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sábado, 4 de fevereiro de 2023

Brasil sob Lula vai na contramão de novo ânimo global - Folha de S. Paulo

 Novos indicadores globais mostram que o Brasil caminha na contramão das principais economias que enfrentaram problemas inflacionários e estruturais nos últimos anos. Enquanto Estados Unidos, zona do euro, Japão e emergentes como Índia projetam desaceleração nos preços em 2023 (ou estabilidade, como China) sem um choque maior de juros, as previsões no Brasil têm piorado sistematicamente.

Mesmo assim, as pressões inflacionárias no Brasil seguem firmes. 
E devem aumentar quando o governo reonerar impostos sobre gasolina e álcool. A volta da tributação foi adiada para o fim de fevereiro e integra o pacote de ajuste fiscal que o ministro Fernando Haddad (Fazenda) apresentou para atacar o desequilíbrio fiscal, esperando arrecadar R$ 29 bilhões com a reoneração.

Para especialistas, enquanto o quadro internacional mudou para melhor, indicando um futuro mais promissor, o governo brasileiro ainda não convenceu empresários e agentes de mercado sobre como controlará a expansão do gasto e de sua dívida pública.O resultado tem sido insegurança entre empresas e mercado; e mais pressão sobre a inflação --num ambiente agravado por falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra juros altos, meta de inflação, autonomia do Banco Central e responsabilidade fiscal.

Na maior fatia dos eleitores de Lula, os mais pobres, a inflação é a principal ameaça para a corrosão da popularidade do presidente. Eles não contam com mecanismos de proteção dos mais ricos, como aplicações indexadas aos juros, e gastam a maior parte da renda com alimentação. Em 12 meses, com a inflação oficial em 5,9%, os alimentos sobem 11,5%.

Na semana passada, o economista-chefe do FMI (Fundo Monetário Internacional), Pierre-Olivier Gourinchas, afirmou que 2023 deve representar o "ponto de virada" para muitos países e revisou para cima as estimativas de crescimento em relação a outubro passado (exceto para o Reino Unido).

O Fundo prevê que cerca de 84% dos países terão inflação menor em relação a 2022, o que reduziria a pressão para que seus bancos centrais subam os juros, deprimindo as economias. Também na semana passada, EUA e zona do euro anunciaram aumentos de 0,25 e 0,5 ponto percentuais em suas taxas básicas de juro. Elevando-as, respectivamente, para até 4,75% e 3% ao ano.

Segundo José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central e chefe do Centro de Estudos Monetários do Ibre-FGV, como a expectativa de inflação norte-americana é de 3,4% neste ano (consenso da Bloomberg), os EUA estarão operando com juros acima da inflação. No caso europeu, a Bloomberg projeta inflação de 5,9% (ante juro agora em 3%). "Com uma inflação de demanda e mercado de trabalho aquecido, os EUA já estão com o juro em terreno contracionista. Na Europa, cerca de 43% da inflação vêm de choques de oferta, como energia e alimentos, daí que o aperto de juros não será tão severo. Mas, nos dois casos, novas altas moderadas podem ser esperadas", diz Senna, também consultor associado da MCM.

O juro real (acima da inflação) levemente positivo nos EUA e ainda negativo na Europa --duas regiões com a inflação em declínio-- contrastam com a situação brasileira de taxas reais perto de 8% ao ano e preços sob pressão. Há sete semanas sobe a estimativa de inflação para 2023 na pesquisa Focus do Banco Central. Na segunda passada (30), ela chegou a 5,74% --praticamente o mesmo nível do IPCA fechado em 2022 (5,79%). Alguns bancos e consultorias já projetam 6,5%. "Quase todo o plano de ajuste fiscal do governo Lula passa pelo aumento da receita, o que acaba tendo impactos inflacionários, e não pelo corte de gastos. Isso tem levado à desancoragem das expectativas de inflação e à alta dos juros, com títulos mais longos do Tesouro pagando entre 6% e 6,5% ao ano, mais inflação. Quanto tempo o país aguenta algo assim?", questiona Senna.

Segundo o economista Affonso Celso Pastore, da AC Pastore & Associados e ex-presidente do Banco Central, a dívida pública brasileira tem prazo médio de quatro anos, o que requer a rolagem de cerca de 25% dela a cada ano com a venda de novos títulos no mercado --que hoje pagam juros reais elevadíssimos."O juro real alto faz a dívida pública aumentar e o PIB, diminuir, piorando a relação entre o tamanho da dívida e o PIB [73,5% em 2022]. Com a piora do indicador, o mercado vai exigir juro maior para rolar a dívida, levando a uma profecia negativa autorrealizável", diz.

Pastore afirma que, até aqui, o governo Lula vem apresentando uma estratégia expansionista (de mais gastos) e que, apesar das reclamações do presidente sobre o nível dos juros, o Banco Central já deixou claro que manterá as taxas elevadas enquanto a política fiscal não controlar as despesas e as expectativas. Com a PEC aprovada antes de Lula assumir, sua equipe ampliou o espaço para gastos em cerca de R$ 170 bilhões neste ano, o que deve pressionar a inflação pelo lado da demanda do governo --embora Fernando Haddad tenha dito que não pretende gastar todo o valor.

Para Lívio Ribeiro, pesquisador do Ibre-FGV e sócio da consultoria BRCG, um dos sintomas da desconfiança na capacidade do governo de ajustar suas contas para que o Banco Central possa baixar os juros e dar chance ao crescimento é que moedas de emergentes têm se valorizado mais do que o real frente o dólar --apesar do juro real brasileiro de 8 pontos acima da inflação; que, em tese, levaria investidores internacionais a trazer dólares ao Brasil para aproveitar esse ganho.

Na quinta passada (2), depois de o BC deixar claro que o juro no Brasil pode continuar elevado por mais tempo caso não haja providências na área fiscal, o dólar chegou a cair abaixo de R$ 5 por conta da atração da taxa. Mas voltou a subir a R$ 5,15 no dia seguinte após Lula, em entrevista, criticar novamente a autonomia do BC e o juro alto."O fato é que continuamos diante de uma incerteza brutal de quais serão as regras do jogo. Os primeiros movimentos do governo vão no sentido contrário ao de uma consolidação fiscal que permita ao Banco Central baixar o juro. O que temos é a perspectiva de mais gastos; e um pacote fiscal pelo lado da receita, via aumento da arrecadação e impostos", afirma Ribeiro.

Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, afirma que a comunicação recente do Ministério da Fazenda no sentido de um ajuste fiscal via arrecadação (que pode acabar redundando em mais gastos), além do "ruído desnecessário" provocado pelas declarações de Lula, começam a apontar para um risco que não existia há algumas semanas: de Banco Central aumentar ainda mais os juros para conter pressões inflacionárias, elevando a dívida pública e deprimindo mais a economia. "Todos os sinais são de um Banco Central agressivo. Em seu último ano de mandato [2024], [Roberto] Campos Neto [presidente do BC] provavelmente fará de tudo para tentar entregar a inflação na meta [de 3%, com tolerância até 4,5%]", afirma Vale. "Se o fiscal não ajudar, juros maiores podem ser necessários." 

Fernando Canzian, colunista - Folha de S. Paulo


sábado, 30 de julho de 2022

Prendam esses números - Revista Oeste

J. R. Guzzo

Para “salvar o Brasil da direita”, estão trocando a disputa política por fanatismo, histeria e rancor

Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock
Foto: Montagem Revista Oeste/Shutterstock

Tudo isso é falso. Chamem a polícia, então, para prender os algarismos que atestam a falsidade — ou, quem sabe, o ministro Moraes, para proibir a sua divulgação nas redes sociais, por ameaçarem a “democracia”. Também se poderia entregar o caso às “agências de checagem”, para declarar que todos esses números, além de ilegais, são “fake news inventadas pela direita.

Até outro dia, os jornalistas davam como certo que a inflação estava “fora de controle”. Quando escreviam isso, com a certeza de quem anuncia um fato científico, estava acontecendo justamente o oposto no mundo das coisas reais

 Que tal começar pela inflação? O último boletim do Banco Central, que hoje é independente do governo, informa que a inflação vai fechar 2022, de ponta a ponta, em 7,3% — são os cálculos do IPCA, ou Índice dos Preços ao Consumidor. É isso mesmo: são 7,3%, no ano inteiro. Este é um dos números mais ilegais e mais odiados de todos.

Edição 123

                   Ele desmancha, sozinho, a sentença de morte sem apelação que o “consórcio de órgãos de imprensa” e os seus analistas de mesa-redonda já tinham passado para a economia brasileira. Até outro dia, os jornalistas davam como certo que a inflação estava “fora de controle”. Quando escreviam isso, com a certeza de quem anuncia um fato científico, estava acontecendo justamente o oposto no mundo das coisas reais. A inflação, naquele preciso momento, não apenas estava sob controle; estava caindo.  

A se confirmarem as estimativas do Banco Central, que não costuma errar nesses casos, o Brasil terá, na verdade, uma das menores taxas de inflação do mundo.                                                                              Vale a pena, aí, pensar um ou dois minutos nesses 7,3%.          Isso é menos do que a inflação prevista para este ano nos Estados Unidos, que está rolando na beira dos 8,5% para os últimos 12 meses, e pode subir ainda mais; é a pior dos últimos 40 anos. Muito bem.           A pergunta a fazer, no caso, é a seguinte: você se lembra, alguma vez na sua vida, de ter visto a inflação no Brasil ser menor que a dos Estados Unidos? Está acontecendo agora; como, então, a economia brasileira poderia estar “destruída”? 

O Brasil não baixou nenhum decreto de “tabelamento de preços”; em vez disso, fez o preço da gasolina baixar. Esse é o tipo de coisa que deixa a esquerda nacional à beira de um colapso de nervos

A inflação é um índice geral; no universo das coisas mais específicas e mais próximas ao bolso das pessoas há um outro número antidemocrático, e da pior espécie. 
 Os preços dos combustíveis, pagos pelo consumidor na bomba do posto de gasolina, acabam de cair pela quarta vez seguida. 
É um desastre, para o Brasil que combate o “fascismo”. 
Anunciava-se, nesse meio, que a explosão mundial nos preços do petróleo ia mandar o Brasil e o governo Bolsonaro para o espaço; 
para o condomínio que luta em favor da democracia, do STF e da perfeição das urnas eletrônicas, por sinal, o preço do combustível subia só no Brasil, e só por culpa direta do presidente da República. E agora? 
 
Agora eles querem declarar que a redução de preços é um atentado à democracia e que o governo deve ser punido pela solução que deu para o problema. 
 O Brasil não baixou nenhum decreto de “tabelamento de preços”; em vez disso, fez o preço da gasolina baixar. Esse é o tipo de coisa que deixa a esquerda nacional à beira de um colapso de nervos. 
Sua religião econômica é a da Argentina, onde o governo mete tabela em tudo o que lhe passa pela frente, e não faz baixar o preço de nada. 
No momento, aliás, estão “reforçando o controle oficial de preços” nos supermercados — e a inflação está indo para os 65% ao ano. Como “o Bolsonaro”, que faz o contrário do que fazem os argentinos e do que manda o manual econômico do Brasil “civilizado”, pode baixar o preço dos combustíveis sem fazer tabelamento e, além disso, segura a inflação anual nos 7,3%?

Segundo a oposição, os banqueiros de esquerda e a cantora que sapateia em cima da bandeira nacional, a queda de preços dos combustíveis, mais toda a melhoria nos programas sociais que também foi aprovada no Congresso —, é coisa do mal

Isso não poderia estar acontecendomas, como é exatamente isso o que acontece, a saída da oposição é pedir ao TSE, o braço do STF que controla as eleições brasileiras, a cassação da candidatura de Jair Bolsonaro para presidente da República
A queda de preços, para a mídia, os intelectuais e o resto do “campo progressista”, foi consequência direta da “demagogia eleitoreira” do presidente; não se pode fazer uma coisa dessas. Por que não pode?    O preço dos combustíveis caiu porque o Congresso Nacional, a pedido do governo e com votação quase unânime, aprovou uma redução importante nos impostos estaduais sobre gasolina, álcool e diesel. É lei; - o STF e os governadores querem melar, mas é lei.  
 
Além do mais, como o governo federal poderia ser punido por praticar a sua obrigação de governar o país? 
Quer dizer que em ano eleitoral, então, o governo tem de ficar trancado em casa, sem fazer nada? 
Não interessa. Segundo a oposição, os banqueiros de esquerda e a cantora que sapateia em cima da bandeira nacional, a queda de preços dos combustíveis, mais toda a melhoria nos programas sociais — que também foi aprovada no Congresso —, é coisa do mal.  
Vai ser usada, como as eleições, para a “direita” continuar no governo e, em seguida, “implantar um regime autoritário” no Brasil. Não faz nexo nenhum. Mas é o que estão dizendo todos os dias. 
Há também o PIB, esse bendito PIB que ninguém sabe como é calculado, mas que é uma tragédia quando está baixo, e uma trapaça que só beneficia os ricos quando está crescendo — ou, então, é uma bobagem sem importância nenhuma para “o povo”. É o caso do Brasil de hoje. No final de 2021, era uma certeza para o FMI, os analistas dos bancos nacionais ou estrangeiros e o noticiário econômico em geral que em 2022 o Brasil estaria em recessão. Não só não iria crescer nada; 
- a economia ia andar para trás, como no segundo governo de Dilma Rousseff, que gerou a maior recessão econômica que o Brasil já teve em sua história. 
 
Vem aí, então, mais um número ilegal: o PIB brasileiro, pelos cálculos agora de julho, vai subir 2% este ano. Como assim? 
É precisamente o inverso do que todos juravam que ia acontecer; o ministro Paulo Guedes, a propósito, disse que os economistas, e analistas do “mercado”, e especialistas etc. etc. etc. iriam passar o ano inteiro revendo para cima as suas previsões. 
Estão fazendo isso, mas acham que o PIB positivo não adianta nada; já o PIB negativo, como a saúva, ia acabar com o Brasil
Para a mídia, em especial, a solução é banir esse número para um estado de semiclandestinidade, o mais longe que for possível das manchetes e dos destaques do horário nobre. 
 
Na verdade, o Brasil é um caso raro de saúde razoável num mundo de economia doente
Nesta semana, o FMI anunciou que as perspectivas de crescimento global “estão inclinadas esmagadoramente para o lado negativo” e que, se as previsões se concretizarem, a economia mundial poderá enfrentar uma das piores recessões em meio século. 
Entre as exceções estão o Brasil e o México. 
O aumento da inflação global e uma desaceleração nos Estados Unidos e na China levaram o FMI a diminuir suas projeções. “O panorama ficou consideravelmente sombrio desde abril”, disse o economista-chefe do FMI, Pierre-Olivier Gourinchas. “As três maiores economias do mundo, os Estados Unidos, a China e a zona do euro, estão empatando nessa estagnação com grandes conseqüências para o panorama global”, estimou ele. 
 
Além do Brasil e do México, a Rússia também apresenta índices econômicos positivos em razão dos preços mais altos do petróleo devido às sanções ocidentais. 
Para a América Latina e o Caribe como um todo, o FMI elevou suas perspectivas de crescimento para este ano para 3%, uma revisão para cima de 0,5 ponto percentual “como resultado de uma recuperação mais forte nas grandes economias”: Brasil, México, Colômbia e Chile.
 
Os índices de desemprego são outra frustração de primeira grandeza. A última cifra é de 9,8%, a menor dos últimos seis anos — ou seja, menor do que era quando começou a pandemia, ou no final do governo Dilma. Neste ano, só de janeiro a abril, foram criados mais de 1 milhão de empregos com carteira assinada;  
em maio, o total de brasileiros com emprego formal estava próximo aos 42 milhões, um recorde na história do cadastro do Ministério do Trabalho, iniciado dez anos atrás. Só no mês de junho, o número disponível mais recente, foram criados 300 mil novos empregos. 
No total, com covid e tudo, o atual governo tem um saldo positivo acima de 2 milhões de vagas.  
 
Se há mais gente empregada agora do que havia antes do governo assumir, e se o STF, os governadores e os prefeitos mantiveram a economia fechada durante dois anos inteiros, o que aconteceu com o “extermínio do trabalho” anunciado com tanta paixão pelos comunicadores, influenciadores e funcionários dos “grandes veículos” de comunicação? É a mesma decepção com o comércio exterior. 
Nos últimos 12 meses o Brasil exportou quase US$ 310 bilhões, e teve um saldo próximo aos 60 bilhões na sua balança comercial; a produção agrícola, em especial, vai bater um novo recorde em 2022. 
Também aí está tudo errado. Segundo garante a nossa melhor elite financeira, o Brasil está “isolado” no mundo: países estrangeiros, bancos internacionais, altas multinacionais e fundos de investimento conduzem um boicote pesadíssimo contra a economia brasileira, para punir o presidente e seu governo pela agressão ao “clima” do planeta em geral, e os incêndios na Floresta Amazônica em particular
É outro mistério. O Brasil é o único país do mundo e da história que está sofrendo um boicote internacional e, assim mesmo, vende cada vez mais os seus produtos no exterior.     
 
O país “destruído” pelo governo atual é uma mentira; pior que isso, é uma bobagem, ou um certificado de estupidez para a frente “equilibrada” que acha uma boa ideia colocar na presidência do seu país um político que passou 20 meses no xadrez, condenado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, em três instâncias e por nove juízes diferentes. 
Para “salvar o Brasil da direita”, estão trocando a disputa política por fanatismo, pela histeria e pelo rancor; 
não respondem mais à razão, e sim aos seus tumultuados desacertos psicológicos. 
 O resultado é que estão em pleno negacionismo dos números.

Leia também “Um tribunal que joga para Lula”

J. R. Guzzo,  colunista - Revista Oeste

 

sábado, 22 de janeiro de 2022

A vacina é legal - Carlos Alberto Sardenberg

Os canadenses da província de Quebec deram a maior  bandeira: o número de vacinados com a primeira dose aumentou exponencialmente depois que o governo local baixou a regra segundo a qual o cidadão só poderia comprar álcool e maconha apresentando o passaporte da vacina. Note-se: lá a maconha é legal inclusive para “fins recreativos”, ou seja, para um baseado.

Não vai aqui nenhuma crítica aos moradores de Quebec, mesmo porque certamente é a minoria que consome bebidas e a erva. Ok, pode ser uma minoria expressiva, não importa. O objetivo é mostrar como os governos pelo mundo estão sendo criativos na tarefa de estimular ou mesmo forçar a vacinação.

Ainda em Quebec, o primeiro-ministro François Legault avalia a cobrança de um imposto a ser pago pelos não-vacinados. Argumenta que esses adoecem mais e transmitem a Covid para um número maior de pessoas, tudo isso sobrecarregando a rede pública de saúde. Logo, como geram mais gasto público, devem pagar por isso.

O mesmo princípio foi utilizado pelo primeiro ministro da Alemanha, o social democrata Olaf Scholz, quando sugeriu que a vacina deveria ser obrigatória para todos os adultos. De novo, os não-vacinados geram custos públicos e sociais. A medida vai a debate no parlamento.

O princípio é o seguinte: liberdade e direitos individuais têm limites. O cidadão não pode recusar a vacina e sair por aí infectando os outros e sobrecarregando a rede de saúde. Simples assim: se o exercício de um suposto direito individual fere o direito dos outros e prejudica a sociedade, então prevalece o direito dos outros e da sociedade.

Já a Suprema Corte dos Estados Unidos derrubou uma portaria do presidente Biden que impunha regra para as empresas com mais de 100 empregados. Pela norma, a empresa deveria exigir certificado de vacina dos funcionários. Os que se recusassem deveriam fazer teste semanalmente.

A decisão foi por seis votos a três, claramente dividida entre juízes conservadores e progressistas, estes lá chamados liberais. Os conservadores valorizam mais os direitos individuais e os progressistas, o interesse coletivo e social. A decisão, entretanto, baseou-se num argumento, digamos, técnico. O presidente não teria o poder de baixar aquela portaria sem autorização do Congresso.

Certo, mas o debate nos EUA não raro cai nesse ponto. O cidadão tem o direito de escolher entre vacinar-se ou não? A resposta totalmente correta seria esta: tem o direito, mas o não vacinado por opção não pode circular onde cause o risco de transmitir o vírus. E se ficar doente, os custos do tratamento não serão cobertos pelo setor público nem pelos seguros privados.

A questão está longe de ser atual. No Brasil já houve uma revolta sangrenta contra a obrigatoriedade vacina da varíola, em 1904. A lei foi suspensa, mas um novo surto de varíola no Rio levou as pessoas a correrem para os postos de vacinação. Hoje, os brasileiros mostram forte adesão às vacinas e, por isso, entre outros motivos, desaprovam cada vez o presidente Bolsonaro e seu ridículo negacionismo.

Mas como subsistem aqui e ali resistências à vacina, é preciso criar regras que forcem a imunização. Governos estão empenhados nisso, mas também estabelecimentos privados. Nas estações de ski na Suíça, segundo me conta um conhecido, bares e restaurantes adotaram a seguinte regra: 
o cliente tem que fazer o teste rápido, fornecido, e cobrado, pelo estabelecimento antes de entrar. Se deu positivo, está fora. Negativo, está dentro. E o que foi pago pelo teste é descontado na conta.

Simples, não é mesmo? O teste é de fácil aplicação, o resultado sai na hora. Aliás, eis mais um argumento a favor da liberação do auto-teste e da ampla distribuição e comercialização dos testes. O prefeito Eduardo Paes gostou da regra de Quebec, assim meio de brincadeira. Mas poderia adotá-la.

Não se pode dizer que ir ao bar seja um direito sagrado do ser humano – embora muitos pensem assim. Assim, negar a entrada para os positivados não configura violação de direitos. Vale como exemplo: estimular e/ou forçar a vacinação é legal.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 Coluna publicada em O Globo - Economia

 

quarta-feira, 29 de dezembro de 2021

O governo tem que facilitar, e não complicar

Levantamento feito pela Agência Nacional de Petróleo em postos de combustíveis no Brasil inteiro encontrou uma diferença de quase R$ 3 no litro do álcool hidratado entre o Rio Grande do Sul e São Paulo. Um posto do Rio Grande do Sul está vendendo o álcool a R$ 7,80 o litro. E, em São Paulo, o preço médio nem é o preço mais baixo - o preço médio é R$ 4,90. A maior parte das refinarias de álcool estão em São Paulo. Mas quase, praticamente R$ 3, porque esse é o preço médio em São Paulo. E está mais baixo em São Paulo por que?  
Consequência de uma medida provisória do governo autorizando a venda direta da refinaria para o posto. 
Não precisa fazer uma viagem até a distribuidora, para depois voltar para o posto. Pode vender para qualquer bandeira. Liberação é isso: o governo tem que abrir, facilitar, e não prender, amarrar, complicar para ficar tudo mais caro. Para fazer passeio por aí.
 
Na semana antes do Natal, o preço caiu muito, na maior parte dos estados. Em 19 estados o preço do litro do álcool caiu. Em Mato Grosso, chegou a cair 15% - ao passo que, no Rio Grande do Sul, esse preço em média é R$ 7, enquanto a média em São Paulo é R$ 4,90. Só para a gente registrar, comparar, na hora de abastecer. Tem muita gente, eu já ouvi muito motorista se queixar de que está vindo pela BR-101, por Santa Catarina, indo em direção ao Rio Grande do Sul, e abastece antes de entrar na divisa do Rio Grande do Sul.  
Porque no Rio Grande do Sul o imposto estadual é mais alto do que em Santa Catarina, e o preço do combustível fica mais caro, qualquer combustível.


Chuvas e inundações

Bahia sofrendo com chuvas, e também Minas Gerais, outros estados. Muita chuva neste verão. 
E o presidente Bolsonaro assinou uma medida provisória criando um crédito extraordinário de R$ 200 milhões para refazer estradas destruídas pelas chuvas, pelas inundações 
R$ 80 milhões para estradas baianas. 
Mas também vai para estradas do Pará, de São Paulo, de Minas Gerais e do Amazonas. Há mais de 20 mortos e mais de 30 mil desabrigados só na Bahia. É uma grande tragédia numa época em que a gente costuma festejar o Natal e o fim de ano.


A vitória de Alex

Quem está festejando também é o jogador que começou no Grêmio, o Alex dos Santos Gonçalves, que estava enrolado na Indonésia, não podia sair, estava sem o passaporte.                                                          E o governo brasileiro entrou nessa dando apoio diplomático e jurídico ao atleta. E o clube em que ele jogava, unilateralmente, violou o contrato reduzindo o salário dele em 75%. Aí ele se queixou para a FIFA, e a FIFA puniu o clube e mandou o clube pagar as diferenças.                                  O clube ficou furioso e retaliou, dando uma queixa na polícia, dizendo que ele já estava com o visto de trabalho vencido na Indonésia, por isso estava em situação irregular e a situação ficou difícil para ele voltar para o Brasil em festas de fim de ano, para se reunir com a família.

O governo brasileiro entrou nessa, conseguiu a liberação dele também, e ontem eu vi um tweet do presidente Bolsonaro e do ministro de Relações Exteriores, o ministro França, anunciando que ele havia passado na alfândega, na migração em Jacarta. Estava em um voo da Emirates para Dubai, ia fazer escala em Dubai, de lá iria para São Paulo, e de São Paulo ia voltar para Porto Alegre onde ele começou a carreira esportiva.

 Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 11 de dezembro de 2021

Ação do BC contra inflação começa a surtir efeito - Editorial

O Globo

Em meio à inflação galopante, é um alento que a mão firme do Banco Central (BC) venha sendo sentida pelos agentes econômicos. As altas recentes nos juros a última delas na quarta-feira — e, sobretudo, a mensagem de que o aperto monetário continuará começam a surtir efeito num dos fatores responsáveis pela espiral ascendente dos preços: as expectativas. Pela primeira vez desde junho, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), medida oficial de inflação, ficou abaixo da expectativa do mercado (em novembro, 0,95% ante 1,07%, segundo o BC).

Como todos percebem quando vão a postos de gasolina, supermercados ou pagam por serviços, a alta dos preços nos últimos 12 meses continua acima do razoável (10,74%). Mas os olhos do BC estão no futuro. A autoridade monetária planeja chegar ao final de 2022 e 2023 com a inflação abaixo do teto da meta (5% no ano que vem e 4,75% no seguinte). Domar as expectativas agora é chave para atingir o objetivo.

Na quarta-feira, o Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, elevou a taxa de juros que serve de referência para o mercado, a Selic, de 7,75% a 9,25% ao ano. É o maior patamar desde julho de 2017
Em janeiro, a Selic estava em 2%, o piso histórico. O salto de 7,25 pontos percentuais é o maior ciclo de alta desde 2002, quando investidores temeram a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva e a adoção de políticas populistas. A alta desta vez nada tem a ver com o pré-candidato do PT à Presidência.

É resultado de dois fatores. O principal é interno: as barbeiragens do governo, incluindo aí o Executivo de Jair Bolsonaro e o Legislativo de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco. Todo o esforço do presidente e dos líderes do Centrão em romper o teto de gastos para poder dispor de recursos antes das eleições do ano que vem provocou estrago gigantesco na credibilidade da política fiscal e da capacidade do Estado em honrar suas dívidas. A irresponsabilidade não saiu de graça. O aumento da incerteza fez o câmbio depreciar, aumentando o valor dos produtos importados e alimentando a inflação.

O segundo fator é externo: a recuperação global depois da pandemia exerceu pressão nos preços em quase todo o mundo. Nos Estados Unidos, a inflação registrou alta de 6,8% nos últimos 12 meses, maior valor desde 1982. Isso afeta as cotações de todos os produtos básicos, como petróleo e soja, definidos pelo mercado internacional.

Em comunicado, o Copom deixou claro que manterá a estratégia conservadora.  
É provável que a Selic suba mais 1,5 ponto percentual na próxima reunião, em fevereiro. 
Os juros altos impõem um freio ao consumo, por isso tiram o ímpeto de fabricantes de produtos e fornecedores de serviços de elevar preços.  
Verdade que, por aqui, esse mecanismo tende a surtir menos efeito diante do hiato persistente entre a demanda e a capacidade de produção. Mas, ao anunciar que pretende seguir elevando a Selic, o BC tenta “ancorar” as expectativas, induzindo os agentes a não repassar custos diante do risco da demanda reprimida adiante, com juros ainda maiores no futuro.

Infelizmente, o BC está sozinho na tarefa. Na verdade, é pior: Bolsonaro trabalha contra. Preocupado apenas em aumentar suas chances na eleição do ano que vem, o presidente insiste na estratégia desajuizada de jogar álcool na fogueira inflacionária. [se adotar medidas para reduzir,  ainda que apenas um pouco, a miséria de mais de 17.000.000 de famílias - além de famintas, estão desprovidas do básico do básico - for jogar fogo na fogueira inflacionária, tragam mais álcool. = VIDAS DE BRASILEIROS FAMINTOS IMPORTAM.]

Editorial - O Globo


terça-feira, 25 de maio de 2021

Governistas conseguem adiar votação de lei pró-maconha - Revista Oeste

Cristyan Costa

O projeto estabelece o cultivo da erva no país 'para fins medicinais'; conservadores denunciam tentativa de legalização

A base do presidente Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados conseguiu prorrogar, por 15 dias, a votação da lei que permite o cultivo da cannabis no Brasil. O movimento só foi possível graças à articulação com o presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). Amanhã, quarta-feira 26, haverá um debate no plenário com a participação de congressistas que não são membros do colegiado especial que discute a medida.
Estudo garante que a droga é pior que o álcool
Estudo garante que a droga é pior que o álcool | Foto: Divulgação/Canva

Conforme o projeto do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE), a autorização para cultivar a erva no país é restrita a “fins medicinais”. Parlamentares conservadores, porém, denunciam a tentativa da esquerda de tentar, paulatinamente, legalizar o consumo do entorpecente. Estudo publicado na revista científica American Journal of Psychiatry garante que a droga é pior para o cérebro do que o álcool.

Leia também: “O mal travestido de bondade”, artigo de Ana Paula Henkel publicado na Edição 60 da Revista Oeste

 

terça-feira, 29 de dezembro de 2020

O pino da granada - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

O acesso de Lula às mensagens hackeadas da Lava Jato vai explodir no STF e em 2022

Ao abrir os arquivos hackeados da Lava Jato para os advogados do ex-presidente Lula, o ministro Ricardo Lewandowski tirou o pino da granada e vem por aí uma explosão política com epicentro no Supremo Tribunal Federal e estilhaços nas eleições presidenciais de 2022. Lewandowski escolheu o momento a dedo, com o Supremo já em chamas.

[o ministro Lewandowski, que dedica grande apreço à família  'Lula da Silva', tirou o pino da granada sem se preocupar com com efeitos colaterais, esquecendo que tais efeitos podem ser benéficos para o Brasil = é comum que uma explosão política desencadeie um processo de mudanças  e nossa Pátria precisa mudar radicalmente em muitos pontos.]

Os arquivos têm cerca de 7 TB (terabytes) de memória, o que corresponde a toneladas de papel, mas Lewandowski permitiu o acesso da defesa de Lula “apenas” às mensagens de autoridades – o então juiz Sérgio Moro e a força-tarefa da Lava Jato – que tenham relação com o ex-presidente e as ações contra ele. Detalhe: mensagens que digam respeito a ele até indiretamente, o que abre uma janela sem fim.

O impacto mais previsível tende a ser no julgamento sobre os pedidos de suspeição de Moro nos casos de Lula, que estão na Segunda Turma do STF e embutem a tentativa de anular suas condenações pelo triplex do Guarujá, pelo qual já ficou 580 dias preso, e pelo sítio de Atibaia. Se o STF declara a suspeição de Moro, tudo volta à primeira instância, à estaca zero. E Lula se torna elegível em 2022. [faltarão votos para o petista, mas para os inimigos do Brasil = inimigos do presidente Bolsonaro = qualquer tentativa vale para impedir que o capitão seja reeleito e, quem sabe, não conclua o atual mandato. Esquecem que os efeitos de uma explosão, prioriza a expansão em círculos.]

A sinalização é pró-Lula, anti-Moro. Em agosto deste ano, a Segunda Turma decidiu pela “parcialidade” do então juiz e anulou a sentença do doleiro Paulo Roberto Krug no caso Banestado, sob alegação do próprio Lewandowski e do ministro Gilmar Mendes de que Moro teria atuado não como juiz, mas como “auxiliar” do Ministério Público até na produção de provas. Essa alegação é a mesma nos casos de Lula.

Diferentemente de Gilmar, Marco Aurélio e Luiz Roberto Barroso, por exemplo, Lewandowski não é dado a palestras, entrevistas e polêmicas públicas. Ele não fala, age. E age sempre na mesma direção: a favor de Lula, para corrigir o que considera erros históricos contra o maior líder popular do País pós-redemocratização. É como se a prisão de Lula estivesse engasgada na garganta.

Não tão petistas, ou nada petistas, outros ministros dividem com Lewandowski a convicção de que a prisão de Lula foi um excesso, logo injusta. “A gente deve a Lula um julgamento decente”, repete Gilmar há anos, enquanto nas redes sociais grassa uma comparação: o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) comprou e vendeu uns 20 imóveis, muitas vezes com dinheiro vivo, mas Lula foi preso por um apartamento que nunca comprou, vendeu ou usou.

A decisão de Lewandowski, portanto, é lenha, álcool e palha na fogueira do Supremo em 2021, que vai chegando ao fim com uma rebelião dos ministros Gilmar, Lewandowski, Marco Aurélio e Alexandre de Moraes contra o presidente Luiz Fux, com Dias Toffoli no banco de reservas. Eles simplesmente decidiram cancelar o próprio recesso e ficar de prontidão. Para quê? Para impedir decisões monocráticas de Fux em processos em que sejam relatores.

Marco Aurélio já cancelou seu recesso durante a presidência de Toffoli, mas não há precedente de quatro ministros agirem assim juntos e isso caracteriza um “atestado de desconfiança” em relação a Fux. Eles são anti Lava Jato, ele é a favor. E a guerra comporta uma provocação: se a mídia usa o vazamento de informações sigilosas, como pode se indignar com o acesso de Lula a tudo o que foi dito – ou armado, como dizem – contra ele?

O efeito político deve ser favorável ao presidente Jair Bolsonaro. Qualquer decisão benevolente com Lula tende a ter correspondência nos processos contra o senador Flávio. E, se os processos são anulados e Lula se torna elegível, isso vai eletrizar o País e acirrar a polarização Lula versus Bolsonaro em 2022, o que ainda é favorável ao capitão, como em 2018. Ao garantir uma “reparação” para Lula, o Supremo pode acabar beneficiando Bolsonaro. [por favor, ministro Lewandowski não reponha o pino, não tente impedir a explosão - ela será boa para o Brasil.]

Eliane Cantanhêde, colunista -  O Estado de S. Paulo


quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Condenado por estupro, Robinho volta ao Santos. E há quem minimize. É o Brasil

Mauro Cezar Pereira

Condenado por estupro na Itália, atacante Robinho foi contratado pelo Santos

"Depois da violência, Robinho humilhou a vítima: por isso o ex-jogador foi condenado a 9 anos". O título da matéria publicada em 22 de fevereiro de 2018 pelo jornal La Repubblica dá o tom da gravidade do que, de acordo com a investigação, se passara em 22 de janeiro de 2013. O periódico italiano detalha a reconstituição da justiça, que levou a tal veredicto.

E não foi apenas isso: segundo juízas de Milão Mariolina Panasiti, Piera Gasparini e Simone Luerti, o atacante, então jogando pelo Milan, "teria comentado o estupro coletivo de uma jovem com 23 anos com expressões de desprezo". A vítima, uma albanesa que naquele dia comemorava seus 22 anos em um clube da cidade, o Sio Café. A publicação acrescenta que também estavam no local Robinho e pelo menos cinco amigos. "O jogador de futebol teria sido o primeiro a estuprar a jovem que, devido ao seu quadro psicofísico comprometido pelo álcool, não conseguiu se opor a Ricardo Falco, 35, amigo de Robinho que a obrigou a se relacionar. Os dois então 'cederam' a vítima para os outros quatro brasileiros que, até então, haviam testemunhado a cena sem intervir", publicou o jornal.

De acordo com a investigação, houve participação de cinco pessoas, além do jogador. No entanto, Ricardo Falco foi o único identificado. Com isso, não se concretizou o processo contra os demais, todos réus jamais encontrados. Assim, a juíza Panasiti decretou a pena, após avaliar a personalidade dos autores do abuso.

Quando da condenação, a assessoria de Robinho, que na época já havia deixado o clube italiano, afirmou que o brasileiro já se defendeu das acusações e não teve qualquer participação no episódio. Ele ainda poderá recorrer em até duas instâncias. O atacante atuava pelo Atlético Mineiro quando saiu a sentença, algo que acelerou sua saída do futebol brasileiro ante protestos e faixas pelas ruas.

Robinho foi para o Sivasspor, da Turquia, seguiu no país vestindo a camisa do Başakşehir e agora teve sua recontratação (a segunda) pelo Santos anunciada, o que gerou críticas ao clube. A condenação na Itália faz com que ele não seja bem recebido, obviamente, por parte da torcida e da sociedade. É provável que Robinho seja repelido, rejeitado, vaiado em muitos estádios por onde passar vestindo a tradicional camisa santista. Apesar da resistência daqueles que minimizam o episódio repugnante que, segundo a justiça da Itália, ocorreu em 2013. Seja pela amizade, admiração ao seu futebol, gratidão por vitórias que ajudou a construir no passado, desinformação ou, absurdamente, por alguém não achar tão grave o que gerou a condenação do jogador.

Caso seja inocentado, isso deverá ser destacado na mídia, obviamente. Mas no momento não é essa a situação. Antes de se posicionar, cabe a cada um de nós se informar a respeito. Ainda mais nesse país onde tantos têm opinião sobre o que sequer conhecem. O código penal define estupro como crime, com pena de até 30 anos de prisão. Tratar a volta de Robinho ao Santos como se não existisse a condenação pela justiça italiana é abjeto, cínico, cretino. Esse é o Brasil atual.

Mauro Cezar Pereira, jornalista - Gazeta do Povo - Vozes



terça-feira, 5 de maio de 2020

Crise sobre crise - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo
A covid-19 avança, mas o tipo de crise de que Bolsonaro gosta é outro. Melhor não alimentá-lo

O objetivo não era esse, mas o ministro do Supremo Alexandre de Moraes pode ter salvo, ou ao menos aliviado, o presidente Jair Bolsonaro no processo em que é acusado pelo ex-ministro Sérgio Moro de investir contra a autonomia da Polícia Federal para obter informações sigilosas e interferir em processos autorizados pelo próprio Supremo. Até onde se sabe, Moro acusa o presidente de “intenções”. Se o ministro Moraes não tivesse impedido a posse do delegado Alexandre Ramagem na direção-geral da PF, estariam criadas as circunstâncias para que essas “intenções” se transformassem em atos – ou não. Sem Ramagem e com o delegado Rolando Alexandre de Souza na PF, os cuidados serão naturalmente redobrados para não jogar álcool na fogueira.

Logo, Alexandre de Moraes pode ter obtido o efeito inverso ao pretendido, dando uma mão para Bolsonaro e evitando que ele saísse do mundo da vontade para o da execução, caso Ramagem já chegasse reunindo investigações sobre este ou aquele amigo, este ou aquele inimigo do presidente e enviando diretamente para o Planalto. A subjetividade teria adquirido materialidade. Por ora, é a palavra de Moro contra a de Bolsonaro. Os generais Braga Netto, Luiz Eduardo Ramos e Augusto Heleno, apontados pelo ex-colega como testemunhas, não podem nem mentir para a Justiça nem incriminar o chefe. Basta confirmar que Bolsonaro exigia, sim, trocar o diretor da PF e ameaçava, sim, demitir o ministro da Justiça. E daí? É atribuição [constitucional]  do presidente nomear e demitir o outro.

Com Moro autorizando a divulgação de seu depoimento de oito horas à própria PF e ao Ministério Público, pode-se vir a saber e balancear o que ele entregou. Com 22 anos de magistratura, não seria ingênuo de fazer acusações pesadas, e justamente contra o presidente, sem provas. De outro lado, ele teria apagado as conversas pelo celular, preservando apenas as dos últimos 15 dias antes da queda.

Se for assim, o torpedo mais letal contra Bolsonaro é a mensagem, já divulgada pela Rede Globo, em que ele reclama de investigações sobre “dez a doze deputados do PSL” e termina com uma frase bastante comprometedora: “Mais um motivo para a troca (na PF)”. Mas será que Moro só tem isso? [Caso só tenha isso, nada tem; 
ao que se sabe a mensagem pode perfeitamente ter sido enviada por Bolsonaro para o ex-ministro, para expressar sua preocupação com o que considerava um exagero da PF e aproveitado o comentário da possível exorbitância da Polícia Federal para fundamentar a conveniência da troca que pretendia fazer.]
Como as demonstrações de Bolsonaro contra o STF e o Congresso, houve um consenso contra ele e pró-Alexandre de Moraes. Porém, juristas, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, e os militares do Planalto estão convencidos de que Moraes extrapolou. E, assim, deu pretexto para Bolsonaro ameaçar também extrapolar. O risco é crise institucional.

E assim vai-se vivendo, de manifestação em manifestação de inspiração golpista, embalada pelo presidente da República e pelos símbolos e cores nacionais e agora com ataques covardes a enfermeiros e a jornalistas, como os brilhantes fotógrafos Dida Sampaio, do Estado, e Orlando Brito, um veterano, e ao motorista Marcos Pereira.

A cada provocação de Bolsonaro e de bolsonaristas, o Ministério da Defesa tem de acertar o tom na defesa da democracia sem atacar Bolsonaro e pregar “a independência e a harmonia entre os Poderes”. 
[missão difícil, especialmente diante do convencimento de que Moraes extrapolou e não é a primeira vez que um ministro do STF invade competência do Executivo. 

O caso do ministro Barroso é outro exemplo de invasão de competência - interferindo na política externa brasileira em relação aos venezuelanos.] Está virando rotina. O coronavírus atinge mais de cem mil brasileiros e mata mais de 7 mil, mas o presidente não está nem aí. O tipo de crise de que ele gosta é bem outro. Quanto menos se alimentar, melhor. 

Equilibristas
Nos deixaram na segunda-feira, 4, além de Flávio Migliaccio, o iluminado Aldir Blanc, autor do hino informal da reabertura política, e o grande político Guilherme Palmeira, que liderou com Marco Maciel e Jorge Bornhausen a dissidência do regime que se revelou fundamental para enterrar a ditadura. A morte de ambos traz memórias e reflexões preciosas neste momento difícil, às vezes assustador.

Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo

domingo, 12 de abril de 2020

O bêbado e a borboleta - Nas entrelinhas

“Desafiar o novo coronavírus se tornou uma espécie de obsessão para o presidente da República, que se comporta como quem adquiriu imunidade contra a doença

No livro O revólver que sempre dispara (Casa Amarela), Emanuel Ferraz Vespucci analisa as causas, os comportamentos e as consequências para a saúde de diversas dependências químicas, inclusive o alcoolismo e o tabagismo. É um livro despido de preconceito e, do ponto de vista clínico, como não poderia deixar de ser, serve de referência para os que lidam com o problema: usuários em busca de tratamento, seus familiares e terapeutas. O livro explica de maneira clara como as diversas drogas causam dependência física e psicológica, os problemas que acarretam e as maneiras de enfrentá-los, sem moralismo. A perda de controle sobre o álcool, a cocaína, o crack, a maconha, morfina, calmantes, inibidores de apetite e outros psicotrópicos é um problema muito mais amplo do que se imagina.

A dependência funciona como uma roleta russa. Em algum momento a bala que está no cilindro do revólver será disparada, na medida em que o sujeito arrisca mais uma vez. Ou seja, o acaso tem um limite, quanto maior a frequência, maior a probalidade de ocorrência. Por causa da dependência, algo grave acontecerá na vida da pessoa, pode ser um acidente de carro, a perda do emprego, um surto psicótico, um infarto. 

O que interessa aqui é a analogia da roleta-russa, ou seja, do revólver que sempre dispara. Durante a pandemia de Covid-19, por causa do risco de contaminação, sair de casa é uma espécie de roleta russa, mesmo que a pessoa utilize máscaras e luvas. Acontece que o presidente da República — com o objetivo declarado de desmoralizar a política de distanciamento social preconizada pelas autoridades médicas, inclusive seu ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e responsabilizar governadores e prefeitos pela recessão econômica — resolveu sair às ruas com frequência e, nesses passeios, visitar o comércio local para estimular proprietários e consumidores a manterem uma vida normal. Bolsonaro ignora uma epidemia que está matando mais de 100 pessoas por dia no Brasil, o equivalente a um desastre de grandes proporções.

Desafiar o novo coronavírus se tornou uma espécie de obsessão para o presidente, que se comporta como quem adquiriu imunidade contra a doença, como acontece com aqueles que já foram contaminados, se recuperaram e adquiriram anticorpos ou que, por qualquer outra razão, têm uma sistema imunológico mais robusto, geralmente mais jovens. Não se sabe se o presidente está imunizado; ele se recusa a revelar os resultados dos exames que fez. Bolsonaro age como um jogador compulsivo, o que não deixa de ser uma dependência, sem levar em conta que a maioria das pessoas não está preparada para lidar com o aleatório.

Teoria do caos
É aí que chegamos a O andar do bêbado (Zahar), o instigante livro do físico Leonard Mlodinow, do Instituto de Tecnologia da Califórnia, sobre o acaso na vida das pessoas, ou melhor, sobre como funciona a aleatoriedade. O novo coronavírus se multiplica como um “Efeito Borboleta”, descoberto em 1960, pelo matemático Edward Lorenz, base para a Teoria do Caos. Mostra como pequenas alterações nas condições iniciais de grandes sistemas podem gerar transformações drásticas e significativas.

Lorenz, que também era meteorologista, realizava cálculos relacionado a padrões climáticos num computador. Em vez de colocar 0,000001, conforme fez na primeira vez, ele colocou 0,0001, alterando completamente o resultado da simulação, como se o bater de asas de uma borboleta na Austrália provocasse um furacão no Caribe. Foi o que aconteceu com o coronavírus na Alemanha e na Coreia do Sul, países que mais bem monitoraram a epidemia e conseguiram mantê-la sobre controle, com testes em massa e hospitalização dos contaminados. No primeiro caso, bastou que uma pessoa contaminada usasse o saleiro num almoço de família para a epidemia se propagar; no segundo, um único paciente, de 30 casos confirmados, escapou do isolamento e disseminou a doença.

Na Sexta-feira da Paixão contabilizamos 1.056 mortes e 19.638 casos confirmados, 44 dias após o primeiro caso registrado no país e 24 dias depois do registro da primeira morte. São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Ceará e Amazonas estão em risco de colapso do sistema de saúde pública. Numa hora em que o país precisa de coesão social e alinhamento das políticas de combate ao novo coronavírus, para evitar o colapso do sistema de saúde, Bolsonaro aposta na autoimunizaçao pelo contagio e num medicamento de eficácia limitada nos tratamentos, a hidroxicloroquina, para evitar as mortes, e prega a retomada imediata das atividades econômicas, com adoção do chamado isolamento seletivo ou vertical. Essas apostas foram feitas em outros países, como os Estados Unidos, Inglaterra e Japão, e fracassaram.

Nas Entrelinhas - Luiz Carlos Azedo, jornalista - Correio Braziliense




quarta-feira, 25 de março de 2020

A Fiesp expôs sua alma em reunião com Bolsonaro - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo

 Videoconferência com empresários em meio à crise do coronavírus é penoso documento histórico - Grandes empresários mostraram-se pedestres e pedinchões

Ofertas concretas e bem-vindas vieram de Jean Jereissati (Ambev) e de David Feffer (Suzano). Um contou que sua fábrica do Rio foi reciclada para produzir álcool que será doado à rede pública. O outro revelou que doará 500 mil máscaras. A  reunião produziu três “Momentos Fiesp”. O primeiro aconteceu depois que Eugênio de Zagottis, falando pelas farmácias, pediu o razoável adiamento da remarcação de preços prevista para a semana que vem: “O Brasil não precisa dessa manchete”.

Deu-se uma saia justa. Carlos Sanchez, representante da indústria farmacêutica, retomou a palavra, dizendo que os aumentos para remédios relacionados com a Covid-19 poderiam ser adiados. Quanto aos demais, só haveria dois caminhos, um dólar de R$ 4 para o seu setor ou uma redução de 5% na margem das farmácias, que deveria ser repassada à sua indústria. A proposta de Zagottis ficou no ar.

Num outro episódio, Rubens Ometto, o maior produtor de álcool neutro do país, trouxe uma agenda filosófica: “A gente precisa tomar muito cuidado com as promessas que têm sido feitas para a população, porque às vezes você pode quebrar uma cadeia dos serviços e dos negócios que são feitos, como a promessa de itens grátis, como água, como luz, como esse negócio todo. Vai se criando uma ideia de que não há necessidade de pagar.”

Tudo bem, mas tinha-se acabado de tratar, sem sucesso, da conveniência de se adiar um aumento de preços de remédios.
No terceiro episódio, Edson Queiroz Neto pediu que aviões da FAB fossem à China para buscar suas encomendas relacionadas com a epidemia. Tomou um contravapor do ministro da Casa Civil, Braga Netto, lembrando-lhe que a Vale fretou um avião para buscar o material que doará.

A Vale, que não estava na reunião, fechou na China a compra de cinco milhões de testes rápidos. A primeira remessa, de um milhão, deve chegar na sexta-feira. Os quatro milhões restantes chegarão em meados de abril. Essa doação equivale à metade das unidades que o Ministério da Saúde estima necessitar. Tudo sem necessidade de pagar. [É muito generosidade, especialmente por parte de uma Empresa que foi vítima de uma fatalidade e que há mais de um ano vem suportando uma "industria" de  indenizações que favorecem a milhares de pessoa, que se apresentam como parentes de vítimas do desastre Brumadinho.]

A Fiesp mostrou um rosto cenográfico, e alguns grandes empresários mostraram-se pedestres e pedinchões. (Paulo Skaf, presidente da Fiesp, prometeu cinco mil leitos. Enquanto ele falava, o ministro Luiz Henrique Mandetta tamborilava com os dedos na mesa.) No dia seguinte a essa cena espetaculosa e irrelevante, uma franquia da Domino’s, sem fanfarra, mandou umas 30 pizzas aos profissionais da saúde de um hospital público do Centro do Rio, com o seguinte bilhete:
“Com um toque de amor, em agradecimento a todos vocês que estão na linha de frente, se sacrificando por nós”.

De vez em quando, surge a ideia de que o ato de pagar (e de receber) não é tudo na vida de um povo, de uma empresa ou até de uma pessoa.

Folha de S.Paulo - O Globo - Elio Gaspari, jornalista