonia planetária.

O cenário mais provável é o Brasil enfrentar uma nova onda de casos, mas, a crer no observado em outros países, a curva de mortes não acompanhar. Por causa da combinação de fatores, como alguma imunização natural, muita vacinação e uma população relativamente mais resistente ao agravamento da doença.

Só uma coisa é certa: mesmo com o aumento previsto no número de casos, as condições políticas e sociais para novos lockdowns são bem mais baixas que nos outros dois momentos quando as ondas começaram a avolumar por aqui nesta pandemia.

Alon Feuerwerker, analista político e jornalista


sábado, 7 de agosto de 2021

Demoraram, hein?! - Carlos Alberto Sardenberg

Reação  - Foi muito bom o conjunto de reações ao presidente. Mas demoraram, hein?

Vão me desculpar, mas tenho de citar a coluna de sábado passado — “Os crimes do presidente: quem vai punir?”.  Em linguagem simples, dizia o seguinte: Bolsonaro passa dos limites todos os dias, e ninguém vai fazer nada?

Bom, fizeram, em três atos.

[Bom? bom em que? adiantou alguma coisa? afinal o imbróglio continua, já que o TSE, se arvorou em 'dono' do sistema eleitoral, bem ao estilo: "é nosso, fazemos o que nos der na telha, conforme nossa vontade e não temos que prestar contas a ninguém", e na condição de 'dono' simplesmente não aceita colocar mais uma cadeado na porta, que pode ser arrombada = não estamos dizendo que foi arrombada ou afirmando que será arrombada, apenas PODE ser arrombada e nada justifica a resistência a um aumento da segurança.
Na hora em que o TSE aceitar que não é Poder Legislativo e não tentar impor a vontade dos seus 'donos', deixando que o Congresso Nacional decida soberanamente sobre o tema, a confusão se acaba. O que o Congresso Nacional decidir,  estará decidido e deve ser acatado. Proceder de tal forma é respeitar a democracia.]

Primeiro, o Tribunal Superior Eleitoral, por unanimidade, incluiu o presidente num inquérito que poderá levar à cassação da chapa de 2018 (Bolsonaro/Mourão) ou apenas do cabeça de chapa. [se o inquérito provar que ocorreram crimes na campanha de 2018, a punição está prevista em lei; aliás, tal inquérito deveria ter sido até concluído.]

Depois, veio o manifesto de empresários, banqueiros, líderes religiosos, economistas, ex-ministros, ex-presidentes do Banco Central, intelectuais, artistas, enfim, uma potente tomada de posição do capital, do PIB e da sociedade civil. [qual o valor da opinião desses manifestantes de sofá?]  O manifesto não cita o nome de Bolsonaro — não queriam fulanizar, disseram alguns signatários —, mas é obviamente contra ele e suas ameaças à democracia e ataques ao sistema eleitoral.

E, já que foi assim, digo eu, deveriam, sim, ter fulanizado. Tem um fulano bem determinado que está ameaçando golpes. De todo modo, o movimento se espalhou rapidamente, saiu de 260 assinaturas iniciais para 7 mil em três dias — e continua recebendo adesões no site eleicaoseresspeita.org.Enfim, cabe aqui um “antes tarde do que nunca”, como registraram alguns pesos pesados do mundo econômico. Houve broncas ao pessoal do mercado financeiro, muito “leniente” diante da aproximação de uma dramática crise institucional. [garimpamos no site do Puggina, o magistral comentário, adiante, que corrobora nosso entendimento do valor ZERO do "manifesto dos manifestantes de sofá" - somem 250, 260, 100.000, etc: "Que importância pode ter a opinião das 250 - ou seja lá quantas forem - "personalidades"? Desde quando popularidade é critério de aferição de verdade científica? A maioria pode, e deve, escolher um governo, (é o seu direito, deve ser respeitado), mas não há garantia de que escolha certo; há exemplos gritantes na História do contrário. Mas sobre a confiabilidade de um processo tecnológico, o quê entendem eles? São esses que assinam que me darão lições? São eles que estarão comigo quando chegar a hora em que Deus vai me julgar? Claro que não - então, que estes presunçosos e vãos "assinadores de manifestos" recolham-se à sua insignificância - darei às suas opiniões o merecido valor (nulo) Fernando A. O. Prieto"]

No terceiro movimento, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Luiz Fux, fulanizou na veia. Praticamente rompeu relações com o presidente da República ao cancelar a reunião entre os chefes dos três Poderes que ele mesmo, Fux, havia arranjado. Disse que fazia isso porque Bolsonaro se tornara uma ameaça à democracia e a seu pilar, o sistema eleitoral. Agora, Bolsonaro é alvo de três inquéritos, mas com um enorme obstáculo para o prosseguimento deles. O presidente só pode ser denunciado pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, que, em vez de defender a sociedade e o estado de direito, tornou-se um quase advogado de Bolsonaro.

Fux chamou Aras para uma conversinha ontem. Ambos deram notas anódinas sobre a reunião, mas é óbvio que o presidente do STF não chamaria o PGR, neste momento, para tratar de abobrinhas. Claro que cobrou uma conduta responsável. Parece que o inquérito do Tribunal Superior Eleitoral poderá caminhar sem a intervenção do PGR. A ver. A reação aos desmandos de Bolsonaro ficou tão nítida que o vice Mourão praticamente se candidatou a presidente. Ele disse que a polarização Bolsonaro x Lula não é boa para o país porque há muitos eleitores que não querem votar nem em um nem no outro. Logo, um terceiro nome poderia atender esse eleitorado. Não poderia ser mais claro.

Claro, muito difícil ele conseguir montar essa candidatura para 2022. Mais possível (provável?) que seja chamado, antes disso, para um mandato tampão. Bolsonaro sofreu ainda uma outra derrota, a derrubada da proposta do voto impresso numa comissão especial da Câmara dos Deputados. Mesmo assim, o presidente da casa, Arthur Lira, pretende levar o projeto direto à votação em plenário.   Quer agradar ao presidente Bolsonaro, que, desse modo, pode não vetar o bilionário fundo eleitoral. [a decisão do Plenário sendo favorável ao voto auditável, deverá ser acatada, respeitada e a PEC     ser encaminhada ao Senado da República, onde se espera o loquaz senador Pacheco não emperre a tramitação.]

Não parece uma jogada viável, pois o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, já disse que lá não passam nem o voto impresso nem outras mudanças no sistema eleitoral tramadas na Câmara. Jogo em andamento, pois. É uma barbaridade. No momento em que a população sofre com a pandemia, a inflação, a instabilidade econômica, a falta de perspectiva para novos empregos, a falta de aulas especialmente para os alunos mais pobres — a cúpula do poder se engalfinha em torno de questões próprias. E o presidente Bolsonaro propositadamente sabota e tumultua. [indubitavelmente, o presidente Bolsonaro atua em reação à postura injustificável do ministro Barroso de transformar sua rejeição à adição de uma segurança adicional ao voto via urnas eletrônicas em algo pessoal. Faz campanha contra, quer a qualquer custo, impor sua suprema vontade.]

Tudo considerado, foi muito bom o conjunto de reações ao presidente. Continuamos diante de uma crise institucional, mas setores cruciais da sociedade e do Judiciário tomaram posição.

Mas demoraram, hein? Tomara que ainda esteja em tempo.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista

Coluna publicada em O Globo - Economia 7 de agosto de 2021


terça-feira, 23 de fevereiro de 2021

Ditadura da toga - Ditadura não começa só com golpe, pode surgir de ataques à liberdade de expressão - Vozes - Gazeta do Povo

Cristina Graeml

Ditaduras nem sempre começam com golpe como costumeiramente se pensa. Nem sempre partem de uma ação orquestrada por grupos poderosos com apoio das Forças Armadas e às vezes até da população. Há tiranos eleitos disfarçados de democratas, que depois não abrem mão do poder e nele se perpetuam corrompendo os demais poderes e promovendo eleições fraudulentas. E há tiranias veladas, infiltradas em democracias, que se firmam conforme vão minando as liberdades individuais e depois avançam sobre o poder.

Trago para a coluna de hoje, com versão em vídeo, parte da história de um imigrante venezuelano no Brasil que já contei nesta coluna em artigo publicado nesta quinta (18). Ela me fez ver semelhanças entre a tirania praticada pelo governo de Nicolás Maduro e o cada vez mais claro autoritarismo de parte do Judiciário brasileiro.

Essa história traz lições importantes sobre o que pode acontecer a uma nação sem liberdade sequer para se manifestar. E justamente na semana em que vimos os ministros do Supremo Tribunal Federal avançarem sobre a liberdade de expressão e a imunidade parlamentar, num claro desrespeito à Constituição.

Ditadura na Venezuela
Se você leu a entrevista com o professor universitário Pedro Pérez (nome fictício por questões de segurança) sugiro que avance no texto, mas trago um pequeno resumo aqui, com a recomendação a quem não leu para que volte à coluna e conheça melhor a história.

“Venezuela não é socialista, aquilo é comunismo”, diz professor que fugiu de Maduro

Na Venezuela, onde morou até novembro de 2018, o professor tinha um segundo emprego como agente penitenciário. Com a recessão, que trouxe fome e miséria extrema, as manifestações contra o governo se tornaram comuns e Maduro decidiu resolver o problema com seguranças armados.  Foi assim que agentes penitenciários foram convocados a trabalhar na rua, usando a força contra quem protestasse e atuando junto às milícias armadas, os chamados coletivos - formados por criminosos que foram soltos sob a promessa de combater ataques ao governo.

Como recusou-se, Pedro foi acusado de traição à Pátria, crime com pena prevista de 30 anos de prisão. E passou a ser perseguido. Decidiu fugir às pressas em direção à fronteira mais próxima (Roraima) no dia em que teve a casa incendiada pelas milícias. Veio acompanhado apenas dos filhos. Não houve tempo sequer de encontrar a esposa ou outros parentes. Há dois anos vive escondido, trabalhando em subempregos, já que é impossível tirar a 2ª via dos diplomas universitários para tentar validação no Brasil.

É apenas uma entre centenas de milhares de histórias de dor e injustiça. Segundo a ONU pelo menos 3 milhões de venezuelanos, o equivalente a 10% da população, deixaram o país nos últimos anos. Nem todos por causa de perseguição política; mas todos, sem exceção, fugindo da fome e da miséria nesse lugar que alguns ainda tentam vender como paraíso socialista.

Mentiras e verdade
Muitos brasileiros não entendem a dimensão da tragédia da Venezuela, porque são enganados por narrativas mentirosas de políticos de esquerda aqui do Brasil, que apoiam o ditador venezuelano. É gente que se deixa doutrinar por uma alucinação ideológica e parece perder por completo a empatia; fica incapaz de se colocar no lugar de uma população que corre atrás dos caminhões de lixo para procurar o que comer. A fome chegou a esse ponto na Venezuela!

É um país onde nem os necrotérios funcionam mais por falta de energia para manter as câmaras frigoríficas ligadas; onde o salário mínimo é equivalente a 60 centavos de dólar, mais ou menos uns 3 reais. E onde um quilo de frango custa 10 dólares, mais de 50 reais. O salário de um ano inteiro não é suficiente pra comprar um quilo de frango. A situação de miséria do povo deixa claro que esse socialismo dos discursos da esquerda é uma mentira: não socializa nada, só a pobreza. E na Venezuela é tirano, violento, usurpador de direitos da maioria em proveito de poucos.

A Venezuela segue nas mãos de milícias comandadas por um ditador que não tem qualquer respeito pelo Estado Democrático de Direito. Maduro é acusado de corromper generais para ter o controle do Exército e de fraudar eleições. Ele tomou conta da Assembleia Nacional e sabe-se lá a que custo, conseguiu o apoio da Suprema Corte.  
Não à toa ninguém mais confia no Judiciário venezuelano, que manda soltar presos condenados ao mesmo tempo em que faz vista grossa para prisões arbitrárias de adversários políticos, cada vez mais comuns.

Viu alguma semelhança aí com o Brasil?

Ameaças às liberdades e à democracia
A essa altura todos sabemos que a vida na Venezuela virou um inferno. Quem se informa não se deixa enganar pelos discursos da esquerda, que tentam amenizar o estrago feito pelo populismo de Hugo Chávez, depois transformado em ditadura pelo sucessor Nicolás Maduro. Mesmo com o fechamento de jornais e emissoras de rádio e TV e todas as tentativas de esconder o óbvio, há muita fonte de informação disponível: de vídeos no YouTube a relatos nas redes sociais, quase todos publicados pela imprensa estrangeira ou por venezuelanos que fugiram do país.

Não há mais imprensa livre na Venezuela e ainda que a cobertura da mídia estrangeira seja esporádica, é impossível não entender no que deram os ataques às liberdades de expressão, manifestação e de imprensa. Está tudo descrito nos relatórios produzidos pelos observadores da ONU: perseguições, prisões arbitrárias, desemprego e fome estão por trás da fuga em massa da população.

Aqui cabe um parênteses. A situação parece distante, por isso pouca gente se dá conta, mas a imigração de 3 milhões de pessoas num país em que a população era de cerca de 30 milhões é algo assombroso. É como se 20 milhões de brasileiros saíssem do Brasil, caso vivêssemos uma crise de proporções venezuelanas. O Brasil já enfrentou períodos de hiperinflação, falta de emprego, de segurança e saúde. Mas mesmo com crises econômicas severas, a maior delas bem recentemente (da qual ainda nem conseguimos nos livrar, porque a pandemia segurou o crescimento que vinha sendo registrado), nunca tivemos uma fuga em massa.

Olhando as atuais ameaças às nossas liberdades, porém, não é difícil pensar no que o Brasil pode se transformar, não por força de um governante tirano, mas de um Judiciário autoritário. Na Venezuela a deterioração da democracia não aconteceu de uma hora para a outra. Foi resultado de várias políticas erradas, que no início eram aceitas pela população. Escolheram governantes que fizeram o Estado ficar gigante, estatizaram as empresas para que o governo fosse “dono” da maior parte dos empregos e assim ficasse com a população na mão. É praxe governos populistas se apoderarem de tudo, transformarem estatais em cabides de emprego e, com isso, ganharem legiões de militantes cegos. Depois vem a fase de sugar as riquezas do país com uma gestão corrupta e irresponsável. De repente estão tomando até a liberdade das pessoas. Sem liberdade ninguém tem força ou voz para reclamar de nada.

Semelhanças com o Brasil
Agora pense no Brasil deste início de 2021 e lembre das atitudes arbitrárias do Judiciário, especialmente no caso mais recente, do deputado que falou demais e foi calado à força. Não vou entrar no mérito do que ele disse, mas no que o STF fez, fingindo não saber que deputados têm imunidade parlamentar e decretando uma prisão inconstitucional.

Não foi a primeira vez que ministros do Supremo Tribunal Federal rasgaram a Constituição. Em 2016, presidindo o julgamento do impeachment da então presidente Dilma Rousseff, o ministro Ricardo Lewandowski decidiu manter os direitos políticos dela, ignorando o que está previsto na lei como punição para políticos que cometem crime de responsabilidade fiscal.

Foi um agrado para o grupo político que pôs no STF a maior parte dos atuais ministros; o mesmo grupo que quase transformou o Brasil numa Venezuela, com corrupção em órgãos e empresas públicas, inflando e endividando o Estado, afundando o país numa crise econômica sem precedentes e gerando desemprego recorde. Ao perder o poder esse grupo passou a chamar os adversários políticos e todos os seus apoiadores de fascistas e tiranos. É sempre a mesma ladainha. 
E o engraçado (se é que dá para usar essa palavra numa situação assim) é que de repente começamos mesmo a ver algo parecido com tirania e fascismo, mas não vindo de quem eles acusam de ser tirano e fascista e sim, da Suprema Corte.

Não à toa falam hoje em ditadura da toga, aquela que solta bandidos condenados e perigosos ao mesmo tempo em que persegue e manda prender quem cometeu o "crime hediondo" de falar demais, mesmo que tenha imunidade parlamentar. Para isso existem outras punições, até perda de mandato por falta de decoro, mas prisão por crime de opinião só existe em ditaduras. Viu como as coisas começam? Na Venezuela as primeiras perseguições também foram por crime de opinião "cometidos" por adversários políticos. A diferença é que lá o Judiciário decretava prisões de adversários políticos do governo e não de partidários do governo, como está acontecendo no Brasil.

Ditadura de direita?
Estranhamente os adeptos da tirania por aqui agora tentam confundir a população com um discurso novo sobre a Venezuela, dizendo que o país está sim sob um regime ditatorial, mas é uma “ditadura de direita”. A declaração, feita pelo ministro do STF Luís Roberto Barroso nem chegou a surpreender. Sim, esta é a pior parte: a gente nem se surpreende mais quando ouve uma declaração desse tipo vinda de um ministro do Supremo. Surpreendente é alguém defender essa ideia.

Como pode ser de direita um ditador que comemora publicamente o aniversário de nascimento de Karl Marx? 
Maduro fez isso no Twitter. 
Como pode ser de direita alguém que faz parte do Foro de São Paulo, a aliança dos esquerdistas radicais da América do Sul? 
Ou que tem fotos com todos os líderes esquerdistas dos países vizinhos?

O ministro Barroso tentou associar o fracasso da Venezuela à forma
de governar da direita, mas não conseguiu.
A esquerda brasileira vive declarando apoio ao regime tirânico da Venezuela, justamente por ser de esquerda. A declaração do ministro Barroso foi tão absurda que os deputados do PT não tinham como concordar, preferiram o silêncio mesmo. A pergunta que ficou no ar é: se o PT apoia abertamente o governo Maduro, que é uma ditadura (o próprio ministro Barroso reconheceu), mas de direita, então o PT apoia a direita desde que seja uma ditadura?

Como vimos, de novo sem nenhuma surpresa, petistas e demais representantes da esquerda ficaram calados. Só voltaram a gritar para apoiar a atitude autoritária, sem sentido e inconstitucional dos ministros do STF contra o deputado que abusou das palavras e foi preso por emitir opinião sobre a politização dos ministros da Suprema Corte.
 
[o mais constrangedor, assustador, imobilizador e outras definições adequadas, que quase sempre terminam em dor, é que toda a matéria, expressa a verdade e mesmo assim não temos a quem reclamar.
 
Quem está acima do Supremo?
 
Uma hipótese: se a prisão da da autora da matéria fosse decretada por crime contra a Lei de Segurança Nacional (afinal ela ousa criticar o Supremo) a quem poderíamos recorrer? ao próprio Supremo?] 

Isso num momento em que estão soltos o deputado flagrado com dinheiro na cueca e a deputada acusada de mandar matar o próprio

 marido, amparados pela imunidade parlamentar que não serviu ao colega sem papas na língua.  Está cada vez mais claro o que é uma tirania de verdade (e não um fascismo imaginário). E como começa uma ditadura: com ataques à liberdade de expressão, depois à liberdade de manifestação, de ir e vir, de estudar ou trabalhar. Não fique calado. Fale enquanto é possível. Ou vamos deixar o Brasil virar uma Venezuela?

Cristina Graeml, colunista - Gazeta do Povo  - VOZES