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sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

O país do privilégio - Merval Pereira

O Globo

O país do privilégio e a fraude na vacinação

Nada mais ignominioso do que as notícias que pipocam dando conta de que em diversos estados brasileiros está havendo fraude na vacinação contra a COVID-19. Pessoas que não fazem parte da primeira leva dos grupos de risco furam a fila para garantirem para si ou familiares o privilégio de serem vacinadas, numa pandemia que testa a nossa solidariedade como humanos e que depende da atitude de cada um para que o conjunto dos cidadãos possa sobreviver à crise sanitária.
[O poder do Exemplo: grande parte dos órgãos de imprensa tentam atribuir  ao presidente Bolsonaro responsabilidade pela mortandade causada pela covid-19. Atribuem à loquacidade do presidente, que algumas vezes adentra à incontinência verbal, serve de exemplo aos brasileiros e com isso a pandemia avança.

Mas neste mau exemplo o STF se superou - assunto amplamente noticiado.
Se a Suprema Corte, tenta furar a fila de vacinação, que dizer dos 'apadrinhados'  por prefeitos e governadores. O correto é que  governador, prefeito, ou seus subordinados e aspones, flagrado furando a fila seja punido com rigor.
 
Felizmente, o STF desistiu de punir quem os que não aceitarem se vacinar. Seria uma medida absurda - especialmente pela não disponibilidade abundante do imunizante  - e que iria resultar no CAOS CAÓTICO que predominou no combate à covid-19, decorrente da decisão que atribuiu aos governadores e prefeitos o protagonismo no combate ao coronavírus. 
Ademais, nos parece não existir legislação estabelecendo punição - teriam que se valer do recurso de punir por analogia (seria algo do tipo: recusar a vacina contra a covid-19 é crime análogo ao .....'estupro', 'propagar doença contagiosa', 'racismo'... ) recurso não aceito em matéria penal e que seria implantado mediante decisão judicial = invadindo a competência privativa do Poder Legislativo.
Também seria uma bagunça, por abrir espaço para um governador proibir furar a fila e um prefeito permitir a prática e vice-versa.]

No Brasil fragilizado pela desorganização de um governo incompetente, que deveria ser responsabilizado pelo retardamento do programa de imunização nacional, há alguns muitos mais iguais que os outros. O atraso na chegada das vacinas e dos insumos, devido a problemas causados por uma política externa nula, e uma ação descoordenada do ministério da Saúde entregue a um General que nem sabia o que era o SUS quando assumiu,  cada dia cobra o pedágio em mais de mil vidas, e é esse número alarmante de mais de 200 mil mortes que deveria fazer com que o governo fosse culpado pela negligência no trato da pandemia e os “espertos” de sempre fossem punidos vigorosamente.

O Ministério Público está investigando casos acontecidos em pelo menos sete estados, em que o privilégio foi concedido a filhos, amigos, parentes de autoridades locais, sem falar nos prefeitos que furam a fila afirmando que estão dando o exemplo. Com o número ínfimo de doses de vacina enviado para cada município, a valorização  do imunizante fez com que se criasse um criminoso mercado paralelo de prestígio, e logo veremos denúncias de pessoas que subornaram para serem vacinadas à frente das que estão na lista de prioridades. [falando na lista, excelente que os profissionais de saúde, especialmente os da linha de frente - não apenas do front de combate à covid-19 e sim dos que tem qualquer contato com doentes (o profissional de saúde pode trabalhar na área de socorro a acidentados e encontrar um portador do coronavírus).
Felizmente desistiram, pelo menos por agora, de priorizar presidiários = estes não precisam de serem vacinados com prioridade,  pelo simples fato de que sendo a lei cumprida, estão sujeitos ao isolamento compulsório - reclusão = regime fechado.
Outra prioridade indevida é a concedida a índios que vivem em aldeias e a quilombolas sem comorbidades; qual a razão da injusta concessão? índios que vivem em aldeias, se supõe que vivem isolados, convivendo apenas com os da aldeia!!!  
- qual a razão de um quilombola, digamos com 62 anos, sem comorbidade, ter prioridade em relação a um não quilombola com 70 anos? pergunta válida para indígena que está sendo vacinado fora da aldeia? 
A TV mostrou índios jovens, sem comorbidades, 'furando' fila com dezenas de profissionais de saúde sendo preteridos.]

Uma lista, aliás, que terá que ser refeita, pois não há vacinas para todo o grupo, e alguns municípios estão distribuindo literalmente meia dúzia de doses para os postos de vacinação. Centro da crise humanitária mais grave dessa pandemia, Manaus teve que suspender a vacinação para reorganizar as prioridades.  As doses de Coronavac que chegaram ao estado nesta semana são suficientes para vacinar somente 34% dos profissionais de saúde que atuam no estado, que sofre há dias com a falta de oxigênio e de insumos para vacinação. Mas as filhas do dono de uma das maiores universidades privadas de Manaus, no Amazonas, já estão protegidas pela primeira dose, pois não apenas furaram a fila, como exibiram seus troféus nas redes sociais. Médicas, foram contratadas pela Secretaria de Saúde na véspera da vacinação começar.

Não foi nem preciso investigar, elas, como várias outras pessoas em diversos estados, foram reveladas pelo próprio narcisismo, pois publicaram suas fotos nos “Insta” da vida sem nem mesmo notar que estavam se autodenunciando por um crime que deveria ser duramente castigado, assim como os responsáveis pela liberação de tal privilégio.

A perda da noção de pertencimento a uma comunidade, que deveria vir sempre antes da escolha individual, é um fenômeno da pós-modernidade, segundo o sociólogo Zygmunt Bauman, e no Brasil ela é exacerbada pela síndrome do “você sabe com quem está falando”, sobre o que escreve com maestria outro sociólogo, o brasileiro Roberto DaMatta, que se espanta até hoje como os sinais de trânsito não são respeitados nas ruas do país.  

DaMatta escreve ensaios sobre nossas autoridades e celebridades que promovem “um espetáculo deprimente de racismo, machismo, ignorância, arrogância e injustiça por se considerarem superiores aos demais e, portanto, dispensados de obedecer às leis e às normas da boa convivência social”. O livro, ampliado e reeditado, continua contemporâneo, prova de nossa falência como sociedade.

 Merval Pereira, jornalista - O Globo


domingo, 10 de janeiro de 2021

Muitas tensões à vista - Nas entrelinhas

O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Congresso foram amortecedores dos conflitos gerados pela mentalidade castrense e centralizadora que predomina no Palácio do Planalto

O ano de 2021 começa com sinais fortes de que será marcado por muitas tensões políticas e poucas entregas do governo Jair Bolsonaro. Dois episódios apontam nessa direção: 
um é a guerra das vacinas, na qual o governo federal, por meio de medida provisória, tentou requisitar vacinas, seringas e agulhas já adquiridas pelos estados para viabilizar a campanha nacional de vacinação; 
o outro, o jogo bruto do Palácio do Planalto para eleger os presidentes da Câmara e do Senado, com apoio ostensivo, a base de liberação de verbas e loteamento de cargos, ao deputado Arthur Lira (PP-AL), e  ao senador Rodrigo Pacheco (DEM-MG), respectivamente. 
Vamos por partes:
A medida provisória que pongava vacinas, seringas e agulhas dos estados foi uma saída do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, para resolver um problema criado por sua própria equipe: 
a não-aquisição dos insumos básicos para a campanha nacional da vacinação em tempo hábil e a aposta numa única vacina, a de Oxford, que será produzida pela Fiocruz. [erro grosseiro foi o do Joãozinho Doria, que apostou tudo em uma vacina genérica chinesa, que está encalhada ainda na fase de apresentação de resultados = no pedido de registro que apresentou à Anvisa,  faltam quase 50% das informações necessárias.
Óbvio que a maior parte da grande mídia vai atribuir a falta de documentos não juntados pela Sinovac ao pedido de registro da Coronavac, a manobra da Anvisa para sabotar o governador paulista.
E, o assunto será judicializado cabendo ao  MD Lewandowski, especialista do STF em CIÊNCIAS da SAÚDE, a palavra final - não é necessário ser cartomante para se deduzir qual será tal decisão.]
São tarefas que as equipes do Ministério da Saúde, em todos os governos, e todos os ministros que o antecederam, tiravam de letra, porque havia expertise de gestão no setor para vacinar até 10 milhões de pessoas por dia. Essas equipes foram desmanteladas e substituídas por militares arrogantes e inexperientes, a começar pelo secretário-executivo da pasta, aquele que anda com uma faca ensangüentada na lapela, o broche de ex-integrante de unidade de operações especiais do Exército. [qualquer integrante, ou ex-integrante, da unidade do 'gorro preto', um comando, usa com orgulho a 'faca na caveira' um maiores símbolos  de uma das unidades de operações especiais mais bem treinadas e que significa a vitória da vida sobre a morte = 'muitos tentam mas poucos conseguem'.]

O papel de Robin Hood ensaiado pelo general Pazuello — tirar dos estados com vacinas para dar aos sem vacinas [as vacinas serão distribuídas de forma equitativa e proporcional, entre todos os estados.

Os recursos são públicos, do Governo Federal, e a decisão privilegiando um estado, em prejuízo do restante do Brasil (especialmente os profissionais da Saúde que deverão ter prioridade sobre todos) será revista.]  foi frustrado por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski, que proibiu a requisição das vacinas, seringas e agulhas já adquiridas por alguns governos estaduais e prefeituras, entre os quais o de São Paulo. Por ironia, a vacina produzida pelo Instituto Butantan, em parceria com os chineses, a CoronaVac, que o presidente Jair Bolsonaro tentou desacreditar [tentativa desnecessária,  já que a própria farmacêutica chinesa se auto desacreditou e está enrolada com a Anvisa devido o elevado número de documentos que não juntou ao seu pedido de uso emergencial.]  e  acabou sendo comprada pelo Ministério da Saúde. São 100 milhões de doses que salvarão o governo federal do vexame de não ter como começar a vacinar imediatamente a população.

O episódio promete ter um final feliz, mas merece uma reflexão mais profunda sobre a natureza do governo Bolsonaro e a relação que pretende manter com os demais entes federados, a imprensa e a sociedade. Primeiro, adota os métodos da caserna em atividades civis, o que não tem chance de dar certo. Segundo, não compreende a natureza democrática do Estado brasileiro, regido pela Constituição de 1988, que é federativo e ampliado, ou seja, garante a independência dos demais poderes, a autonomia de estados e municípios, os direitos dos cidadãos e presta contas aos órgãos de controle e à sociedade. O Ministério da Saúde, muito mais do que o vértice, é o centro do Sistema Único de Saúde (SUS), que tem uma gestão compartilhada horizontalmente com os demais entes federados e outros órgãos e autarquias, e não uma cadeia de comando vertical e militarizada, ou seja, trabalha na base da coordenação e cooperação. O ministro da Saúde precisa fazer a sua parte e liderar; se achar que manda em tudo, vira rainha da Inglaterra.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense 

 

sexta-feira, 25 de dezembro de 2020

A vacina do Natal - Luiz Carlos Azedo

Nas Entrelinhas -  Correio Braziliense

Sim, os mais fortes sobreviverão. E por que não os mais fracos? É para isso que serve a medicina. Fé e confiança na ciência, por isso, são o melhor remédio contra a desesperança

Talvez esse seja o pior Natal de nossas vidas, em termos sociais, é claro, porque a experiência de vida de cada um é que determina a avaliação. Festa que congrega a família, confraterniza os amigos, dissemina amor e solidariedade, neste ano, a data magna do cristianismo, que é comemorada por todas as religiões ecumênicas, está sendo marcada pela maior tragédia humanitária já vista por nossas gerações, desde a Segunda Guerra Mundial. Aqui no Brasil, só não é maior por causa do nosso Sistema Único de Saúde (SUS), público e universal, apesar de um presidente da República que, com seu negativismo, no combate à crise sanitária, sabota seu povo, seu governo e, em última instância, a si próprio.

Entretanto, é Natal. Os miseráveis, os enfermos, os condenados, todos sem exceção, de alguma forma, são acarinhados com votos de esperança e compaixão. Os poetas, os cantores, os cronistas, todos que podem espalhar amor e esperança se encarregam de fazer chegar sua mensagem àqueles que estão na pior. 
De igual maneira, os trabalhadores dos serviços essenciais, de plantão, mesmo privados da convivência com suas respectivas famílias, com sua labuta, principalmente os cientistas e o pessoal da saúde, mandam o recado: confiem, estamos cuidando de vocês.  
A magia do Natal é uma enorme força transformadora da sociedade, no sentido civilizatório, mesmo agnósticos e ateus devem reconhecê-lo.

A propósito, o biólogo evolucionista Richard Dawkins, no livro O Gene egoísta, publicado em 1976, sua obra-prima, tenta explicar a evolução biológica ao mostrar como certas moléculas replicadoras (ancestrais dos genes) poderiam ter evoluído de modo a formar as primeiras células e, a partir daí, todos os seres vivos existentes. O microscópico encontro de um vírus com uma bactéria, por exemplo, é um grande evento histórico da criação, que se reproduz na natureza a todo instante e provoca mutações genéticas. A covid-19 é fruto desse fenômeno.

Dawkins tentar explicar o problema profundo de nossa existência ao sugerir que os organismos vivos são sofisticadas máquinas de sobrevivência, eficientemente moldadas pelo processo de evolução para promover a replicação sexuada dos genes nelas contidos. Entretanto, essa abordagem levanta sérios questionamentos filosóficos. Seremos meros replicadores de genes, controlados por eles. Onde entra a consciência? Dawkins afirma que genes não têm vontades próprias ou valores morais. Aqueles genes que apresentam um comportamento que seria visto como egoísta pelos seres humanos são os que se mantêm representados dentro dos genomas das espécies, ao longo do processo evolutivo, com o passar dos anos e milênios. O altruísmo seria uma estratégia de sobrevivência, principalmente nos seres humanos.

Eugenia
Genes são polímeros químicos de fósforo e carbono, associados a uma molécula de açúcar e bases nitrogenadas, encapsulados em duas fitas reversas e complementares; ou seja, genes são codificados em moléculas de DNA. Dawkins sugere uma forma de seleção natural darwiniana na qual as moléculas quimicamente mais estáveis perduravam — enquanto aquelas mais instáveis eram destruídas. A evolução sempre dependeu da adaptação, uma molécula mais estável é mais adaptada ao universo em que vivemos. Assim como existe luta pela sobrevivência na sociedade humana, existe, também, num ambiente molecular.

Hoje, sabemos que os replicadores que sobreviveram foram aqueles que construíram as máquinas de sobrevivência mais eficazes para morarem; aqueles que foram menos aptos não deixaram descendentes. Cerca de 4 bilhões de anos depois, Dawkins explica: “Com certeza, eles não morreram, pois são antigos mestres na arte da sobrevivência. (…) Eles estão em mim e em você. Eles nos criaram, corpo e mente. E sua preservação é a razão última de nossa existência. Transformaram-se, esses replicadores. Agora, eles recebem o nome de genes e nós (todos os organismos vivos) somos suas máquinas de sobrevivência.”

O gene passa de corpo em corpo através das gerações, manipulando as máquinas de sobrevivência por meio de instruções escritas em linguagem digital (A, C, T e G), abandonando tais corpos mortais na medida que eles vão ficando senis e duplicando-se em sua prole. As instruções dizem basicamente: copie-me, ou seja, viva e reproduza. A reprodução é o processo de cópia dos genes, é o processo que os mantém vivos ao longo dos tempos. Socialmente falando, porém, essa eugenia (seleção de certos genótipos para a reprodução em lugar de outros) é totalmente inaceitável. Lembra as teorias de superioridade ariana e o Holocausto.

Sim, os mais fortes sobreviverão. E por que não os mais fracos? É para isso que serve a medicina. A postura do presidente Jair Bolsonaro em relação à pandemia do novo coronavírus — “a melhor vacina é pegar o vírus” — é um inaceitável darwinismo social. Fé e confiança na ciência, por isso, são o melhor remédio contra a desesperança. Que venham as vacinas contra a covid-19. 

Feliz Natal!

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense

 

sábado, 12 de dezembro de 2020

Justiça barrará o confisco de vacinas contra a Covid-19 -

Bolsonaro, a eterna vítima do vírus ideológico

De fato, caberia ao Ministério da Saúde comandar a vacinação em massa dos brasileiros contra a Covid-19. Ninguém mais do que ele tem expertise para isso, e experiência e meios. Mas tudo foi deixado de lado quando o presidente Jair Bolsonaro recrutou o general Eduardo Pazuello para ocupar o cargo de ministro, que por sua vez recrutou militares para auxiliá-lo.

[O governador do estado de São Paulo permanece firme no propósito primeiro de usar, politicamente, a vacina contra a covid-19, custe o que custar.

Bolsonaro aderiu ao firme propósito de vacinar a população brasileira contra a covid-19 - sem que a vacinação seja obrigatória = a não obrigatoriedade está sendo a regra no Reino Unido, será nos Estados Unidos e ao que tudo indica na maior parte dos países. 

Pelo 'andar da carruagem' a vacina da Pfizer será primeira a ser utilizada no Brasil. A 'coronavac' defendida pelo governo  paulista, não concluiu a fase três - essencial para que a Anvisa, FDA e outras agências de renome aprovem o uso - deixando espaço para que a da Pfizer comece a ser usada no Brasil, ainda este mês. 
Caso ocorra uma reviravolta e a chinesa se torne disponível antes da americana, muitos entendem que o presidente Bolsonaro pode ordenar o confisco da produção do Butantã, para que o governo federal assuma a vacinação em todo o território nacional.  
Também há defensores da ideia de que sendo iniciada a vacinação com o imunizante da Pfizer e Doria decida usar a vacina chinesa - sem autorização da Anvisa - o produto chinês seja confiscado. 
 
Vacinação é competência do Ministério da Saúde, através do Plano Nacional de Imunização, que existe desde 1975 - antecedendo o SUS e a exemplo deste o PNI é sucesso reconhecido em todo o mundo. 
A competência legal e o sucesso do MS na gestão do PNI (45 anos), se somam para reforçar que seja o Ministério da Saúde, integrante do Poder Executivo da União, o responsável pela vacinação e adoção de todas as medidas correlatas - a decisão do Supremo no inicio da pandemia retirou do governo federal a competência para decretar medidas de combate à covid-19 - passando para os prefeitos e governadores a execução das medidas de isolamento e distanciamento sociais, e outras,  não alcançou o PNI.

O ilustre articulista no último parágrafo deste post diz: "É de se ver o tamanho da coragem de Bolsonaro para ordenar ao Exército o confisco das vacinas encomendadas por Doria e já em linha de produção". Continua...]

Pazuello pode ser um especialista em logística, mas no caso dele logística militar. E aprendeu na caserna que manda quem pode, obedece quem tem juízo. É Bolsonaro que manda, e ele se curva. De saúde pública nunca soube de nada. Admitiu que sequer sabia direito o que era o Serviço Único de Saúde (SUS) até o dia em que pôs os pés pela primeira vez no ministério.

Deve ter aprendido alguma coisa desde então, mas o insuficiente para continuar onde está. Confiscar a vacina produzida pelo Instituto Butantã é mais uma de suas ideias de jerico. Foi o governador Ronaldo Caiado (DEM), de Goiás, a quem Pazuello visitou ontem em Goiânia, quem disse que o confisco virá por meio de uma Medida Provisória a ser assinada por Bolsonaro.

 [......Continuação: 
É assunto complicado, exige notório saber jurídico - que não possuímos. Temos opinião e ela é no sentido de se tratando de fazer cumprir norma de órgão com competência legal - no caso Ministério da Saúde - para cumprir e fazer cumprir no âmbito federal norma de interesse público o tema vai ou para a Polícia Federal ou as Forças Armadas.     
Por ser aplicável em grande parte do território nacional, só as Forças Armadas possuem efetivo e estrutura logística para tal operação.  
Se tratando de uma ordem legal e de interesse público - saúde, vida -  as Forças Armadas cumprirão e uma vez iniciado o processo - de 'requisição' da vacina aprovada e que o estado paulista tenta impedir seja utilizada pela União Federal ou de 'confisco' da vacina (não aprovada)que o governo paulista quer aplicar na população, mesmo sem o imunizante ter autorização para uso em território nacional não poderá ser interrompido e/ou revertido.]

O governador João Doria (PSDB) apressou-se a comprar a vacina chinesa fabricada pelo Butantã porque o governo federal não deu sinais convincentes de que vidas também lhe importam. Caiado defende o confisco porque não tomou a tempo a mesma providência e agora está sendo cobrado em seu Estado. Outros governadores foram mais responsáveis do que ele.

É de se ver o tamanho da coragem de Bolsonaro para ordenar ao Exército o confisco das vacinas encomendadas por Doria e já em linha de produção. Pode ser mais um blefe dele. Se não for, o Supremo Tribunal Federal, provocado por Doria, impedirá a consumação do absurdo.

Blog do Noblat - Ricardo Noblat, jornalista - VEJA

 

domingo, 6 de dezembro de 2020

Júnior conhece a caixa-preta da saúde - Elio Gaspari

 Folha de S. Paulo - O Globo

Ministro Luís Roberto Barroso poderá homologar a papelada da colaboração do empresário José Seripieri Júnior, da Qualicorp, feita à Procuradoria-Geral da República (PGR)

Nesta semana, o ministro Luís Roberto Barroso poderá homologar a papelada da colaboração do empresário José Seripieri Júnior, da Qualicorp, feita à Procuradoria-Geral da República (PGR). Há mais de uma semana, a repórter Bela Megale revelou que Júnior, como ele é conhecido, concordou em pagar R$ 200 milhões à Viúva pelas transações em que se meteu, alimentando caixas de políticos. Em julho, ele passou três dias na cadeia, e sua colaboração foi antecedida pela de um sócio.

Chegando a valer cerca de R$ 4 bilhões, a Qualicorp tornou-se uma campeã organizando planos coletivos de saúde. Como uma jabuticaba, ela nunca foi uma operadora, mas Júnior tornou-se um bilionário trabalhando num mercado onde se misturam capilés para políticos que colocam jabutis nas leis e azeitam-se promiscuidades com as agências reguladoras.

Finalmente, o Ministério Público acercou-se desse mercado. A Lava-Jato chegou perto, mas distraiu-se. Deltan Dallagnol, ex-coordenador da força-tarefa, recebeu pelo menos R$ 580 mil fazendo palestras para plateias da Unimed. Ele explicou que repassava os valores a entidades filantrópicas.

Quando a colaboração de Júnior for conhecida, será possível avaliar a sua profundidade. A operação Lava-Jato começou com muito menos, pois nela o fio da meada foi puxado a partir de um posto de gasolina que lavava dinheiro. A memória da Qualicorp, ou de qualquer grande operadora, guarda muito mais que isso. Os procuradores de Curitiba puxaram os fios e deu no que deu. A PGR está com o novelo na mão. Sabe-se que negociou uma multa milionária, mas a questão está também em outro lugar: na máquina desse mercado.

Pode-se dar de barato que a colaboração de Júnior levará para a mesa alguns políticos, provavelmente figurinhas fáceis de outros escândalos, alguns confessos, ou notoriamente mentirosos. Pelo cheiro da brilhantina, cairá na roda um doutor que queria cobrar os serviços do SUS.

O valor da colaboração de Júnior poderá ser avaliada se ela tratar do funcionamento da porta giratória pela qual maganos saem do mercado e vão para as agências reguladoras, ou fazem o caminho inverso, sempre enriquecendo. Noutra vertente, pode-se vir a saber como se enfiou um jabuti numa Medida Provisória de 2015. Ele reduzia o valor unitário das multas aplicadas pela Agência Nacional de Saúde Suplementar quando o volume passasse de certos limites. Em bom português: quem delinquir muito pagaria menos que quem delinquiu pouco. Dilma Rousseff vetou o jabuti. Trata-se de perguntar, ouvir, anotar o nome do magano e chamá-lo a depor. Se for o caso, remetê-lo à carceragem.

Seripieri Júnior fez todo o caminho do mercado, conheceu suas vísceras e no ano passado começou a montar uma empresa fechada. Nela, ao contrário das operadoras que cobrem despesas com centenas de médicos, laboratórios ou hospitais, as operadoras fechadas têm suas listas e, sobretudo, seus hospitais. Graças a isso, controlam seus custos e acabam cobrando menos.

A PGR está diante da oportunidade de abrir a caixa-preta dos planos de saúde. Basta expandir a operação abrindo um capítulo em que se fazem perguntas estranhas ao ritual, porém essenciais para o propósito da investigação. Assim foi com a Lava-Jato e assim foi com a investigação da Receita Federal e do FBI americano, que detonou as roubalheiras da cartolagem internacional do futebol.

A ideia segundo a qual se combate a corrupção com multas milionárias é pobre. Acaba criando uma espécie de pedágio, caro, porém imunizante. A turma dos planos de saúde, acossada pela perda de clientes e pela reação aos reajustes selvagens, já tentou dois saltos triplos. Num, no escurinho de Brasília, queriam mudar a lei que regula seu mercado. A elas, tudo, aos consumidores, nada. Noutro, querem privatizar serviços do SUS. Isso durante uma pandemia na qual tentaram negar cobertura para os testes de coronavírus.

Madame Natasha e o general
Madame Natasha não perde entrevistas do general Eduardo  Pazuello e admira os momentos em que ele fica calado. Outro dia, falando a parlamentares, o ministro da Saúde incomodou a senhora quando disse coisas assim: “Se o processo eleitoral nas cidades, com todas as aglomerações e eventos, não causa nenhum tipo de aumento da contaminação, então não falem mais em afastamento social.”
“Precisamos compreender de uma vez por todas que nós só aplicaremos vacinas no Brasil registradas na Anvisa.”

Com décadas de serviço nos quartéis, o general Pazuello aprendeu a falar como comandante. Como ministro da Saúde, deveria aprender que não manda nas suas audiências. Dizer a quem quer que seja que não deve mais falar em afastamento social é uma indelicadeza, se não for uma bobagem. Quando ele diz que “precisamos compreender de uma vez por todas” que o governo só patrocinará vacinas aprovadas pela Anvisa, diz uma platitude. O problema é outro: cadê a vacina federal? [preferimos perguntar: cadê uma vacina? vale de qualquer país.] 
 
Natasha recomenda gentilmente ao general entender que seu desempenho terá uma avaliação cronológica. A vacina chegará a diversos países em janeiro, inclusive à Inglaterra e ao México, cujos governos foram negacionistas. Pazuello não sabe precisar o mês do início da vacinação no Brasil e acha razoável que metade da população de Pindorama só consiga ser imunizada no segundo semestre do ano que vem. Em São Paulo, a vacinação vai começar em janeiro, a menos que Pazuello e Bolsonaro queiram atrapalhar, metendo-se numa ridícula Revolta da Vacina 2.0.

Quando Natasha era uma mocinha e os generais se metiam onde não deviam, ela teve que ir a Montevidéu para ver o filme “Último Tango em Paris”. (Achou-o muito chato.)
Natasha morre de medo de ter que viajar ao exterior para ser vacinada.
 
Coisas de Pindorama
Um marciano passou pelo Brasil em 1821 e gostou das gazetas que defendiam a independência da Colônia. Voltou em 1823 e soube que ela fora proclamada, com o filho do rei de Portugal coroado imperador.

Imortal, o marciano foi ao comícios das Diretas de 1984 e encantou-se. Voltou em 1985 e soube que a campanha havia resultado na eleição indireta de Tancredo Neves, mas quem estava na Presidência era José Sarney, presidente do partido do governo em 1982.

O marciano resolveu nunca mais voltar ao Brasil. Ele vive em Washington e soube que o doutor Sergio Moro é novo sócio-diretor da firma em cujo portfólio de clientes está a Odebrecht com seu processo de recuperação judicial. 
 
Kerry e os agrotrogloditas
A nomeação do ex-senador John Kerry para a posição de czar na política de meio ambiente do governo de Joe Biden deve acender um sinal de alerta no Planalto.

Ex-secretário de Estado, Kerry não conhece agrotrogloditas, mas tem boas relações com alguns ambientalistas brasileiros.Seria útil que os çábios do bolsonarismo parassem de pressionar empresas multinacionais que pararam de comprar soja plantada em áreas de conflito ambiental. As filiais comunicam essas pressões às suas matrizes. [Curioso é que Bolsonaro ao manter boas relações com Trump - tendo sempre presente que nações não possuem amigos e sim interesses, vale o mesmo para seus governantes - acusavam do nosso presidente adotar uma postura de submissão do Brasil. 
Agora já aceitam que os chamados ambientalistas fiquem de 'quatro' para Kerry.
As filiais das empresas americanas agem corretamente quando passam informações, ainda que desfavoráveis, as suas matrizes; já os inimigos do Brasil = os traidores brasileiros que traem o Brasil para ter boas relações com Kerry =  agem como 'judas' e sempre terão nosso desprezo e fiquem que são também desprezados pelos  norte-americanos.
De qualquer modo as empresas dos EUA façam o melhor para eles e deixem que os brasileiros façam o melhor para o Brasil.]

O Globo - Elio Gaspari, jornalista


sábado, 31 de outubro de 2020

Sanha protelatória - Bolsonaro age para ganhar tempo e retardar vacina [?] - IstoÉ

 Como Jair Bolsonaro e órgãos de saúde, que são seus aliados, estão agindo para ganhar tempo e afastar cada vez mais a vacinação contra o coronavírus. Com um pé na ideologia e outro em interesses eleitoreiros, o presidente segue em seu descaso pelos mortos e doentes

[já existe uma vacina contra a covid-19, com  segurança no uso e  eficácia na imunização disponível?

Se a resposta for SIM, a resposta à pergunta do título será também SIM.

Todos sabem que a resposta à pergunta acima só pode ser NÃO, um sólido NÃO, assim a do título é também um NÃO.  

O governador de Santa Catarina está sofrendo um processo de impeachment por ter comprado material para o combate à covid-19 que não foi entregue.
Pretendem que o presidente Bolsonaro faça o mesmo?]

O Brasil precisa urgentemente de duas vacinas: uma é contra a Covid-19 que já matara cerca de 160 mil pessoas até a quarta-feira, 28;  [atualizando: o número de mortos até a manhã de hoje, 31, ainda não alcançou 160.000 - infelizmente deve atingir, mas, se retirar os mortos por problemas respiratórios não decorrentes peste ...] ; a segunda é para neutralizar uma peste chamada Jair Bolsonaro, que desdenha de toda essa tragédia. Creia, leitor, que a profilaxia em relação à doença logo será consolidada pela comunidade científica, que trabalha com seriedade. Quanto ao antídoto político, o mais eficaz seria a compulsória institucionalização do presidente da República em uma casa de custódia para tratamento psiquiátrico. Prova disso é que uma de suas últimas falas, de tão ironicamente gelada e desumana, parece saída do livro de contos “O cobrador”, do saudoso escritor Rubem Fonseca. “Não sei a razão de tanta pressa rumo à vacina”, disse Bolsonaro. São frases desse tipo que confundem as coisas, pois causam polêmicas quando se carece de serenidade.

Não bastasse isso, Bolsonaro age nos bastidores com sanha protelatória para que não tenhamos tão cedo a vacina. A mais evidente dessas manobras de protelação foi emperrar o máximo possível as importações de insumos indispensáveis para a sua produção no País. [quais os insumos indispensáveis que serão utilizados na produção da vacina que ainda  não existe? Tão absurda e criminosa era essa situação que a própria Anvisa não mais aguentou ser desclassificada e aprovou na quarta-feira 28 a importação de tais insumos para a produção da Coronavac. “Cada dia que esperamos a autorização significou um dia a menos de vacina”, diz o hematologista Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan, um dos mais conceituados em todo o mundo.

Em São Paulo, onde está sediado, o Instituto Butantan tem capacidade de transformar seis milhões de doses em quarenta e seis milhões. Está com os laboratórios prontos, mas eles seguirão parados enquanto esses insumos não desembarcarem nas mãos dos pesquisadores. [perguntinha idiota,  mas adequada, no Brasil,  para nossa contribuição na guerra pela vacina que não existe:  e se após comprar tais insumos, milhões e milhões de dólares, a Coronavac se revelar  insegura para uso ou ineficaz? 
Quem pagará o prejuízo?
Ou tudo é uma tentativa burlesca de responsabilizar o presidente Bolsonaro?  - afinal, ele foi proibido de assumir o comando das ações contra a coronavírus, mas, agora querem que ele seja responsabilizado pelo fracasso dos governadores e prefeitos.]
Houve autorização de importação, mas é preciso que não fiquem retidos em malhas burocráticas. Nesse momento, o Brasil se encontra em um lugar que nenhum outro país, em meio à pandemia, queria estar. O presidente da República escolhe o jogo político, ideológico e partidário quando deveria privilegiar a saúde da população. “Não pode um juiz decidir se você vai ou não se vacinar”, declarou Bolsonaro. O que ele quer com isso? Tumultuar, criar notícias que vão minando a estabilidade institucional, colocar em prática a tática diversionista com nítido interesse eleitoreiro. O governador de São Paulo, João Doria, definiu de forma exemplar: “Não é uma questão de Justiça, mas, isso sim, de saúde”. [quando vão lembrar de questionar o Doria por estar exercendo, em concomitância, suas funções de governador e de adido comercial da República Popular da China?
Lembramos aos partidecos de aluguel, sem votos e sem programa, que estão desprezando uma ótima oportunidade de judicializar mais a vacina? Um governador não pode ser garoto propaganda de um produto de um governo estrangeiro.]

Na coxia de cada teatral polêmica que Bolsonaro levanta, estão a intenção e a estratégia protelatórias. Assim, na semana passada, ele veio com mais um desatino, e isso em um instante no qual os brasileiros estão sob a ameaça de um inimigo invisível. O presidente decretou o início dos estudos visando a conceder à iniciativa privada as Unidades Básicas de Saúde. O decreto significava dar o primeiro passo na direção da privatização do SUS — é mais ou menos como privatizar o ar que respiramos. Despencou sobre Bolsonaro uma avalanche de críticas (de médicos, cientistas, juristas e políticos), e ele, no seu estilo vaivém, voltou atrás em vinte e quatro horas: acerta quem pensar que, dessa forma, ganhou mais dia de distanciamento na concentração de esforços pela vacina. [ainda que errando Bolsonaro acertou ao provocar uma causa nobre: o reconhecimento público e notório por todos da eficiência do SUS, tanto no dia a dia, quanto durante a peste covid-19.

Só assim o SUS ganharia as manchetes, sendo enaltecidos seus méritos e o heroísmo e dedicação dos seus anônimos funcionários.]

Em IstoÉ, MATÉRIA COMPLETA


sexta-feira, 30 de outubro de 2020

O jabutizeiro do SUS - Nas entrelinhas

Quando a pandemia do novo coronavírus passar, a medicina nunca mais será a mesma. As consultas por teleconferência, introduzidas em massa durante a pandemia, vieram para ficar

A Prefeitura de Vitória (ES) tem uma das melhores redes de atendimento básico à saúde do país, resultado de sucessivas administrações, mas, sobretudo, do avanço tecnológico promovido pelo atual prefeito, Luciano Rezende (Cidadania), que encerra o seu segundo mandato. Com as inovações, foi possível ampliar o atendimento em 30%, sem contratação de médicos ou construção de novos postos de saúde. Qualquer cidadão atendido na rede, inclusive nos dois pronto atendimentos (PAs) da cidade, recebe um torpedo no celular para dar uma nota de 0 a 10 de avaliação do atendimento. A nota média, em setembro, mesmo na pandemia da covid-19, foi 9,11. O ovo de Colombo surgiu depois de uma viagem de avião, quando o prefeito recebeu uma mensagem pedindo uma nota de avaliação do serviço da companhia aérea.

A revolução tecnológica começou pelo Pronto Atendimento de São Pedro, antiga região de palafitas, erradicadas nas administrações de Vitor Buaiz (PT) e Paulo Hartung (MDB). Na administração do tucano Luiz Paulo Velozzo Lucas, da qual Rezende foi secretário de Saúde e de Educação, esses serviços foram ampliados. Mas, foi preciso muita inovação tecnológica para que a gestão da saúde fosse focada 100% na ponta do atendimento ao público. Quando os torpedos começaram a ser disparados, houve muitos questionamentos, porque tudo influencia a avaliação, e não apenas o atendimento médico propriamente dito. O PA de São Pedro, por exemplo, foi o mais mal avaliado. Esse resultado levou a que os diretores dos dois melhores postos de saúde da cidade fossem transferidos para lá, onde a população mais pobre da cidade é atendida na emergência, 24 horas, todos os dias, inclusive domingos e feriados. A média da avaliação dos usuários, em setembro passado, foi de 8,66. Mesmo com a pandemia, a menor nota de avaliação do PA de São Pedro foi 7,29, em março.

A chave para o alto desempenho foi a sinergia entre as secretarias de Saúde e da Fazenda, que colocou o time da subsecretaria de Tecnologia de Informação para desenvolver soluções que melhorassem a gestão da Saúde, obrigada a fazer mais com menos, devido à queda de 25% da arrecadação da cidade, com o fim do Fundap (fundo de desenvolvimento extinto em 2002, que beneficiava o complexo exportador capixaba). Ao contrário de outros municípios, que estão na latitude dos poços da Bacia de Campos, Vitória se beneficia pouco dos royalties de petróleo destinados aos capixabas.

Medicina a distância
Para melhorar o atendimento à população, o acesso à informação, a organização e o controle das unidades de saúde, a Secretaria Municipal de Saúde (Semus) registra a fila de atendimento, a classificação de risco, os procedimentos da sala de medicação, com prescrição e checagem de forma eletrônica. Os sistemas informatizados permitem agilizar procedimentos administrativos, gerenciais, de atendimento e acesso à informação de pacientes. Além disso, o sistema gera o prontuário eletrônico com os dados do atendimento prestado ao paciente. Para que o atendimento seja mais rápido, basta o usuário apresentar um documento com foto e ele será encaminhado para a classificação de risco. Depois, aguarda o atendimento médico ou odontológico de acordo com a gravidade do caso. As consultas são automaticamente remarcadas em caso de não confirmação. O time de engenheiros e programadores da prefeitura, funcionários de carreira, acabou com as filas de atendimento e reduziu a 5% as faltas às consultas médicas, que representavam 30% do total.

Além da rede de postos de saúde e centros de referência, a prefeitura mantém atendimentos psicossocial para adultos e infanto-juvenil, de prevenção e tratamento de toxicômanos, atenção a idosos, gestantes e pediatria. São oferecidos serviços de cardiologia, dermatologia, endocrinologia, gastroenterologia, neurologia, obstetrícia (alto risco), oftalmologia, ortopedia, otorrinolaringologia, proctologia, psiquiatria, reumatologia, urologia, homeopatia, acupuntura e pequenas cirurgias, além de tratamento odontológico (radiologia, endodontia, periodontia e prótese dentária), e de diagnóstico de câncer de boca. Tudo gratuito. Além de equipes de médicos de família, agentes comunitários de saúde e orientadores de exercícios físicos.

E quando é que os jabutis subiram na árvore? Quando a pandemia do novo coronavírus passar, a medicina nunca mais será a mesma. As consultas por teleconferência, por exemplo, que foram introduzidas em massa na rede pública de Vitória durante a crise sanitária, vieram para ficar, assim como outras inovações tecnológicas introduzidas por lá. Acontece que grandes empresas de tecnologia já estão operando na área médica, aqui no Brasil, como a Afya, que oferece ensino especializado e treinamento a distância em larga escala (Paraná, São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Piauí, Pará, Tocantins e Distrito Federal). Há grande interesse na gestão dos serviços do SUS. As soluções que a Prefeitura de Vitória oferece de graça às demais prefeituras do país, via Frente Nacional de Prefeitos, na ótica dos grupos de medicina privada, são um grande business inexplorado. Por isso, as unidades básicas de saúde inacabadas do governo federal são quatro mil jabutis. Falta descobrir quem armou o “jabutizeiro” do SUS, que é muito maior. Com certeza, não foi enchente, foi mão de gente. [FATO: até quando erra o presidente Bolsonaro acerta.
O delírio de privatizar o SUS já passou - aliás foi um péssimo pensamento em voz alta. 

Para mostrar que seria um desastre para os brasileiros basta considerar que um representante da medicina privada declarou em entrevista que a desistência da privatização foi um retrocesso - se eles são contra a desistência é sinal que privatizar seria um desastre privatizando o povão iria sofrer e muito com a falta do SUS. 

O delírio da privatização teve outro aspecto bom; jogou holofotes sobre o SUS permitindo mostrar ao Brasil e mesmo ao mundo,  sua eficiência e importância.
Mostrar a todos que o SUS agiu com presteza, eficiência, mesmo quando foi exigido além do limite.]

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Ideia de jerico - Nas Entrelinhas

Bolsonaro assinou o decreto autorizando estudos para privatização das unidades básicas de atendimento do SUS

Tem razão o general da reserva Rêgo Barros, ex-porta-voz da Presidência: falta alguém ao lado do presidente Jair Bolsonaro para dizer-lhe no ouvido: “Memento Mori!” lembra-te que és mortal!  A sentença latina intitula o artigo publicado, na terça-feira, pelo Correio Braziliense, com a assinatura do militar. É a mais dura crítica feita ao ex-capitão por um dos generais que apoiaram sua eleição e agora se arrependem. “Os líderes atuais, após alcançarem suas vitórias nos coliseus eleitorais, são tragados pelos comentários babosos dos que o cercam ou pelas demonstrações alucinadas de seguidores de ocasião. É doloroso perceber que os projetos apresentados nas campanhas eleitorais, com vistas a convencer-nos a depositar nosso voto nas urnas eletrônicas, são meras peças publicitárias, talhadas para aquele momento. Valem tanto quanto uma nota de sete reais.”

Rêgo Barros não cita Bolsonaro, mas é a ele que se refere quando alerta que os demais Poderes da República “precisarão, então, blindar-se contra os atos indecorosos, desalinhados dos interesses da sociedade, que advirão como decisões do ‘imperador imortal’. Deverão ser firmes, não recuar diante de pressões. A imprensa, sempre ela, deverá fortalecer-se na ética para o cumprimento de seu papel de informar, esclarecendo à população os pontos de fragilidade e os de potencialidade nos atos do César”. Rêgo Barros foi defenestrado do cargo depois de uma longa queda de braço com o vereador carioca Carlos Bolsonaro, filho do presidente da República, que dá as cartas na Comunicação Social do Palácio do Planalto.

Seu artigo reflete o pensamento de uma parcela dos altos oficiais das Forças Armadas, principalmente depois da humilhação a que foi submetido o general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, desautorizado por Bolsonaro e, depois, constrangido a dar uma declaração, ao lado do chefe, dizendo que Bolsonaro manda e ele obedece. Na semana passada, no Dia do Aviador, durante a solenidade de entrega dos novos caças F-39E Gripen da Aeronáutica, era visível o constrangimento dos generais presentes, inclusive do comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, para quem o cerimonial da Presidência reservou a cadeira mais distante do presidente da República, entre todas as autoridades presentes.

Entretanto, nada disso muda o fato de que Bolsonaro manda e os militares, de fato, obedecem, por dever constitucional. São poucos os militares que se manifestam contra Bolsonaro, a maioria apoia o governo incondicionalmente. Além de abrigar muitos oficiais no governo — estima-se que sejam em torno de sete mil, inclusive, alguns generais da ativa —, Bolsonaro poupou os militares na reforma da Previdência, mantendo o salário integral dos oficiais ao se aposentar, sem idade mínima obrigatória, e a contribuição máxima de 10,5% ao INSS, contra o teto de 11,68% na iniciativa privada. [atualização: os militares não estavam subordinados ao RGPS, portanto, não foram poupados - apenas não foram alcançados pela reforma, realizada em normas que não alcançavam os militares.

Aproveitamos para registrar, pela enésima vez,  uma posição já conhecida: Deveria ser obrigatório um porta-voz para expressar a posição oficial do presidente da República - as entrevistas de corredor, de cercadinho deveriam ser evitadas.

Em situações excepcionais,  o presidente da República poderia conceder entrevista coletivas, com perguntas apresentadas previamente.]   

Atendimento em massa
A propósito, faltou um memento mori, por exemplo, na hora em que Bolsonaro assinou o decreto autorizando a realização de estudos para privatização das unidades básicas do Sistema Único de Saúde (SUS), a cargo dos municípios, para espanto dos sanitaristas, dos prefeitos e da população que utiliza os serviços públicos, a maioria por não ter plano de saúde. A reação foi tão negativa nas redes sociais que Bolsonaro teve de cancelar o decreto, que incluía o sistema de atendimento básico considerado um dos melhores do mundo — no programa de privatizações e parcerias público-privadas do Ministério da Economia. Como filho feio que não tem pai, ninguém assume a ideia de jerico. O governo divulgou a versão de que a proposta era do Ministério da Saúde. E que seria uma solução para conclusão de 4 mil UBS inacabadas, que já consumiram R$ 1,7 bilhão de recursos do SUS, obras de responsabilidade do governo federal.

Bolsonaro não levou em conta que o SUS atende 190 milhões de brasileiros, contra 46 milhões dos planos de saúde. Antes de sua criação, eram apenas 30 milhões. Produz 7,8 bilhões de medicamentos, sendo 163 milhões de antiretrovirais. Realiza 2 milhões de partos por ano, tem mais de 30 mil equipes de saúde da família e 248 mil agentes comunitários de saúde em 5.393 municípios. Graças a essa estrutura, com todas as suas deficiências, a tragédia da pandemia do novo coronavírus, que já matou 157,8 mil brasileiros, não é maior. Dos 5,4 milhões de infectados,  4,9 milhões recuperaram-se e 375,2 mil estão em recuperação

A esmagadora maioria utiliza os serviços do SUS.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


quinta-feira, 15 de outubro de 2020

Não existe vírus grátis - Nas Entrelinhas

A fatura chegou primeiro para os desempregados e trabalhadores “por conta própria”, que dependem do auxílio emergencial do governo; mas virá para todos, à prestação

Desculpe-me o trocadilho, mas tem tudo a ver com a velha frase dos bares norte-americanos que nas décadas de 1930 e 1940 ofereciam a refeição para quem pagasse a bebida. Ficou mundialmente famosa porque intitulou um dos livros do economista liberal Milton Friedman, guru do ministro da Economia, Paulo Guedes. A lembrança não tem nenhuma relação direta com suas frases de efeito, até porque, ele tem evitado declarações polêmicas, mas, com o artigo publicado, ontem, pela economista Mônica de Bolle no jornal O Estado de S. Paulo, a propósito dos custos econômicos do negacionismo de Donald Trump em relação à pandemia. Os custos políticos podem inviabilizar a reeleição dele.

Segundo os economistas norte-americanos David Cutler e Lady Summers, citados no artigo, a queda do PIB norte-americano deve chegar a US$ 16 trilhões até outubro do próximo ano, ou seja, 90% do PIB, se a pandemia for controlada até lá. Nos cálculos dos dois economistas, foram incluídos os indicadores econômicos, como o aumento dos pedidos de seguro desemprego, mas, também, estimativas relativas aos prejuízos causados pela liquidação de vidas humanas, ou seja, de força de trabalho geradora de riqueza. [a realidade mostrada nesse parágrafo, isenta o governo Bolsonaro por qualquer responsabilidade de eventual desastre econômico no ano 2020 = incluindo, sem limitar a esperada queda do PIB.]

O Brasil não tem indicadores que possibilitem esse tipo de cálculo, mas tem estatísticas que podem servir de referência para um razoável balanço de perdas e danos. Pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University, Mônica De Bolle destaca que o nosso Sistema Único de Saúde (SUS), posto à prova pela pandemia, pode nos dar uma noção, por exemplo, de quanto será preciso investir na Saúde em razão das sequelas da covid-19 nas pessoas que se recuperaram da doença. Como a população está envelhecendo, a pandemia também agrava, por falta de tratamento, as doenças associadas à idade — diabetes, câncer, cardiopatias —, que se somam àquelas que são consideradas endêmicas, como tuberculose, dengue, hanseníase, malária e Aids, que já pressionavam o sistema de saúde.

Crediário
O número de casos graves com longas internações é sete vezes maior do que o de óbitos; 30% dos que sobreviveram apresentam sequelas. Projetam-se 350 mil pessoas nessa situação, a grande maioria dependente do SUS. Com mais de 150 mil mortos, Mônica de Bolle estima que o custo econômico da pandemia no Brasil, por baixo, pode chegar a R$ 9 bilhões, sem considerar as mortes prematuras, ou seja, dos jovens que não faziam parte da população de risco. Coincidentemente, ontem, num evento da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), o presidente Jair Bolsonaro disse que a pandemia da covid-19 no Brasil foi superestimada. Bolsonaro insiste que o vírus e o desemprego devem ser tratados de igual maneira, simultaneamente. [Bolsonaro é presidente do Brasil e de todos os brasileiros, o que torna imperativo que sempre considere o Brasil no todo e tenha sempre presente evitar a frase: sobreviveu à covid-19,mar morreu de fome.] 

O Brasil é o 2º país com mais mortes por covid-19. Só os Estados Unidos têm mais vítimas: 220.694. Até o final da tarde de ontem, eram 150.998 óbitos de brasileiros causados pela doença. Segundo o Ministério da Saúde, 5.113.628 pessoas foram infectadas pelo novo coronavírus no país, 10.220 a mais nas últimas 24 horas. O número de mortes, felizmente, está caindo: foram 309.

Aproximadamente 4,5 milhões de pessoas se recuperaram da doença até o momento. Outras 436 mil estão em acompanhamento. São 713 vítimas a cada milhão de habitantes, o que coloca o Brasil na 3ª posição de letalidade da pandemia no ranking mundial. O Peru é o país onde a covid-19 mais mata em relação ao número de habitantes (1.008 pessoas para cada milhão), o segundo é a Bélgica (880 pessoas). [percebe-se que a letalidade da pandemia ignora a capacidade econômica dos países: Peru x Bélgica ?

Falando sobre letalidade da covid-19 no Brasil, surge a necessidade de destacar uma informação:

Se consultarmos o site do Registro Civil, que tem fé pública, constatamos que, no ano passado, no Brasil, no mesmo período, morreram de pneumonia 139.906 pessoas e, neste ano, 140.957 da covid-19. Não houve histeria por causa da pneumonia no ano passado. Seria medo de uma doença desconhecida? ]

As advertências de Mônica de Bolle são importantes porque as pesquisas de popularidade do presidente Jair Bolsonaro, com a recuperação de seu prestígio, reforçam o discurso negacionista oficial, robustecido pelo fato de que o pior já passou e a redução das taxas de contaminação permite que a política de isolamento social seja flexibilizada, como está sendo, na maioria das cidades. A fatura do vírus chegou primeiro para os desempregados e trabalhadores “por conta própria”, que perderam sua fonte de renda e dependem do auxílio emergencial do governo. A ideia de uma recuperação econômica rápida, acalentada pelo ministro Paulo Guedes, porém, não tem sustentação técnica. A conta está chegando para os demais à prestação.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense


quinta-feira, 8 de outubro de 2020

Tem onde cortar gastos - Carlos Alberto Sardenberg

 Coluna publicada em O Globo - Economia 8 de outubro de 2020

Entre as diversas ideias de jerico propostas para financiar o programa Renda Cidadã, apareceu mais uma nesta semana: a de eliminar a dedução de 20% aplicável aos contribuintes do IR que declaram pelo formulário simples. Nesse caso, o contribuinte abre mão de descontar os gastos com saúde e educação, que são, digamos, os mais vantajosos para os que podem pagar escola, médicos e hospitais no particular.

Inversamente, quem escolhe a declaração simplificada está nas faixas mais baixas de renda, usa o SUS e coloca as crianças em escolas públicas. Ou seja, cortar o desconto de 20% na declaração simples é favorecer os mais ricos e tomar dinheiro dos mais pobres. É evidente que tem de ser o contrário. Acompanhem estes números: neste ano, ficou isento de pagar IR quem ganhou abaixo de R$ 28.559 em 2019. O presidente Bolsonaro prometeu várias vezes aumentar a faixa de isenção, primeiro para R$ 4.700 e depois para R$ 3.000. Deixou para lá. A faixa não foi sequer corrigida pela inflação. [nessa 'omissão' o presidente Bolsonaro está inocente = corrigir tabela de IR, aumentando a faixa de isenção, em um ano de pandemia seria um complicador a mais. Quem deve ir para o troncos são os três antecessores do presidente, que se omitiram vergonhosamente].

Agora, comparem: o teto salarial do funcionalismo é de R$ 39,2 mil por mês – dez mil acima da faixa de isenção de IR para ganhos anuais. Tem mais: o teto do funcionalismo simplesmente não é respeitado. A combinação dos auxílios moradia, educação, transporte e alimentação – que variam de setor para setor e entre Estados – mais tempo de serviço, participação em conselhos de estatais, venda de férias e acumulação com aposentadorias, milhares de funcionários recebem muito mais que o teto. Dizem que o teto é só o salário. O resto é direito adquirido e/ou vantagem pessoal, fura-teto, portanto.

Assim, o contracheque pode passar de R$ 200 mil mensais. Vencimentos entre 50 e 60 mil são até comuns em determinadas categorias, especialmente no Judiciário. [destaque-se: nos contracheques dos MEMBROS do Poder Judiciário, dos MEMBROS do Ministério Público e nos MEMBROS do Poder Legislativo.]

Sem contar alguns absurdos que nem custam tanto, mas são de espantar: funcionários em trabalho remoto recebendo auxílio …. transporteNão é simples calcular o custo desses benefícios pelo país todo, mas o corte de parte dos auxílios para funcionários que, digamos, ganhem acima de R$ 5 mil mensais e mais imposição rigorosa do teto de R$ 39,2 mil chegariam fácil ao valor anual do atual Renda Família (R$ 30 bilhões). [quem quiser ter uma ideia das dificuldades, melhor dizendo, impossibilidades de fazer respeitar o teto de R$ 39,2 mil, clique aqui.] Para os do topo, seria um “sacrifício” razoável de se pedir. No Brasil, quem ganha R$ 30 mil/mês está no grupo do 1% mais rico. Segundo um estudo do Instituto Millenium, o salário médio dos funcionários do Legislativo federal com curso superior está justamente em torno desses 30 mil. Reparem, é salário médio.

Grosso modo, a despesa do governo federal prevista para o ano que vem é de R$ 1,5 trilhão. Parece muito, é muito, mas mal dividida. Cerca de 80% disso, ou R$ 1,2 tri vão para aposentadorias, pensões e salários. Dos R$ 330 bi que sobram, R$ 200 bi vão para outras despesas obrigatórias, especialmente com saúde e educação. Sobram R$ 100 bi para o Congresso e o governo distribuírem para despesas de custeio e investimento. [qual a sugestão?  - tendo em conta que saúde e educação precisam de mais recursos ou, na pior das hipóteses, deixar como está; despesas inúteis ou postergáveis (tipo Fundos Eleitoral e Partidário ou acabar com esse gasto com eleições a cada dois anos = realizando uma só a cada quatro anos) - não aceitam mexer. 

Se adiar por um ano uma das despesas citadas e a outra por dois anos, teremos pelo menos 1/3 dos R$ 30 bilhões do Renda Cidadã.

Eliminar os salários obrigando os funcionários públicos a trabalharem de graça é impossível; eliminar as despesas com aposentadorias  e pensões - eliminando os beneficiários =  é crime.]

Nessa conta, é impossível arranjar o dinheiro para engordar o Bolsa Família. Só restam dois caminhos, aumento de imposto (a tal CPMF digital) ou o corte de gastos na folha dos funcionários de nível mais alto. [A CPMF não passa - caso passe o presidente Bolsonaro estará encerrando sua carreira política - e cortar gastos na filha dos funcionários mais altos é mexer com MEMBROS, vai complicar,  não vai dar certo e o apurado - caso consigam - será insuficiente].

Sim, porque há uma enorme desigualdade dentro do setor público. Há professores do ensino fundamental, com curso superior, ganhando R$ 3,3 mil mensais, pouco mais da metade da média de R$ 6 mil dos servidores federais com nível médio. Olhando os números, dá para saber onde cortar, com justiça.

Currículos 
Em março de 2011, o então ministro da Defesa da Alemanha, Karl-Theodor zu Guttenberg, figura política em ascensão, renunciou ao cargo após ter sido acusado de plágio em sua tese de doutorado apresentada e aprovada dez anos antes. A Universidade de Bayreuth cassou seu título de doutor em direito e ele mesmo concordou com a medida. Negou o plágio, mas admitiu erros graves.

Reparem: a tese não tinha nada a ver com sua função de ministro da Defesa e sua atuação política. Mas ele teve que renunciar. É uma questão moral óbvia. A pessoa, qualquer pessoa, não pode copiar teses, nem inventar currículos.

[presidente Bolsonaro, uma indicação errada, desde que anulada, cai no pacote do 'errar é humano, permanecer no erro é diabólico'.

Só que manter a indicação é permanecer no erro - cabe ao senhor escolher]. 

Simples assim.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 


domingo, 17 de maio de 2020

E se Caso Bolsonaro fizesse uma live defendendo o isolamento social? - O Globo

Dorrit Harazim 

E se...?

‘Foi o derradeiro comando, o mais essencial”, escreveu George Orwell no clássico distópico “1984”, referindo-se à ordem da fictícia Oceania para que seus súditos rejeitassem tudo o que os olhos vissem e os ouvidos escutassem à margem da linha oficial. Donald Trump volta e meia adapta a citação quando aponta para o inimigo que adoraria domesticar: a imprensa independente. “Lembrem-se, o que vocês estão vendo e o que vocês estão lendo não é o que está acontecendo”, avisa sempre. No Brasil de Jair Bolsonaro o que se vê, ouve ou lê é bastante parecido com o que acontece intestinamente no governo manicomial eleito em 2018. Um assombro diário. E é o jornalismo arretado, investigativo, que nos permite ver e escutar. Já a tarefa de pensar fica a cargo de cada um.

Basta misturar alguns fatos da semana para constatar que eles mereceriam manter rigoroso distanciamento entre si. No Brasil que beira 15 mil mortes de Covid-19, o participante de uma reunião virtual de empresários com o chefe da nação se esqueceu de desativar a função “vídeo” e apareceu meio peladão na tela tornada pública. Debatiam-se os rumos da economia nacional. O país ultrapassa a barreira de 200 mil casos confirmados do vírus, o SUS pede socorro, erguem-se hospitais de campanha desossados e fraudados, aos moribundos resta esperar morrer fora da curva. Cinco meses após o primeiro caso da doença na China, Bolsonaro ainda se atrapalha com o uso de máscara e mistura “lockout” e “blecaute” com “lockdowntalvez por horror ao real significado do termo. Mas trocou de ministro da Saúde pela segunda vez em um mês, e comanda o país de 211 milhões de almas sem diretriz clara de enfrentamento da crise tríplice sanitária, política e econômica. A execução do pagamento do auxílio emergencial de R$ 600 virou cipoal de armadilhas para os mais necessitados, e a realização do próximo Enem também promete ser. Jair Bolsonaro, pseudônimo Airton, Rafael ou Paciente 05 nos testes negativos de Covid-19 que apresentou dias atrás, libera academias de ginástica, salões de beleza e barbearias como sendo serviços essenciais. Não fosse tudo tão sério, o conjunto daria um roteiro e tanto para o diretor Cacá Diegues filmar um “Bye Bye Brasil 2020”.

Se em tempos excepcionais é desejável que o mundo tenha líderes de qualidades adequadas, em tempos de crise pandêmica é mais crucial ainda. É quando a diferença entre exercer ou não uma liderança sólida vai definir o cociente de vidas salvas ou mortes desnecessárias. Estatísticos e formuladores de métricas da Covid-19 poderiam trabalhar com uma variável hipotética: e se Jair Bolsonaro fizesse uma live proclamando que doravante, para o bem da amada pátria e em nome de Deus, todos deveriam aderir ao distanciamento social — se necessário até mesmo a um isolamento temporário? 

Considerando-se a fidelidade já demonstrada pelos milhões de apoiadores do presidente-mito, é provável que uma boa parcela o seguiria de casa e bíblia na mão.
Nessa hipótese, como seria a mudança de comportamento da curva do vírus no Brasil? 
O índice de contaminação diminuiria para quanto? E a mortandade? Poderíamos regredir quantas casas no sombrio ranking global? 
Dá para calcular o efeito de mais leitos de CTI e respiradores com tempo de se tornarem operacionais. Talvez deixássemos de ser o país-pária da atualidade, e fronteiras se entreabririam para o Brasil quando o mundo retomasse sua rotina. A gritante subnotificação de óbitos e contaminados do país teria mais chances de ser computada e aperfeiçoar as políticas sanitárias?

O exercício de métrica serve apenas para jogar o foco no tamanho da (ir)responsabilidade do ocupante do cargo. Liderança é uma questão de fatos, não de opinião, e nem todo chefe de nação nasce estadista. As dificuldades se agravam quando o governante tem consciência íntima de estar aquém do exigido para conduzir um país em crise. No caso da Covid-19, deve ser irreprimível a tentação de acenar com a falsa promessa de uma vacina iminente ou uma droga capaz de inverter o quadro. A aposta presidencial no uso da cloroquina deve ter essa raiz.

Já disponível para outras enfermidades como malária mas ainda não liberada para tratar o coronavírus em sua fase inicial, a poção mágica abraçada por Bolsonaro torna-se, agora, política oficial para pacientes do SUS. Os dois ministros da Saúde defenestrados, ambos médicos, se opunham à medida devido a seus possíveis efeitos colaterais. “Votaram em mim para eu decidir e esta questão passa por mim”, decidiu o presidente.

Nos Estados Unidos, onde o número de óbitos se aproxima dos 100 mil, o Instituto de Alergias e Doenças Infecciosas deu início a um teste clínico da droga em 2.000 adultos. Até a conclusão do estudo, nem Donald Trump, outro fervoroso adepto da droga, terá vez. O terceiro promotor ativo da cloroquina é o venezuelano Nicolás Maduro, formando um improvável eixo de líderes errados para tempos de pandemia.

Dorrit Harazim, jornalista - O Globo